Direito reconhecido

Tribunal gaúcho reconhece ampliação dos juizados criminais

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25 de fevereiro de 2002, 21h19

§ § O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (Quinta Câmara Criminal, no Recurso em Sentido Estrito 70003736428, relator o Des. Amilton Bueno de Carvalho, v. u., j. 20.02.02) acaba de reconhecer, num caso de porte ilegal e disparo de arma de fogo (arma de uso permitido), que foi ampliado o conceito de infração de menor potencial ofensivo para dois anos, tal como previsto na Lei 10.259/02 (lei dos juizados especiais federais).

§ § É do conhecimento geral que, desde a vigência desta lei (que se deu em 14/1/02, não 13/1/02, como inicialmente chegamos a imaginar), grande polêmica se estabeleceu sobre se o novo limite de dois anos (para as infrações de menor potencial ofensivo) seria ou não estendido aos juizados especiais estaduais.

§ § Acompanhando doutrinadores de renome (Alberto Silva Franco, Suannes, Bitencourt, Capez, Tourinho Filho, Damásio, Nalini, Vitor Gonçalves etc.) sustentamos a tese da ampliação da competência dos juizados estaduais (Leia mais a respeito do assunto clicando aqui) já em nosso livro sobre Juizados Criminais, São Paulo: RT, 2002.

§ § O acórdão, abaixo reproduzido, acolheu a tese por nós sustentada, sobretudo por questão de isonomia (igualdade entre todos) e admitiu que foi derrogado o art. 61 da Lei 9.099/95, que previa para a competência dos juizados estaduais os delitos punidos com pena até um ano.

§ § Admitiu-se, de outro lado, a retroatividade da Lei 10.259/01, por se tratar de lei nova mais favorável (CF, art. 5º, inc. XL).

§ § Outro interessante aspecto decidido pelo referido julgado foi o seguinte: os processos que estavam em andamento na data de vigência da lei nova (14.01.02) (relacionados com crimes até dois anos) devem continuar tramitando no juízo comum, onde dar-se-á aplicação à lei nova mais favorável.

§ § Entendeu-se que não deve ser alterada a competência do caso por três razões: 1) porque essa já estava firmada definitivamente antes da vigência da lei nova; 2) porque o procedimento sumaríssimo da Lei 9.099/95 é mais prejudicial ao autor do fato; 3) porque o art. 25 da Lei 10.259/02 não permite a remessa de processos para os juizados especiais.

§ § Em suma, os processos iniciados na vara comum até 13.01.02 continuam na vara comum e aí terão aplicação todos os institutos despenalizadores (mais benéficos) da Lei 9.099/95. Casos novos iniciados de 14.01.02 em diante devem ter andamento nos próprios juizados criminais.

§ § O primeiro acórdão sobre a polêmica que se estabeleceu em torno da ampliação da competência dos juizados estaduais para alcançar os crimes punidos até dois anos seguiu, no nosso entender, o caminho do justo e do proporcional.

§ § Demonstra, de outro lado, que o velho e provecto método de ensino do direito (formalista, legalista, asséptico e napoleônico) está com seus dias contados. Tem preponderância o método da ponderação, do equilíbrio e da razoabilidade.

§ § O juiz, como sempre defendeu o relator do caso (Amilton Bueno de Carvalho) deve sempre estar comprometido com os resultados práticos (e justos) do seu julgamento, não com a adequação lógico-sistemática da sua decisão ao pobre e positivista silogismo formal.

§ § Nossos encômios à Quinta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul por sua pioneira decisão (até onde sabemos) sobre o controvertido tema.

DICAS E REMINDERS:

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Leia a íntegra do acórdão gaúcho

PENAL. PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PORTE E DISPARO DE ARMA DE FOGO. COMPETÊNCIA. ISONOMIA. DERROGAÇÃO DO ARTIGO 61 DA LEI 9.099/95. RETROATIVIDADE DA LEI 10.259/01.

– Com o advento da Lei 10.259/01, restou ampliado o conceito de infração penal de menor potencial ofensivo, por exigência da isonomia Constitucional.

