'Corpo legal'

PL quer normatizar operação e utilização da Internet no Brasil

Autor

  • Omar Kaminski

    é advogado e consultor gestor do Observatório do Marco Civil da Internet membro especialista da Câmara de Segurança e Direitos do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) e diretor de Internet da Comissão de Assuntos Culturais e Propriedade Intelectual da OAB-PR.

12 de julho de 2002, 16h24

“Adicionar à legislação a previsão legal, bem como a proteção de direitos dos que usam e prestam serviços na lnternet, criando relações jurídicas” é o que pretende o Projeto de Lei nº 3.303/00, de autoria do deputado Antonio Feijão (PSDB-AP). Feijão pretende criar em torno da Internet um “corpo legal”, que inclua dispositivos de proteção aos seus usuários.

O texto prevê maior segurança para as operações de compra e venda no âmbito da rede, protegendo os consumidores de ataques de vírus e outros invasores; protege o direito da privacidade dos dados dos usuários, contudo veda o anonimato, meio pelo qual acessos, procedimentos e ações indevidos são exercidos; e obriga que todas as informações resultantes de conexões do usuário, incluindo data, horário de início e término do acesso, sejam mantidas por pelo menos dois anos.

Pretende conferir validade jurídica a informações eletrônicas; classifica os provedores como prestadores de serviços, nos termos da Lei nº 8.078/90 (Código de Proteção e Defesa do Consumidor) e como pessoa jurídica de direito privado – prestador de serviços de valor adicionado ao serviço de telecomunicação – sem, no entanto, se confundir com aquela atividade; e assegura o direito da propriedade de marca junto ao registro de domínio, o que deve gerar polêmica: “ao titular de marca registrada nos termos da legislação vigente será concedida preferência na escolha do nome de domínio, ainda que o nome de domínio esteja registrado por outrem” (§ 4º do art. 10, grifo nosso). Cria, ainda, o Conselho de Ética da Internet, com a participação de religiosos.

O projeto tramita conjuntamente com o PL nº 5.403/01 (veja a íntegra), e está com a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática, de onde irá seguir para a Comissão de Constituição e Justiça e de Redação.

(Com Agência Câmara).

Veja a íntegra:

PROJETO DE LEI Nº 3.303, DE 2000

(Do Sr. Antônio Feijão)

Dispõe sobre normas de operação e uso da lnternet no Brasil.

(Apense-se ao Projeto de Lei nº 3.016, de 2000)

O Congresso Nacional decreta:

CAPÍTULO I

Disposições Preliminares

Art. 1º A operação e o uso da internet no âmbito do território brasileiro serão regidos pelas normas constantes desta lei e suas posteriores alterações.

CAPÍTULO II

Dos Provedores

Art. 2º Considera-se provedor, para efeito desta lei, pessoa jurídica de direito privado que presta serviço a usuário final de internet.

Parágrafo único. Os provedores de acesso classificam-se como sendo prestadores de serviços de valor adicionado ao serviço de telecomunicação, não se confundindo o primeiro com este.

Art. 3º Os provedores deverão instituir:

I – mecanismos de segurança que garantam a proteção dos dados de usuários, bem como dos de transações, a fim de evitar a desconexão, a transmissão de vírus, ou a invasão e apropriação de dados;

II – meios adequados para identificação de práticas ilícitas na lnternet;

III – padrões mínimos que permitam maior desempenho no uso dos recursos;

IV – cadastro de usuários no caso de provedores de acesso, devendo o preenchimento obedecer ao que dispõe o art. 16 desta Lei.

Parágrafo único. Não serão divulgados dados do cadastro de usuários, salvo por solicitação do titular ou por determinação judicial, sendo vedado publicar, vender, alugar, ceder ou negociar qualquer dado do cadastro.

Art. 4º Deverão ser mantidos por período de 2 (dois) anos, pelos provedores de acesso, informações de conexão de usuário, de data, de horário de inicio e término do acesso, de endereço IP e de telefone de chamada, a fim de identificar a origem da conexão no provedor de acesso.

Parágrafo único. Fica estabelecido o prazo de 90 (noventa) dias para que os provedores de acesso implementem o disposto no caput deste artigo.

Art. 5º Os provedores de informação que prestam serviços de comercialização responderão solidariamente ao dano causado quando do extravio, por insuficiência de mecanismos de segurança, de informações de usuários, em especial as informações de cartão de crédito, de senhas de qualquer natureza, de contas bancárias e de registros fiscais.

