Crise geral

Juiz bloqueia R$ 12,6 milhões da Enron no Brasil

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18 de janeiro de 2002, 15h16

O juiz Adherbal dos Santos Acquati, da 38ª Vara Cível Central de São Paulo determinou, nesta sexta-feira (18/1), o bloqueio de R$ 12.676.176,00 em créditos da subsidiária brasileira da Enron, gigante mundial que vem enfrentando sérios problemas com a justiça nos EUA.

A decisão atendeu a pedido da Eucatex, com quem a Enron contratara a compra de energia gerada por usina montada pela empresa brasileira e que, na esteira dos acontecimentos envolvendo a holding estrangeira, teve as encomendas canceladas.

Segundo o advogado da Eucatex, Eduardo Diamantino, a usina foi construída com o compromisso de compra por parte da Enron.

Leia a decisão do juiz Santos Acquati

Processo nº 003.214-5/02 – 38ª Vara Cível Central

Fls. 279/282 – Recebo como aditamento à inicial. Retifique-se o valor da causa para R$ 4.225.392,00. Tenho por presentes os requisitos legais, desde que os documentos anexados à inicial demonstram o elevado grau de risco de inadimplência da ré, vinculada a um grupo econômico que entrou em colapso financeiro nos Estados Unidos da América, conforme é público e notório. São sólidos os indícios de que a rescisão do contrato praticada pela ré tenha sido influenciada pela difícil situação financeira da ora ré. Nesses termos, DEFIRO a liminar, para determinar o bloqueio de créditos que a ré possua para liquidação perante o Mercado Atacadista de Energia, até o limite de R$ 12.676.176,00, devendo o representante legal dessa instituição ser intimado a efetivar o depósito judicial desses créditos, até o montante mencionado. Indefiro o recolhimento de parte das custas processuais a final, por não se enquadrar em qualquer das hipóteses previstas na Lei Estadual nº 4.952, de 27.12.85. Defiro a expedição de ofício à JUCESP, a fim de que proceda à averbação na ficha de registro da ré, acerca da existência da presente ação cautelar. Cite-se a ré, via postal. Expeça-se mandado para intimação do representante legal do Mercado Atacadista de Energia. Após, encaminhem-se os autos para conferência do cálculo das custas. Intime-se. São Paulo, 18.01.2.002.

ADHERBAL DOS SANTOS ACQUATI

Juiz de Direito

Leia o pedido feito pela Eucatex

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 38ª VARA CÍVEL DO FORO CENTRAL DA COMARCA DE SÃO PAULO – CAPITAL.

DISTRIBUIÇÃO COM URGÊNCIA

Petição Inicial

Ação Cautelar assecuratória e preparatória com pedido de liminar inaudita altera parte

EUCATEX S.A. INDÚSTRIA E COMÉRCIO, pessoa jurídica de direito privado com sede na rua Ribeirão Preto, nºs. 811/909, Salto, São Paulo, e com escritório na avenida Presidente Juscelino Kubitschek, nº 1.830, Torre I, 12º andar, inscrita no CNPJ sob o nº 56.643.018/0001-66 (doc. 01) por seus procuradores infra-assinados (docs. 02/05), vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência requerer MEDIDA CAUTELAR INOMINADA DE NATUREZA ASSECURATÓRIA E PREPARATÓRIA DO PROCESSO PRINCIPAL, COM PEDIDO DE CONCESSÃO DE LIMINAR INAUDITA ALTERA PARTE contra ENRON COMERCIALIZADORA DE ENERGIA LTDA. (representada por seus gerentes-delegados Sami Arap Sobrinho, Orlando Rufo Gonzalez e Brett Russell Wiggs) com sede nesta Capital, na avenida das Nações Unidas, nº 11.541, 5º andar (CEP 01000-000), pelas fundadas razões de fato e de direito a seguir articuladas.

1. DOS FATOS

1.1. Da Contratação

A Autora é nacionalmente conhecida. Atua em diversos segmentos empresariais. Em face da recente e presente crise de energia elétrica do País, podendo dizer mesmo da provocação incentivadora da Ré, foi motivada a montar em sua unidade fabril de Salto-SP, uma usina termelétrica geradora de eletricidade, com capacidade de geração de até 12 MW/mês (megawatts).

Pesou muito da tomada de tal decisão além de um estudo de mercado e de viabilidade econômica, como já dito, as tratativas comerciais com a Ré, que se apresentou como adquirente da energia que fosse gerada e toda outra que se soubesse disponível, impondo até o caráter de exclusividade na aquisição. (docs. 06/08), tamanho era o seu interesse.

Assim, em data de 23 de agosto de 2001, Autora e a Ré firmaram contrato de venda e compra de energia elétrica através do qual a segunda se comprometeu a comprar da primeira, toda a eletricidade gerada, a saber 12 MW/mês de energia ao preço estipulado na cláusula 8ª daquele instrumento , no período compreendido entre 10 de outubro de 2001 e 31 de março de 2003 (doc. 09).

1.2 – Do Cumprimento das Cláusulas pela Autora

Observando rigorosamente as disposições contratuais, a Autora cumpriu integralmente as “Condições Precedentes” enumeradas na cláusula 3ª do contrato, obtendo as indispensáveis autorizações para comercializar e para operar como produtora independente de energia elétrica (doc. 10), bem como celebrou os contratos de conexão e de uso do sistema de distribuição (docs. 11/14).


Também, a Autora fez registrar o ponto de medição de sua unidade geradora junto ao MAE (Mercado Atacadista de Energia) e à CPFL, sob a titularidade da Ré , ultimando todas as providências necessárias ao cabal cumprimento de suas obrigações para com a Ré.

