Propriedade intelectual

Os elementos que integram a noção jurídica do software

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3 de julho de 2002, 11h54

1. A Evolução Internacional da Proteção Jurídica do Software no Plano da Propriedade Intelectual.

A proteção jurídica dos programas de computador começou a ficar delineada pela Convenção de Concessão de Patentes Européias, na Convenção de Munique em 1973, tendo aí consagrado a impossibilidade de atribuição de patentes a programas de computador.

Os demais países europeus paulatinamente adotaram em suas legislações internas tal orientação. A Alemanha e a França em 1985 regulamentaram o software como tutelado pelo Direito Autoral.

No Brasil na década de 80 elaborou-se pesquisas sobre a possibilidade de patente do programa de computador. Contudo, a SEI – Secretaria Especial de Informática, detectou que dos 99% dos programas de computador existentes no mundo não seriam patenteáveis, por lhes faltarem o requisito de 100% de originalidade. Assim, apenas 1% poderiam ser objeto de patente. De tal sorte, perfilaria o Brasil no rol dos países que admitem a tutela do Direito Autoral para proteção do software com a introdução no ordenamento jurídico da Lei n. 7.646/87.

Na Diretiva do Conselho n. 91/250/CEE, de 14 maio de 1991 à expressão programa de computador, inclui também o material de concepção (artigo 1o, in fine). Assim, a que se ter claro que o programa de computador não está preso a um meio físico determinado, guardando a sua identidade para além das corporificações várias que pode revestir. O software situando-se entre as “coisas incorpóreas”, na categoria dos “bens intelectuais”, é consequentemente susceptível à tutela de direito autoral.

Todo o direito autoral representa a proteção na realidade jurídica da evolução dos meios técnicos. Com a invenção da imprensa surgiu a possibilidade de fácil multiplicação de exemplares de uma obra, e só então se colocou o problema de uma tutela jurídica do criador intelectual.

No caso da informática o programa de computador está protegido, posto que é obra intelectual, obra literária, mas sua ideia-base não, poderá ela inspirar outros programas a desenvolverem os seus próprios programas. (Assim como o arquiteto descobre uma solução arquitetônica revolucionaria, a obra que realizou está protegida pelo direito autoral, mas a solução se tornou patrimônio comum).

O programa de computador se inclui entre as obras intelectuais de expressão lingüistica, na medida que todo o software exige, antes de mais nada uma anotação, que constitui na linguagem de computação, que permitirá um procedimento, do qual se obterão resultados. O programa de computador é por natureza um esquema para ação.

A nível global a proteção dos programas de computador teve lugar com a conclusão do Uruguai Round, no âmbito do GATT, em 1994, e deu origem ao denominado TRIP’s Agreemente (Agremente on Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights).

O acordo TRIP’s instituiu uma estrutura jurídica objetivando uma ampla proteção da propriedade intelectual. Podendo-se destacar quatro características principais : a globalidade externa por estar vinculada de forma integral à OMC; a globalidade interna ao proibir a inaplicação de qualquer de suas normas, no que se diferencia das outras convenções em matéria de propriedade intelectual; o hibridismo de normas substantivas e procedimentais ao tratar dos direitos intelecutais; e, por fim, o baixo nível jurídico do acordo que carece de rigor na formulação de conceitos técnico-jurídico.

No tocante ao software o acordo TRIP’s assegura aos programas de computador pelo prazo de 50 anos a proteção como trabalhos literários sob a convenção e os esboços de Berne como as bases de dados devem ser protegidas. Expande também regras internacionais dos direitos autorais para cobrir o direito de aluguel. Aos autores de programas de computador é assegurado o direito de proibir o aluguel comercial de seus trabalhos em público.

Como decorrência direta dos resultados da Rodada do Uruguai de Negociações Comerciais Multilaterais do GATT, no Brasil foi aprovado o Decreto n. 1.355, de 30 de dezembro de 1994, incorporando à legislação brasileira o acordo sobre aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados ao comércio.

Na Argentina por meio do Decreto 165/94, foi incorporada a legislação de Propriedade Intelectual disposições específicas sobre o software e base de dados, caracterizando o software como bem intelectual de forma ampla, vale dizer: propriedade imaterial do software abrange além do programa de computador sí, para os efeitos de proteção da lei se estende aos desenhos, gerais ou detalhados do fluxo lógico dos dados de um sistema de computador, englobam tanto o sistema fonte e o sistema objeto, bem como toda a documentação técnica com a finalidade de exploração, suporte e treinamento para o desenvolvimento, uso e manutenção do software.