– O comando normativo contido no art. 2°, da Lei 10.259/01 possui contornos penais suficientes a atrair a observância imperativa do disposto no inciso XL do rol das garantias constitucionais (art. 5°).


– As demandas iniciadas antes de 14.01.02 tramitarão no juízo comum, assegurado ao réu os benefícios da Lei 9.099/95.

– Recurso provido, em parte, por unanimidade.

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO

Quinta Câmara Criminal

Passo Fundo

N° 70003736428

Recorrente Ministério Público

Recorridos: Marlo Trech Gilberto Mesquita Gonçalves

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento ao recurso ministerial, para determinar o processamento do feito perante a jurisdição comum (Primeira Vara Criminal de Passo Fundo), assegurados aos réus os benefícios previstos na Lei 9.099/95.

Custas, na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Desembargadores Aramis Nassif e Luís Gonzaga da Silva Moura.

Porto Alegre, 20 de fevereiro de 2002.

AMILTON BUENO DE CARVALHO,

Relator.

RELATÓRIO

AMILTON BUENO DE CARVALHO (RELATOR) – Na Comarca de Passo Fundo, o Ministério Público denunciou GILBERTO MESQUITA GONÇALVES como incurso nas sanções do art. 10, caput, da lei 9.437/97; e, MARLO TECH, como incurso nas sanções do art. 10, caput, e § 1°, III, da mesma lei.

Entendendo tratar-se de crimes de menor potencial ofensivo, ante a alteração do referido conceito pela lei 10.259/01, que estabeleceu o Juizado Especial Criminal no âmbito da Justiça Federal, o Magistrado da 1ª Vara Criminal de Passo Fundo determinou a remessa do expediente ao juizado especial daquela Comarca.

Irresignado, o agente ministerial interpôs recurso em sentido estrito. Arrazoando, sustenta ter o art. 27 da lei 10.259/01 estabelecido um prazo de vacatio legis de 6 meses, a contar da data de sua publicação, ocorrida em 12 de julho de 2001; e, as regras de competência são de natureza processual, sendo reguladas pelo princípio tempus regit actum, contido no art. 2° do Código de Processo Penal, sendo a nova lei inaplicável aos fatos delituosos denunciados. Requer o provimento do recurso para determinar o processamento do feito no juízo comum.

Contra-arrazoando a defesa postulou pela manutenção da decisão hostilizada.

Mantida a decisão pelos seus próprios fundamentos (fl. 72), vieram os autos a esta Corte.

Nesta instância, a Procuradoria de Justiça, através do Dr. Lenio Luiz Streck, manifestou-se pelo improvimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

AMILTON BUENO DE CARVALHO (RELATOR) – A insurgência ministerial merece parcial acolhida.

Gize-se, inicialmente, que o debate restou superado em parte: a vacatio legis da Lei 10.259/01 venceu em 14.01.02.

Assim, o cerne sofreu pequeno deslocamento: as questões a serem elucidadas, agora, são duas: (a) a derrogação ou não do art. 61 da Lei 9.099/95 pelo art. 2° da Lei 10.259/01; e, (b) a retroatividade ou não da referida lei. Destaco os temas.

DERROGAÇÃO DO ARTIGO 61 DA LEI 9.099/95

A oposição entre os dois comandos legais é muito clara. Para os juizados estaduais (art. 61 da Lei 9.099/95), crime de menor potencial ofensivo é aquele cuja lei comine pena máxima não superior a 1 ano; nos juizados federais (art. 2° da Lei 10.259/01), aquele cuja pena máxima não seja superior a 2 anos.

Tenho, eminentes colegas, que o comando contido no art. 98, I, da Constituição Federal não suporta a distinção. Eis a redação:

“art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:

I – juizados especiais, providos por juizes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juizes de primeiro grau;”.

Vê-se, pois, que infração menor – no viés constitucional – tem suporte único e não bipartido.

“Menor ofensividade” é conceito material, merecendo definição una. O nome já indica – o que torna a afirmação nada brilhante – que sua verificação se dá pela intensidade da lesão ao bem jurídico protegido. A razoabilidade aponta para a irrelevância da esfera jurisdicional como critério para determiná-la.

