Enunciado 363

TST reedita Enunciado 363 e perde oportunidade de corrigir injustiça

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21 de abril de 2002, 0h02

Ao reeditar o Enunciado 363, o Tribunal Superior do Trabalho perdeu excepcional oportunidade de corrigir uma distorção no entendimento pacificado de só assegurar ao trabalhador admitido para trabalho ao Poder Público, sem o requisito concurso público, apenas o direito de receber o salário “seco” dos dias trabalhados, declarando-se o contrato nulo, sem quaisquer outros efeitos.

Essa conclusão da mais alta Corte da Justiça Trabalhista do País pune apenas o trabalhador, a parte mais fraca da relação de trabalho.

Não pune os desmandos do mal administrador público, que descumpre a lei e contraria as garantias constitucionais protetivas do trabalho humano.

O entendimento adotado pelo TST contraria também os princípios vigentes em nosso ordenamento jurídico, dentre eles, o que produz apenas efeito ex nunc, ou seja, não atinge o direito já antes consumado (nunca para trás e sim somente para frente, e não desde o início do contrato), tal como previsto no art. 158 do CCB: “Anulado o ato, restituir-se-ão as partes ao estado, em que antes dele se achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente”.

Ao magistrado cabe examinar o fato que lhe chega às mãos, utilizando-se da idéia de unidade da ordem jurídica como um todo que se irradia a partir da Constituição e não somente de textos isolados, v.g, como ocorre, com o exame do art. 37, II e § 2º da CF.

É de entendimento pacificado que da simples literalidade de um dispositivo, não há de se encerrar a interpretação da Lei Maior, devendo, pois, examinar-se a unidade da legislação vigente, para que a legislação vigente se mantenha hígida e harmônica, como ensina Luiz Roberto Barroso: “uma disposição constitucional não pode ser considerada de forma isolada nem pode ser interpretada exclusivamente a partir de si mesma. Ela está em uma conexão de sentido com os demais preceitos da Constituição, a qual representa uma unidade interna”. (autor citado, in “Interpretação e aplicação da Constituição”, Editora Saraiva, 1996, pág. 182).

O entendimento em comento contraria também o próprio princípio que repudia o enriquecimento sem causa, não tutelado pelo nosso ordenamento jurídico pátrio (v. g, como se vê do disposto nos artigos 82 (licitude do objeto), 159 e 964 do Cód. Civ. Bras, princípio este assegurado até constitucionalmente, como já decidiu o STF: “O alcance respectivo há de ser perquirido considerada a garantia constitucional implícita, vedadora do enriquecimento sem causa. (STF – AG 182.458-1 (AgRg) – 2ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio – DJU 16.05.1997).

Pelo entendimento anterior, agora modificado, sequer o salário em seu sentido mais amplo como disciplinado pela CLT era assegurado ao trabalhador, desrespeitando-se a garantia constitucional que o tutela: “proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa” (CF, inciso X, art. 7º), desrespeitando-se a própria legislação vigente definidora do que venha a ser salário: “Além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário, para todos os efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações in natura que a empresa, por força do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao empregado. Em caso algum será permitido o pagamento com bebidas alcoólicas ou drogas nocivas” (CLT, art. 458).

Dentro dessa visão, sustentando a necessidade de assegurar-se ao trabalhador uma completa indenização de todos os créditos alimentares, como se válido tivesse sido o contrato, diversos juristas de escol já se manifestaram visando sensibilizar os Ministros do TST à urgente, justa e necessária providência de revisão do En. 363.

E, dentre eles, citamos o Prof. José Affonso Dallegrave Neto, autor de diversas obras jurídicas publicadas pela LTR, que assim se posicionou sobre o assunto: “É cediço e universal, desde o direito romano antigo, o princípio da Restitutio in integrum: “a indenização se dá na medida do prejuízo”.

O direito positivo pátrio contempla tal enunciado em vários dispositivos [52]. Da mesma forma, a doutrina alienígena já pacificou entendimento de que o contrato de trabalho, por ser de trato sucessivo, encerra nulidade irretroativa como regra, salvo os casos de objeto ilícito [53].

O artigo 158 do Código Civil em vigor é claro ao dispor: “anulado o ato, restituir-se-ão as partes ao estado, em que antes dele se achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente”.

