Financiamento suspeito

Veja denúncia do MP contra o candidato a deputado preso em MS

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6 de agosto de 2002, 10h32

O empresário mato-grossense e candidato a deputado estadual, Roberto Razuk, está preso desde o último domingo (4/8) em Dourados (MS). Ele é acusado de ter obtido, por meio de fraudes, um financiamento de R$ 3,5 milhões.

A denúncia foi feita pelo Ministério Público. Razuk teria cometido as fraudes em nome de seus empregados.

Leia a denúncia feita pelos procuradores contra Roberto Razuk e o pedido de prisão preventiva:

Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz Federal da 1ª Vara Federal da 2ª Subseção Judiciária do Estado de Mato Grosso do Sul – Dourados.

Autos número 2002.60.02.002178-8

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por intermédio dos Procuradores da República subscreventes, no uso de suas atribuições legais e constitucionais, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, oferecer DENÚNCIA em face de

ROBERTO RAZUK, brasileiro, casado, empresário, pela prática dos seguintes fatos delituosos:

Em maio de 1995, sob o pálio da pessoa jurídica CIPAMS, Comércio, Indústria, Importação e Exportação de Produtos Alimentícios de Mato Grosso do Sul Ltda, ROBERTO RAZUK e sua esposa DELIA GODOY RAZUK firmaram a Cédula de Crédito Industrial 95/05002-7 e receberam a quantia de R$ 3.500.000,00 (três milhões e quinhentos mil reais) a título de financiamento (fls. 33 a 35).

Em garantia do principal da dívida e das demais obrigações contratuais, gravou-se, “em hipoteca cedular de primeiro grau e sem concorrência de terceiros” parte do imóvel rural denominado FAZENDA NABILEQUE, situada, em tese, na cidade de Ladário-MS (fls. 02 da Cédula de Crédito Industrial – fls. 34).

A FAZENDA NABILEQUE, porém, não existe, não foi localizada, não pertence aos investigados. É uma fraude total.

Veja-se que, uma vez não quitado o financiamento, o Banco do Brasil levou a efeito a correspondente ação executiva. Em embargos de devedor, novamente surge a FAZENDA NABILEQUE, agora como bem imóvel nomeado à penhora pelos próprios executados (fls. 15 e 16).

A Certidão do Avaliador Judicial (fls. 23 a 25) revela circunstâncias esclarecedoras, senão vejamos:

01) Após intensa busca e diversos contatos com sitiantes, fazendeiros e pescadores das imediações, constatou-se que ninguém conhece a FAZENDA NABILEQUE, tampouco ROBERTO RAZUK ou DELIA GODOY RAZUK;

02) O Tabelião da 1ª. Circunscrição Imobiliária de Corumbá-MS (teoricamente responsável pelas escrituras da área do Nabileque) mostrou-se surpreso com a cópia da escritura que lhe foi apresentada, pois “reclamou sua competência para a emissão daquele título”. Indagado se a empresa CIPAMS LTDA ou ROBERTO RAZUK ou DELIA RAZUK possuem alguma matrícula em seu cartório, respondeu que não;

03) Em conversa com alguns fazendeiros da região, à luz de todas as suspeitas, chegaram a afirmar que as terras ficam “no segundo andar”;

04) Moradores das imediações informaram que se a área está localizada no traçado não-mapeado, então a área é indígena. A versão foi ratificada por técnico do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA;

05) O Avaliador Judicial expressou, ao fim e ao cabo: “nestas marchas e contramarchas, existem outras seis ou sete Cartas Precatórias em trâmite nesta Comarca, e as terras estão situadas naquela região, também inexistentes”.

Em igual sentido, o TERRASUL – Departamento de Terras e Colonização do Estado do Mato Grosso do Sul (fls. 26) informou que em seus registros fundiários nada consta em nome de BAZILIO COVRE, inexistindo, também, “titulação primitiva expedida pelo Estado de Mato Grosso”. Pesquisa junto à Secretaria de Agricultura, Indústria, Comércio, Viação e Obras Públicas – Departamento de Terras e Colonização de Cuiabá-MT, em linha idêntica, restou infrutífera.

Cristalina, portanto, a assertiva de que a FAZENDA NABILEQUE é imóvel rural fantasioso e imaginário. Não existe no mundo real. Representa, apenas, artifício imoral e ilegal utilizado para a obtenção de financiamento. Os documentos de folhas 18 a 20 são materialmente falsos; os de folhas 21 e 22, ideologicamente falsos.