1.3 – Do Investimento

Para viabilizar a geração da energia que se obrigou a fornecer à adquirente, a Autora fez elevado investimento, da ordem de R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais), construindo uma unidade de geração de energia elétrica como já dito, localizada no município de Salto. (docs. 15/16 e 34).

1.4 – Do Início da Operação

Para a dinamização da operação de geração a Autora teve que firmar em 26 de setembro p.passado, contrato para fornecimento de gás (GLP) com a Supergasbrás, distribuidora do mesmo (doc. 17).

Ainda, posteriormente, visando melhorar a sua performance do fornecimento, a Autora firmou também contrato com a empresa Gás Natural São Paulo Sul S.A. para fornecimento de gás canalizado, com cláusula “take-or-pay” (doc. 18).

Para tal, foi necessário a instalação de um gasoduto até a planta industrial da Autora. Este contrato obriga a Autora ao pagamento mensal, independentemente de seu consumo (Capítulo II – Condições Particulares – cláusula II.3.6), na quantidade mínima de 22.680.000m3 ao ano. Isto importa em um desembolso anual de R$ 7.188.199.20,00 (sete milhões, cento e oitenta e oito mil, cento e noventa e nove reais e vinte centavos) – cf. Capítulo II – Condições Particulares – cláusula II.4.1-tarifas.

Reza também referido instrumento que, caso a Autora desista da implementação do projeto, deverá ressarcir a Gás Natural São Paulo Sul S.A. de todos os custos e despesas necessários à instalação e compra de equipamentos (Capítulo II- Condições particulares – cláusula II.3.4).

1.5 – Do Início da Geração e da Injustificada Notificação para sua Interrupção

Daí, em 04 de novembro p.passado, a Autora deu início à geração da energia vendida para a Ré, disponibilizando-a para ela, dando cumprimento à obrigação contratual que lhe cabia.

Porém, qual não foi sua surpresa quando recepcionou notificação da Ré, datada de 29 de novembro de 2001, solicitando à Autora a interrupção da geração de energia no período de novembro e dezembro do corrente ano (doc. 19).

Atente-se, desde já, para o incontroverso fato de que a Ré deixou de efetivar o pagamento do valor devido à Autora pela utilização da energia elétrica gerada no mês de novembro (docs. 20 e 25, in fine).

1.6 – Da Outorga das Garantias

Cumpre esclarecer que, nos termos da cláusula 15ª, incisos “vi” e “vii”, a Ré ofertou garantia consubstanciada em Carta de Fiança emitida pela Enron América do Sul Ltda. (doc. 21), enquanto a Autora apresentou seguro-garantia emitido por J.Malucelli Seguradora S.A. (doc. 22), ambas no valor de R$ 3.000.000,00 (três milhões de reais).

2 – DA RESOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS

Reza a cláusula 24ª do contrato que a solução das controvérsias decorrentes daquele instrumento deverão ser dirimidas através da arbitragem. Porém, a mesma cláusula expressamente consigna:

“As partes elegem o foro central da Comarca de São Paulo, Estado de São Paulo, com exclusão de qualquer outro, por mais privilegiado que seja, para, se necessário, e apenas e tão somente com essa finalidade, conhecer de ações que garantam a completa realização do procedimento arbitral nos moldes estabelecidos na presente Cláusula, bem como para intentar e obter junto a tal juízo competente medidas judiciais de urgência, como cautelares e tutelas antecipatórias, a fim de, e tão somente com tal finalidade, coibir uma violação ou a continuidade de uma violação ao presente Contrato por parte da outra Parte, quer seja antes ou durante a pendência de um procedimento arbitral. As partes reconhecem que o ressarcimento econômico não se faz adequado para remediar qualquer violação ao presente Contrato, razão pela qual uma Parte terá o direito à execução específica e às medidas judiciais de urgência para remediar qualquer de tais violações. Tais remédios jurídicos não serão considerados como excludentes de quaisquer outras medidas judiciais cabíveis contra a violação do presente Contrato, mas serão complementares a todos os demais remédios legalmente previstos.” (g.n.).

2.1 – Do Entendimento Doutrinário

Assim, havendo previsão expressa no contrato, inconteste o direito de socorrerem-se as partes ao Poder Judiciário, conforme lição de Teresa Arruda Alvim Wambier:

“Descabe, no caso em tela, falar-se da falta de jurisdição, porque, em ultima ratio, o Poder Judiciário tem sempre jurisdição para decidir sobre sua competência e, bem assim, sobre a ‘competência’ do juízo arbitral.

(…)

Só pode ser alegado (existência de compromisso arbitral) pela parte, a título de exceção, em sentido amplo, se for um compromisso em que se estabelecia a exclusividade do juízo arbitral e não a possibilidade de as partes optarem pela atividade jurisdicional (facultatividade). Neste último caso, o fato de a parte ter se socorrido do judiciário tem valor jurídico de opção, opção essa que os próprios termos do compromisso permitem. Trata-se de efeito semelhante ao da prevenção.” (in “Nulidades do Processo e da Sentença”, ed. RT, 4ª edição, 1998, p. 64/65 – grifamos).


2.2 – Do Entendimento Jurisprudencial

Neste exato sentido, o Egrégio Tribunal de Justiça desta Capital, pontuou:

“Na espécie em julgamento, o contrato foi extinto por falta de renovação e remanesce apenas a irresignação da autora com o que denominou de fim imprevisto de uma parceria comercial firmada e desenvolvida com empenho e dedicação para os desígnios da requerida.

A questão de índole indenitária que daí decorre é de direito puro, escapando dos fundamentos costumeiros da arbitragem. Não está em pauta a avaliação de uma infração contratual ou do desvio do iter padronizado dos acordos internacionais e sim o estudo de um comportamento ilícito, uma variante do tema responsabilidade civil e que demanda a interpretação do elemento subjetivo (culpa ou dolo), da verificação do dano injusto e do nexo de causalidade.