Aceitar definições distintas implica em agredir a igualdade Constitucional – e a própria lógica –, pois permite que a condição das partes influa nos benefícios que serão alcançados pelo réu – aliás, nada mais odioso.

O legislador – e aqui não se deprecia a sua atividade, importantíssima, ante a atual crise do Estado – possui limites, os quais se consubstanciam, preponderantemente, no respeito à ordem principiológica, seja constitucional ou não.


E frente a contradição legislativa, cabe ao jurista interpretar o conceito de crime de menor potencial ofensivo de maneira uniforme, ampliando aquele contido no art. 61 da Lei 9.099/95, eis mais benéfico ao cidadão-réu. Ademais, caminho contrário consistiria em indisfarçável discriminação.

A confortar a tese, recolho da doutrina preciosa lição do Prof. Luiz Flávio Gomes in “Lei dos Juizados Especiais Federais (10.259/2001): Aspectos Criminais” (Wunderlich, Alexandre. org. Escritos de Direito e Processo Penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 223/235):

“A lei n° 10.259/2001, ao definir o que se entende por infração de menor potencial ofensivo (art. 2°), ampliou esse conceito e aplica-se também aos Juizados Estaduais (cf., nesse sentido, vários artigos no site do ibccrim.com.br). A razão é simples: o legislador não se limitou a disciplinar os delitos que são da competência exclusiva (ratione materiae) da Justiça Federal, como, por exemplo, o crime político, o crime de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro etc. Se assim tivesse procedido, jamais o art. 2° se estenderia aos Juizados Estaduais. Adotou, ao contrário, critério amplo, que envolve todos os crimes da sua competência. Ocorre que a grande maioria deles são também julgados pelas Justiças Estaduais”.

Complementa:

“Violação ao Princípio da Igualdade

Não se pode admitir o disparate de um desacato contra policial federal ser infração de menor potencial ofensivo (com todas as medidas despenalizadoras respectivas) e a mesma conduta praticada contra um policial militar não o ser. Não existe diferença valorativa dos bens jurídicos envolvidos. O valor do bem e a intensidade do ataque é a mesma. Fatos iguais, tratamento isonômico.

A Restrição Expressa da Lei n° 10.259/2001 Sucumbe Diante da Constituição

É bem verdade que em vários momentos a Lei n° 10.259/2001 procurou deixar claro que sua aplicação era restrita ao âmbito federal (arts. 1° no que não conflitar com esta lei, art. 2° para os efeitos desta lei, art. 20 vedada a aplicação desta lei na Justiça Estadual). Apesar disso, nossa posição é no sentido de que deve ser aplicado o novo conceito de infração de menor potencial ofensivo nos juizado estaduais. Por quê? Porque sobre o legislador ordinário está a vontade do Constituinte (a Constituição). Nenhum texto legal ordinário pode, sem justo motivo, discriminar situações. Se o crime da mesma natureza é julgado pela Justiça Estadual e Federal, deve receber o mesmo tratamento jurídico em ambas as jurisdições ”.

Seguindo a mesma linha: AREND, Márcia Aguiar e MARCOS, Rudson in Lei dos Juizados Especiais Federais: Reflexos da Ampliação do Conceito de Infrações de Menor Potencial Ofensivo no Ordenamento Penal e Processual Penal, RT 793/491; e, TEIXEIRA, Fernando Tadeu Cabral, in Primeiras Impressões Sobre a Lei n° 10.259 de 12 de julho de 2001, Que Institui os Juizados Especiais Cíveis e Criminais no Âmbito da Justiça Federal, Boletim IBCCRIM, n° 106, p. 3.

Acrescenta-se que a semelhança entre os diplomas vem denunciada pela própria lei, quando, já no seu art. 1°, utiliza-se da regulação prevista na Lei 9.099/95, “no que não conflitar”. Claro que a parte final do dispositivo, por si-só, não pode justificar o tratamento desigual.

