Consultor Jurídico

O Código de Defesa dos Sonegadores no Brasil

27 de agosto de 2002, 12h33

Por Douglas Fischer

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Há algum tempo ousei lançar em alguns meios de comunicação manifestação destacando os reais propósitos — evidentemente não divulgados pelos seus defensores — do denominado “Código de Defesa dos Contribuintes”. Em contrapartida, vieram as naturais críticas. Após hibernação, eis que ressurge a discussão no Senado Federal da República.

Tenho certeza absoluta de que o cidadão brasileiro não tem dúvidas de que um dos maiores fatores que causam a pobreza neste nosso Brasil e que impedem o Estado de dar melhor atendimento aos mais necessitados decorre da sonegação fiscal, seja ela fraudulenta ou não.

Os danos sociais são imensuráveis. Não bastasse toda a falta de estrutura para a fiscalização federal — importante registro: mesmo assim tem sido exemplar e elogiável o trabalho da Receita Federal —, quer-se, agora, sob um manto falso de “proteção dos contribuintes”, garantir, sem qualquer pudor, a impunidade definitiva de uma classe de criminosos que, por seus atos, atingindo o patrimônio público, causam muito mais violência e miséria do que os tradicionais criminosos contra o patrimônio privado.

Nos §§ 2º e 3º do art. 16 do “projeto” temos que, em investigação por infrações tributárias (que podem refletir na esfera penal), a Receita Federal somente poderá investigar os “sócios que detenham poder de controle sobre a empresa”. Muito se fala nos denominados “laranjas” e “testas-de-ferro”, que são aqueles “legalmente” estão à frente de atos e da administração de sociedades com fins não tão lícitos como os que aparentam. Pela regra, vejam só, somente eles, “os laranjas e os testas-de-ferro” poderão ser responsabilizados, de modo que os administradores “de fato” — aqueles que não aparecem – , que se utilizam deste artifício criminoso, para, dentre outros, sonegar e “lavar dinheiro”, estarão imunes à fiscalização. Um escândalo!

Da interpretação do art. 23 e seu § 2º extrai-se que, uma vez instaurado o processo administrativo tributário, será essencial a prévia “intimação do interessado” (sic), com prazo de 5 dias, para tomar ciência da “efetivação de diligências”. Ou seja, toda vez que se irá fiscalizar determinada empresa, essencial será “avisar” o investigado de que a fiscalização se fará presente em 5 dias, e, se assim entender, poderá ele “esconder” ou até “destruir” provas dos ilícitos que porventura tenha cometido. E por aí vai… Uma vergonha!

Lalaus, Luiz Estevãos, Cacciolas, todos livres da real possibilidade de perseguição penal e devida punição. Enquanto isto, cuidado senhor ladrão de galinhas, a lei continuará lhe sendo implacável! E atentem que, atualmente, quem sonegar milhões e devolver o produto do crime antes da denúncia (inclusive parcelado, segundo “interpretação” de alguns segmentos do Judiciário) estará imune à sanção penal (art. 34 da Lei 9.249/95). Mas se, por uma “infelicidade”, um sujeito furtar cem reais da carteira daquele criminoso acima citado e resolver devolver-lhe o dinheiro, no máximo se lhe reduzirá um pouco a pena (art. 16 do Código Penal).

O Ministério Público Federal tem lutado arduamente com a finalidade de combater a denominada macrocriminalidade, mesmo diante de ameaças de aprovação de leis de mordaça. Mas a população precisar ser informada do que está ocorrendo. Diz a Constituição Pátria que o poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos. Se o senhor, cidadão, somente é lembrado de ser consultado por seus representantes em “determinados períodos”, não se esqueça disto! O poder de evitar a continuidade das desigualdades sociais também passa por suas mãos. Exerça-o com firmeza e convicção, não compactuando com a impunidade.