Alterações necessárias

Ajufe é contra veto total do Projeto de Lei antidrogas

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10 de janeiro de 2002, 12h50

A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) é contra o veto total à nova lei antitráfico brasileira. Para o presidente da Ajufe, Flávio Dino, a lei atual nº 6.368/76 ficou defasada em 25 anos de vigência e a que está para ser sancionada pelo presidente Fernando Henrique introduz alterações necessárias à evolução da sociedade no período.

“A sociedade brasileira mudou muito nesses anos. A urbanização – que gera o público consumidor e o grande traficante, viabilizando o narcotráfico em larga escala – foi acentuada em todo país, os costumes sociais se alteraram e com isso também o modo de encarar as drogas”, avalia Flávio Dino.

Quanto à parte mais polêmica da nova lei – a da progressão do regime de penas – a Ajufe ainda não chegou a um consenso, havendo entendimentos diferentes entre os juízes.

Entretanto, a posição pessoal de Flávio Dino é a de que a progressão proposta não deve ser vetada. Ele entende que isso abre a possibilidade para o tratamento diferenciado, ou seja, proporcional para grandes e pequenos traficantes.

“Não podemos continuar a dar o mesmo tratamento legal – o regime fechado de prisão – a traficantes que transportam grandes carregamentos de drogas em aviões e organizam sua distribuição e a pessoas contratadas para fazer o transporte popularmente conhecidas como ‘mulas'”, exemplifica. “Há uma diferença de periculosidade aí e os juízes devem ter a possibilidade de avaliar isso”.

Confira a lista dos artigos que a Ajufe considera como evoluídos em relação à lei atual e também a dos que a entidade defende o veto.

Veja os artigos que a Ajufe considera uma evolução

1) Artigo 2º, parágrafo 1º – Reforça a colaboração de pessoas jurídicas privadas no combate ao narcotráfico, na medida em que amplia o leque de sanções que o poder público pode impor a elas. Como a suspensão ou indeferimento de auxílios ou subvenções e mesmo a suspensão da autorização de funcionamento às que se negarem a colaborar. Exemplo: quando uma casa noturna funciona como ponto de venda de drogas, o município, responsável pela concessão do alvará de funcionamento, agora poderá cassá-lo com esse fundamento.

2) Artigo 2º, parágrafo 2º – Na mesma linha do anterior, prevê a possibilidade do poder público conceder incentivos fiscais às pessoas jurídicas que colaborarem na prevenção ao narcotráfico. Ou seja, a nova lei prevê sanções para quem não colaborar e prêmios para quem o fizer.

3) Artigo 3º – O rol de substâncias proibidas passa a ser especificado em lei ou tratado internacional, não mais pelo Ministério da Saúde, que agora ficará responsável apenas por relacioná-los, depois de ouvir o Ministério da Justiça. Para a Ajufe, isso confere maior credibilidade e critério à seleção, pois uma lei é mais rígida e controlável do que uma mera lista.

4) Artigos 20 e 21 – Avançam na distinção das sanções ao traficante e ao usuário, deixando a diferença entre ambos mais clara. Isso na medida em que para o usuário (que usa drogas apenas para consumo pessoal) não são mais previstas penas de prisão e ele também não pode mais ser preso em flagrante. A nova lei deixa claro que o usuário será submetido a processo perante os Juizados Especiais, que é um instrumento mais rápido, e sempre condenado a penas alternativas.

5) Artigos 33 e 34 – Legaliza o uso de meios e procedimentos mais modernos e eficientes de investigação dos crimes do narcotráfico, que a polícia vinha utilizando informalmente. Como a infiltração de policiais em quadrilhas, o retardamento de flagrantes, o rastreamento de contas bancárias e o acesso ao sistema informatizado dos bancos.

Veja os artigos que devem ser vetados

1) Artigo 8º, parágrafo 8º – A Constituição prevê no artigo 243 que as glebas de terra destinadas à plantação de drogas ilícitas serão imediatamente expropriadas e destinada ao assentamento de colonos. Mas a nova lei introduz uma condição que não está prevista na Constituição: ressalva desse procedimento os casos em que for comprovada a boa-fé do proprietário que não esteja na posse direta da terra em questão. Para a Ajufe, isso abre uma brecha perigosa que deve ser vetada, pois facilita contratos forjados via “laranjas”, esvaziando a punição prevista na Constituição.

2) Artigo 32 – Possibilita que o processo policial seja arquivado por requerimento do advogado. Para a Ajufe, isso é inconstitucional, pois a Constituição determina que só o Ministério Público pode pedir esse arquivamento. Isso mudaria o sistema brasileiro de apuração, que é do tipo acusatório, em que essa competência é compartilhada com o MP. Hoje, quem faz a primeira apuração também em casos de tráfico é o MP, que propõe ação penal se considerar indícios de crime ou pede o arquivamento, em caso contrário.

3) Artigo 56, parágrafo único – É o que delega à Justiça Estadual o julgamento do tráfico internacional, quando o município em que o crime ocorre não tiver vara da Justiça Federal. Para a Ajufe, essa ressalva não é mais necessária, porque na época da lei atual – 1976 – a Justiça Federal só estava presente nas capitais, o que justificava o cuidado, porém, hoje, 38% das varas federais já são interiorizadas.

De acordo com a entidade, deixar todos os casos de tráfico internacional sob a guarda da Justiça Federal evitaria conflitos de competência entre as instâncias estaduais, assim como nulidades processuais, além de assegurar uniformidade na aplicação da lei penal.

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