Trata-se, por conseguinte, de matéria contenciosa própria da jurisdição oficial, de sorte que remeter os interessados ao juízo arbitral para resolver pedido indenizatório pós-resolução do contrato é, acima de tudo, negar vigência ao princípio constitucional da inafastabilidade do controle jurisdicional (art. 5º, XXXV, da CF).” (3ª Câmara, Apelação nº 083.125-4/2, rel. Desembargador Ênio Zuliani, j. 1º.12.1998 – grifamos).

Acrescente-se que, em momento algum, houve a instituição da arbitragem com a formalização do compromisso arbitral, não impedindo as partes, pois, de recorrerem ao Poder Judiciário, conforme já decidiu o Egrégio II Tribunal de Alçada Civil desta Capital:

“Simples cláusula compromissória não constitui a instituição do Juízo Arbitral, não impedindo os interessados de pleitear no juízo comum seu direito” (1ª Câmara, Apelação nº 479936-00/6-Cubatão, Relator Juiz Renato Sartorelli, j. 15.12.1997).

No mesmo sentido, leciona Paulo Cezar Pinheiro Carneiro:

“Ressalte-se que enquanto não instituída a arbitragem … poderão os interessados pleitear, na justiça comum, medidas cautelares preparatórias.” (in Revista Forense, 339/139).

2.3 – Da Rescisão Unilateral Imotivada Causadora de Injusto Prejuízo e que Desprotege Totalmente o Direito da Autora

Ocorre que a Ré, sem valer quer do juízo arbitral, quer do Judiciário, em decisão unilateral e arbitrária, sob inverídicas impropriedades das condições gerais da apólice do seguro-garantia ofertada pela Autora, DECLAROU UNILATERALMENTE RESCINDIDO O CONTRATO de compra e venda de energia elétrica, conforme fax recepcionado pela Autora em data de 10 de dezembro p.passado (doc. 23).

Como se não bastasse, na mesma notificação de rescindibilidade, a Ré, contrariando frontalmente cláusula expressa do contrato que obriga a validade das garantias até final (cláusula 13ª, “v”), COMUNICOU A DESCONSTITUIÇÃO DA GARANTIA OFERTADA, de forma que a Autora ficará também desprovida de qualquer garantia para ver-se ressarcida das perdas e danos que lhe serão causadas, mormente considerando a periclitante e notória situação econômica da Ré.

Atente-se que a comunicação da desconstituição da garantia prestada pela Enron América do Sul Ltda. foi formalizada pelo Gerente Delegado da Enron Comercializadora e não pela fiadora, sem, entretanto, comprovar sua legitimação para tanto, caracterizando flagrante abusividade, e grave subtração da garantia que no momento da contratação era um importante componente assegurador do equilíbrio financeiro-econômico das partes.

É fato incontroverso, pois, que a rescisão do contrato com a total subtração da fiança-garantia foi praticada unilateralmente pela Ré, fere flagrantemente as cláusulas contratuais, o direito da Autora, causa prejuízo de reparabilidade impossível.

Rescindindo imotivamente o contrato unilateral, extrajudicialmente e fora do Juízo Arbitral, com a comunicada subtração da fiança, a Ré cometeu infração culposa, lesiva ao direito da Autora assegurado no instrumento rescindido e respectiva garantia agora inexistente (!)

Por oportuno, a Autora quer esclarecer que ela não se furtará a, oportunamente, submeter o litígio ao Juízo Arbitral, caso assim venha a entender o Judiciário.

Em face do inquestionável dano decorrente da culposa e unilateral rescisão declarada pela Ré, é imperiosa a necessidade da intervenção do Judiciário para assegurar o direito e o resultado útil do processo principal, através do qual a Autora buscará receber os prejuízos que lhe foram efetivamente impostos.

3. DA PLAUSIBILIDADE DO DIREITO DA AUTORA – DA NECESSIDADE DA VIA JUDICIAL

Infrutíferas as tentativas de solucionar amigavelmente o litígio, resta à Autora recorrer ao Poder Judiciário para obter a urgente providência jurisdicional cabível, garantindo o resultado útil do processo principal, através do qual buscará ressarcimento dos prejuízos já causados pela Ré, que deverão ser acrescidos das perdas e danos em face da aventura empresarial do Grupo Enron.


A Enron representa a maior bancarrota da história americana, quiçá mundial (docs. 24).

Referido “Grupo”, com no máximo uma década de existência, simulou vertiginoso crescimento, desenvolvendo atividades em vários países, em áreas que iam desde a comercialização de energia elétrica até empreendimentos na área da meteorologia.

Deu publicidade a inverídicos e espantosos lucros e meteu-se em operações arriscadas que culminaram com a paralisação de suas atividades, principalmente nos Estados Unidos da América a partir do dia 03 de dezembro deste ano.

Atente-se que os reflexos econômico-financeiros da quebra lá alastraram-se rapidamente: após o pedido de concordata de 28 (vinte e oito) empresas subsidiárias do Grupo Enron, outras duas de suas ramificações empresariais (Enron Broadband Services LP e Enron Freight Markets Corp) requereram tal favor legal nos Estados Unidos da América no último dia 26 (docs. 24).

Estes malefícios atingiram diretamente as empresas do Grupo Enron no Brasil pois, conforme provam as correspondências trocadas entre Autora e Ré (docs. 25), esta subsume todas as suas decisões à Houston, onde se situa a matriz americana, sede de fato da holding denominada Enron Corp.