O investigado ROBERTO RAZUK, valendo-se da condição de empregador, aproveitou-se da simplicidade e da subordinação de pessoas humildes e de pouca instrução, seus empregados BAZILIO COVRE (vigia) e OSMÁRIO CUSTÓDIO (motorista, o qual assinou Escritura Pública de Compra e Venda, falsa, -fls. 21 e 22), e, em prejuízo da coletividade, logrou êxito em empreitada fraudulenta de vultoso porte.

Em raciocínio lógico, mostra-se evidente o poder de ROBERTO RAZUK sobre pessoas de menor expressão e sob seu comando administrativo.

Lembremos de BAZILIO COVRE. Quem é esse cidadão, que em meados de 1960 adquiriu 294.500 (DUZENTOS E NOVENTA E QUATRO MIL E QUINHENTOS) hectares de terra do então Estado do Mato Grosso (fls. 20)? E, em 1994, vendeu parte de seu imóvel rural, pelo valor de R$ 300.000,00 (TREZENTOS MIL REAIS) à empresa CIPAMS LTDA, pertencente a ROBERTO RAZUK (fls. 21 e 22)?


Certamente BAZILIO COVRE, consoante qualificação nos documentos mencionados, é pecuarista. Um grande empresário, talvez!

Não, em definitivo. A verdade é que BAZILIO COVRE, pessoa extremamente humilde, é um simples vigia. O teor da certidão lavrada pelos eminentes Promotores de Justiça, Clóvis Amauri Smaniotto e Marcos Fernandes Sisti (fls. 09 e 10), com fotos ilustrativas (fls. 11 a 13) evidencia:

A residência de BAZILIO COVRE é “uma casa de madeira modesta”. Questionado sobre a sua propriedade de 294.500 hectares, particularmente a respeito do Título de Cessão passado pelo Departamento de Terras de Colonização do Estado do Mato Grosso, asseverou que “nunca recebeu, tampouco foi proprietário de terras”. As revelações de BAZILIO COVRE surpreendem:

a) “trabalhou para o Senhor ROBERTO RAZUK por aproximadamente 20 (vinte) anos, como vigia da sua residência, nesta cidade, dizendo ter sido ‘encostado’ há aproximadamente 04 (quatro) anos, em razão de sua idade”;

b) “nunca foi registrado; que sempre recebeu um salário mínimo, e desde que deixou seus serviços ainda vai todos os meses receber R$ 150,00 na casa do Sr. RAZUK para receber sua ‘aposentadoria'”;

c) “nunca esteve em Corumbá-MS; nunca esteve no Cartório em Corumbá ou Ladário; nunca assinou Escritura Pública de Compra e Venda de Terras ou Procuração para quem quer que fosse para comprar ou vender terras em seu nome”;

d) “tempos atrás (não se recordando a data), assinou 1 folha de papel em branco a pedido do Sr. RAZUK, quando ainda trabalhava em sua casa”;

e) Quanto à “Procuração Ad Judicia” outorgada ao Dr. LAUDELINO BALBUENA MEDEIROS, “afirmou conhecê-lo somente de nome, mas não lhe ter outorgado a procuração, sempre demonstrando surpresa com o teor dos documentos, chegando a dizer em tom jocoso ‘será que eu estou rico e não sabia'”;

f) Indagado, pelos Promotores de Justiça, se estaria disposto a prestar declarações por escrito ou ser filmado, BAZILIO COVRE expressou: “primeiro preciso falar com ele (Razuk)”. Expôs, derradeiramente, que “não era aposentado pelo INSS; que sobrevivia apenas dos R$ 150,00 pagos pelo Sr. Razuk”.

Conclui-se, por óbvio, que BAZILIO COVRE serviu de instrumento humano para a prática de vários delitos. A falsidade está caracterizada em relação ao Registro de Imóvel (fls. 18 e 19), ao Título de Propriedade (fls. 20), à Escritura Pública, sendo usada, também, a pessoa de OSMÁRIO CUSTÓDIO, motorista de ROBERTO RAZUK, conforme esclarecido pelos Promotores de Justiça na alínea “c”, parte final, fls. 07(fls. 21 e 22), à Procuração “Ad Judicia” (fls. 29) que, vimos, BAZILIO COVRE aduziu jamais tê-la assinado.

Via de conseqüência, BAZILIO COVRE e OSMÁRIO CUSTÓDIO, vigia e motorista, respectivamente, de ROBERTO RAZUK são pessoas humildes, sofrem influência e dependem de ROBERTO RAZUK. O vigia BAZILIO COVRE, aliás, sobrevive do dinheiro mensal que recebe a título de “aposentadoria” do denunciado e, antes de prestar declarações por escrito ou ser filmado pelos Promotores de Justiça, alegou, reprise-se: “primeiro preciso falar com ele (Razuk)”.

