Caso Boi Gordo

Boi Gordo: CVM suspende distribuição de ações da Global Brasil.

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22 de abril de 2002, 14h27

No dia 10 de abril de 2002, a CVM editou a “Deliberação CVM nº 428, de 10 de abril de 2002”, suspendendo a distribuição de ações da Global Brasil Participações S.A., no mercado de valores mobiliários, sem o respectivo registro de distribuição pública na CVM, como está previsto no artigo 19, parágrafo 3º, da Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976.

Para aqueles que não estão acompanhando o dia a dia do affaire FRBG, ou simplesmente o conhecido “Caso Boi Gordo” é necessário entender os precedentes que culminaram com a determinação pela CVM para que a Global Brasil Participações S.A. se “abstenha de colocar publicamente as ações no mercado, assim como alertar os participantes do mercado de valores mobiliários, em especial os detentores de créditos ou de contratos de investimentos coletivo “CIC”s”, de emissão das Fazendas Reunidas Boi Gordo S.A. sobre a suspensão da distribuição de ações pela GLOBAL BRASIL pela CVM”.

É público e notório que as FRBG requereram Concordata Preventiva no dia 15/10/2001, na Comarca de Comodoro, Estado de Mato Grosso, rompendo unilateralmente todos os CICs, quer os emitidos com lastro, quer os colocados no mercado sem registro na CVM e “Contratos Verdes”, assim considerados aqueles que a empresa FRBG estava proibida de emitir, propondo pagar todos os investidores e credores, no prazo de dois anos, sendo 40% no primeiro ano (15-10-2002) e 60% no segundo ano (15-10-2003).

No início de novembro/2001 patrocinamos, quer como investidor, quer como advogado do Grupo Investidor Boi Gordo (www.investidorboigordo.com.br) o Mandado de Segurança nº 2607, junto ao Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso (www.tj.mt.gob.br) pleiteando o reconhecimento da ilegalidade do despacho do MM. Juiz de Comodoro-MT, pois os procedimentos (Concordata, Falência e outros) relacionados à matéria normada na lei de Falência têm sua competência fixada em lei, em razão da matéria, que a teor do art. 113 do CPC, è denominada competência ABSOLUTA que deve ser declarada de ofício e pode ser alegada, em qualquer tempo e grau de jurisdição, independentemente de exceção”; pode ser argüida por simples petição, como preliminar de contestação (CPC 301, II); não há preclusão; é questão ditada no interesse público, pressuposto processual de validade do processo, não podendo ser modificada por vontade das partes (CPC 102).

Diferentemente da competência absoluta, existe a competência relativa, isto é, aquela envolvendo, v.g., questão territorial, que deve ser argüidas, por meio de exceção (CPC 112) , juntamente com a contestação ou resposta.

Nos procedimentos de Concordata não existe esta fase para contestação, não dispondo o interessado da oportunidade do art. 301, II do CPC.

Como o despacho que defere a Concordata sem resolver qualquer questão incidental, segundo a doutrina unânime, a posição atual de todas as Turmas do STJ e de vários Tribunais Estatuais, inclusive o TJ-SP, é considerado irrecorrível, para o interessado atacar e corrigir o ato ilegal do Juiz que aceitou como competente o foro de Comodoro-MT, quando o certo seria o de São Paulo-Capital, não há outra medida judicial a não ser o Mandado de Segurança, única cabível aqui na espécie.

O MS 2.607, que no Mérito já tem Parecer favorável da douta Procuradoria de Justiça do Mato Grosso deverá ser julgado pelas Câmaras Cíveis Reunidas do TJ-MT (RI/TJMT 17, II c/c 8) no próximo dia 02/5/02 ou no dia 06/6/02. Isto porque no TJ-MT tais Câmaras Julgadoras só se reúnem na primeira quinta-feira de cada mês.

A Liminar que obtivemos no MS 2.607 suspendendo o andamento da Concordata da empresa FRBG, atinge tão somente atos processuais, razão pela qual o prazo para habilitações de créditos, impugnação de valores etc, estão suspensos até o julgamento do Mandado de Segurança pelo TJ-MT.