Art. 6º Os provedores terão poder de controle e de edição sobre as páginas e serviços armazenados e publicados em seus computadores, respondendo solidariamente pelas informações contidas nestes que configurem qualquer das hipóteses do art. desta lei, ainda que só incentivem.

Parágrafo único. Os provedores de qualquer natureza não terão poder de controle e de edição sobre mensagens de correio eletrônico, serviços de bate-papo e grupos de discussão, salvo por determinação judicial.


Art. 7º Os provedores de acesso serão classificados como fornecedores de serviços nos termos do art. 14, da Lei nº 8.078, de 1990, Código de Proteção e Defesa do Consumidor.

§ 1º Os provedores de acesso deverão:

I – disponibilizar serviço de atendimento ao usuário, de caráter gratuito, a fim de disseminar informações, em especial sobre segurança na lnternet e procedimentos para solução de problemas;

II – fornecer ao usuário relatório de uso que indique a hora de inicio e término, a data de conexão e a identificação do telefone de origem;

III – dar conhecimento dos termos e condições da prestação de serviço incluída a classificação indicativa do conteúdo veicuIado;

IV – prestar serviços nos termos desta lei, não podendo eximir-se de tal, salvo por motivo evidentemente ilegal por parte de quem os solicita, devendo ser encaminhada justificação dos motivos da não-prestação.

§ 2º Fica estabelecido o prazo de 60 (sessenta) dias para que os provedores de acesso implementem o disposto nos incisos II e III do parágrafo anterior.

Art. 8º É vedado aos provedores divulgar ou publicar páginas que incitem:

I – ao uso de substâncias proibidas de qualquer espécie;

II – ao tráfico ou ao uso de drogas de qualquer natureza;

III – à pornografia, à exploração da prostituição, à pedofilia, ou à corrupção de menores;

IV – à comercialização de produtos de contrabando ou descaminho, de animais silvestres, de órgãos humanos, de medicamentos controlados sem prescrição médica, de explosivos ou de armas de fogo;

V – à violência, ao terrorismo, ao racismo, à discriminação de qualquer natureza ou à difamação;

VI – à disseminação e quebra de sigilos e senhas e aos jogos proibidos.

CAPÍTULO III

Do Registro de Domínios

Art. 9º O registro de nome de domínio bem como a atribuição de endereços IP (Internet Protocol), com o objetivo de disponibilizar informações e serviços, serão coordenados pelo Comitê Gestor Internet do Brasil – CG.

Art. 10. O registro de nome de domínio obedecerá a critérios estabelecidos nos termos desta lei e a critérios adicionais definidos pelo Comitê Gestor lnternet do Brasil.

§ 1º O nome de domínio será concedido a pessoa jurídica e física quando requerido por estas e satisfeitas as seguintes exigências:

I – para pessoas jurídicas, fornecimento:

a) de comprovante de inscrição no Cadastro Geral de Contribuintes do Ministério da Fazenda (CGC/MF);

b) de documentação que comprove a natureza da instituição.

II – para pessoas físicas, fornecimento:

a) de comprovante de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda (CPF/MF);

b) de registro de identidade civil;

c) de endereço;

d) de descrição do conteúdo a ser divulgado.

§ 2º A exigência de que trata a alínea a, inciso I, deste artigo, poderá ser dispensada nos casos de órgãos militares e órgãos governamentais.

§ 3º Ficará a cargo do requerente a escolha do nome de domínio, respeitados os perfis dos grupos e categorias de Domínios de Primeiro Nível fixados pelo Comitê Gestor lnternet do Brasil e os registros de marca no Instituto Nacional de Propriedade Industrial – INPI.

§ 4º Ao titular de marca registrada nos termos da legislação vigente será concedida preferência na escolha do nome de domínio, ainda que o nome de domínio esteja registrado por outrem.

Art. 11. O nome de domínio que, evidentemente ensejar a práticas ilegais e a termos de baixo calão, o titular do nome de domínio será notificado para que, no prazo de 15 (quinze) dias, promova a alteração do nome.

Parágrafo único. Para os efeitos do caput deste artigo, entende-se por práticas ilegais, nomes que insinuem a substâncias e drogas proibidas qualquer espécie, à pornografia, ao racismo, ao preconceito de qualquer espécie, à difamação e ofensa a pessoas, à violência e a qualquer forma de crime previsto em lei.

