Críticas repudiadas

Algumas reflexões sobre a situação atual do Poder Judiciário

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26 de junho de 2002, 18h26

Sombrio o futuro de um país no qual o Poder Judiciário seja amesquinhado, constantemente e sem qualquer conseqüência para os que anelam diminuí-lo e efetivamente o fazem. E infelizmente isso anda ocorrendo com extrema facilidade no nosso amado Brasil.

Com efeito em completo desrespeito ao Poder Judiciário e seus componentes, integrantes de setores da sociedade, em sentido amplo, atacam as decisões judiciais abordado-as mesmo sendo, alguns jejunos nesse tipo de questão agredindo os juízes sem consideração pelo cargo que ocupam e mesmo enquanto homens não lembrando sequer dos rigorosos exames a que se submetem para que possam ingressar na Magistratura, que os obrigam a possuir conhecimentos absolutamente não exigidos, nem normalmente encontrados, salvo gloriosas exceções, entre os seus detratores.

Tal procedimento, sem qualquer dúvida, é uma agressão à própria soberania do Estado realmente, pois como é bom recordar. Jurisdição é uma função de soberania do Estado. É poder de declarar o direito aplicável aos fatos.

No regime da legalidade é missão precípua do Estado manter o prestígio e a autoridade da lei (1). E esse ataque ao Poder Judiciário e aos juizes, a par de agredir a soberania, como salientado já também não é recomendável por mexer com o ponto central de toda organização política do Estado, já que:

“As condições de investidora e acesso dos juízes as garantias de sua independência, constituem uma das mais altas missões políticas do Estado. É matéria que mais interessa ao direito constitucional do que propriamente ao direito judiciário pois não trata apenas de garantir uma classe de funcionários nem de disciplinar a atuação de um dos poderes constitucionais, mas de dar ao próprio povo, que se organiza politicamente, as supremas garantias existenciais.

Explica-se portanto o carinho com que todas as constituições políticas encaram o problema da organização judiciária. É que, no Poder Judiciário reside o ponto central de equilíbrio de toda organização política. Enquanto legislativo e executivo pela própria natureza de suas funções, são poderes eminentemente políticos, cuja ação se morteia pelas contingências de momento, o judiciário está plantado no centro de toda a estrutura constitucional, como um porto fixo de garantia contra as paixões do ambiente social ou político e salvaguarda dos direitos do homem particular ou como cidadão(2).

Ou seja, os indivíduos e mesmo o próprio Estado, acrescenta-se não estarão seguros, antes ficarão sujeitos aos interesses de momento naturalmente instáveis, e que guiam os demais poderes não no mau sentido da expressão mas com atenção na dose de inconstância mutabilidade e variação às vezes repentina que os norteia na busca da nota certa e que pode levar o País ao progresso.

Mas podem os poderes vez por outra no afã de acertar a senda, colidir com direitos dos cidadãos e em situações tais é que assoma a relevância do Poder Judiciário, que. Já por isso não deve ser menosprezado nem se pode permitir ainda que por vias oblíquas, sejam e/ou não asseguradas as garantias que seus representantes devem possuir.

E foi se olvide, longo e íngreme o caminho percorrido para que se tivesse juízes que pudessem, sem sofrer pressões, imparcialmente aplicar a lei, e tão torturoso que não se deve criar ambiente favorável a que seja novamente percorrido. O insigne Arruda Alvim, com a clareza que o distingue dilucidou que:

“Por outro lado, foi muito longa a caminhada do homem para conseguir um juiz que viesse aplicar imparcialmente a lei para que conseguisse a realização da justiça de forma justa entendendo-se por justa a fiel observância das leis, necessitou-se defender o homem que a distribuía. Ainda foi preciso especializar no quadro das funções estatais, a função por ele exercida, com o que impedindo-se injunção dos outros poderes ou mesmo de indivíduos poderosos sobre o Judiciário defendia-se a pessoa do juiz, como imparcial e justo aplicador da lei não em favor do homem juiz porém em benefício da sociedade”.(3)

Note-se bem, por mui relevante que oferecer as garantias necessárias aos integrantes do Poder Judiciário para que possam cumprir serena mas firmemente, suas obrigações não beneficiará o juiz enquanto homem mas a sociedade como um todo porquanto ter-se-á a tranqüilidade de que os julgamentos serão feitos sem que seus prolatores sofram influências externas e extremamente perniciosas, além do que como se desconhece os homens vão mas se espera que a sociedade fique.

