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Juízes apresentam novas propostas para segurança pública

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27 de fevereiro de 2002, 21h01

O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), juiz Flávio Dino, entrega, nesta quinta-feira (28/2), a proposta da entidade para integrar o plano nacional de Segurança Pública ao relator-geral da Comissão Mista de Segurança Pública do Congresso Nacional, deputado Moroni Torgan.

Entre as propostas apresentadas está a que altera a redação atual da lei sobre a prisão preventiva. Para a Ajufe a redação atual está muito vaga e, por isso, dá margem a várias interpretações, o que resulta em decisões judiciais antagônicas, como no caso da prisão e rápida soltura do ex-senador Jader Barbalho, há poucos dias.

Flávio Dino ainda entregará as propostas ao presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Paulo Costa Leite e ao subrelator da comissão para Agilização do Processo Penal, deputado Fleury Filho.

Veja as propostas

Ofício nº

Brasília, 27 de fevereiro de 2002.

Exmo. Sr. Deputado,

A Associação dos Juízes Federais do Brasil – AJUFE tem a honra de apresentar a V. Exa. as sugestões de medidas que se apresentam como prioritárias, sob nossa ótica, para integrarem um plano de segurança pública, com as conseqüentes modificações que se fizerem necessárias na legislação correlata.

Como base orientadora da deliberação da AJUFE, a respeito dos tópicos que a seguir serão enumerados, reafirmamos que todas as medidas integrantes de um plano de segurança pública, que sejam aptas a enfrentar a intolerável criminalidade existente em nossa sociedade, não podem, sob pena de insucesso, estar divorciadas da efetivação dos princípios e direitos fundamentais, relacionados na Constituição da República.

Não se atingirá o resultado esperado, em termos de segurança pública, sem a pacificação de conflitos oriundos de desigualdades, só formalmente banidas da sociedade. Ratifica-se a necessidade de ações concretas, no sentido de permitir a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, na qual todos sejam beneficiários do desenvolvimento nacional.

Observadas essas premissas, são essas medidas que sugerimos:

Modificação do inquérito policial

Peça de fundamental importância para a persecução penal, o inquérito policial não pode persistir com seu perfil burocrático e meramente repetitivo de formalidades, que somente na fase judicial devem ser observadas.

Objetividade, emprego de tecnologia, e envolvimento direto da polícia com a investigação – abandonando-se, sempre que possível, as tradicionais diligências “de papel”, veiculadas por toda sorte de ofícios – é o que se espera desta importante fase administrativa da investigação.

Com tais escopos, vemos como altamente positivo o exame do PL nº 4209/2001, com a observância das proposições de alterações insertas nos documentos anexados.

Fortalecimento da polícia técnica

Cada vez mais torna-se importante o combate à criminalidade pelo uso da inteligência e dos serviços técnicos especializados, com ênfase no incremento quantitativo e qualitativo da criminalística e das perícias em geral, e o fortalecimento destes departamentos. Seria bastante significativo, portanto, que a Comissão de Segurança Pública do Congresso Nacional fixasse esta diretriz a ser observada pelos órgãos federais e estaduais.

Criação do cadastro nacional de processados, condenados e foragidos

É necessário que se desenvolva uma política voltada para a disciplina legal e a efetivação prática do registro criminal nacional. Valorizado, estudado e disciplinado em diversos países, o registro criminal é instrumento fundamental de memória e consulta dos órgãos de segurança pública e do Poder Judiciário.

Possibilitando o conhecimento global das informações sobre processos e condenações criminais, bem como a situação de foragido do cidadão, o registro único torna-se imprescindível ao combate eficaz à criminalidade, em âmbito nacional.

Propomos, por conseguinte, que determinação desta natureza conste em lei, fixando-se prazo para que o Ministério da Justiça coordene a implantação deste serviço.

Construção das penitenciárias federais

Visa atender à demanda por vagas diferenciadas para os condenados pela Justiça Federal, cuja competência em matéria criminal vem se firmando na prática, sobretudo no tocante a crimes de importante repercussão nacional e transnacional, a exemplo do que ocorre com o tráfico de internacional de entorpecentes; os crimes praticados por organizações criminosas transnacionais; a lavagem de dinheiro e os crimes contra os direitos humanos.

Do mesmo modo que o item anterior, sugerimos que lei determine prazo para a implementação desta diretriz, estabelecendo-se um número mínimo de estabelecimentos a serem edificados.

Competência da Justiça Federal para a execução penal de suas sentenças

Como reafirmação do incremento prático da competência da Justiça Federal, é fundamental que esta conte com disposição legal afirmativa de sua competência para a execução penal de suas sentenças, dado o interesse federal peculiar que encerram tais casos. Neste sentido, é fundamental a apreciação do PLC nº 64/01 (PL 2882/00).