Na suma, comungo integralmente com ensinamento colacionado, eis entendo que os juizados especiais estaduais (pelo alargamento do conceito de infração de menor potencial ofensivo), com o advento da Lei 10.259/01, tiveram sua competência ampliada, para julgar os crimes cuja pena máxima cominada não seja superior a dois anos – inteligência do art. 61 da Lei 9.099/95, c/c os arts. 5°, caput, 98, I da CF/88.

RETROATIVIDADE DA LEI PROCESSUAL PENAL

A questão tem precedente histórico, quando os mais diversos Tribunais do país, com o advento da Lei 9.099/95, discutiram a retroação dos seus dispositivos. À época, doutrina e jurisprudência dividiram-se, até mesmo porque o art. 90 da referida lei, expressamente, estabelecia a irretroatividade das suas disposições para os processos cuja instrução já estivesse iniciado.

Parte considerável da doutrina posicionou-se favoravelmente à retroação da lei, considerando que, não obstante seu caráter processual, continha implicações no direito material, como, por exemplo, a extinção da punibilidade. Assim, estaria justificada a retroatividade da lei, por mais benéfica ao réu.

A polêmica restou superada, todavia, com a ADIMC – 1719/DF, julgada pelo Pretório Excelso em 03.12.97, assim ementada:

“EMENTA: Ação direta de inconstitucionalidade. Argüição de inconstitucionalidade do artigo 90 da Lei 9.099, de 26.09.95, em face do princípio constitucional da retroatividade da lei penal mais benigna (art. 5º, XL, da Carta Magna). Pedido de liminar.

– Ocorrência dos requisitos da relevância da fundamentação jurídica do pedido e da conveniência da suspensão parcial da norma impugnada. Pedido de liminar que se defere, em parte, para, dando ao artigo 90 da Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995, interpretação conforme à Constituição suspender “ex tunc”, sua eficácia com relação ao sentido de ser ele aplicável às normas de conteúdo penal mais favorável contidas nessa Lei” (Rel. Min. Moreira Alves).


O Superior Tribunal de Justiça, decidindo o HC 11769/SP, adotou a mesma linha:

“Ementa: PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS-CORPUS. HOMICÍDIO CULPOSO. SENTENÇA CONDENATÓRIA. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. LEI Nº 9.099/95. RETROATIVIDADE.

– A suspensão condicional do processo, solução extra-penal para o controle social de crimes de menor potencial ofensivo, é um direito subjetivo do réu, desde que presentes os pressupostos objetivos.

– A providência processual em tela, por fundar-se em norma penal de natureza benigna, deve sempre ser aplicada, inclusive nos processos com sentença penal condenatória, em razão do princípio da retroatividade penal benéfica, hipótese em que devem ser os autos baixados ao Juízo processante, para que seja oportunizada a proposta de que trata o art. 89, da Lei nº 9.099/95.

– Habeas-corpus concedido.” (Rel. Min. VICENTE LEAL, julgado em 20.06.00, SEXTA TURMA).

Logo percebe-se que o entendimento antes adotado pelos Tribunais Superiores é perfeitamente adaptável ao caso presente. As duas leis – 9.099/95 e 10.259/01 – tratam do mesmo assunto: juizados especiais, no âmbito da Justiça Estadual e Federal, respectivamente. Ambas possuem normas de natureza processual/material.

Então, a ampliação do conceito “menor potencial” operada pelo art. 2°, da Lei 10.259/01, antes demonstrada, deve surtir efeitos mesmo em relação àqueles processos cuja ação penal fora proposta antes da entrada em vigor do diploma legal.

Todavia, forte em entendimento do Centro de Estudos do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, as ações penais – como a presente – iniciadas antes do dia 14.01.02 (fim da “vacatio legis”), seguirão no juízo comum, assegurados, ali, os benefícios da Lei 9.099/95 (art. 25 da Lei 10.259/01).

Inegável que os delitos imputados aos réus – porte e disparo de arma de fogo –, frente a nova legislação, possuem menor ofensividade, pois o apenamento máximo abstrato não excede 2 anos.

Por outro lado, inegável também que as normas processuais – como as definidoras da competência dos Juizados Especiais – guiam-se pelo princípio tempus regit actum, a teor do art. 2° do Código de Processo Penal. E a ação penal, in casu, iniciara-se em 17.04.01, perante o juízo comum, com o oferecimento da denúncia de fls. 02/05.

