Vestido de baile

A polêmica do vestido de baile

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24 de julho de 2002, 17h21

Pois é….

“De cabeça de juiz; barriga de criança e urna… realmente ninguém sabe o que pode sair !”

Malgrado as ponderações de S. Exa., todas de grande relevância social, no sentido assistencial que o termo possa comportar, é claro. Mister é verificar as razões pelas quais o judiciário brasileiro efetiva e cabalmente não consegue de fato livrar-se da terrível carga quantitativa de processos que por seus ombros pesa.

“Data venia” não é moral, nem honesto, menosprezar o que se vislumbrou como “direito de menor importância”. E, isso para dizer-se o menos, na exata medida em que é de se duvidar exista tão odiosa figura, via da qual se possa mensurar objetivamente maior ou menor importância à dor alheia…

Pior que se pretender objetivar o subjetivismo, só mesmo é atribuir-se à vislumbrada “pequenez da querela” uma, senão a principal causa das incontáveis mazelas sociais referidas. Como se o judiciário, malgrado seus heróicos e indormidos esforços, mercê do tempo dele “furtado” na resolução de tais “questiúnculas” se visse “impedido” solucionar a tempo e hora as necessidades humanas de maior alcance social que rotineiramente dele reclama solução.

Tanto seria cômico se trágico não fosse! O silogismo é patente! S.Exa. deveria saber que a causa da impotência do judiciário repousa não na sua clientela e menos ainda nas ferramentas de que dispõe para a solução de qualquer litígio. A impotência está em seu próprio seio.

Essa causa é encontrável, dentre outros, no procedimento irresponsável daquele juiz que, inobstante, leva diariamente para casa pilhas e pilhas de feitos. E que em cada manhã seguinte, é encontrado nos clubes da vida jogando golfe, tênis ou tomando sauna. Afinal o Fórum só abre após o almoço.

É encontrável também dentre outros, no procedimento abjeto e covarde daquele juiz que, ao término da audiência instrutória, também impropriamente dita de julgamento, onde se produziu toda a prova de que necessitaria para julgar o caso.

Bem ao revés disso, sem nada decidir, relega o feito ao futuro, movido exclusivamente pela expectativa de que as partes, afinal se componham, evitando-lhe assim não só o trabalho de decidir, mas também e, principalmente, a impossibilidade de reexame de sua decisão pela Segunda Instância o que poderia, ao menos em tese, macular seu bom conceito entre seus pares; vale dizer; o tempo mata dois coelhos de uma só cajadada…

Seria de perguntar se, inocorrendo o aguardado acordo outro juiz, que não acompanhou o caso e, portanto, vê-se preso à letra fria das assentadas, poderá distribuir justiça com o mesmo equilíbrio daquele que instruiu o feito?

E, quanto a este; passado o tempo, mercê da sempre presente sobrecarga de trabalho, lembrar-se-á ainda que perfunctoriamente do caso que naquela longínqua audiência instrutória estimulava seus sentidos?

Estes alguns dos fatos enfrentados no dia-a-dia forense. Porém, é necessário, quando se fala de justiça, ser justo! E justiça seja feita: há juízes que honram sobremaneira a toga que envergam e que não se prestam a essas práticas. Porém a existência destes não pode conduzir automaticamente à falsa conclusão da inexistência daqueles e que o judiciário, como um todo, está infenso a críticas, nada mais falso.

Tanto quanto, “venia concessa” de S. Exa. pretender valorar objetivamente a dor e a vergonha sofrida por uma adolescente impedida de adentrar a um baile. Ante particulares e infelizes circunstâncias, ela sentiu-se ferida de morte na valoração pessoal que de si fazia, com profundos e inescondíveis reflexos em seu quiçá restrito, porém e, ao menos para ela, importantíssimo mundo.

Não se critica a decisão em si. Até mesmo porque, espera-se que ela seja objeto de reapreciação. O que se rejeita é a motivação cambaia e a distorcida ótica com que S. Exa. gratuitamente ofende a própria cidadania ao pretender subtrair da apreciação do judiciário direito legalmente amparado (senão o fosse, sequer objeto de sentença poderia ser).

Pensar-se de forma diferente seria dar-se crédito irrestrito à ensinança do genial Piero Calamandrei: “A justiça como toda divindade, só se manifesta àqueles que nela crêem”.

Convenha-se com a modernidade. Os ordálios divinatórios são ecos de um passado longínquo!

Edmundo Adonhiram Dias Canavezzi

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