Certamente não será imprescindível enumerar as vantagens que daí advirão para todos mas e principalmente para os homens humildes, não poderosos os simples os indivíduos do povo o que não implica a exclusão dos poderosos pois o que prevalece é o suum cuique tribuere, independentemente da classe social a que pertença. Por isso lembra o culto Francisco Vani Bemfica;

“Daí porque Story valendo-se de uma frase de Burke escreveu que o estado deve organizar a magistratura, como se esta fosse uma instituição criada e existente fora do mesmo estado”(4)

Ora se esse sistema é bom e justo porque vem sendo tão acremente criticado? A quem interessa indispor a coletividade contra o Poder Judiciário?

As sentenças dos juízes quando contrárias aos interesses de certos segmentos que podem influenciar nos destinos da Nação certamente contribuem para açular a ira de seus componentes os quais então passam valendo-se dos meios de que dispõem inclusive indivíduos que entram ingenuamente na trama acreditando mesmo estar sendo útil ao País a orquestrar campanha contra o Poder Judiciário visando minar o conceito bom, aliás que desfruta junto à população.

Outros pensando que a economia tudo pode e tudo resolve acreditam que quando o Judiciário a que um plano econômico seja executado exatamente como concebido traz prejuízo ao País e desdouro ao criador desse mesmo plano pelo que cumpre cercear as atividades do Poder Judiciário, atacando as mãos dos juízes.

Mas não é essa a idéia que deve vingar. O Poder Judiciário por seus integrantes patriotas como os demais brasileiros devem ou deveriam ser torce também e muito para que a economia possibilite seja traçado e colocado em prática algum plano que permita ao País melhorar a condição de vida de todos mas não pode quando provocado, pois é uma das condições para sua atuação como é bom não esquecer, e realmente verificada a hipótese admitir que algum plano ignore a leis existentes e em sua execução venha a atingir muitas vezes com prejuízos altamente consideráveis os direitos dos outros, pois aí sim estaria negando seus fins e tornando-se passível de críticas.

Ocasiões outras se apresentam em que se ataca critica-se duramente, o Poder Judiciário, mas o ataque, a crítica, não têm um fim em si mesmos tendo como escopo isso sim desviar a atenção dos problemas sérios que tanto afligem torturam o povo brasileiro.

A impressão que se tem é a de que sabendo-se já que os integrantes do Poder Judiciário são avessos à política e/ou manifestações públicas e/ou sensacionalismos pela natureza de suas funções há os que procuram valer-se dessa circunstância e tentam agredi-lo, seja para se promoverem seja para desviar a atenção dos problemas sérios que atormentam o povo brasileiro e obstam o progresso deste País.

É por isso entende-se é chegada hora de se pôr cobro a tal situação. O Poder Judiciário não deve ser político no sentido partidário, mas deve sê-lo no sentido mais alto do vocábulo devendo sempre se manifestar quando for atacado enquanto Poder, ou mesmo quando um de seus membros e/ou garantias não for respeitado informando a coletividade acerca do que realmente se passa neste ou naquele caso, que precise de amplo esclarecimento.

Por derradeiro, não será importuna a reprodução de trecho da introdução de Bill Moyers ao livro O poder do Mito, de Joseph Campbell, em conversações deste com aquele, publicado pela Editora Palas Athena p VIII. in verbis:

“Considere-se a posição dos juízes em nossa sociedade, que Campbell encantava em termos mitológicos não sociológicos. Se essa posição representasse apenas um papel o juiz poderia vestir, na corte um termo cinza em vez da negra toga magisterial. Para que alei possa manter a autoridade além da mera coerção, o poder do juiz precisa se ritualizado mitologizado”.

Ora com as adaptações devidas essa mesma idéia é útil e válida em outros países, como o nosso porque interessa incutir ao povo o respeito não exatamente ao juiz enquanto singularmente considerado, mas ao Poder que ele integra, pois se e quando o Poder Judiciário não for mais respeitado pela sociedade ter-se-á como inconcebível a continuidade de existência da mesma sem alguma procela que possa até comprometer o modo de vida de seus componentes, até então. Que o grande arquiteto não permita que o Brasil por mais esse transe.

Notas de rodapé

1- Gabriel José Rodrigues de Rezende Filho, Curso de direito processual civil. 7. ed; saraiva 1962 p. 86.

2 – José Bonumá, direito processual civil, saraiva 1946. v I, p 260-1.

3 – Manual de direito processual civil. Revista dos Tribunais, 1977. v. I p. 69-70.

4 – O juiz. O promotor. O advogado, I ed. Forense. P. 2.

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