Em Genebra no ano de 1996, na Organização Mundial de Propriedade Intelectual – OMPI, concluí-se o Tratado de Direito do Autor, confirmando toda a tendência generalizada de proteção do software no plano do direito autoral. A OMPI. fixou o conceito de software em três categorias, a saber :

a) Programa de computador : É o conjunto de instruções capaz, quando incorporado num veículo legível pela maquina de fazer com que uma máquina, disponha de capacidade para processar informações, indique, desempenhe ou execute uma particular função, tarefa ou resultado.

b) Descrição de Programa : É uma apresentação completa de um processo, expressa por palavras, esquema ou de outro modo, suficientemente pormenorizada para determinar o conjunto de instruções que constitui o programa do computador correspondente.

c) Material de apoio : É qualquer material, para além do programa de computador e da descrição do programa, preparado para ajudar a compreensão ou a aplicação de um programa de computador, como por exemplo as descrições de programas e as instruções para usuários.

A obra literária ou artística (livros ou quadros) são obras intelectuais finais. Nesse ponto difere o programa de computador que é uma obra intelectual para ação, que não visa uma obra intelectual final (literária ou artística).

O direito autoral protegerá o programa de computador por ter expressão mediante notação (linguagem) e não os seus resultados que possam produzir. Ex.: se um programa de computador é idealizador para fazer composições musicais aleatórias, a música produzida através de combinações feitas pelo computador não terá proteção do direito autoral.

Porém, o programa de computador estará protegido perante terceiros que por ventura realizarem transposição ou conversão de linguagem (Java, Pascal, C, Fortran, etc…).

A transposição do programa assemelha-se à tradução de um livro (Italiano, Francês, Inglês). A transposição tal qual a tradução é uma versão da obra de uma linguagem para outra, o que é vedado pelo Direito Autoral.

No estudo de Direito Comparado Internacional para a proteção do autor, importante também é diferenciar a visão anglo-americana (copyright), do sistema continental europeu (Direito Autoral). Nos EUA, de acordo com a emenda de 1984, o “Copyrigh Act” o titular de um direito autoral válido tem o direito exclusivo de cópia do trabalho registrado. O escopo da Emenda foi proteger não só a cópia literal como também as cópias do que é substancialmente semelhante ao trabalho protegido.

A Lei de copyright é centrada na tutela da obra criada, e assim, visa a coibição da reprodução do software. Já o sistema europeu de proteção assente na tutela do criador da obra. No mesmo sentido, José de Oliveira ASCENSÃO, assevera que, porque centrado na tutela do exemplar, o sistema anglo-saxão admite que o direito de autor seja atribuído à empresa, acolhendo o copyright a noção de obra coletiva. A admissibilidade da noção de obra coletiva é acolhida pelos países latinos, mas não o é nos países germânicos. Tais especificidade não acarretam grandes diferenças no estudo de direito comparado, porém, pode se constitui obstáculos em cláusulas contratuais, de desenvolvimento de sistemas ou de transferência de tecnologia.

A Lei Brasileira n. 9.609/98, neste mesmo sentido ao definir software, enfatizou a noção de conjunto organizado de instruções em linguagem própria distinto de seu corpo material em seu artigo 1º “in verbis” :

“Programa de computador é a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados.”

Assim, entabuladas as definições jurídicas de software em níveis internacional e nacionais, é necessário uma percepção dos elementos que integram a noção jurídica do programa de computador, para compreendê-lo enquanto um bem jurídico que será objeto de direito nas relações jurídicas que se estabelecem na sociedade da informação em decorrência da sua disponibilização pela INTERNET.

2. Os Elementos que Integram a Noção Jurídica de Software

O programa de computador é definido como sendo todo o escrito destinado a processamento de dados, compreendendo todo o conjunto de instruções para o citado fim (textos, manuais, codificações).

Não há, pois, como se confundir o software, com o respectivo suporte ou hardware (disquete, fita, ou chip), que se constitui no respectivo corpo físico, ou mecânico. Assim como o disco é o suporte da música.

Contudo, a proteção da propriedade intelectual que integra a noção jurídica do software envolve uma análise relativamente complexa.

O desenvolvimento de um plano normativo estratégico de proteção para o programa de computador, implica necessariamente que o software seja percebido sob seus vários aspectos, que merecem proteção, quais sejam :

A Arquitetura do programa de computador – que consiste na modulação ou estrutura geral de um programa.

O Algoritmo – metodologia geral empregada num programa para dotá-lo de funcionalidade.

O Código – que consiste numa determinada seqüência de símbolos, para leitura mecânica ou humana, a ser operada por hardware computadorizado, tais como código objeto e código fonte.

A Documentação – manuais do programa de computador explicativos de seu funcionamento para leitura do usuário.

A Base de Dados – que engloba o conjunto de dados organizados, para ser usado junto com o programa.

O Uso do Sistema – função desempenhada pelo software no contexto de um determinado sistema ou processo.

Ademais, o software não pode mais ser mensurado de forma dissociada das auto-estradas da informação, enquanto infra-estrutura do ciberespaço, que permite a existência de uma imensa rede, chamada de INTERNET, que interliga elevado número de computadores em todo o planeta, disponibilizando uma base de informação colossal, que a cada dia se amplia numa velocidade surpreendente.

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