Combate à morosidade

Presidente da Ajufe defende implantação de Juizados Especiais

Autor

  • Flávio Dino de Castro e Costa

    é juiz federal ex-presidente e diretor da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) membro da Comissão Especial de Combate ao Trabalho Forçado (CDDPH/MJ) e mestre em Direito Público.

25 de setembro de 2001, 17h10

1- A crise de desempenho do Judiciário

Adotaremos como premissa do presente estudo uma constatação que nos parece claramente consensual: há uma crise de desempenho no aparelho jurisdicional brasileiro espelhada na morosidade e no número crescente de processos em estoque, aguardando apreciação.

A morosidade é, sem dúvida, o principal fato gerador de insatisfação com o serviço judiciário, como revelam todas as pesquisas realizadas sobre o assunto. Em 1993, em pesquisa de opinião coordenada pelo IBOPE, foi proposta a seguinte afirmação: “O problema do Brasil não está nas leis, mas na Justiça, que é muito lenta”. Dos entrevistados, 87% consignaram suas concordâncias, 8% discordaram e 5% não souberam responder. Já em 1999, o jornal “O Estado de São Paulo”(1) chegou a índices ainda mais elevados: 92% consideraram a Justiça muito lenta.

Paradoxalmente, as estatísticas dos diversos ramos do Poder Judiciário demonstram um crescente aumento do número de decisões proferidas(2), como se lê a seguir:

Quadro 01 – Número de Sentenças Proferidas na Justiça de 1ª Instância (1995-1999)

Justiça Ano
1995
Ano
1996
Ano
1997
Ano
1998
Ano
1999
Jul
G
Jul
G
Jul
G
Jul
G
Jul
G
Comum 2.970.509 4.106.962 5.472.489 5.180.066 5.695.184
Federal 345.606 377.562 413.272 494.493 552.990
Trabalho 1.702.931 1.863.003 1.922.367 1.904.062 1.918.960
Total
Nacional
5.019.046 6.347.527 7.808.128 7.578.621 8.167.134

Fonte: STF

Se analisarmos em separado os dados referentes à Justiça Federal de primeira instância e aos Tribunais Regionais Federais, os números ficam ainda mais eloqüentes:

Quadro 02 – Processos Distribuídos e Julgados na Justiça Federal de 1º e 2º Graus

Ano Justiça
Federal de 1º Grau
Justiça
Federal de 2º Grau
Total
Distribuídos Julgados Distribuídos Julgados Distribuídos Julgados
1989 234.301 129.896 96.021 22.765 330.322 152.661
1990 266.585 172.068 122.017 89.335 388.602 261.403
1991 724.129 271.740 114.678 85.356 838.807 357.096
1992 554.382 422.981 194.655 124.609 749.037 547.590
1993 535.438 328.733 256.895 162.670 792.333 491.403
1994 528.172 410.013 266.051 188.411 794.223 598.424
1995 641.450 345.606 285.749 196.171 927.199 541.777
1996 680.776 377.562 293.956 202.428 974.732 579.990
1997 901.489 413.272 316.899 213.253 1.218.388 626.525
1998 838.643 494.493 357.280 253.107 1.195.923 747.600
1999 1.079.158 552.990 548.826 327.702 1.627.984 880.692


Fonte: Conselho da Justiça Federal/Secretaria de Orçamento e Finanças

Igualmente, os gastos com o Judiciário na União e nos Estados não param de crescer(3). Estudo elaborado por técnicos do BNDES(4) demonstra que – no período de 1988 a 1999 – os custos com a função judiciária aumentaram anualmente à razão de 14,8% na esfera da União e 8,6% nos Estados. Frisamos que, consoante os critérios adotados na pesquisa, tais dados incluem as chamadas “funções essenciais à Justiça” (que integram o Poder Executivo) (5), mas excluem as folhas de pagamento com inativos e os precatórios. Mesmo assim, é evidente que eles fornecem indícios expressivos do que aconteceu nos orçamentos específicos dos Tribunais.