Com base nessas premissas dogmáticas é equivocada, ilegal e iníqua a Súmula 363 do TST, quando declara que a indenização referente ao contrato nulo – por inobservância do art. 37, II, CF/88 – equivale tão-somente “aos dias trabalhados e pelo valor do salário ajustado”. Ora, a indenização deve alcançar todo o prejuízo: férias, 13o. salário, FGTS, tudo em conformidade com o salário devido e não apenas pelo salário ajustado.


Dizer que a indenização equivale somente “aos dias trabalhados e pelo valor do salário ajustado” é o mesmo que nada deferir, premiando o órgão da administração pública que utilizou mão-de-obra qualificada sem qualquer encargo trabalhista. Esse verbete precisa ser revisto com urgência a fim de reparar esta injusta e deformada fattispecie.

A efetividade dos direitos trabalhistas, incluindo-se a indenização equivalente a todo prejuízo, não pode ser relegada a critério aleatório e infundado, sobretudo quando lesivo ao regramento basilar das nulidades e da responsabilidade civil”. (LTR, 65-04/397/398, JOSÉ AFFONSO DALLEGRAVE NETO, Análise de Conjuntura socioeconômica e o Impacto no Direito do Trabalho).

O TST pela Resolução nº 111/2002 publicada no Diário da Justiça de 11/4/02 reedita o novo En. 363, com a seguinte redação:

“Contrato nulo. Efeitos – Redação dada pela Res. 111/2002- DJ 11.04.2002. A contratação de servidor público, após a Constituição de 1988, sem prévia aprovação em concurso público, encontra óbice no seu art. 37, II, e § 2º, somente conferindo-lhe direito ao pagamento da contraprestação pactuada, em relação ao número de horas trabalhadas, respeitado o salário-mínimo/hora”.

Confrontando-se os dois Enunciados, o de redação anterior com o de redação nova e ampliada, vemos que o texto novo assegura: “direito ao pagamento da contraprestação pactuada” (separado da frase seguinte, vírgula, uma oração completa, portanto, que basta por si própria).

A frase seguinte, trata-se, em nosso entender, de mero apêndice e que não interfere no sentido do texto e nem muda o sentido da frase anterior já completa, ou seja, a de conferir direito ao pagamento da contraprestação pactuada (todos os créditos que se convencionou), tais como as habituais férias, acrescidas de 1/3, 13º salário, FGTS, aviso prévio, etc, que costumeiramente aparecem os recibos de pagamentos mensais.

A frase última utilizada na nova redação do E. reeditado (em relação ao número de horas trabalhadas), entendemos estar ela de acordo com a garantia assegurada pelo art. 7º, inciso XIII da CF, ou seja, que a partir de 1.988, a jornada máxima de trabalho de qualquer trabalhador não pode ser superior a oito horas, sendo as excedentes pagas como horas extras, com o adicional mínimo de 50% (CF, art. 7º, inciso XVI), sendo que a frase final (em relação ao número de horas trabalhadas), por óbvio não permite pagamento em valor inferior ao salário mínimo legal previsto pela Medida Provisória n. 35, de 27.03.2002 – DOU de 28.03.2002 (Código ID: 24135), caso o trabalho tenha sido efetivado após 30 de março de 2002.

Portanto, se dentro da contratação, tida como irregular (inexistência do requisito concurso exigido pelo Art. 37, inciso II da CF), e em havendo reconhecimento de direitos celetistas, tais como o de férias, acrescidas de 1/3, 13º salário, depósitos de FGTS, etc.

Em nosso entender concluímos portanto que a nova redação então utilizada é mais ampla e abrangente que a adotada anteriormente no En. 363 que agora foi renovado, possibilitando desde logo assegurar-se todos os trabalhadores admitidos irregularmente sem concurso público os mesmos créditos trabalhistas alimentares, como se válido tivesse sido o contato.

E por que não? O próprio governo federal, reconhecendo a impossibilidade de repor as energias já exauridas nos serviços já prestados numa contratação irregular, sem concurso público, através de MP nº 2.164-41, já passou a reconhecer direito eminentemente trabalhista – o FGTS: “Art. 19-A. É devido o depósito do FGTS na conta vinculada do trabalhador cujo contrato de trabalho seja declarado nulo nas hipóteses previstas no art. 37, § 2º, da Constituição Federal, quando mantido o direito ao salário. Parágrafo único. O saldo existente em conta vinculada, oriundo de contrato declarado nulo até 28 de julho de 2001, nas condições do caput, que não tenha sido levantado até essa data, será liberado ao trabalhador a partir do mês de agosto de 2002. (NR) (Artigo acrescentado pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 24.08.2001, DOU 27.08.2001, em vigor conforme o art. 2º da EC nº 32/2001)”

E porque se aplicar entendimento restritivo que não veda na prática o enriquecimento sem causa? E porque não se assegurar o direito ao recebimento de todos os créditos trabalhistas alimentares tutelados na legislação vigente no País?

