Primeira Leitura: conservadores exigem linha dura de Bush no Oriente
29 de abril de 2002, 9h21
“Clareza moral”
A direita americana cunhou a expressão “clareza moral” para pressionar o governo Bush a não avançar em seu hesitante apelo ao premiê Ariel Sharon – para que retire seu Exército da Cisjordânia e reinicie conversações com a Autoridade Palestina.
Ferramenta direitista
Expoentes do conservadorismo usam a expressão para exigir de Bush que mantenha a linha dura no Oriente Médio. A revista The Nation compilou alguns exemplos. O editor de Opinião do The Wall Street Journal, Paul Gigot, afirma que o presidente “perdeu a clareza moral sobre o terror”. O ex-premiê israelense Benjamin Netanyahu, que disputa com Sharon a liderança do Likud, reclama que Bush revela falta de “clareza moral”.
Sem trégua
O senador Joseph Lieberman, democrata conservador, engrossa o coro: para ele, o apelo da Casa Branca a Sharon “turvou a clareza moral” do governo na luta contra o terrorismo.
O escritor William Bennett, que foi o czar antidrogas do governo de Bush, pai, garante: “Não podemos ficar entre eles (israelenses e palestinos) sem perder a clareza moral da mensagem anterior” do presidente, depois dos atentados de 11 de setembro.
Virou moda
Em um ato público pró-Israel em frente ao Congresso, em Washington, um manifestante pedia que Bush “demonstrasse a mesma clareza moral (sobre o Oriente Médio) que tem exibido na luta contra a Al Qaeda”.
Em outro ato, pró-palestinos, um entrevistado, contrário à manifestação, disse que estava “apoiando a guerra do presidente Bush contra o terrorismo e a clareza moral que a acompanha”.
Para ser realmente claro
Esgrimida pelos conservadores, a expressão acaba significando: deixe Sharon fazer o que quiser na Cisjordânia. Afinal, se Bush pôde retratar sua guerra pós-atentados de forma maniqueísta – você está comigo ou contra mim -, por que Sharon não poderia fazer o mesmo?
Preto ou branco
“Clareza moral”, na forma usada pela direita militarista, nega a existência de nuances. Sugere que exista uma solução simples e direta para uma difícil e delicada questão de política externa – uma tragédia, na verdade: a destruição da chamada “infra-estrutura terrorista palestina” sem se preocupar com o mal causado a civis ou às perspectivas de uma negociação de paz.
Outra natureza
Quando Bush finalmente decidiu se envolver – tarde demais -, ele olhou para o Oriente Médio e viu um conflito que não poderia ser definido na base do “ou isso ou aquilo”, como na caçada a Bin Laden. E isso levou à loucura a turma da “clareza moral”.
Palavras, palavras…
Quando o secretário de Estado, Colin Powell, terminou sua frustrada viagem ao Oriente Médio – e Sharon desafiou o apelo de Bush pela desocupação imediata das cidades palestinas -, o presidente americano chamou o premiê israelense de “homem da paz”.
Nem os falcões pró-Sharon em Israel diriam isso. O premiê tem muito apoio em seu país hoje justamente porque é um homem da guerra. Onde está a clareza moral quando se chama um militarista de “homem da paz”?
Assim falou…George W. Bush
“Não vamos permitir que Israel seja esmagado.”
Do presidente americano, sem explicar como o país correria esse risco, dada a grande superioridade militar israelense sobre os países árabes.
Tudo é história
O secretário-adjunto de Defesa dos EUA, Paul Wolfowitz, foi um dos oradores no ato pró-Israel em frente ao Capitólio, no dia 15 de abril. Talvez o mais empedernido falcão do governo Bush, Wolfowitz expressou a solidariedade da administração a Israel, mas ousou dizer que “palestinos inocentes estão sofrendo e morrendo também”, como as vítimas israelenses dos homens-bombas.
“Nós deploramos o assassinato deliberado de inocentes, e eu acredito, no meu coração, que a maioria dos palestinos pensa da mesma forma.” A multidão vaiou. Quando Wolfowitz falou de um Estado palestino, ela gargalhou. O número dois do Pentágono não teve opção: deixou o palanque e foi embora.
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