Importante ressaltar que este Grupo atingiu o aparente crescimento através de um mistificado e inidôneo planejamento societário que lhe permitia maquiar o seu resultado operacional em inúmeras subsidiárias.

Conforme documento aqui anexado (doc. 26), a Ré pertence a um fantasioso conglomerado empresarial que tem aproximadamente 3.500 (três mil e quinhentas) subsidiárias, com a peculiaridade de que uma delas, criada para carregar todo o prejuízo da imensa teia, tinha o nome de Chewco, em alusão ao personagem Chewbaca, da famosa produção cinematográfica “Guerra nas Estrelas”.

A pseudo estrutura societária das subsidiárias do Grupo Enron no Brasil é formada por empresas cujo controle acionário é exercido por pessoas jurídicas sediadas nas Ihas Cayman. E lá, é público e notório, impera o sigilo absoluto, a possibilidade de uso de ações ao portador, a ausência de controles cambiais, e em alguns casos ausência de contabilidade, não havendo sequer obrigatoriedade de integralização do capital social das empresas (doc. 27).

Mais do que isso, valem-se de sociedades do tipo “Ltd” ou “limited” que de acordo com as leis locais não podem operar em seu território. Ou seja, destinam-se a operações internacionais, típicas empresas “off shore”.

Naquele conhecido paraíso caribenho há, inclusive, uma lei que impõe pena de até dois anos de prisão a qualquer pessoa que divulgue, obtenha ou tente obter informações fornecidas sob condição expressa ou implícita de sigilo fiscal .

Assim, se aproveitam de brechas na legislação societária para dificultar o efetivo adimplemento das obrigações contraídas em todo o mundo pelas empresas que constitui.

E é dessa artimanha societária de que valeu a Ré em nosso País, conforme se passa a demonstrar.

3.1 – Da Enron Comercializadora de Energia no Brasil

A Ré, aqui se instalando, dedicou-se às atividades de aquisição de energia elétrica de geradores autônomos brasileiros, para comercializá-la junto a terceiros. Constitui-se em uma empresa do tipo “trader” cuidando exclusivamente de negócios de balcão.

Geração, distribuição ou investimento em ativos nunca fizeram parte de seu objetivo, até porque estas são atividades que exigem investimentos concretos.

Assim, sua operação no Brasil foi vender parte dessa energia junto ao MAE – Mercado Atacadista de Energia que é um órgão formado por agentes do setor elétrico brasileiro.

A energia por ela adquirida da Autora (e não paga), foi vendida e contabilizada em seu nome.

Esses valores contabilizados, são, com certeza, um dos poucos senão o único ativo da Ré no Brasil, e está registrado junto ao MAE.

3.2 – Da Estrutura Societária da Ré

Conforme se constata dos inclusos documentos arquivados na Junta Comercial de São Paulo (doc. 28), a Ré é constituída exclusivamente por duas pessoas jurídicas (Enron Brazil Power Holdings VII LTD e Enron Brazil Power Investments VII LTD), “sociedades organizadas e existentes sob as leis das Ilhas Cayman”, ambas com sede em Grand Cayman, sem patrimônio e capital social de irrisório valor (R$ 10.000,00 – dez mil reais).

Note-se que nem mesmo o valor do capital social encontra-se integralizado pois, conforme consta do § 1º da cláusula 5ª do seu contrato de constituição (datado de julho de 1998), o capital seria integralizado em 12 meses a contar daquela data; porém, referida cláusula vem integralmente reproduzida na consolidação do contrato social ocorrida em outubro de 2001 !

Frise-se que a inatingibilidade do patrimônio de uma empresa, tal como a Ré, decorre do inescrupuloso planejamento societário elaborado justamente para inviabilizar qualquer paga aos seus credores.


Assim, tal estrutura societária permite fácil e rápida alteração em sua composição, com variação imediata de patrimônio, impedindo a efetiva constrição de bens garantidores de suas obrigações, tudo protegido pelo sigilo daqueles paraísos fiscais.

Ainda, mais grave e danosa se mostra tal circunstância, na medida em que a referida sociedade é de tal forma constituída que dificulta a percepção do engodo negocial que aplica em quem com ela contrata.

Com efeito, adiante-se que, à exceção de alguns ativos financeiros que movimenta no País (que evidentemente são facilmente desviáveis), inexistem (ao menos legalmente) bens capazes de mantê-la no ponto de equilíbrio inicialmente existente entre as partes por força da fiança subtraída para responder pelo ressarcimento dos danos causados à Autora.

Neste ponto, imprescindível atentar-se para a real causa que levou a Ré a declarar a rescisão do contrato pois, diferente do que ela apontou, outras circunstâncias (notórias) se apresentam.

Com efeito, a quebra nos Estados Unidos e a ampla divulgação de sua insolvabilidade no Brasil e no mundo já seriam o bastante para denunciar a hiposuficiência econômico-financeira da Ré para honrar o contrato firmado entre as partes.

Tanto é assim, que diversos outros contratos assemelhados firmados entre ela e terceiros foram, desde a decretação da mencionada concordata americana, rescindidos por fundamentos igualmente insubsistentes.

Aliás, a imprensa internacional e a brasileira deram ampla publicação à quebra da Ré e à conduta de descumprimento de seus compromissos, com lesão a todos que com ela contrataram. Porém, a Ré não veio a público, com uma linha sequer para o fim de desmentir sua situação financeira falimentar e de inadimplente culposa.

Portanto, é público e notório o seu estado de insolvabilidade e assim sendo, dispensa mais provas, pois a regra jurídica dispensa prova do que for notório e público.

Porém, sabedora das penalidades previstas para a rescisão imotivada do contrato objeto desta ação e pretendendo delas furtar-se, atribuiu infundadamente à Autora o inadimplemento de cláusula contratual e subtraiu imediatamente a garantia da fiança.