Não obstante esta nossa compreensão do texto novo reeditado, o mesmo entendimento não foi compartilhado pelo nobre e culto Ministro João Oreste Dalazém – um dos mais ilustres integrantes do TST – que esteve no último final de semana em Curitiba, participando de seminário realizado pela www.internet-lex.com.br.

Ao ser questionado sobre as razões da reedição do En. 363, esclareceu-nos que a intenção do TST neste momento foi ainda o de apenas corrigir a distorção pertinente ao equívoco da redação anterior que permitia a indenização do trabalhador apenas do salário dos dias efetivamente trabalhados e com base no salário contratado, não se respeitando no entendimento anterior sequer a observância necessária à garantia do salário mínimo legal previsto em lei.


Segundo o Ministro apontado o objetivo da reedição foi o de reconhecer o direito à indenização somente das horas trabalhadas, com base no salário contratado e que não pode ser inferior ao mínimo legal.

Necessário esclarecer que antes da entrada em vigência da Constituição de 1988 era normal a regular contratação celetista, sem concurso público.

O constituinte de 1988, visando moralizar o acesso aos empregos públicos, passou a exigir o concurso público obrigatório na administração direta e indireta das três esferas de governo: a federal, a estadual e a municipal.

A exigência passou a valer também no âmbito dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, a teor do que se verifica do exame do inciso II do art. 37 da Constituição Federal de 1.988, assim dispondo: “a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração”.

Com a CF/88, a única exceção autorizada para a admissão sem concurso público é para os casos necessários ao atendimento das necessidades temporárias e excepcionais de interesse público, nos precisos termos autorizados pelo inciso IX do mesmo art. 37 citado: “A lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público”.

Apesar disso, as contratações irregulares de trabalhadores para a administração direta e indireta continuavam ao arrepio da lei, principalmente, nos períodos pré-eleitorais em que os administradores públicos faziam contratações numerosas.

Para isso, sobrecarregavam e oneravam os orçamentos-financeiros, já insuficientes ao atendimento das necessidades básicas do bem-comum, anomalia esta que passou a ser conhecida como “trem da alegria”.

Imbuído de espírito moralizador, o Tribunal Superior do Trabalho editou o E. 363 acima já referido, declarando nulo o contrato, se a contratação de servidor público, após a Constituição Federal de 1988 não teve a observância do requisito concurso público, com óbice no seu art. 37, II, e § 2º, fato este que autorizou o entendimento de só conferir ao trabalhador o direito ao pagamento dos dias efetivamente trabalhados segundo a contraprestação pactuada.

Apesar dos reconhecidos méritos que se pretendeu emprestar ao entendimento sedimentado no E. 363, não se alcançou o resultado esperado, tendo ocasionado, ao contrário do que se esperava, dois efeitos dos mais nefastos e deletérios:

a)- as contratações irregulares, sem concurso público, não cessaram, mas, na verdade, sim, aumentaram, diante do sentimento de impunidade que se alastrou, diante inexistência de uma legislação, já que as normas punitivas previstas no mesmo art. 37, §§ 2º e 4º da CF, que faz alusão à suspensão dos direitos políticos, perda da função pública, indisponibilidade dos bens e ressarcimento ao erário, se tratavam de normas de eficácia contida, dependente da aprovação de norma infraconstitucional específica, definidora e tipificadora da conduta ilícita e estabelecimento da sanção aplicável, à punição de tais desmandos.

b)- a possibilidade de a administração pública vir a juízo, em defesa, argüir a nulidade da contratação, por inobservância do requisito concurso público exigido pelo inciso II do art. 37 da CF, favorecendo-se o enriquecimento ilícito, utilizando-se em benefício próprio a torpeza que ela própria praticou, em prejuízo do obreiro, que já tendo concluído os serviços, não mais tinha possibilidade de repor as energias já exauridas, consumidas.

Com o entendimento então adotado pela redação emprestada ao antigo E. 363, os Tribunais passaram a acatar as argüições da defesa da administração pública da irregularidade da contratação sem concurso público, com violação do inciso II do art. 37 da CF, julgando nulo o contrato, sem quaisquer efeitos, a não ser o direito ao recebimento do salário dos dias trabalhados e com base nos salários ajustados, mesmo que inferiores ao salário mínimo previsto em lei.