A propósito, é evidente que ROBERTO RAZUK, que “EXERCE ATIVIDADE EMPRESARIAL EM NOSSA CIDADE (DOURADOS-MS) HÁ MAIS DE 30 ANOS” (conforme as declarações, em anexo, que o denunciado apresentou nos autos onde é processado por porte ilegal de arma de uso restrito), jamais compraria imóvel rural “sem sentar o pó da terra com os próprios pés”. Em verdade, ROBERTO RAZUK, sempre soube da inexistência da FAZENDA NABILEQUE (mais, ele a inventou!).

As assinaturas constantes da Cédula de Crédito Industrial que formalizaram o empréstimo de R$ 3.500.000,00 (fls. 35) comprovam que ROBERTO RAZUK assinou OITO VEZES a documentação. Aliás, apenas ROBERTO RAZUK firmou assinatura, seja como devedor principal, em seu nome e de sua esposa (a assinatura de DELIA GODOY RAZUK, com firma reconhecida, é diferente!, fls. 41), seja na qualidade de avalista, em nome próprio e da esposa, seja, ao final, na retificação.

ASSIM AGINDO, o denunciado infringiu, em concurso material, os artigos 297, caput e 299 (documento público), conjugados com o artigo 304, todos do Código Penal, e artigo 19, parágrafo único, da Lei 7.492/86.

A materialidade delitiva está devidamente comprovada com os documentos juntados aos autos (fls. 15 a 26 e 33 a 35).

Em virtude do exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL requer seja recebida a presente denúncia, citando-se o acusado para ser interrogado e processado até final julgamento por infração aos delitos anteriormente tipificados. Em igual sentido, requer sejam ouvidas as testemunhas arroladas. Tudo, nos termos do ordenamento jurídico pátrio vigente.


Dourados-MS, aos 31 dias de julho de 2002.

RAMIRO ROCKENBACH DA SILVA

Procurador da República

CHARLES STEVAN DA MOTA PESSOA

Procurador da República

EMERSON KALIF SIQUEIRA

Procurador da República

ROL

1) CLÓVIS AMAURI SMANIOTTO, Promotor de Justiça, lotado na 17ª Promotoria de Justiça de Campo Grande/MS, localizada na Avenida Fernando Corrêa da Costa, 559 – Edifício do Fórum – Centro – Campo Grande/MS;

2) MARCOS FERNANDES SISTI, Promotor de Justiça, 10ª Promotoria de Justiça da Comarca de Dourados/MS, na Rua Presidente Vargas, 309, centro, Dourados/MS;

3) BAZÍLIO COVRE, brasileiro, casado, portador da Cédula de Identidade n.º 171.594, emitida pela Secretaria de Segurança Pública do Estado de Mato Grosso do Sul, residente e domiciliado à rua Palmeiras, n.º 62 cidade Dourados/MS;

4) MIGUEL GONÇALVES DE MORAES, Coordenador dos Oficiais de Justiça, lotado no Fórum de Justiça Estadual da Comarca de Corumbá/MS, localizado na Rua Major Gama, n.º 290, centro, na cidade de Corumbá/MS;

5) RENE CUNEGUNDES RAMIRES, Avaliador Judicial, lotado no Fórum de Justiça Estadual da Comarca de Corumbá – MS, na Rua Major Gama, n.º 290, centro, Corumbá/MS.

Pedido de Prisao Preventiva

Autos número 2002.60.02.002178-8

Pedido de Prisão Preventiva

MM. JUIZ FEDERAL

O inquisitório policial que originou os autos em epígrafe investiga vultosa fraude em detrimento da Fé Pública e do Sistema Financeiro Nacional.

As pessoas de ROBERTO RAZUK e DELIA GODOY RAZUK, proprietárias da empresa CIPAMS – Comércio, Indústria, Importação e Exportação de Produtos Alimentícios de Mato Grosso do Sul, pleitearam e obtiveram, junto à agência do Banco do Brasil em Dourados-MS, em maio de 1995, financiamento no valor de R$ 3.500.000,00 (três milhões e quinhentos mil reais) oferecendo em garantia parte da gleba de terras denominada FAZENDA NABILEQUE, de cem mil hectares, no município de Ladário/MS, avaliada em R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais). O imóvel rural teria sido adquirido de BAZILIO COVRE.