Ainda – sob outro ângulo – há corrente jurisprudencial defendendo a retroação da lei mais benéfica, mesmo em se tratando de normas processuais. É que o art. 5°, XL, da CF/88 não está expressamente dirigido às normas substantivas tão-somente. De qualquer sorte, o rito sumaríssimo – buscando sempre agilizar o andamento do feito – acaba por reduzir os momentos destinados à comprovação do álibi defensivo, não constituindo, por conseqüência, norma benéfica.

Então, a competência da 1ª Vara da Comarca de Passo Fundo está firmada.

Isto não afasta, todavia, que o crime seja – no juízo comum – reconhecido como de menor potencial ofensivo, assegurando-se aos réus os benefícios previstos na Lei 9.099/95. O caráter substancial do art. 2° da Lei 10.259/01 torna a retroação inarredável.

Aliás, o Centro de Estudos do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul enfrentou a polêmica, em sessão ordinária realizada no dia 12.12.01, cuja ata foi assim lavrada:

“Da Seção Criminal: 1 – A partir de 14-01-02, no Âmbito da Justiça Estadual, em razão do estabelecido no art. 61 da Lei n.° 9099/95 e no parágrafo único do art. 2.° da Lei n.° 10.259/01, considerar-se-ão infrações penais de menor potencial ofensivo (CF art. 98, inciso I, e art. 5° “caput”) as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a dois anos. (Maioria).

2 – Em se tratando de ações penais iniciadas antes de 14-01-02, os artigos 72 a 76 da Lei n.° 9.099/95 serão aplicados no próprio juízo criminal comum, tendo em vista o disposto no art. 25 da Lei n.° 10.259/01. (Unanimidade).”.

Talvez sirva de norte, para definir quais são os dispositivos retroativos da Lei 9.099/95, decisão da lavra do ilustre Min. Celso de Mello, nos autos do INQO – 1055/AM, julgado pela Suprema Corte:

“…

– A Lei n. 9.099/95, que constitui o estatuto disciplinador dos Juizados Especiais, mais do que a regulamentação normativa desses órgãos judiciários de primeira instância, importou em expressiva transformação do panorama penal vigente no Brasil, criando instrumentos destinados a viabilizar, juridicamente, processos de despenalização, com a inequívoca finalidade de forjar um novo modelo de Justiça criminal, que privilegie a ampliação do espaço de consenso, valorizando, desse modo, na definição das controvérsias oriundas do ilícito criminal, a adoção de soluções fundadas na própria vontade dos sujeitos que integram a relação processual penal. Esse novíssimo estatuto normativo, ao conferir expressão formal e positiva as premissas ideológicas que dão suporte as medidas despenalizadoras previstas na Lei n. 9.099/95, atribui, de modo conseqüente, especial primazia aos institutos (a) da composição civil (art. 74, parágrafo único), (b) da transação penal (art. 76), (c) da representação nos delitos de lesões culposas ou dolosas de natureza leve (arts. 88 e 91) e (d) da suspensão condicional do processo (art. 89).

…”

Parece-me que a decisão é irretocável. Estes são os dispositivos cuja retroação é imperativa. Claro que a orientação deve ser adaptada, já que o caso presente possui contornos diferenciados. Representação, por óbvio, não se fará necessária. Mas adequação, por certo, deve partir do juízo singular, que tem melhores condições de fazê-la.

Com estas considerações, dá-se parcial provimento ao recurso ministerial para determinar o processamento do feito perante a jurisdição comum (Primeira Vara Criminal de Passo Fundo), assegurados aos réus os benefícios previstos na Lei 9.099/95.

DES. ARAMIS NASSIF – De acordo.

DES. LUÍS GONZAGA DA SILVA MOURA – De acordo.

Autores

  • Brave

    é mestre em direito penal pela Faculdade de Direito da USP, professor doutor em direito penal pela Universidade Complutense de Madri (Espanha) e diretor-presidente da Rede de Ensino LFG.

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