Todavia a empresa concordatária (FRBG) continuou com a administração normal, não obstante a indisponibilidade de seus bens que continua em vigor, e o prazo para o depósito da primeira parcela de 40% do débito por ela declarado, vencerá dia 15-10-2002 (não está suspenso), segundo o comando do art. 175 da LF que norma o seguinte: “O prazo para o cumprimento da concordata inicia-se na data do ingresso do pedido em juízo”, isto é, 15-10-2001, e não de eventual despacho; o só fato da distribuição do pedido impulsiona a fluência do prazo para seu cumprimento.

Outro ponto importante a ser lembrado é que a mudança da sua sede estatutária para Cuiabá entre dez/01-jan/02 e o fechamento das atividades negociais em São Paulo, em nada afeta o julgamento do MS 2.607 ou a questão da competência que está sendo discutida, porque o art. 87 do CPC estabelece o princípio da perpetuatio iurisdicionis, segundo o qual, “determina-se a competência no momento em que a ação é proposta. São irrelevantes as modificações do estado de fato e de direito ocorridas posteriormente”. A ação (Concordata) foi proposta dia 15-10-2001; a primeira parcela (40%) vencerá dia 15-10-2002, sob pena de ser decretada a falência.

Voltando agora à questão da Global, como nós, os responsáveis pela empresa FRBG sabem perfeitamente que estão falidos contabilmente, financeiramente e juridicamente; é uma situação irreversível, ainda que não se entenda como isto possa ter ocorrido num negócio rentável e em franca expansão (Gado); os argumentos fornecidos pela FRBG até agora não convenceram.

A CVM atenta e cumprindo sua função de assegurar ao público o devido “acesso dos investidores à adequada informação sobre as companhias emissoras de valores mobiliários, de maneira que possam, inclusive à luz dessa informação, tomar suas decisões de investimento,” já havia suspendido em março de 2001 a distribuição irregular de ações pelas FRBG (www.cvm.gov.br).

Persistindo as FRBG na prática de irregularidades, em final de 2001 foi instaurado pela CVM o Inquérito Administrativo CVM nº RJ2001/6094, para apurar as irregularidades que vinham sendo praticadas pela empresa, culminando com a sua condenação e aplicação da multa de R$ 28.186.328,07 ao diretor-presidente Paulo Roberto de Andrade e a de R$ 1.409.316,40 a cada um dos diretores da FRBG, Klécius Antônio dos Santos e Antônio Carlos de Andrade.

Surgiram as Globais Do Brasil, espalhadas pelos diversos cantos do país alegando que tinham “o objetivo de evitar a falência da FRBGSA e criar mecanismos que permitam a cada sócio receber a totalidade de seus créditos”, como sonho de criança, indicando como caminho para viabilizar esta operação, a necessidade de “reunir o maior número possível de investidores dispostos a converter os Certificados de Investimentos (CICs) em ações da Global Brasil”.

Foram chamadas de Holding para administrar uma firma falida, sem que tivessem recursos, meios e condições legais de atender aos objetivos. Surgiu até mesmo uma Global propondo trocar os créditos dos investidores por “esmeraldas semi-lapidadas”, não obstante a TV Globo tivesse dias antes levado ao ar, no Jornal Nacional, denúncia de derrame de “esmeraldas” no mercado, com Certificado Falso de garantia. Tudo mediante cobrança ou pagamento de taxas, tanto no caso das GLOBAIS, como das “Esmeraldas”… O credor perde o seu crédito e ainda paga, aumentando seu prejuízo…

Acreditamos que esta história de Global pretendendo conseguir dois terços dos créditos, tenha muito a ver com o disposto no parágrafo 1º, do art. 123, da Lei de Falência, pelo qual “ditos credores podem organizar sociedade para continuação do negócio do falido, ou autorizar o síndico a ceder o ativo a terceiros”.

É uma maneira sutil, ao que tudo leva a crer, dos diretores da FRBG, estando por trás das Globais, poderem continuar com o controle do negócio da Boi Gordo depois de falida, fato que julgamos muito remoto, porque não acreditamos que ela consiga dois terço dos créditos.

Lançando a campo numa campanha forte para atingir seu objetivo, esqueceu a Global que há leis a serem respeitadas no pais e a CVM, considerando “que a empresa GLOBAL BRASIL PARTICIPAÇÕES S.A. por meio de propagando veiculada em seu endereço eletrônico na INTERNET (www.globalbrasil.com) e folhetos impressos procura investidores, detentores de créditos junto à empresa FRBRSA, inclusive proprietários de CICs, ofertando ações de sua emissão, mediante integralização com tais créditos e valores mobiliários” através da Deliberação CVM nº 428, de 10/04/2002 suspendeu a distribuição pública de ações de emissão da GLOBAL BRASIL PARTICIPAÇÕES, que ficou proibida de colocar publicamente ações sob a cominação de multa diária de R$ 5.000,00.