A inadimplência, no que tange ao financiamento, impulsionou o Banco do Brasil a ajuizar Ação de Execução fundada em Título Extrajudicial (Cédula de Crédito Industrial 95/05002-7, de 22 de maio de 1995) sobre o bem dado em garantia: a FAZENDA NABILEQUE que, porém, jamais foi localizada.

De fato, o TERRASUL – Departamento de Terras e Colonização do Estado do Mato Grosso do Sul NÃO ENCONTROU A FAZENDA NABILEQUE. Consultado o título definitivo expedido pela Secretaria de Agricultura, Indústria, Comércio, Viação e Obras Públicas – Departamento de Terras e Colonização de Cuiabá-MT, em nome de BAZILIO COVRE, de igual forma, absolutamente NENHUM REGISTRO FOI LOCALIZADO.

As precisas observações do Ilustre Delegado de Polícia Federal, no presente contexto, são dignas de nota:

“Sendo assim, inexistente a titulação primitiva expedida pelo então Estado de Mato Grosso em favor de Bazilio Covre, fácil se concluir que:

a) O título provisório de Cessão da Fazenda denominada Nabileque, em Ladário/MS, com 294.500 ha, passado pelo Departamento de Terras e Colonização do Estado do Mato Grosso, datado de 03.11.1960, em favor de Bazilio Covre, é MATERIALMENTE FALSO;

b) A escritura de compra e venda de parte daquela fazenda, com 100.000 ha, de propriedade de BAZILIO, passada em 06.09.94, no valor de R$ 300.000,00, no 5º. Ofício de Notas de Corumbá, tendo como compradora a CIPAMS, de propriedade de ROBERTO RAZUK, é IDEOLOGICAMENTE FALSA;

Não bastasse isso, BAZILIO COVRE, ouvido pela Promotoria de Justiça de Dourados, afirmou nunca ter sequer ouvido falar de tal área de terra; e não podia ser diferente, já que pessoa extremamente humilde e, curiosamente, empregado de ROBERTO RAZUK, na função de vigia, por quase 20 anos.

Reconheceu, ainda, ter assinado ‘alguns papéis em branco’ para seu patrão, sem saber do que se tratava.

Em resumo, um INOCENTE ÚTIL ou, na linguagem de todos conhecida, um típico LARANJA, sendo assim, ROBERTO RAZUK, valendo-se da ignorância de um empregado, falsificou documentos e os utilizou para obter financiamento de invejável quantia, perante instituição financeira pública, para fim até agora não esclarecido, dando em garantia, imóvel que não existe.

E se existe (até agora ninguém o localizou), certamente que não lhe pertence” (destaques em negrito no original).

A Autoridade Policial, com base nos artigos 311, 312 e 313 do Código de Processo Penal, representa pela prisão preventiva de ROBERTO RAZUK.

É a breve exposição fática. Passemos à análise.


O caso sob exame é de extrema gravidade.

O investigado ROBERTO RAZUK, valendo-se da condição de empregador, aproveitou-se da simplicidade e da subordinação de pessoas humildes e de pouca instrução, seus empregados BAZILIO COVRE (vigia) e OSMÁRIO CUSTÓDIO (motorista, o qual assinou Escritura Pública de Compra e Venda, falsa, – fls. 21 e 22), e, em prejuízo da coletividade, logrou êxito em empreitada fraudulenta de vultoso porte.

Em maio de 1995, sob o pálio da pessoa jurídica CIPAMS, Comércio, Indústria, Importação e Exportação de Produtos Alimentícios de Mato Grosso do Sul Ltda, ROBERTO RAZUK e sua esposa DELIA GODOY RAZUK firmaram a Cédula de Crédito Industrial 95/05002-7 e receberam a quantia de R$ 3.500.000,00 (três milhões e quinhentos mil reais) a título de financiamento (fls. 33 a 35).

Em garantia do principal da dívida e das demais obrigações contratuais, gravou-se, “em hipoteca cedular de primeiro grau e sem concorrência de terceiros” parte do imóvel rural denominado FAZENDA NABILEQUE, situada, em tese, na cidade de Ladário-MS (fls. 02 da Cédula de Crédito Industrial – fls. 34).

A FAZENDA NABILEQUE, porém, não existe, não foi localizada, não pertence aos investigados. É uma fraude total.

Veja-se que, uma vez não quitado o financiamento, o Banco do Brasil levou a efeito a correspondente ação executiva. Em embargos de devedor, novamente surge a FAZENDA NABILEQUE, agora como bem imóvel nomeado à penhora pelos executados (fls. 15 e 16).

