Desemprego é uma das causas da violência, diz Francisco Fausto.
17 de julho de 2002, 18h46
O presidente do Tribunal Superior do Trabalho, ministro Francisco Fausto, afirmou, nesta quarta-feira (17/7), que o desemprego é um dos fatores de violência no país.
Em entrevista à Rádio CBN de Vitória, o ministro disse que o desemprego está ligado à miséria. Ele apontou a globalização como uma das causas do desemprego e observou que “o País deveria voltar à política nacional de desenvolvimento, como vinha fazendo até pouco tempo atrás”.
O presidente do TST defendeu a necessidade de investimentos maciços na área social como forma de redução da miséria. Ele falou sobre a polêmica em torno do pedido de intervenção no Espírito Santo e defendeu rigor na lei penal e critérios mais rígidos para concessão de habeas-corpus que, a seu ver, tem beneficiado muitos bandidos.
Leia a entrevista concedia à rádio CBN.
Pergunta – O sr. não acha que o procurador-geral da República deveria ter dado prosseguimento ao pedido de intervenção no Espírito Santo?
Resposta – O que parece haver de fato é um comprometimento de áreas oficiais do Estado do Espírito Santo com a bandidagem, com a corrupção. Nessas hipóteses, sem dúvida alguma, devia haver intervenção. Por quê? Porque a intervenção é um instrumento constitucional e democrático.
Dessa forma, acredito que o bom Direito estaria do lado do interventor,
e não do lado dos bandidos. Portanto, a minha opinião é de que de fato deveria ter havido intervenção no Espírito Santo, porque o quadro fático é este.
P – Presidente, o sr. também defende mudança com urgência na legislação penal, como forma de conter a violência no País. Que mudanças o sr. entende que seriam necessárias?
R – Em princípio, eu me bato é contra a concessão indiscriminada, sem qualquer critério mais rigoroso, do habeas-corpus. Entendo que o
habeas corpus é instrumento de defesa da cidadania. Ele foi ótimo nos tempos da ditadura militar, quando muitos presos políticos recorreram a esse instrumento.
Muitos que praticavam os chamados crimes de pensamento foram libertados pelo habeas-corpus. O que ocorre hoje? Hoje, em 95% dos casos o habeas-corpus tem sido utilizado exatamente para defender criminosos, para botar bandidos nas ruas. É nisso que precisa haver uma mudança radical, nos critérios de concessão do habeas-corpus.
P – E no que se refere ao regime de progressão, que permite redução
de penas, o sr. também tem críticas…
R – A redução da pena deve ser contida, deve ser vista de maneira
mais rigorosa por parte do Estado. Isto porque na redução da pena acaba havendo a libertação de criminosos que acabam voltando às ruas para cometer novos crimes. Infelizmente, é isso que está acontecendo no País e o juiz não pode fazer nada diante da legislação vigente. O que é preciso é mudar a lei penal no Brasil.
P – Nos casos de crimes hediondos, por exemplo, a redução seria
indevida.
R – No caso dos crimes hediondos, jamais deveria haver redução de
pena.
P – Quais as principais causas dessa expansão da violência hoje, no
País, na sua opinião?
R – Há dois fatos que geram a violência, no meu modo de ver.
Primeiro, a falta de aplicação de políticas certas na área social; é a
miséria gerando a marginalidade. A outra é a impunidade. Quando o
bandido tem consciência de que não será punido, ou será punido com uma pena branda, que ele cumpre sem nenhum problema e logo depois está na rua, ele certamente volta a cometer os crimes com a mesma intensidade.
P – Como presidente da mais alta corte da Justiça do Trabalho no
País, o senhor diria que o desemprego está relacionado à violência?
R – Sem dúvida, o desemprego está ligado à miséria, ao quadro social
dramático em que vivemos. Ele é provocado por diversos fatores e, no
Brasil como em diversos lugares do mundo, ele é estimulado pela
globalização.
O que se diz por aí é que a globalização é um processo irreversível. Eu até acredito que a globalização pode ser uma boa medida, desde que ela venha proteger o cidadão, proteger a empresa nacional.
Mas se a globalização causa desemprego e leva as empresas nacionais à falência, então esse lado perverso da globalização deve ser combatido, deve ser extirpado. E se não houver possibilidade de se mudar os critérios da globalização, que se acabe com ela, fazendo voltar a política nacional de desenvolvimento, como vínhamos fazendo até pouco tempo atrás.
P – A sociedade tem cobrado aos candidatos a governantes do Brasil e dos Estados , quais as políticas sociais que serão adotadas pelos próximos quatro anos. As medidas dos últimos oito anos, como
bolsa-escola, tíquete-alimentação, ajudam em alguma coisa?
R – Acho que alivia. Mas não estamos nessa fase de buscar remédios
que aliviam problema. Precisamos investir maciçamente na área social.
O que acontece é que, de uns tempos para cá, o Estado passou a investir maciçamente na área econômica, esquecendo-se das seqüelas de natureza social que ocorrem a partir daí. Para acabar com a miséria hoje, é preciso investir não de maneira cautelosa, mas maciçamente na área social , o que é fundamental.
P – Quando o sr. se refere à área social, aí está incluída também a
Educação?
R – A Educação, saúde e principalmente o emprego. É preciso proteger o emprego, dar emprego ao cidadão. O cidadão não precisa de esmola, precisa de emprego. O que há com relação ás nossas áreas sociais. O problema é que nossas áreas oficiais pensam com a mentalidade do esmoleu, alguém que dá esmola. O que se trata é que o cidadão, seja ele rico ou pobre, deve ser protegido por políticas sociais.
P – Os indicadores do IBGE dizem que há muitos ganhando pouco e
poucos ganhando muito. Qual a solução para a concentração de renda no Brasil?
R – Infelizmente, não vejo solução no curto prazo para esse problema.
Hoje temos uma campanha presidencial, e os candidatos à Presidência da República fazem belos discursos, falam em seus programas, mas não dizem exatamente em que é que vão aplicar na área social, nem como vão aplicar.
Acho que deve haver um tipo de política que provoque mesmo a distribuição de renda. As estatísticas internacionais dizem que temos 50 milhões de miseráveis. As estatísticas do governo dizem: não, são
30 milhões de brasileiros paupérrimos.
Mesmo assim, trata-se de um número grande de pessoas abaixo da linha da pobreza e precisamos tratar disso, cuidar disso. Não dá mais para ficar só no remédio para alívio. É preciso investir pesado no social.
P – Voltando à questão da intervenção: como repercutiu em Brasília o
anúncio dessa missão federal de combate ao crime no Estado do Espírito Santo?
R – Não tenho dúvida de que a missão já um passo que se dá contra a
violência. Não tenho dúvida. Não é um passo tão seguro ou sério como seria a intervenção, que mostraria que temos instrumento democrático para combater o crime e a violência de forma radical. O que vamos fazer é um paliativo. Vai-se tentar reprimir a violência, mas na verdade ela é endêmica, e tem de ser combatida em suas causas.
E, para se combater essa violência em suas causas, no que se refere ao Espírito Santo, se verdadeiro os dados fáticos que a imprensa descreve, então seria melhor a intervenção.
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