Ponto-a-ponto

Associação dos EUA quer processar quem 'baixa' músicas na Internet

Autor

  • Omar Kaminski

    é advogado e consultor gestor do Observatório do Marco Civil da Internet membro especialista da Câmara de Segurança e Direitos do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) e diretor de Internet da Comissão de Assuntos Culturais e Propriedade Intelectual da OAB-PR.

10 de julho de 2002, 16h09

Alguns grupos da grande mídia autorizaram a Recording Industry Association of America (RIAA) a processar judicialmente, a partir do início de julho, indivíduos que estiverem compartilhando publicamente arquivos de música protegidos por direitos autorais.

Os alvos provavelmente serão as pessoas com grandes coleções de música em formato digital, e participantes de redes de compartilhamento de arquivos (file sharing) como Gnutella, eDonkey, Morpheus, AudioGalaxy e Kazaa. Com isto, a RIAA objetiva formalizar um manifesto público, demonstrando que a indústria da música não tolera que suas canções sejam disponibilizadas livremente na Internet, apesar da maciça popularidade das redes peer-to-peer (P2P – “igual-a-igual”) de compartilhamento de arquivos, intensificada com o (agora defunto) Napster.

O baterista da banda Metallica, Lars Ulrich, atacou publicamente os usuários finais (que podem ser considerados como sendo a base jovem de fãs do grupo) por estarem “baixando” músicas no Napster, durante sua declaração defronte do Congresso norte-americano em 2000. Até então, e por quase dez anos, o Metallica era a mais popular e bem-sucedida banda de rock nos EUA. Nos dois anos seguintes, viu sua popularidade encolher. O Limp Bizkit, grupo de rock mais simpático ao Napster, é tido hoje como o “rei do pedaço” quando se fala em popularidade do rock and roll que reflete nas vendas. Portanto, parece que Hilary Rosen, Presidente e CEO da RIAA, está prosseguindo na trilha abandonada por Ulrich, atacando e insultando diretamente aqueles que compram a maior parte das gravações, e que são os maiores entusiastas da música. O trabalho de Rosen, definitivamente, é o de proteger os interesses das gravadoras e de suas músicas protegidas por direitos autorais, entretanto, no segundo ano consecutivo de perdas financeiras para a indústria da música, que historicamente não tem altos e baixos, Rosen está fazendo alguns executivos tremerem nas bases.

Durante a batalha da música que pode ser descarregada da Internet, a RIAA vem seguidamente adotando uma postura de “nós iremos quebrá-lo antes de deixarmos que você fique com ele”, demonstrada por meio do bombardeio jurídico ao Napster, em 2000. O problema é que os consumidores querem a música disponível, e a RIAA e as gravadoras têm que descobrir um modo de prover isso. Assim, os consumidores terão meios de trocar online até as músicas protegidas por direitos autorais. Talvez se as gravadoras percebessem que há uma intensa demanda por músicas na Rede, poderiam encontrar modos de alto desempenho para entregar ao consumidor o que ele quer, e de uma maneira suportável pela indústria. Isto não significa a cobrança de uns US$3 por música no site da gravadora. Ninguém em sã consciência iria pagar por isso.

A BMG está tentando ressuscitar o Napster, lançando mão de sua base anterior de 54 milhões de usuários, assim poderá transformá-lo em um serviço “pague-para-baixar”. Boatos dizem que a AOL-Time Warner está trabalhando em um projeto similar, que irá proporcionar um conteúdo exclusivo aos seus assinantes. Sem que os consumidores tenham uma boa opção disponível, o sincronismo da RIAA com as ameaças de processos judiciais não poderia acontecer em pior momento.

A solução do problema não é a litigância com os fãs da música. A resposta deverá fornecer um novo formato de áudio similar ao do DVD, que tem feito as músicas pré-gravadas em estéreo ficarem muito melhores, remixes com som surround de alta definição, vídeos de música, entrevistas com os artistas e tudo mais por US$16,99, podendo se valer da maioria das funções dos 30 milhões de aparelhos de DVD já comercializados.

Crianças e jovens em idade escolar estão sendo levadas a pensar que as gravadoras e as promotoras de eventos musicais são como um império maligno, que apenas quer roubar o dinheiro deles. Perguntam “por que devo pagar por um disco quando posso ‘baixar’ no computador que seus pais me deram, e então queimar em um CDR de US$0,20?”. A resposta é que o disco de DVD-Audio soa muito melhor, ocasionalmente oferece algumas faixas-bônus, tem entrevistas com a banda e mais. O fato desse formato permitir uma proteção anti-cópia será de pouca relevância quando o público pagante puder adquirir uma mídia gravável, com conteúdo valioso, que realmente corresponda ao que é cobrado por ela.

Se Hilary Rosen e a RIAA estão começado a incitar artistas e gravadoras para produzir gravações de alta qualidade, masterizadas especificamente para obter sons surround, de modo que os selos possam atrair diretamente seu público alvo, seja de qual idade for, estaria agindo melhor do que com ameaças de processos judiciais contra os grandes entusiastas da música.

Se as reivindicações da RIAA são certas ou erradas a respeito da música estar sendo objeto de “furto digital” (outros falam em “uso justo”), é certo que não só o negócio da música irá perder se Rosen resolver, aleatória e tresloucadamente, processar pessoas que compartilham suas músicas e arquivos online. Teremos reações públicas sem precedentes, enquanto que a RIAA poderia estar disponibilizando uma solução que encorajasse as pessoas a tomar a auto-estrada da informação, apoiando-se em um ou outro dos ‘novos e emocionantes’ formatos de áudio.

As informações são do The Wall Street Journal e USAToday.com.

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    é advogado, diretor de Internet do Instituto Brasileiro de Política e Direito da Informática (IBDI) e membro suplente do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br).

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