A Certidão do Avaliador Judicial (fls. 23 a 25) revela circunstâncias esclarecedoras, senão vejamos:

01) Após intensa busca e diversos contatos com sitiantes, fazendeiros e pescadores das imediações, constatou-se que ninguém conhece a FAZENDA NABILEQUE, tampouco ROBERTO RAZUK ou DELIA GODOY RAZUK;

02) O Tabelião da 1ª. Circunscrição Imobiliária de Corumbá-MS (teoricamente responsável pelas escrituras da área do Nabileque) mostrou-se surpreso com a cópia da escritura que lhe foi apresentada, pois “reclamou sua competência para a emissão daquele título”. Indagado se a empresa CIPAMS LTDA ou ROBERTO RAZUK ou DELIA RAZUK possuem alguma matrícula em seu cartório, respondeu que não;

03) Em conversa com alguns fazendeiros da região, à luz de todas as suspeitas, chegaram a afirmar que as terras ficam “no segundo andar”;

04) Moradores das imediações informaram que se a área está localizada no traçado não-mapeado, então a área é indígena. A versão foi ratificada por técnico do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA;

05) O Avaliador Judicial expressou, ao fim e ao cabo: “nestas marchas e contramarchas, existem outras seis ou sete Cartas Precatórias em trâmite nesta Comarca, e as terras estão situadas naquela região, também inexistentes”.

Em igual sentido, o TERRASUL – Departamento de Terras e Colonização do Estado do Mato Grosso do Sul (fls. 26) informou que em seus registros fundiários nada consta em nome de BAZILIO COVRE, inexistindo, também, “titulação primitiva expedida pelo Estado de Mato Grosso”. Pesquisa junto à Secretaria de Agricultura, Indústria, Comércio, Viação e Obras Públicas – Departamento de Terras e Colonização de Cuiabá-MT, em linha idêntica, restou infrutífera.

Cristalina, portanto, a assertiva de que a FAZENDA NABILEQUE é imóvel rural fantasioso e imaginário. Não existe no mundo real. Representa, apenas, artifício imoral e ilegal utilizado para a obtenção de financiamento.

Configurado, em tese, CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL, na modalidade de obtenção, mediante fraude, de financiamento em instituição financeira oficial (artigo 19, § único, Lei 7.492/86) e DELITOS CONTRA A FÉ PÚBLICA (falsidade material e ideológica).

Os TRÊS MILHÕES E QUINHENTOS MIL REAIS, por conseguinte, foram obtidos de maneira fraudulenta, não estão pagos, e é desconhecida sua aplicação. Tudo, utilizando-se de complexo e elaborado projeto criminoso.

A magnitude da lesão causada, a garantia da ordem econômica, a necessidade de assegurar a aplicação da lei penal e a conveniência (exigência, na verdade!) da instrução criminal, impõem a prisão preventiva de ROBERTO RAZUK, nos termos a seguir delineados.

I – A magnitude da lesão causada e a garantia da ordem econômica: A Lei Regente dos Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional dispõe, em seu artigo 30, que sem prejuízo do artigo 312 do Código de Processo Penal, a prisão preventiva do acusado poderá ser decretada em razão da magnitude da lesão causada.

O simples fato de o infrator ocasionar desfalques de grande monta é suficiente para ensejar a custódia cautelar. Rememore-se que o caso em exame envolve QUANTIA SUPERIOR A 3 MILHÕES DE REAIS.


Todavia, os princípios constitucionais, norteadores do processo penal contemporâneo, demonstram que a liberdade ambulatória de um cidadão deve, sim, ser defendida ao máximo. O Ministério Público Federal, ciente de seu mister institucional e social, pugna por absolvições, assente em pedidos de liberdade provisória, preza, enfim, pelas garantias individuais e coletivas.

O comportamento de ROBERTO RAZUK, no entanto, é-lhe totalmente desfavorável. A reunião de circunstâncias e fatos concretos está a exigir o seu recolhimento preventivo ao cárcere público.

A magnitude da lesão é notória. São R$ 3.500.000,00 obtidos mediante fraude, desfalcando o Sistema Financeiro Nacional em favor de pessoa não merecedora do respectivo crédito, a qual o obteve somente com o emprego de artifícios.