4. DA INJUSTIFICADA RESCISÃO CONTRATUAL

Embora esta não seja a sede própria para aprofundar-se na aferição da regularidade da conduta empresarial da Ré ou da garantia ofertada pela Autora, basta uma análise perfunctória das suas razões como pseudo fundamento da rescisão contratual, para se constatar a sua absoluta insubsistência.

Alega a Ré que a cláusula de exclusão de responsabilidade por caso fortuito ou força maior contida nas condições gerais da apólice do seguro-garantia ofertado pela Autora não estariam em conformidade com as condições pactuadas na cláusula 21ª do contrato.

Ora, o contrato securitário apenas reproduz o quanto expressamente prevê o artigo 1.058 do Código Civil, que é norma de direito cogente, aplicável, pois, ainda que não escrita.

Ademais, é de clareza meridiana que o contrato firmado entre as partes apenas especifica e exemplifica os casos de força maior, não havendo qualquer divergência com o contido na apólice securitária.

Ad argumentandum, a cláusula inserta na apólice do seguro é mais benéfica à própria Ré, na medida em que a exclusão da responsabilidade da seguradora, somente poderá ser argüida nas hipóteses previstas na legislação vigente.

Por fim, atente-se que, a teor do quanto dispõe o § 1º da cláusula 17ª daquele instrumento contratual, constata que a inadimplência de qualquer obrigação contratual, impunha-se fosse notificada a parte inadimplente para adimplir a obrigação no prazo de 30 dias, que no entanto nem é o caso.

Mas, mesmo assim, se tivesse razão a Ré, quanto a alegada imprecisão, teria que ter notificado a Autora, para que procedesse à eventual retificação, no prazo de 30 (trinta) dias.

Entretanto, assim não procedeu a Ré. Rescindiu o contrato sem fundamento de ordem contratual ou legal e em flagrante afronta às disposições avençadas, aliás, o fez com todas as demais empresas com quem contratou no Brasil, unicamente por sua insolvabilidade.

5. DO DIREITO

5.1 – Do “Fumus Boni Iuris”

É patente a plausibilidade do direito alegado pela Autora, em pretender considerar culposa a rescindibilidade imposta pela Ré insolvável, que não tem condições econômico-financeiras de honrar as obrigações contratuais assumidas, retirando da Autora, inclusive, a garantia da fiança, como que, na linguagem chula, retirou a escada e deixou a Autora com a brocha na mão.

Exsurge, pois, o inexorável direito da Autora de ver-se ressarcida dos danos causados pela Ré, nos termos do capítulo XII do contrato e com arrimo nos artigos 159, 1.056, 1092, parágrafo único e 1.118 e seguintes, todos do Código Civil. Por isso, pleiteia a presente medida para assegurar a utilidade e eficácia da prestação jurisdicional a lhe ser outorgada na ação principal.


Atente-se que, nos termos do inciso II do artigo 585 do Código de Processo Civil e conforme expressamente consignado na cláusula 32ª, o instrumento firmado entre as partes será o fundamento e a base para a apuração dos valores devidos em razão da rescindibilidade desrespeitosa das cláusulas avençadas e contrária à Lei, nascendo daí a executividade do crédito que for apurado a favor da Autora.

A plausibilidade do direito da Autora autoriza a concessão dos pedidos formulados para garantir a efetividade da prestação jurisdicional final. Frise-se que a indisponibilidade dos créditos da Autora junto ao MAE e a inalterabilidade dos registros societários da Ré na Junta Comercial não inviabilizam, em absoluto, a continuação das atividades da Ré, nem caracterizam a irreversibilidade da liminar pleiteada.

Neste diapasão, esclareça-se que o MAE – Mercado Atacadista de Energia Elétrica – foi constituído em 1998 com o intuito de operar como uma “bolsa de liquidação financeira” de transações de energia elétrica. Seriam membros do MAE, obrigatoriamente, as distribuidoras e os geradores de energia e, facultativamente, os comercializadores e os grandes consumidores de energia.

Através das regras do MAE, todos os contratos de compra e venda de energia elétrica devem obrigatoriamente ser registrados junto ao mesmo, e através do monitoramento mensal destes contratos, o MAE identifica os agentes que venderam energia junto a ele (e conseqüentemente acumularam créditos a receber do MAE), e os agentes que compraram energia do MAE (acumulando débitos junto ao mesmo).

Devido a uma série de percalços desde a sua implementação, o MAE nunca chegou a liquidar uma transação sequer. Os maiores entraves ao seu funcionamento foram: (i) inadimplemento por parte de Furnas relativo a energia não gerada pela usina nuclear de Angra II, o que resultou em débitos não pagos junto ao MAE no montante de R$ 600.000.000,00 (seiscentos milhões de reais); (ii) ausência de uma política de garantias financeiras a serem obrigatoriamente apresentadas por seus agentes, o que resultou numa inadimplência generalizada dos agentes após o referido evento de Furnas, e (iii) comprovação de improbidades administrativas por parte de seus gestores (fraude, desvio de recursos e irregularidades administrativas), o que resultou numa intervenção realizada pela ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica – junto ao MAE, e na substituição de toda a sua diretoria.

Tanto assim que o governo federal já anuncia a possibilidade de substituição do MAE pelo MBE – Mercado Brasileiro de Energia (docs. 29).

Sendo assim, os créditos da Enron junto ao MAE, advindos da venda da energia gerada, representam ativos financeiros passíveis de garantir a efetividade da prestação jurisdicional final, não obstante serem de liquidação totalmente incerta quanto ao prazo de recebimento e a efetiva liquidação dos créditos, pois existe a possibilidade dos mesmos jamais serem liquidados.