Modificação dos procedimentos e do sistema recursal no processo penal

A agilização do processo penal, para entrega rápida e eficaz da prestação jurisdicional, impede a perpetuação da acusação contra o inocente e permite a resposta rápida ao crime, sem resultar na impunidade através da prescrição.

Por esta razão, fundamental é a racionalização dos ritos processuais, com a concentração de atos de instrução, e a maior agilidade na admissão e processamento dos recursos.

Com tais objetivos, vemos como relevante o exame dos PLs nºs 4203/2001, 4204/2001, 4205/2001, 4206/2001 e 4207/2001, com a observância das proposições de alterações insertas nos documentos anexados.

Projeto de medidas cautelares e prisão preventiva

As medidas cautelares são instrumentos imprescindíveis à tutela do processo penal, sempre que razões urgentes recomendem tais providências, já que o processo carece de um certo tempo para desenvolver a sua marcha.

Especificamente em relação à prisão preventiva, não se pode olvidar que nosso ordenamento jurídico – como uma unidade de sistema integrado de normas – recomenda seja a sua disciplina aperfeiçoada, de modo a possibilitar o exame de proporcionalidade entre as normas constitucionais em jogo, quais sejam aquelas que se destinam à tutela do interesse individual frente aquelas que visam à tutela coletiva da segurança pública, da ordem pública e econômica, bem como da incolumidade pessoal e real, dever do Estado inserido nos artigos 5º, caput, e 144, da CF.

Por esta razão, sugerimos a apreciação do PL nº 4208/2001, com as modificações apontadas nos documentos anexados.

Proibição da venda de armas e aumento da pena para o porte ilegal

As armas de fogo estão no centro da criminalidade violenta que ora se manifesta, devendo ser reprimida sua disseminação na sociedade, a partir da raiz do problema: a sua venda indiscriminada à população.

Esta medida preventiva, contudo, não terá os efeitos práticos esperados se não for possível uma repressão mais eficaz no âmbito da resposta penal ao fato praticado. Vale dizer, se mesmo diante da proibição da aquisição da arma de fogo, esta vem a ser portada ilegalmente, é preciso que o Direito reaja com uma sanção que retire tal crime do rol das infrações de menor potencial ofensivo, o que só será possível – à vista do art. 2º, parágrafo único, da Lei n. 10.259, de 12 de julho de 2001 (Lei dos Juizados Especiais Federais) – com o aumento da pena hoje prevista no art. 10, da Lei nº 9.437, de 20 de fevereiro de 1997 (Lei das Armas de Fogo).

Aumento das penas dos crimes de resistência e desacato

Com o advento da Lei dos Juizados Especiais Federais, que transformou em infrações de menor potencial ofensivo aquelas cuja pena máxima não ultrapasse dois anos de prisão, a exemplo da resistência e do desacato, houve considerável enfraquecimento dos instrumentos de coerção à disposição dos funcionários públicos, dentre os quais os agentes das polícias militar, civil e federal.

No exercício da função policial, hoje, é possível que o agente público se depare com obstáculos intransponíveis aos seus atos, através do desacato e da resistência ativa (artigos 329 e 331 do Código Penal), sem que possa reprimi-los através da ordem de prisão em flagrante.

É que, diante da prática de tais crimes, o policial deverá agir de acordo com o disposto no art. 69 e seu parágrafo único, da Lei n. 9.099, de 26 de setembro de 1995, ficando à mercê da vontade do infrator em acompanhá-lo até o Juizado Especial, ou da confiabilidade de seu compromisso de a este comparecer.

Ocorre que, em determinadas situações, a autoridade sem poder de coerção não pode corresponder aos anseios da ordem e da segurança pública, restando desacreditada – daí porque sugerimos o incremento de penas nos casos mencionados.

Ampliação das Defensorias Públicas

A celeridade e a eficácia do processo penal dependem da asseguração do devido processo legal e do respeito aos direitos fundamentais dos indivíduos, o que só se efetiva pelo real acesso à Justiça, sobretudo por aqueles que são carentes de recursos econômicos para contratarem advogado para sua defesa.

O pleno funcionamento das Defensorias Públicas, no âmbito da União e dos Estados, representará contribuição decisiva para a superação de uma das maiores críticas que se dirige contra o sistema penal brasileiro: a desigualdade de tratamento entre ricos e pobres, decorrente muitas vezes da impossibilidade de os últimos disporem de adequada defesa técnica.

Propomos que recomendação expressa sobre o tema seja dirigida ao Governo Federal e aos Governos estaduais.

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