Reforma Agrária

Incra paga menos da metade das desapropriações da reforma agrária

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4 de maio de 2002, 19h33

Entre 1993 e setembro de 2001, o presidente Fernando Henrique Cardoso desapropriou 3.541 imóveis rurais para fazer a reforma agrária. Mas, no mesmo período, só pagou a metade dos valores determinados pela Justiça como indenização aos desapropriados.

A explicação, além da indisposição do governo em pagar, são as sucessivas vitórias do Incra na Justiça. Das 3,5 mil desapropriações feitas, aponta relatório obtido com exclusividade por este site, apenas 1,16% foram revertidas no Supremo Tribunal Federal – o endereço onde esse tipo de caso tem solução definitiva.

Nos últimos cinco anos, o governo chegou a comprometer-se com o pagamento de R$ 1,170 bilhão aos desapropriados. Essa quantia chegou a ser lançada nas previsões orçamentárias. Mas apenas R$ 515 milhões foram pagos. O restante foi impugnado pela procuradoria do Incra.

Em valores atualizados, relata a Procuradoria do Ministério do Desenvolvimento Agrário, foram economizados mais de R$ 836 milhões no período.

É uma guerra insana que percorre todas as instâncias da Justiça Federal. Nos últimos anos, a União passou a impugnar os pagamentos depois do trânsito em julgado dos processos, apresentando ações rescisórias sobre os precatórios já emitidos.

A avalanche de processos contra o Incra não é pequena. Nos cinco TRFs acumulam-se 6.784 processos. Nem todos se referem a desapropriações. Muitos referem-se a dívidas trabalhistas. Já quanto aos valores, somente em 2001, as desapropriações representaram mais da metade dos R$ 26 milhões “poupados” pelo órgão.

No STF registra-se a existência de 271 recursos. No STJ, outros 182.

Analisados os últimos cinco anos, vê-se que o Incra tem reduzido, a cada exercício, o volume de pagamentos. Em 1997, foram pagos R$ 313 milhões (59% da previsão orçamentária); em 1998, pagou-se R$ 79 milhões (16% do previsto); em 1999, R$ 81 milhões (33%); em 2000, R$ 21 milhões (84%); e, finalmente, em 2001, R$ 20 milhões (42% do comprometido).

Resta saber se, em eventual mudança do comportamento do Judiciário, o sucessor de FHC não terá de arcar com os valores que a atual administração vem impugnando ou adiando a quitação. E chega-se aí à dúvida principal: o montante da dívida cobrada. Esse número o governo não revela. Seja por discordar dos cálculos, seja porque o volume pode ser, efetivamente, assustador.

Levantamento do Incra

O STF recebeu o pedido de 189 mandados de segurança para anular as desapropriações, de acordo com levantamento do Incra. De todos os mandados de segurança impetrados contra desapropriações, 97 foram indeferidos, 41 foram deferidos e 51 ainda estão em julgamento no STF. Assim, dos imóveis indicados para desapropriação apenas 1,16% não foram desapropriados.

Os proprietários rurais dos Estados do Amazonas (três decretos), Piauí (108 decretos), Rio Grande do Norte (222 decretos) e Rondônia (37 decretos) não entraram com ação contra a decisão governamental. Nos Estados de Roraima e Amapá nenhuma propriedade rural foi indicada para desapropriação.

O Incra analisou as decisões do STF, de 1993 a setembro de 2001, sobre os mandados de segurança pedidos pelos proprietários que não aceitaram a desapropriação de seus imóveis. A conclusão foi de que os temas debatidos são recorrentes.

Na maioria dos mandados de segurança (59) alegou-se descumprimento do devido processo legal. Os proprietários reclamaram que não tiveram direito à ampla defesa. A falta de vistoria apuratória, por exemplo, que precisa ser comunicada previamente ao proprietário do terreno. Do total, quarenta pedidos baseados nessa alegação foram indeferidos.

Outro argumento comum é a produtividade do imóvel. Segundo a Lei 8.629/93, somente imóveis improdutivos podem ser desapropriados pela Administração Pública. Todos os 48 mandados que se basearam nesse ponto foram indeferidos pelo STF.

O terceiro motivo mais utilizado pelos proprietários rurais é a inconstitucionalidade do artigo 6º da Lei 8.629/93. Esse artigo diz quais são os parâmetros para definição de “imóvel produtivo”. Segundo os advogados dos autores dos mandados, essa lei é inconstitucional. Ela não seguiria os critérios estabelecidos pelo artigo 186 da Constituição Federal.

O STF indeferiu os trezes pedidos que alegaram a inconstitucionalidade. De acordo com o Supremo, a jurisprudência sobre este assunto já é pacífica. Os pedidos foram anulados.

Outros proprietários argumentaram a perda de produtividade por caso fortuito ou força maior (5 pedidos, 3 indeferidos), que o imóvel rural foi invadido (6 pedidos, 4 indeferidos), que o fracionamento do imóvel rural tornou o terreno insuscetível à desapropriação (10 pedidos, 9 deferidos), a implantação de projeto técnico de exploração que tornará a propriedade produtiva (6 pedidos, 4 indeferidos), e a classificação da propriedade como pequena ou média (5 pedidos, 4 indeferidos).

Para o Incra, o número mínimo de mandados de segurança deferidos demonstra o acerto nas indicações dos imóveis rurais para a desapropriação.

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