A ordem econômica a ser preservada constitui o fundamento inicial. É o supedâneo a englobar toda a situação fática. O valor, repita-se, de R$ 3.500.000,00 (TRÊS MILHÕES E QUINHENTOS MIL REAIS), criminosamente alcançado por ROBERTO RAZUK, seria apto a financiar a lavoura de, por exemplo, 200 pequenos produtores de Dourados-MS, recebendo cada qual a quantia de R$ 17.500,00, beneficiando centenas de famílias, gerando empregos, distribuindo riquezas e contribuindo efetivamente para construir uma sociedade livre, justa e solidária, garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais e promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Todos, objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, ao teor do artigo 3º., incisos I a IV, do Texto Supremo.

As lições jurisprudenciais merecem referência:

“A simples apropriação vernacular da expressão ‘sem prejuízo do disposto no artigo 312, do Código de Processo Penal’, contida no artigo 30, da Lei Federal nº. 7492/86, autoriza a decretação da prisão preventiva, com o fundamento isolado da magnitude da lesão supostamente causada” (HC-9255, Processo 199903000477971, TRF 3ª. Região, DJU 06/06/2000).

“Conforme dicção do art. 30 da Lei 7.492/86, sem prejuízo do contido no art. 312 do CPP, a prisão preventiva do acusado da prática de quaisquer dos crimes previstos nessa Lei poderá ser decretada em razão da magnitude da lesão causada” (HC-13845, Processo 200000688584, STJ, DJ 04/12/2000).

O Tribunal Regional Federal sediado em São Paulo-SP, com jurisdição, inclusive, sobre o Mato Grosso do Sul, bem como o Superior Tribunal de Justiça, abrangendo jurisdicionados em todo o território nacional, posicionam-se no sentido de que a magnitude da lesão é fato suficiente para decretar a prisão preventiva.

O Ministério Público Federal observa, também, as posições mais exigentes. O Tribunal Regional Federal sediado em Porto Alegre-RS, saliente-se, requer seja a magnitude da lesão somada a pelo menos mais um requisito:

“nos crimes contra o sistema financeiro, havendo magnitude da lesão, a presença dos pressupostos previstos no artigo 312 do CPP constitui uma exigência mais elástica. Assim, se for reconhecida a possibilidade mínima de perigo à ordem pública ou econômica, fuga do agente ou influência na prova, sendo grave a lesão ao sistema financeiro, está justificada a custódia provisória” (HC-3041, Processo 200104010753106, TRF 4ª. Região, DJU 16/01/2002).

Em oportunidade diversa, contudo, o Tribunal Regional Federal da Quarta Região verberou nos termos doravante expostos:

“O art. 30 da Lei nº. 7.492/86 autoriza a decretação de prisão preventiva nos crimes nela descritos em razão da magnitude da lesão causada ao Sistema Financeiro Nacional. A quantia encontrada com o acusado (R$ 500.000,00 – quinhentos mil reais) enseja, nos termos do referido comando legal, a aplicação da medida cautelar” (HC-2147, Processo número 200004010357180, TRF 4ª. Região, DJU 19/07/2000).

Em suma, a envergadura expressiva do dano econômico ocasionado por ROBERTO RAZUK é indiscutível. A quantia de 3.500.000,00 (TRÊS MILHÕES E QUINHENTOS MIL REAIS), exemplifique-se, equivale a DEZ VEZES O ORÇAMENTO ANUAL DA FUNAI PARA ATENDER ÀS NECESSIDADES DE 20 MIL INDÍGENAS em Dourados-MS e adjacências (documento em anexo). Exsurge, em acréscimo, demais elementos a tornar escorreita a necessidade da prisão provisória.

II – A necessidade de assegurar a aplicação da lei penal: Consabe-se o quanto os investigados detentores de poderio econômico e influência política atuam, em vários segmentos, no intuito de evitar (ou retardar ao máximo) eventual condenação. “A escusa em atender o chamamento judicial, dificultando o andamento do processo, retarda e torna incerta a aplicação da lei penal, justificando a custódia preventiva”, ministra o juspenalista Julio Fabbrini Mirabete (in PROCESSO PENAL. São Paulo: Editora Atlas, 2000, página 386. Grifamos).


