Na mira

Oficial de Justiça diz que não há como provar origem de depósitos

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2 de abril de 2002, 11h06

O presidente da Associação Beneficente dos Oficiais de Justiça do Estado (Abojeris), Paulino Luiz da Silva, disse que a maioria dos oficiais estaduais não tem controle sobre a movimentação de dinheiro em suas contas bancárias.

A declaração de Paulino foi uma resposta ao promotor Mauro Rockenbach, autor de denúncia contra 315 servidores por suposto recebimento de propina para acelerar o cumprimento de mandados judiciais.

Rockenbach apurou que cerca de 8 mil cheques de R$ 50 a R$ 600 entraram nas contas dos oficiais após cumprimento do mandado de busca e apreensão de veículos cujos donos estavam em débito com agentes financeiros e de arrendamento.

O pagamento das gratificações teria sido feito pelo escritório M.L. Gomes Advogados Associados, com matriz em São Paulo, que divulgou nota “lamentando o envolvimento de seu nome em processo sigiloso”. (Leia a nota divulgada).

O presidente da Abojeris argumentou que, por determinação judicial, os oficiais recebem depósitos diários em suas contas bancárias a título de ajuda de transporte. Por isso, segundo Paulino, torna-se difícil provar a origem de créditos correspondentes a cerca de 600 mandados de busca e apreensão de veículos ao longo dos últimos quatro anos, período que compreende a investigação do Ministério Público Estadual.

O artigo 484 do Provimento 25/93 da Corregedoria-geral da Justiça determina que as despesas de condução sejam antecipadas e depositadas em contas bancárias em nome dos oficiais. Isso ocorre em 152 das 160 comarcas do Estado.

– O dinheiro entra nas contas nas quais o servidor recebe o salário. Elas são abertas para os depósitos do auxílio-condução, conforme previsto em lei desde 1993. E há colegas que têm conta conjunta com familiares. A conta serve para tudo – argumentou Paulino.

O oficial de Justiça lamentou que a categoria tenha dificuldades para provar a origem do dinheiro e considerou a divulgação das investigações um “ato criminoso”.

– O promotor agiu de má-fé. Nós o desafiamos a provar um caso em que foi dada prioridade a um mandado de apreensão de veículo, deixando para trás uma busca de adolescente ou uma internação de doente por ordem judicial. O promotor foi sensacionalista na ânsia de buscar promoção na mídia – reclamou.

O presidente da Abojeris se mostrou surpreso ao saber que seu nome figura na lista de suspeitos.

– Estou perplexo em saber como isso chegou ao conhecimento da imprensa se ainda não tomei conhecimento da denúncia. Vou preparar minha defesa – afirmou.

Segundo o MP, o caso seria mantido em sigilo, pois menos da metade dos investigados foi denunciada. A divulgação foi antecipada para a Sexta-feira Santa devido ao vazamento da informação em São Paulo, onde promotores deram entrevistas sobre o caso.

Rockenbach diz ter provas para levar os envolvidos a julgamento. Quanto às críticas, respondeu: – Ele não gostou da divulgação por interesse próprio. Ao acusado compete bajular o julgador e desmoralizar que o acusa.

O corregedor-geral da Justiça, desembargador Marcelo Bandeira Pereira, afirmou não haver meios de controlar os depósitos nas contas dos oficiais. Segundo Pereira, o Tribunal de Justiça do Estado acompanha as investigações do MP desde o seu início e, caso confirmadas as denúncias, os oficiais de Justiça podem ser demitidos. (Veja notícia)

Segundo o Ministério Público do Estado, que denunciou 315 oficiais de Justiça, o esquema funciona assim:

* A pessoa compra um carro financiado e não paga

* A instituição financeira à qual pertence o veículo (montadoras) ou pela qual foi feito o financiamento (bancos) contrata os serviços do escritório denunciado para a cobrança

* Quando não há acordo, o escritório ingressa com ação judicial de cobrança para a apreensão do veículo

* Após ser expedido o mandado de busca e apreensão do carro, um funcionário do escritório faz contato com o oficial de Justiça responsável por cumprir o mandado e acerta a gratificação

* Com o pagamento, os oficiais de Justiça dão prioridade à apreensão dos veículos em relação a outros mandados

* Conforme as investigações do MP, as gratificações variavam de R$ 50 a R$ 600. Alguns oficiais de Justiça teriam recebido gratificações mais de uma vez

* A investigação apurou que 568 oficiais de Justiça gaúchos receberam gratificações. Isso representa 56% do quadro de oficiais de Justiça do Estado, que é de 1.012 servidores

* Trezentos e quinze oficiais de Justiça, que receberam em suas contas depósitos com cheques nominais do escritório, prestaram depoimento e foram denunciados pelo MP. Eles responderão por corrupção passiva. Alguns também foram enquadrados em formação de quadrilha

* Os demais seguem sendo investigados. O MP apurou que eles receberam a propina em contas de terceiros

* Na quinta-feira, a Promotoria Especializada Criminal distribuiu à Justiça 10 denúncias das 315. Foi apurado o envolvimento de oficiais de Justiça de 112 comarcas do Estado.

Fonte: Zero Hora

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