Remarque-se que os referidos créditos não representam qualquer impacto sobre o andamento das atividades da Enron no Brasil, mas constituem a única fonte de ativos de propriedade da Enron Comercializadora de Energia Ltda. identificados pela Eucatex, sendo os mesmos, portanto, objeto desta ação.

Igualmente inafastável a plausibilidade da pleiteada inalterabilidade dos registros societários da Ré na Junta Comercial de São Paulo em face dos relevantes fatos aqui noticiados e cabalmente documentados, cuja concessão encontra arrimo no poder cautelar do juiz, também amparada pela jurisprudência pátria (docs. 35).

Não se trata, pois, de arresto ou seqüestro, mas da medida atípica e pertinente, asseguradora do direito cuja plausibilidade está demonstrada na presente postulação, inclusive com farta documentação.

O Código Adjetivo dispõe em seu artigo 798, que:

“Poderá o Juiz determinar as medidas provisórias que julgar adequadas, quando houver fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação”.

E o art. 799 do referido Código, complementando aquele dispositivo, concede ao Juiz o poder de “autorizar ou vedar a prática de determinados atos, ordenar a guarda judicial de pessoas, o depósito de bens e impor a prestação de caução”.

Assim, as providências jurisdicionais pleiteadas encontram amparo do direito pátrio, conforme entendimento esposado pelo Tribunal de Justiça desta Capital:

“MEDIDA CAUTELAR – OBJETIVO DA AÇÃO – TORNAR ÚTIL E EFICAZ O PROCESSO COMO REMÉDIO ADEQUADO À JUSTA COMPOSIÇÃO DA LIDE – HIPÓTESE EM QUE NECESSÁRIA A INDISPONIBILIDADE DOS BENS, CONFORME REQUERIDO PELOS AGRAVADOS – PREVISÃO LEGAL – REGRA DO ARTIGO 798 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – RECURSO NÃO PROVIDO” (1ª Câmara de Direito Privado, Agravo de Instrumento nº 112.880-4/SP, Relator Desembargador Guimarães e Souza, j. 25.05.1999, votação unânime – g.n.).


O mesmo Tribunal, apreciando matéria jurídica de irrefutável semelhança, confirmou liminar que concedeu a indisponibilidade de bens, lecionando:

“A lei processual civil prevê expressamente a possibilidade de concessão de cautelas inespecíficas, entre as quais a imposição da vedação da prática de determinados atos (arts. 798 e 799 do Código de Processo Civil), antes mesmo do julgamento da lide principal, toda vez que se evidencie a possibilidade de lesão grave e de difícil reparação ao direito da parte que a requer.

(…)

Apenas que, diante da probabilidade de dilapidação de seu patrimônio… foram tomadas providências acautelatórias, visando à obtenção do resultado útil na ação principal. Não houve diminuição alguma no patrimônio do agravante, mesmo porque o interesse dos autores é o de mantê-lo hígido, na esfera jurídica do réu, sem que sobre tais bens recaiam encargos e ônus em favor de terceiros.” (7ª Câmara Civil, Agravo de Instrumento 165.646-1/6/Socorro, Relator Desembargador Campos Mello, j. 19.08.1992, v.u. – grifamos).

Também,

“PROCESSO CIVIL – AGRAVO – PRELIMINAR – REJEITADA – CAUTELAR INOMINADA PARA ALCANÇAR A FINALIDADE DO ARRESTO – POSSIBILIDADE – AUSÊNCIA DOS REQUISITOS ESPECÍFICOS – PODER GERAL DE CAUTELA – FUNGIBILIDADE – INSTRUMENTALIDADE – SISTEMÁTICA DAS MEDIDAS – PECULIARIDADE DO CASO CONCRETO – RECURSO IMPROVIDO.

… Quando ausentes os pressupostos autorizativos para a concessão de medida típica, a lei não proíbe que seja concedida a medida inominada, desde que presentes os elementos autorizativos para concessão da medida atípica (fumus boni iuris e o periculum in mora), graças ao poder cautelar geral, a instrumentalidade, a fungibilidade, e a interpretação sistemática das medidas cautelares. Dadas as peculiaridades do caso específico, não pode ficar desprotegido o direito, quando tem-se a probabilidade de existência do mesmo, e risco iminente de dano, que não foram atacados pelo recurso, pois a finalidade dos provimentos cautelares é de assegurar o direito e a utilidade de um processo principal”. (TJES – AI 049019000022 – Rel. Des. Frederico Guilherme Pimentel – j. 05.04.2001).

A primeira decisão foi ratificada pelo C. Superior Tribunal de Justiça em irretocável Acórdão da lavra do ilustre Ministro Fontes de Alencar (4ª Turma, REsp 38.615/SP, j. 22.03.1994 – RSTJ 59/339) – docs. 35.

A presente medida cautelar é o único remédio de que se pode valer a Empresa brasileira para assegurar a eficácia ao seu direito de pleitear a indenização em ação principal.

5.2- Do “Periculum in Mora”

É inafastável que, considerando os fatos públicos e notórios, principalmente da insolvabilidade, a plausibilidade do direito da Autora restará irreversivelmente frustrada, caso não se obtenha as tutelas jurisdicionais abaixo pleiteadas, em sede de liminar initio litis.

O perigo concreto reside no fato de a Ré estar insolvável, ter descumprido todos seus contratos no Brasil como amplamente divulgado, ter rescindido infundadamente o contrato com a Autora e ter subtraído a fiança, que era a garantia das obrigações contratuais ou da própria rescisão indevida.

Mais do que receio de dano, é patente o dano concreto e efetivo que a Ré vem causando à Autora que, se repita, será ainda de total irreparabilidade caso não haja a pertinente e urgente intervenção judicial, com a concessão da liminar.