Curial consignar, nesse diapasão, que ROBERTO RAZUK, nos autos número 1999.6002000688-9, em trâmite na Vara Federal de Dourados-MS, (documentos em anexo) demonstra sua reprovável atitude face às autoridades empenhadas na persecução criminal e aplicação da lei penal. Passemos a colacionar o que segue:

01) Intimado a depor na seara policial, ROBERTO RAZUKnão compareceu. Ao contrário, apresentou atestado médico informando sua incapacidade de locomoção por 03 dias devido a “efisema pulmonar infectado”;

02) Quando do interrogatório na fase judicial, ROBERTO RAZUKreiterou a posição de não comparecer. Novamente alegou enfermidade;

O então Juiz Federal decretou a prisão preventiva como única maneira viável a assegurar a aplicação da lei penal, no verbo:

“Designada audiência para esta data, o acusado foi citado e para ela intimado em 29.07.99 (f. 59). Contudo, hoje mesmo, o acusado fez protocolizar uma petição requerendo a designação de uma nova data para seu interrogatório, alegando impossibilidade de comparecer por encontrar-se enfermo. Para comprovar suas alegações, no sentido da impossibilidade de comparecimento, apresentou atestado médico firmado pelo Dr. George Takimoto. A teor do art. 367 do CPP, ‘o processo seguirá sem a presença do acusado que, citado ou intimado pessoalmente para qualquer ato, deixar de comparecer sem motivo justificado’, caso em que ser-lhe-á decretada a revelia. No caso dos autos, tenho que o atestado médico apresentado, máxime pelas circunstâncias que o envolvem, não se presta a justificar a ausência do réu. Conforme se verifica de f. 19, estando designado interrogatório do acusado na fase policial para as 14h00 do dia 22 de abril do corrente ano, consoante se verifica da petição de f. 17, naquela mesma data o acusado apresentou atestado médico, subscrito pelo mesmo Dr. George Takimoto, que dava conta de estar o réu incapacitado de locomover-se, por 03 (três) dias, “por apresentar efisema pulmonar infectado”. Desta feita, o mesmo médico atestou que Roberto Razuk deveria permanecer de repouso para tratamento de doença, cujo o Código Internacional deixou de indicar, limitando-se a descrição de difícil compreensão (em face da qualidade da letra utilizada). Assim, o procedimento ora adotado pelo acusado revela reiterado propósito de dificultar a apuração dos fatos que lhe são atribuídos, frustrando, pois, a aplicação da lei penal. Em razão disso, decreto a revelia do acusado bem como a sua prisão preventiva”.

03) Uma vez em liberdade, ROBERTO RAZUKprossegue com manobras protelatórias. Os autos mencionados revelam que as testemunhas arroladas pela defesa, com endereço em Ponta Porã-MS, o foram, no compromisso de comparecerem independente de intimação. Após, no entanto, o causídico peticionou alegando equívoco, declinando como correto o endereço dos depoentes na cidade de Pedro Juan Caballero, no Paraguai, fazendo-se necessária a expedição de Carta Rogatória.

O investigado, reprise-se, usando de sua influência, apresenta atestados médicos para procrastinar o trâmite processual. As relações com detentores do poder, ademais, são trazidas ao feito como declaração de idoneidade (firmadas por vereador, magistrado e deputado estadual, nos autos aludidos).

Enfim, ao ser abordado pela Polícia Federal, ROBERTO RAZUK, quando flagrado internando irregularmente em solo pátrio armamento de uso restrito, apresentou Identidade de Deputado Estadual (quando já não mais o era!) em nítido propósito de intimidar os agentes públicos.

A influência assume proporções imensuráveis.

As assinaturas constantes da Cédula de Crédito Industrial que formalizaram o empréstimo de R$ 3.500.000,00 (fls. 35) comprovam que ROBERTO RAZUKassinou OITO VEZES a documentação. Aliás, apenas ROBERTO RAZUKfirmou assinatura, seja como devedor principal, em seu nome e de sua esposa (a assinatura de DELIA GODOY RAZUK, com firma reconhecida, é diferente!, fls. 41), seja na qualidade de avalista, em nome próprio e da esposa, seja, ao final, na retificação.

Em síntese, apenas uma expressão explica como alguém consegue obter financiamento no valor de R$ 3.500.000,00, assinando OITO VEZES o documento e sem a devida vistoria do imóvel rural dado em garantia. A expressão explicativa é INFLUÊNCIA POLÍTICA, SOCIAL e ECONÔMICA.

III – A conveniência (exigência, na verdade!) da instrução criminal: Os argumentos supradeclinados certificam a forte influência de ROBERTO RAZUK sobre pessoas ocupantes de cargos e funções de maior relevância.

Em raciocínio lógico, mostra-se evidente o poder de ROBERTO RAZUK sobre pessoas de menor expressão e sob seu comando administrativo. Lembremos de BAZILIO COVRE.

Quem é esse cidadão, que em meados de 1960 adquiriu 294.500 (DUZENTOS E NOVENTA E QUATRO MIL E QUINHENTOS) hectares de terra do então Estado do Mato Grosso (fls. 20)? E, em 1994, vendeu parte de seu imóvel rural, pelo valor de R$ 300.000,00 (TREZENTOS MIL REAIS) à empresa CIPAMS LTDA, pertencente a ROBERTO RAZUK (fls. 21 e 22)?