Art. 12. O Comitê Gestor lnternet do Brasil poderá, sob sua supervisão, delegar competência para realizar as atividades de registro de nomes de domínio, distribuição de endereços IP (Intemet Protocol) e sua manutenção na rede eletrônica lnternet.

Art. 13. É devido o pagamento pelo registro de nome de domínio e por sua conseqüente manutenção anual, conforme Resolução nº 1/98 do Comitê Gestor lnternet do Brasil.

Art. 14. O nome de domínio registrado na Internet sob o domínio br será cancelado nos seguintes casos:

I – renúncia, expressa por escrito, do titular;

II – não publicação de conteúdo significativo de página de internet no prazo de 30 (trinta) dias da liberação do nome de domínio;

III – não uso regular do nome do domínio por período de 60 (sessenta) dias;


IV – fornecimento de informações falsas para cadastro, bem como a desatualização deste cadastro por período superior a 60 (sessenta) dias;

V – inobservância dos dispositivos contidos neste Capítulo;

VI – por determinação judicial.

Parágrafo único. Não caberá ressarcimento nem indenização nos casos previstos neste artigo.

CAPÍTULO IV

Dos Usuários de Internet

Art. 15. Considera-se usuário aquele que, por meio de provedor, tem acesso a todo e qualquer serviço ou recurso disponível na lnternet.

Parágrafo único. O usuário de internet responderá por todo ato por ele praticado na internet, nos termos da legislação vigente.

Art. 16. Os usuários deverão, obrigatoriamente, cadastrar-se em provedor de acesso à internet, devendo prestar informações verídicas.

§ 1º Para fins de cadastro, deverão constar informações de nome completo, de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda (CPF/MF), de registro de identidade civil e endereço.

§ 2º Informações adicionais poderão ser solicitadas pelo provedor para o cadastro.

§ 3º Em se tratando do civilmente incapaz, constará também os dados do responsável, responsabilizando-se, nos termos da lei, pelos atos praticados por aqueles.

§ 4º Fica obrigatório o cadastro, nos termos deste artigo, para os serviços de correio eletrônico na internet.

Art. 17. É assegurado o direito à propriedade intelectual, nos termos da legislação vigente, ficando vedada a alteração, a contaminação, a adulteração, a subtração e a apropriação de informações e configurações de computador e serviços de internet de terceiros sem a devida autorização.

Art. 18. Fica assegurada a privacidade das informações de cadastro, mantidas em sigilo, não podendo ser divulgadas nem fornecidas a outrem, salvo em caso de solicitação do titular ou de determinação judicial.

§ 1º É vedado:

I – anonimato na internet, permitido o uso de pseudônimo;

II – divulgação do endereço de correio eletrônico de usuário, salvo no caso de solicitação do usuário;

III – envio de mensagens de caráter comercial a usuários que não as solicitaram;

IV – interceptação ou conhecimento do conteúdo de mensagens de terceiros, ainda que seja feita por provedor de acesso, salvo por determinação judicial.

§ 2º Considera-se anonimato a situação na qual não se permite identificar a titularidade ou a autoria.

CAPÍTULO V

Disposições Finais

Art. 19. Admitir-se-á, a título de comprovação de solicitação ou prestação de serviço, informação eletrônica de realização de transação ou seu registro, desde que autenticado por assinatura eletrônica ou número de código, ou autografado pelo fornecedor, admitindo-se como prova da sua autenticidade, na ausência da autenticação, o registro da transação pelo provedor de acesso.

Art. 20. Fica criado o Conselho de Ética da Internet composto de nove membros com mandato de três anos, renovando-se, alternadamente, por um e dois terços.

§ 1º Integrará como membro do Conselho, representante do Comitê Gestor da lnternet, do Ministério das Comunicações, da Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, do Conselho Nacional dos Pastores, de provedores de acesso e dois representantes de usuários da Internet.

§ 2º O Conselho de que trata o caput deste artigo deverá ser regulamentado em cento e oitenta dias da publicação desta lei, devendo o primeiro mandato ser renovado por um terço pelos representantes dos provedores de acesso e usuários de internet.

Art. 21. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Sala das Sessões, 27 de junho de 2000.

Deputado Antônio Feijão

Autores

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    é advogado, diretor de Internet do Instituto Brasileiro de Política e Direito da Informática (IBDI) e membro suplente do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br).

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