Este prejuízo, efetivamente, está a causar desemprego dos empregados diretos da Autora geradora, já que esta não terá receita para honrar os compromissos assumidos com os seus fornecedores para a construção da termelétrica, nem como se ressarcir dos prejuízos, a fim de buscar recursos em outro lugar momentaneamente.

A Autora vem sofrendo vultosos prejuízos tendo em vista o elevado custo do investimento (em torno de R$ 15.000.000,00) e as despesas com gás necessário à geração de energia elétrica (R$ 7.000.000,00 ao ano, aproximadamente), pendentes de pagamento em razão do inadimplemento contratual da Ré.

Ademais, além da quebra nos Estados Unidos da América, conforme amplamente noticiado na imprensa, a Ré está procedendo à saída do País. Exemplificativamente, dos 150 (cento e cinqüenta) funcionários que tinha em sua sede nesta Capital, remanescem pouco mais de uma dezena, tendo, inclusive, desocupado 2 dos 3 andares do edifício-sede, no endereço declinado no preâmbulo.

Igualmente é público e notório que todas as suas participações acionárias estão a venda ou vêm sendo canceladas.

Por tais razões e pela inexistência de bens da Ré que garantam o adimplemento de suas obrigações, restam apenas os seus possíveis créditos junto a terceiros, como os únicos ativos capazes de ainda que palidamente, assegurar uma possibilidade de responder pela sua inadimplência culposa e rescindibilidade infratora de obrigações contratuais e legais.


Relembre-se que, conforme confesso pela Ré, deixou esta de efetuar o pagamento, inclusive, pela energia elétrica gerada e fornecida pela Autora no mês de novembro p.passado (docs 21 e 25, in fine).

A par da notória insolvável situação financeira da Ré, o perigo da demora se verifica, ademais, pelo elevado montante da indenização, conforme já asseverou o Egrégio Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, confirmando a decretação liminar da indisponibilidade de bens em ação cautelar assemelhada:

“… O pressuposto do periculum in mora se tem, no caso, por atendido pelo substancial volume monetário das indenizações devidas. Decisão mantida. Agravo improvido. Confirma-se a decisão que decretou a indisponibilidade de bens da agravante.” (16ª Câmara Cível, Agravo de Instrumento nº 1998.002.03289, Rel. Desembargador Jayro dos Santos Ferreira, j. 08.09.1998, v.u.).

Indubitável, pois, que a demora na concessão da liminar frustrará a eficácia da medida e importará em dano irreparável à Autora, restando configurado o “periculum in mora”.

Ou, nos dizeres do mestre Calamandrei,

“O provimento cautelar visa salvaguardar o imperium iudicis, ou seja, impedir que a soberania do Estado, na sua mais alta expressão, que é a justiça, se reduza a uma tardia e inútil expressão verbal, uma vã ostentação de um lento mecanismo destinado, como os guardas da ópera burlesca, a chegar sempre demasiado tarde” (in “Introduzione allo Studio Sistematico dei Provimenti Cautelari”, pág. 144).

Ademais, a prévia citação da Ré comprometerá, inexoravelmente, a eficácia da medida (artigo 804, CPC), sendo, pois, imperiosa a concessão da liminar “inaudita altera parte”.

O periculum in mora, no caso é concreto e já está a se perpretar. É preciso que o Julgador compreenda esta situação e defira a liminar assecuratória pedida.

6 – DA AÇÃO PRINCIPAL

Como o presente processo cautelar é instrumental e visa garantir a ação principal, em cumprimento ao artigo 801, III, do Código de Processo Civil, a Autora em demonstração da probabilidade da medida judicial de mérito, esclarece que irá propor Ação Ordinária visando a declaração judicial da rescisão do contrato (a rescisão fática indevida foi anunciada pela Ré), por inadimplemento da Requerida.

Na referida ação far-se-á a cobrança dos valores previstos na Cláusula Penal.

Pleitear-se-á, ainda, a Indenização por Perdas e Danos, conforme o que está disposto no artigo 18 e seus respectivos parágrafos do Contrato de Compra e Venda de Energia Elétrica e Outras Avenças, além da cobrança do valor integral referente à energia não-firme, que se consubstancia em contrato aleatório (artigos 1.118 e seguintes do Código Civil), cujo valor total alcança hoje a importância de R$ 27.411.696,00 (vinte e sete milhões, quatrocentos e onze mil e seiscentos e noventa e seis reais).

Reitere-se, outrossim, que a referida ação poderá ser, a critério deste d. Juízo, substituída pelo Juízo Arbitral, desde que mantida a efetividade da medida liminar até a execução da sentença arbitral, ou judicial.

Assim, a Autora tem necessidade urgente de garantir o resultado útil da ação principal aqui anunciada, fazendo-se imprescindível, a concessão da liminar requerida, sob pena de restar inócua a prestação jurisdicional final, importando, inexoravelmente, em dano irreparável à Autora.

7 – DO CÁLCULO DOS VALORES DA INDENIZAÇÃO – NECESSIDADE DE BLOQUEIO

Para uma melhor quantificação dos valores que se pretende alcançar na ação principal, de que esta cautelar é assecuratória, a Autora passa a demonstrá-los na forma abaixo:

O preço da energia foi calculado da seguinte forma:

Parte fixa: R$155,00

Parte variável: 40% da diferença entre o preço do MAE (R$ 336,00 – doc. 30) e a parcela fixa.

Assim temos: Preço do MAE (R$ 336,00) – preço fixo (R$ 155,00) = R$ 181,00 X 40% = R$ 72.40 + R$155.00 = R$ 227.40 (duzentos e vinte e sete reais e quarenta centavos).