Certamente BAZILIO COVRE, consoante qualificação nos documentos mencionados, é pecuarista. Um grande empresário, talvez!

Não, em definitivo. A verdade é que BAZILIO COVRE, pessoa extremamente humilde, é um simples vigia. O teor da certidão lavrada pelos eminentes Promotores de Justiça, Clóvis Amauri Smaniotto e Marcos Fernandes Sisti (fls. 09 e 10), com fotos ilustrativas (fls. 11 a 13) evidencia:

A residência de BAZILIO COVRE é “uma casa de madeira modesta”. Questionado sobre a sua propriedade de 294.500 hectares, particularmente a respeito do Título de Cessão passado pelo Departamento de Terras de Colonização do Estado do Mato Grosso, asseverou que “nunca recebeu, tampouco foi proprietário de terras”. As revelações de BAZILIO COVRE surpreendem:

a) “trabalhou para o Senhor ROBERTO RAZUK por aproximadamente 20 (vinte) anos, como vigia da sua residência, nesta cidade, dizendo ter sido ‘encostado’ há aproximadamente 04 (quatro) anos, em razão de sua idade”;

b) “nunca foi registrado; que sempre recebeu um salário mínimo, e desde que deixou seus serviços ainda vai todos os meses receber R$ 150,00 na casa do Sr. RAZUK para receber sua ‘aposentadoria'”;

c) “nunca esteve em Corumbá-MS; nunca esteve no Cartório em Corumbá ou Ladário; nunca assinou Escritura Pública de Compra e Venda de Terras ou Procuração para quem quer que fosse para comprar ou vender terras em seu nome”;

d) “tempos atrás (não se recordando a data), assinou 1 folha de papel em branco a pedido do Sr. RAZUK, quando ainda trabalhava em sua casa”;

e) Quanto à “Procuração Ad Judicia” outorgada ao Dr. LAUDELINO BALBUENA MEDEIROS, “afirmou conhecê-lo somente de nome, mas não lhe ter outorgado a procuração, sempre demonstrando surpresa com o teor dos documentos, chegando a dizer em tom jocoso ‘será que eu estou rico e não sabia'”;

f) Indagado, pelos Promotores de Justiça, se estaria disposto a prestar declarações por escrito ou ser filmado, BAZILIO COVRE expressou: “primeiro preciso falar com ele (Razuk)”. Expôs, derradeiramente, que “não era aposentado pelo INSS; que sobrevivia apenas dos R$ 150,00 pagos pelo Sr. Razuk”.

Conclui-se, por óbvio, que BAZILIO COVRE serviu de instrumento humano para a prática de vários delitos. A falsidade está caracterizada em relação ao Registro de Imóvel (fls. 18 e 19), ao Título de Propriedade (fls. 20), à Escritura Pública, sendo usada, também, a pessoa de OSMÁRIO CUSTÓDIO, motorista de ROBERTO RAZUK, conforme esclarecido pelos Promotores de Justiça na alínea “c”, parte final, fls. 07 (fls. 21 e 22), à Procuração “Ad Judicia” (fls. 29) que, vimos, BAZILIO COVRE aduziu jamais tê-la assinado.

Via de conseqüência, BAZILIO COVRE e OSMÁRIO CUSTÓDIO, vigia e motorista, respectivamente, de ROBERTO RAZUK são testemunhas de essencial importância no que se refere aos delitos investigados. A influência do último sobre os primeiros é inegável. Dependem de ROBERTO RAZUK. O vigia BAZILIO COVRE, aliás, sobrevive do dinheiro mensal que recebe a título de “aposentadoria” do investigado e, antes de prestar declarações por escrito ou ser filmado pelos Promotores de Justiça, alegou, reprise-se: “primeiro preciso falar com ele (Razuk)”.

Face ao exposto, considerando a magnitude da lesão causada, a necessidade de garantir a ordem econômica, de assegurar a aplicação da lei penal e a conveniência (exigência, na verdade!) da instrução criminal, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ratificando o pedido da D.D. Autoridade Policial, requer a decretação da prisão preventiva de ROBERTO RAZUK.

Dourados-MS, aos 31 dias de julho de 2002.

RAMIRO ROCKENBACH DA SILVA

Procurador da República

CHARLES STEVAN DA MOTA PESSOA

Procurador da República

EMERSON KALIF SIQUEIRA

Procurador da República

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