Ao não reconhecer a integralidade dos créditos trabalhistas tutelares e alimentares, violava-se, por via oblíqua, as demais garantias legais e constitucionais protetivas do trabalho humano que tem prioridade sobre o capital como se extrai do exame do texto constitucional: “a propriedade atenderá sua função social”. (art. 5º, inciso XXIII); “a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I- soberania nacional; III)- função social da propriedade; V) defesa do consumidor; VI)- defesa do meio ambiente; VII)- redução das desigualdades regionais e sociais; VIII)- a busca do pleno emprego (art.170).


Por isso, os advogados trabalhistas defensores dos obreiros prejudicados tiveram que reagir, passando a sustentar a ilegitimidade da administração pública em utilizar-se, em suas defesas, da argüição de nulidade do contrato, eis que isso implica em obtenção de finalidade ilícita – o benefício da própria torpeza, além de contrariar o princípio legal que não tutela o enriquecimento ilícito, sendo que tal ato não encontra guarida na lei, eis que a própria CF, no mesmo art. 37, § 6º protege o terceiro contra lesões praticadas por seus agentes, ao dispor que: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado, prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros (…)”.

A doutrina sobre essa garantia constitucional assim, tem se manifestado, através de seus doutrinadores máximos, como se extrai da lição do Grande Mestre HELY LOPES MEIRELLES, ao afirmar que o Estado tem responsabilidade indenizatória patrimonial e não mera responsabilidade civil (decorrente do conceito de culpabilidade, enquanto que a responsabilidade patrimonial não importa examinar a questão da culpa por decorrer do simples dano causado ao patrimônio, ou seja, o que interessa ao ato é o ressarcimento do dano causado.

No mesmo sentido, o festejado constitucionalista pátrio, Prof. CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, concluindo tratar-se de responsabilidade objetiva do Estado o dispositivo em comento, ensina:

“Com efeito, se o ato administrativo era inválido, isto significa que a administração, ao praticá-lo, feriu a ordem jurídica. Assim, ao invalidar o ato estará, ipso facto, proclamando que fora autora de uma violação da ordem jurídica. Seria inícuo que o agente violador do direito, confessando se tal se livrasse de quaisquer ônus que decorreram do ato e lançasse sobre costas alheias todas as conseqüências patrimoniais gravosas que daí decorreriam, locupletando-se, ainda, a custa de quem, não tendo concorrido para o vício, haja procedido de boa-fé”.(“in Curso de Direito Administrativo”, p. 239, 4ª ed).

Por seu lado, também, a jurisprudência de nossos Pretórios Trabalhistas, com base no disposto pelo mesmo art. 37, § 6º, assim vinham decidindo a questão dos contratos irregulares, sem concurso público, não tutelando o enriquecimento ilícito:

“Contratação de Servidor Municipal após a Constituição de 1988 sem Concurso Público – Responsabilidade Pessoal do Prefeito Responsável pela Irregularidade, no Âmbito Trabalhista – Havendo a contratação do reclamante sem prévia aprovação em concurso público, pelo entendimento majoritário da Eg. Turma Julgadora, produzindo todos os efeitos de uma relação de emprego válida e regular até a data de sua extinção, com a conseqüente condenação do Município contratante ao pagamento das correspondentes verbas trabalhistas, deve o ex-Prefeito Municipal que também foi demandado responder por aquelas obrigações com seu patrimônio pessoal e de forma solidária. Tal responsabilidade decorre da própria Constituição (artigo 37, parágrafos 2º, 4º e 6º) e da Lei (artigo 1º, XIII, do Decreto-lei nº 201/67 c/c os artigos 159 e 1.518 do Código Civil). Por outro lado, a circunstância de o reclamante não ter sido empregado direto daquele agente público não afasta a competência da Justiça do Trabalho para julgar, em toda a sua extensão necessária, as lides decorrentes das relações de emprego (artigo 114 da CF/88). Não é por outro motivo, aliás, que o item IV do Enunciado nº 331/TST corretamente consagrou o entendimento de que o tomador de serviços responde, subsidiariamente e de forma objetiva, pelo inadimplemento das obrigações trabalhistas pelo empregador direto dos obreiros que atuarem em seu benefício, bastando que tenha participado da relação processual”. (TRT 3ª R. – RO 17.062/94 – 3ª T. – Rel. Juiz José Roberto Freire Pimenta – DJMG 07.11.95).

