Vida digital

Bioinformática é a profissão do futuro para talentosos

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30 de junho de 2002, 10h13

Apesar de uma ligeira desaceleração da nova economia (tech economy), em que assistimos constantemente ao nascimento e morte de empresas ponto.com, a evolução da tecnologia continua criando cada vez mais novas oportunidades de emprego – e muito bem remunerados. Uma dessas atividades, a “bioinformática”, que sequer existia há alguns anos, já está se tornando um ímã para jovens inteligentes e talentosos.

A bioinformática – literalmente, a fusão da biologia com a supercomputação – já está começando a revolucionar a indústria da saúde. O novo campo engloba seu mais conhecido tentáculo – genômica, o estudo dos genes e sua função. Envolve ainda o uso de supercomputadores, extensas bases de dados e complexos softwares para analisar a montanha de dados emergentes do seqüenciamento do genoma humano, cujo mapeamento foi praticamente encerrado no ano 2000.

O projeto, que durou uma década, catalogou 1 bilhão de pares de DNA, o componente químico que viabiliza os genes que nos fabricam, a partir de apenas quatro ingredientes do DNA: adenina, timina, citosina e guanina. É aí que entra a bioinformática, oferecendo as ferramentas para explorar essa imensa gama de informações e casar o DNA com os genes. Investidores já injetaram mais de US$ 700 milhões no campo somente no ano passado; dezenas de instituições, incluindo a prestigiosa Universidade da Califórnia (UCLA) criaram centros de bioinformática nos últimos dois anos e gigantes tecnológicos como a IBM já estão se preparando para criar e vender equipamentos computacionais para esse nascente campo digital.

Estima-se que essa nova face da indústria poderá consumir até US$ 40 bilhões nos próximos cinco anos em todo o mundo, possibilitando, segundo os especialistas, que as empresas farmacêuticas economizem anos de pesquisa para novos medicamentos e permitindo aos médicos “fabricarem” remédios especificamente destinados ao perfil genético dos pacientes. Na opinião de Nathan Myhrvold, ex-alto executivo da Microsoft e atualmente um investidor voltado para a biotecnologia, “a bioinformática pode se tornar uma oportunidade de negócios tão grande quanto a própria indústria de computadores”.

Mas o jovem campo precisa encontrar as pessoas certas para criar, aplicar e administrar sistemas tão complexos. Um dos estudos realizados demonstra que essa indústria necessitará algo em torno de 20.000 indivíduos altamente treinados até o ano 2005, uma nova geração de “supernerds” capazes de entender as complexas linguagens da biologia e da ciência dos computadores. Não raro, esses profissionais irão ter acesso a salários iniciais de US$ 100.000/ano. A maioria das pessoas com o preparo clássico da biologia não tem as capacidades quantitativas necessárias para abraçar o novíssimo campo da bioinformática e a maioria das pessoas treinadas em computação ou estatística não conhece o suficiente de biologia para entender a complexidade dos problemas emergentes. Apesar do repentino interesse e importância, a bioinformática já existe, de alguma forma, há uns 20 anos.

Na década de 80 era chamada de biologia computacional. Naquela época, os pesquisadores verificavam as seqüências de DNA através de um data-base chamado GenBank, que oferecia acesso gratuito a partir do Departamento de Energia do governo dos Estados Unidos. Desde então os estudos para classificar os ingredientes genéticos humanos ganharam formidável impulso e copiosas quantidades de informação. Em 1985 o GenBank continha cerca de 5.700 seqüências de DNA.

Hoje, com o projeto Genoma Humano, esse número já pulou para mais de 10 milhões. Algumas das mais importantes companhias do projeto, como a Human Genome Sciences e a Celera já têm suas divisões de bioinformática oferecendo suas próprias bases de dados de DNA. E o direito autoral já se faz presente na nova e nascente disciplina: todos os cientistas que utilizam essas informações em suas pesquisas têm que pagar royalties às empresas sobre quaisquer resultados práticos, como novos medicamentos ou métodos de profilaxia. Ainda assim, seria uma tarefa de séculos para pesquisadores percorrerem e conhecerem a totalidade dos dados disponibilizados pelo projeto Genoma. Assim, uma nova categoria de empresas de bioinformática está surgindo, com o objetivo de desenvolver os softwares necessários para estudar toda essa gama de informações.

Grandes empresas da informática como a IBM, a Compaq e a Oracle não querem ficar de fora e já estão investindo milhões de dólares no desenvolvimento de novos supercomputadores. Somente a IBM já jogou US$ 100 milhões numa máquina apelidada de “Blue Gene”, que pretende descrever como as proteínas humanas são compostas e que atividades exercem, criando outro tentáculo da genômica chamado de “proteômica” (proteomics). Como todas essas novas atividades e estudos irão mudar o mundo? Essas novas ferramentas poderão reduzir os ciclos de desenvolvimento de novos medicamentos – hoje em torno de 10 anos – bem como os seus altos custos. Remédios antes considerados inócuos poderão ser descartados mais cedo, se os computadores revelarem que alguns dos seus componentes produziram reações tóxicas no passado.

A bioinformática também irá mudar a categoria dos remédios autorizados. Hoje, no mercado, as drogas são como calçados de tênis: produzidos em massa para uma inteira classe de indivíduos (ex: os que calçam tamanho 40 e as vítimas de AIDS). Pesquisadores já vislumbram o tempo em que remédios abandonados porque causavam efeitos colaterais nocivos em algumas pessoas continuarão a ser produzidos, pois através de complexos estudos genéticos de seus componentes, não causarão tais efeitos em outras.

Os cientistas vão além, prevendo o tempo em que rotineiros exames de sangue identificarão para os médicos que tipo de mecanismo genético de cada paciente seu se adaptará melhor a determinado tipo de medicamento. Todos esses avanços ainda esbarram na necessidade urgente de ampliação da oferta de elemento humano para preencher tantos e tão vitais postos de trabalho em gestação pela bioinformática, mais um tentáculo da assombrosa evolução propiciada pela era digital dos computadores na virada do Terceiro Milênio.

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