Simultaneamente a CVM alertou “os participantes do mercado de valores mobiliários, em especial os detentores de créditos ou de contratos de investimentos coletivo “CICs” de emissão das FRBGSA sobre a suspensão da distribuição de ações pela GLOBAL.

A Global vinha agindo irregularmente, por não ter feito o registro prévio na CVM, nos termos do artigo 19, parágrafo 3º, da Lei nº 6.385 de 7/12/1976, mesmo porque nos termos do art. 4º, parágrafo 1º, da Lei nº 6.404, de 15-12-1976, somente os valores mobiliários emitidos por companhias registradas na CVM podem ser negociados no mercado de valores mobiliários.

Concluímos que a troca de CICs emitidos pela FRBG por ações da Global é um negócio irregular, sem segurança alguma, tirando do investidor a possibilidade de um dia ainda poder receber uma parcela de seu crédito, dependendo do trabalho a ser desenvolvido pelos advogados que irão rastrear fraudes à cata de bens, inclusive os particulares dos sócios da FRBG, para, mediante a desconsideração da personalidade jurídica, poderem arrecadar o maior volume de bens e dinheiro (no País e no exterior), que deverão ser vendidos para com o produto pagar um percentual dos créditos dos investidores, já que é sabido que os ativos das FRBG jamais servirão para pagamento total dos investimentos que foram feitos nas FRBG pelas pessoas que hoje se sentem duramente lesadas.

Deliberação CVM no 428, de 10 de abril de 2002

Suspensão de distribuição de ações no mercado de valores mobiliários, sem o registro de distribuição pública na CVM

O Presidente da Comissão de Valores Mobiliários – CVM torna público que o Colegiado, em reunião realizada nesta data, com fundamento nos arts. 9º, parágrafo 1o, inciso IV, e 20, inciso II, da Lei no 6.385, de 7 de dezembro de 1976;

Considerando

– que a empresa Global Brasil Participações S.A., por meio de propaganda veiculada em seu endereço eletrônico na Internet (www.globalbrasil.com) e folhetos impressos, procura investidores, detentores de créditos junto à empresa Fazendas Reunidas Boi Gordo S.A., inclusive proprietários de Contratos de Investimento Coletivo (CIC), ofertando ações de sua emissão, mediante integralização com tais créditos e valores mobiliários;

– que a utilização de anúncios e folhetos destinados ao público, ofertando valores mobiliários, caracteriza-se como emissão pública, sendo necessário, para sua distribuição, o prévio registro na CVM, nos termos do artigo 19, parágrafo 3o da Lei no 6.385 de 7 de dezembro de 1976;

– que nos termos do artigo 4o, parágrafo 1o, da Lei no 6.404 de 15 de dezembro de 1976, somente os valores mobiliários emitidos por companhias registradas na CVM podem ser negociados no mercado de valores mobiliários;

– que a Global Brasil Participações S.A. não apresentou a esta CVM, até o momento, o pedido de registro de emissão pública e o pedido de registro de companhia aberta;

Deliberou:

I – suspender a distribuição pública de ações de emissão da Global Brasil Participações S.A. (CNPJ 04.818.598/0001-81) no mercado de valores mobiliários;

II – alertar os participantes do mercado de valores mobiliários, em especial os detentores de créditos ou de contratos de investimento coletivo “CICs” de emissão da Fazendas Reunidas Boi Gordo S.A. sobre a suspensão de que trata o item I acima;

III – determinar à Global Brasil Participações S.A. que se abstenha de colocar publicamente as ações, alertando que a não observância da presente determinação sujeitará a infratora à aplicação de multa cominatória diária no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), nos termos do parágrafo 11 do art. 11 da Lei no 6.385/76, sem prejuízo da responsabilidade por eventuais infrações já cometidas e conseqüente imposição das penalidades cabíveis; e

IV – que esta Deliberação entra em vigor na data de sua publicação no Diário Oficial da União.

Original assinado por

Marcelo Fernandez Trindade

Presidente em exercício

Revista Consultor Jurídico 22 de abril de 2002.

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