Consultor Jurídico

Pleno do TST examinará incorporação de adicional

22 de junho de 2002, 16h36

Por Flávia Arbache

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Uma decisão recente da 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) referente à não incorporação do adicional noturno na parcela do salário de João Nunes Rezende, deve ser brevemente questionada como inconstitucional no pleno da corte trabalhista.

O caso refere-se a uma ação trabalhista impetrada pelo funcionário João Nunes Rezende, que durante 27 anos cumpriu expediente noturno no Banco Banerj, mas acabou transferido para o horário diurno, quando estava prestes a requerer aposentadoria.

Especialistas afirmam que a decisão fere à Consolidação das Leis Trabalhistas e à Constituição Federal. A mudança de horário não pode acarretar danos e prejuízos à saúde do empregado, assim como não pode interferir no direito adquirido ao longo do tempo, conforme assegura o artigo 36 da Constituição Federal.

O recurso deverá ser interposto na Seção de Dissídios Individuais do TST somente após a publicação do acórdão no Diário Oficial. O Banco Banerj, hoje incorporado pelo Itaú, havia recorrido da decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região que concedeu o pagamento do adicional ao salário do empregado por entender como habitual na vida do empregado.

Pré-requisito

Rezende foi admitido, em 1957, pelo antigo Banco da Prefeitura do Distrito Federal S/A, sucedido pelo Banco Banerj, como auxiliar de escritório. Em 1966, Rezende foi submetido a uma mudança e seu horário, trabalhando das 22h45m às 7h na área de processamento de dados. Vinte anos depois, foi promovido a chefe da seção. Em 1993, Rezende teve a sua rotina novamente modificada pela empresa. Ele passou a cumprir o horário das 12h às 21h e o adicional noturno foi cancelado.

Rezende ajuizou ação trabalhista contra o Banerj a fim de contestar o motivo da alteração de horário, uma vez que a modificação fora feita justamente quando ele estava prestes a requerer a aposentadoria por tempo de serviço.

A ministra relatora, Maria Cristina Peduzzi, foi vencida por maioria de votos e a turma acolheu o recurso do banco, cassando a decisão do TRT/RJ. O ministro Carlos Alberto Reis, relator do processo, afirmou que o adicional noturno somente é pago em condições excepcionais e quando o trabalhador volta a cumprir horário normal o valor adicional é retirado normalmente.

– A causa tira o efeito do adicional. O empregado teve o horário modificado e ainda está trabalhando, só que agora em horário diurno. O pedido é uma contradição, pois a natureza do adicional é a de que o trabalhador deve receber enquanto estiver trabalhando em períodos noturnos. Apenas julguei o que estava nos autos – afirmou o ministro.

Para Alberto Reis, a decisão do TRT/RJ levou em consideração o longo tempo de serviço prestado pelo trabalhador. “A interpretação foi a de que o empregado deveria receber o pagamento habitual, mas não concordo com esta posição”, ressaltou o ministro.

O advogado Gustavo Vogel explicou que o Enunciado nº 265 do TST estabelece que a transferência para o período diurno de trabalho implica a perda do direito ao adicional noturno. No entanto, Vogel adverte que a mudança de turno não pode ser desprezada se o empregado sair lesado com a alteração sofrida.

O artigo 468 do Consolidação das Leis Trabalhistas determina que “nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração de respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia”.

– Em face deste artigo, a decisão da 3ªTurma do TST é flagrantemente injurídica, pois considera válida uma alteração de condições de trabalho que só se poderia admitir com o consentimento do empregado. A transferência para o serviço diurno, após 27 anos, constitui ato ilegal do empregador, afetando seriamente a rotina de vida e os interesses do trabalhador – afirmou Vogel.

Luciana Gato, advogada do Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro, também contesta a decisão da 3ª Turma do TST. Para ela, a alteração contratual não pode ser feita unilateralmente, pois pode causar danos ao empregado.

Direito extrapolado

– Após 27 anos em um único turno, é óbvio que acarretará prejuízos ao trabalhador. Aliás, a Constituição Federal, no artigo 5º, inciso XXXVI, estabelece que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. O adicional noturno já estava incorporado na vida do trabalhador e isso deve ser preservado, pois lhe é de direito – afirmou Luciana.

Para o advogado Luis Fernando Aragão, a habitualidade pelo tempo de serviço era incorporada no salário. Mas, em 1987, o

Enunciado nº 265 mudou o entendimento. Apesar de o trabalho ter sido exercido durante a madrugada, após a transferência para horário diurno, o empregado perde o direito do adicional.

– O TST pode novamente mudar o seu entendimento e até mesmo criar jurisprudência uniforme. Mas, meste caso, a probabilidade

de êxito é pequena, pois o Pleno não irá contrariar um entendimento já firmado do próprio TST – ressaltou Aragão.

O advogado Gustavo Vogel acrescentou ainda que o adicional noturno equivale a 20% do valor da hora diurna. “No caso, o empregador extrapolou visivelmente os limites daquele direito, ocasionando sério prejuízo ao empregado, sem lhe dar oportunidade de manifestar a sua concordância ou não quanto à mudança de turno”, disse Vogel.

Fonte: Jornal do Commercio