“Cargo público. Relação de emprego. É indiscutível que a investidura em cargo público depende de prévia aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos (art. 37 da CF/88), ressalvados os cargos em comissão. A regra destina-se ao Poder Público e, uma vez desobedecido o comando do referido artigo, o administrador deverá arcar com todos os ônus de seu ato. Do contrário estar-se-ia admitindo os enriquecimentos ilícitos da Administração, que se utilizou os serviços de alguém sem despender da correspondente retribuição; logo, o ato irregular de admissão do trabalhador gera direitos, cabendo ao Estado responsabilizar o administrador pelos encargos pecuniários “.(TRT-3a.Reg. RO-14288/93, Relatora Juíza Alice Monteiro de Barros , in DJMG II, 15.06.95, pág. 77).

“ADMISSÃO ILEGAL NO SERVIÇO PÚBLICO. AUSÊNCIA DE CONCURSO. REQUISITO PREVISTO NO ART. 37, INCISO II, DA CF. NULIDADE DO ATO FRENTE À PREVISÃO DO § 2º DO MESMO ARTIGO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ÓRGÃO PÚBLICO E DA AUTORIDADE QUE PRATICOU OU AUTORIZOU A PRÁTICA DO ATO. SERVIDOR INVESTIDO DE BOA-FÉ. INTELIGÊNCIA E RAZOABILIDADE DAS REGRAS DE DIREITO. A admissão de trabalhadores pelos órgãos públicos com vulneração do art. 37, inciso II, da CF, por força do § 2º do mesmo art. importa nulidade do ato contratual ou administrativo, com responsabilidade da autoridade que praticou o ilícito constitucional, cujos ônus serão assumidos pelo poder público frente à sua responsabilidade adjetiva. A conduta ilegal do administrador público ou da autoridade praticante do ato nulificado, não pode ser interpretada em benefício do órgão público com isenção dos ônus e deveres contratuais e legais e em prejuízo de quem presuntivamente agiu de boa-fé no desenvolvimento do trabalho, insuscetível de restituição do “status quo ante”, sob pena de o infrator onerado com a responsabilidade objetiva obter proveito da nulidade que, conscientemente, deu causa, extraindo benefícios de sua própria torpeza”. (TRT/SC/RO-4-V-0421/94, AC. 1ª T, 06894/95, publicado no DJ-SC EM 21.09.95).

É que com a promulgação da Carta Política de 1.988, o contrato de trabalho adquiriu status constitucional e novos contornos, subordinando-se a propriedade ao atendimento de sua função social (art. 5º, inciso XXIII), em razão dos fundamentos então estabelecidos no sentido de que a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tenha por finalidade assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I- soberania nacional; III)- função social da propriedade; V) defesa do consumidor; VI)- defesa do meio ambiente; VII)- redução das desigualdades regionais e sociais; VIII)- a busca do pleno emprego, tudo isso visando a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, ficando assegurado a todo cidadão, o direito à cidadania, ao trabalho, ao salário.

Como decorrência desses postulados constitucionais, tem, o trabalhador direito ao ressarcimento pelos frutos de seu labor já prestados, observando-se sempre o equilíbrio, a justeza, o direito à igualdade (art. 5º caput), sem a prática de qualquer discriminação (art. 7º, inciso XXX) e sem contrariar a legislação vigente também aplicável à hipótese prevista no art. 158 do CCB, que assim dispõe: “Anulado o ato, restituir-se-ão as partes ao estado, em que antes dele se achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente”.

CONCLUSÃO

O Tribunal Superior do Trabalho ao reeditar o Enunciado 363 perdeu excepcional oportunidade de corrigir distorção existente no entendimento pacificado de assegurar ao trabalhador admitido para trabalho ao Poder Público, sem o requisito concurso público, apenas, única e exclusivamente, o direito ao pagamento da contraprestação pactuada, em relação ao número de horas trabalhadas, respeitado o salário-mínimo/hora e não o direito ao recebimento de a uma indenização compatível com os créditos alimentares tutelados, como se válido tivesse sido o contrato ajustado, não permitindo com isso guarida ao enriquecimento sem causa, num entendimento mais equilibrado e consentâneo com a realidade vivida pelo atual estágio de nosso desenvolvimento econômico e social, guardando simetria com a unicidade contratual e infraconstitucional, que a par da exigência formal do requisito concurso público, assegura o direitos amplos de acesso ao trabalho, garantia do salário e do exercício do direito pleno à cidadania, de respeito à dignidade à pessoa humana.

Revista Consultor Jurídico, 21 de abril de 2002.

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