Seleção e formação

Vice-presidente do TST defende estágio para seleção de juízes

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9 de julho de 2002, 17h31

O Tribunal Superior do Trabalho inicia, em março, uma experiência destinada a mudar os atuais padrões de seleção e formação de magistrados. Trata-se da criação da Escola Nacional da Magistratura do Trabalho, prevista na Proposta de Emenda Constitucional da Reforma do Judiciário. Será ainda uma fase embrionária, informal, explica o vice-presidente do TST, ministro Vantuil Abdala. Uma resolução administrativa, aprovada pelo Pleno do TST, possibilitará a instalação desse centro de formação e aperfeiçoamento antes da aprovação da PEC pelo Congresso Nacional.

A expectativa é que a futura escola, vinculada ao TST, exerça papel fundamental na formação dos futuros quadros da magistratura. “Sabemos das deficiências existentes no recrutamento e no aperfeiçoamento dos magistrados”, afirma Vantuil Abdala. Ele considera o sistema atual de seleção, restrito ao concurso de provas e títulos, insuficiente para avaliar o perfil do candidato e defende um modelo semelhante ao da França, onde a seleção final é feita depois que o candidato aprovado em concurso passa por um estágio teórico e prático de dois anos e sete meses na Escola Nacional de Magistratura.

O vice-presidente do TST não acredita que essas mudanças irão provocar a fuga de candidatos. “Quem sai da universidade, não tem mercado e há muitos jovens que querem a magistratura a qualquer custo, tanto que há muitos que fazem cinco, seis concursos, pagam cursinhos para serem aprovados”, afirma. Outro fator de estímulo, acredita, é que o período de formação na Escola de Magistratura será remunerado como uma bolsa de estudos. “É um aprendizado muito grande”, diz.

Mais do que conhecimento teórico, o juiz precisa ter bom senso, equilíbrio, serenidade e maturidade, afirma o vice-presidente do TST. Por isso, ele defende a fixação de uma idade mínima para o ingresso na magistratura, como propõe o texto da Reforma do Judiciário, que fixou a idade em 25 anos. A Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho, nome oficial adotado no texto da Reforma do Judiciário, terá a sede central em Brasília, mas Vantuil Abdala anuncia que posteriormente serão instaladas unidades regionais.

Em recente visita a Portugal e França, o presidente do TST, ministro Francisco Fausto, e o vice-presidente colheram os subsídios para a instalação da escola e acertaram um intercâmbio com a escola francesa. Um ministro do TST fará um curso intensivo de 10 dias chamado “Formação de Formadores”, destinado a preparar pessoas que cuidam da instalação de escolas de magistraturas.

A seguir, o ministro Vantuil Abdala comenta os pontos principais relacionados à formação e aperfeiçoamento dos juízes na França e em Portugal que servirão de base para a criação da escola no Brasil.

Concurso

“O concurso público de provas e títulos é muito pouco para avaliar se alguém tem efetivamente condições de exercer a magistratura. A Escola da Magistratura do Trabalho visa exatamente suprir essa deficiência e melhorar não só o sistema de recrutamento como o sistema de aperfeiçoamento do magistrado. Vai acabar esse sistema que permite ao aprovado se tornar magistrado no dia seguinte ao resultado do concurso.”

Idade mínima para juízes

“É muito grave que, muitas vezes, jovens, sem nenhuma experiência de vida, sejam admitidos como juízes. Evidentemente, esses jovens não têm amadurecimento e bom senso para exercer o cargo de tamanha responsabilidade. Por isso, não são raros abusos por parte dos magistrados, em muitos casos provocados por insegurança. O juiz precisa ter muito bom senso, muito equilíbrio, muita serenidade.”

Experiência de vida

“A Escola de Magistratura da França, que é mais tradicional e foi modelo para a escola de Portugal, considera um grande erro a ênfase que se deu inicialmente ao concurso para testar apenas o domínio técnico-científico. Depois de alguns anos, eles verificaram que não era uma boa seleção. O domínio técnico-científico do Direito passou a ser secundário. O importante é o conhecimento de vida, de sociologia, psicologia, filosofia. Mas não é só o conhecimento teórico. A prova avalia também o amadurecimento do candidato, a sua integração com a sociedade. O candidato pode ser um iluminado na área jurídica, mas pode ser reprovado. No Brasil, nossos concursos são apenas para testar os conhecimentos jurídicos. Sequer há prova de Português.”

Estágio remunerado

“Os aprovados em concurso terão, na Escola de Magistratura, um período de exercício teórico e prático. Seria uma espécie de estágio remunerado. Na parte de teoria, eles estudariam mais especificamente as questões processuais, inclusive as práxis processuais que não se encontram em compêndios. Na parte prática, participariam das audiências, ajudariam o juiz a fazer sentença. Eles atuariam no processo, com a supervisão e o acompanhamento do juiz.”

Novo exame

“Depois desse período de estágio, os candidatos se submeteriam a um outro exame. Ai sim, se fossem aprovados, assumiriam o cargo de juiz. Seria uma avaliação geral das competências do candidato. Nesse exame, o candidato, evidentemente, pode ser reprovado. Não teria sentido ter exame se não houvesse a possibilidade de reprovação. Na França, o candidato reprovado no exame final pode repetir o estágio de dois anos e sete meses e prestar novo exame. Se for reprovado novamente, aí é definitivo, mas ele tem a oportunidade de escolher outra função, a de escrivão ou a de assistente de juiz. “

Teste psicotécnico

“Quando da votação da Constituição, em 1975, um dos debates mais vivos acerca da Escola de Magistratura foi a questão do exame psicotécnico para a seleção de juízes. A opção foi por não adotá-lo. O teste psicotécnico implica a adoção de parâmetros e aí existe o risco de um direcionamento do futuro magistrado, de acordo com quem aplica o teste. A opção foi por magistrados independentes e livres. No Brasil, não existe mais psicotécnico em concurso de magistrados. Há 12 anos mais ou menos, em São Paulo, um candidato a juiz foi reprovado no psicotécnico aplicado por uma junta de psicólogos. O candidato recorreu e garantiu a realização de novo exame, dessa vez por dois psiquiatras da Universidade de São Paulo. Os dois atestaram que candidato era absolutamente apto para exercer a magistratura. Se houvesse segurança nos resultados do psicotécnico, seria excelente, mas se há risco de injustiça é melhor não ter. Com a Escola de Magistratura, acho que problemas como esses serão eliminados porque o comportamento do candidato será avaliado durante um período maior.”

Exame psiquiátrico

“Em Portugal, antes de o candidato tomar posse no cargo de juiz, após ser aprovado em duas provas, há um exame médico feito por um psiquiatra, apenas para verificar se ele não sofre de uma doença mental grave. O que é diferente de um psicotécnico. A França não adota o psicotécnico e sequer adota o exame psiquiátrico. Essa avaliação é feita pelos próprios professores e juízes que acompanham o candidato durante o período de permanência na Escola de Magistratura.”

Mestres

“A escola francesa de magistratura considerava ideal a contratação de grandes mestres das universidades Com a experiência ao longo dos anos, a instituição concluiu que não era a melhor alternativa. Ou os professores eram muito acadêmicos, sem prática do exercício da magistratura ou da advocacia, ou eram muito militantes, com tendência de impor suas teses. Chegou-se à conclusão de que o melhor era ter como professores os próprios magistrados. Eles são convidados pela Escola da Magistratura e recebem um pequeno acréscimo de remuneração. O convite constitui uma honraria.”

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