A- Cláusula Penal: é representada pela multa por rescisão imotivada e antecipada equivalente a 30% do valor remanescente do Contrato, nos termos do item I da cláusula 18ª. Considerando que remanescem 15 meses para a expiração do contrato; que um mês tem 720 horas; e que a parte de geração firme de energia é de 6MW, deve-se multiplicar: 6MW X 720 X 15 meses, onde se encontrará, como energia remanescente, 64.800 MWh que, multiplicados pela alíquota da multa (30%), importa em 19.440 MWh que, multiplicado pelo preço atual da energia no contrato (R$ 227,40) = R$ 4.420.656,00 (quatro milhões, quatrocentos e vinte mil, seiscentos e cinqüenta e seis reais).

B- Perdas e danos por rescisão antecipada do contrato pela Ré: calcula-se da seguinte forma: PDs Contrato = Valor Presente {Volume de energia firme X {preço – preço de energia de reposição} (cotações anexas – docs. 31/33).


Volume de energia já definido: 64.800MWh (6MW de energia firme X 720h/m X 15 meses remanescentes).

Preço: R$ 227,40 – R$ 100,00 (cotação da energia no mercado) = R$ 127.40 (cento e vinte e sete reais e quarenta centavos)

Onde:

64.800 MWh X R$ 127.40 = R$ 8.255.520,00 (oito milhões, duzentos e cinqüenta e cinco mil, quinhentos e vinte reais)

C- Energia não firme/ contrato aleatório: 64.800 MWh X R$227.40 = R$ 14.735.520,00 (quatorze milhões, setecentos e trinta e cinco mil, quinhentos e vinte reais).

TOTAL = multa (R$ 4.420.656,00) + energia firme (R$ 8.255.520,00) + energia não firme (R$ 14.735.520,00) = R$ 27.411.696,00.

Assim demonstrados, o crédito da Autora perfaz a quantia de R$ 27.411.696,00.

8 – DA CAUÇÃO – SE NECESSÁRIO

Inobstante cabalmente demonstrado o preenchimento dos requisitos autorizadores da concessão da liminar necessária à execução do contrato, caso V. Exª entenda necessário, a Autora se dispõe a oferecer em caução o equipamento de geração de energia elétrica, de sua propriedade, representado por uma turbina a gás, marca Rolls-royce, instalada na referida usina de Salto/SP, no valor de R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais), conforme inclusa fatura pró-forma (doc. 16).

Dispõe-se a Autora, ainda, a prestar caução imobiliária do valor integral do seu crédito, caso assim determine esse d. Juízo.

9 – DO PEDIDO

Pelo exposto, estando indubitavelmente presentes e comprovados o “fumus boni iuris” e o “periculum in mora”, requer se digne Vossa Excelência de, liminarmente e inaudita altera parte, determinar:

a) Seja oficiado à Junta Comercial do Estado de São Paulo, a fim de que não proceda a qualquer averbação ou alteração societária da Ré, ou no mínimo, em o fazendo, consignar a existência da presente cautelar, dando ciência a quem a conhecer;

b)

b) o bloqueio dos créditos da Ré contabilizados e não liquidados junto ao Mercado Atacadista de Energia (ou ao órgão que vier a substituí-lo), frutos da venda de energia elétrica, até o valor do crédito da Autora, oficiando àquele órgão na forma mais rápida.

Requer, pois, seja determinada a imediata expedição dos ofícios requeridos, para o urgente cumprimento da ordem supra pleiteada.

Deferida e cumprida a liminar “inaudita altera parte”, requer se digne Vossa Excelência de determinar a citação postal da Ré, na pessoa de seus representantes legais no preâmbulo mencionadas, dos termos da presente cautelar, para, querendo, contestá-la, prosseguindo-se até final decisão, quando espera seja julgada procedente, convolando em definitiva a cautela liminarmente concedida, debitando-se à Ré os ônus da sucumbência.

Provará o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos, notadamente testemunhal, documental, pericial, bem como pelo depoimento pessoal dos representantes legais da Ré, sob pena de confesso.

Atribui-se à presente o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais).

São Paulo-SP, 10 de janeiro de 2002.

RENATA MARIA DE RANIERI GOMARA

OAB/SP 98.542

ÍNDICE DE DOCUMENTOS

Docs./Descrição

01- Atos constitutivos da Autora;

02/05- Procurações;

06/08- Tratativas comerciais;

09- Contrato;

10- Resolução ANEEL;

11/14- Contratos e documentos relativos à conexão com o sistema de distribuição de energia;

15- Investimento na construção da termelétrica;

16- Fatura pró-forma da turbina de geração;

17- Contrato de fornecimento de gás GLP;

18- Contrato de fornecimento de gás natural (“Take-or-pay”);

19- Solicitação da Ré para não geração de energia;

20- Correspondência da Autora encaminhamento fatura à Ré;

21- Carta de fiança ofertada pela Ré;

22- Apólice do seguro-garantia ofertado pela Autora;

23- Fax da Ré informando a rescisão contratual;

24- Dossiê de matérias sobre a Enron;

25- Fax e e-mail provando a submissão das decisões à Houston;

26- Reportagem sobre a estrutura societária da Ré;

27- Subsídios doutrinários sobre as Ilhas Cayman;

28- Alterações contratuais da Ré;

29- Reportagem sobre a provável substituição do MAE;

30- Resolução da Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica de nº 49;

31- Cotação de compra e venda de energia da Comerc;

32- Cotação de compra e venda de energia da El Paso;

33- Valor referencial da energia gerada em termelétrica da ANEEL;

34- Fotografias da usina termelétrica da Autora;

35- Jurisprudência.

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