Novamente isolando a situação da Justiça Federal, temos os seguintes dados(6):

Quadro 03 – Desembolsos Orçamentários da União para a Justiça Federal – 1988-2000 (R$ de Janeiro/2000)

Ano Pessoal
(a)
Custeio/Projetos
(b)
Total
(c)
(b)/(c)
1988 154.509.817,07 45.579.367,51 200.089.184,58 0,228
1989 293.388.149,25 111.846.532,66 405.234.681,91 0,276
1990 463.964.334,60 159.563.484,61 623.527.819,21 0,256
1991 429.324.604,91 215.428.678,08 644.753.282,99 0,334
1992 391.680.493,97 197.979.184,97 589.659.678,94 0,336
1993 544.861.412,75 166.764.180,58 711.625.593,33 0,234
1994 551.623.863,33 254.606.464,87 806.230.328,19 0,316
1995 683.632.311,56 229.141.399,48 912.773.711,05 0,251
1996 751.392.123,74 263.114.776,75 1.014.506.900,50 0,259
1997 978.206.751,95 271.155.069,67 1.249.361.821,62 0,217
1998 1.218.900.165,53 308.775,367,98 1.527.675.533,51 0,202
1999 1.230.818.258,30 333.787.747,27 1.564.606.005,56 0,213
2000 1.450.931.857,00 352.595.456,00 1.803.527.313,00 0,196


Fonte: Conselho da Justiça Federal/ Secretaria de Orçamento e Finanças.

É fácil concluir então que – não obstante aumentem as estruturas judiciárias, a produtividade dos juízes e os recursos alocados – os fatores que conduzem à morosidade têm prevalecido, mormente a “explosão de litigiosidade” (7) e a tendência à eternização dos processos.

Quanto ao primeiro fator, atuam principalmente as “lesões de massa” (8) (v.g. ações de reparação de danos causados por planos econômicos) e fenômenos como a recessão e o desemprego, os quais acarretam mais processos trabalhistas, execuções propostas por Bancos ou pela Fazenda Pública etc(9). No tocante ao segundo, além da permanente defasagem entre novas ações ajuizadas e processos arquivados, merecem menção a enorme cadeia de recursos processuais postos à disposição dos litigantes(10) e as dificuldades que marcam a execução das sentenças no Brasil – especialmente contra o Erário.

A identificação da morosidade como um grave problema do Judiciário transformou-se em consenso inclusive entre os juízes. Pesquisa feita em 1995 pelo Conselho da Justiça Federal concluiu que 99,12% dos magistrados federais faziam tal identificação(11).

Instados pelo IDESP, no ano de 2000, a se pronunciarem sobre a “relevância de fatores responsáveis pela morosidade da Justiça”, os juízes responderam(12):

Quadro 04 – Relevância de Fatores Responsáveis pela Morosidade da Justiça, sob a ótica dos Juízes.

Muito
relevante
Relevante Pouco
relevante
Sem
nenhuma relevância
Não
sabe/sem opinião
Não
respondeu
Freq % Freq % Freq % Freq % Freq % Freq %
Insuficiência
de recursos (humanos, materiais, etc.)
508 68,6 175 23,6 32 4,3 8 1,1 1 0,1 17 2,3
Deficiências
do ordenamento jurídico
385 52,0 243 32,7 78 10,5 17 2,3 1 0,1 17 2,3
Ineficiência
administrativa
216 29,1 337 45,5 148 20 13 1,8 2 0,3 25 3,4
Formalismo
Processual exagerado
379 51,1 239 32,3 91 12,3 10 1,3 1 0,1 21 2,8
Mau
funcionamento do Ministério Público
62 8,4 192 25,9 306 41,3 135 18,2 18 2,4 28 3,8
Mau
funcionamento dos Cartórios
207 27,9 319 43,0 154 20,8 30 4,0 6 0,8 25 3,4
Forma
de atuação dos advogados
308 41,6 288 38,9 107 14,4 16 2,2 1 0,1 21 2,8
Atitute
passiva de juízes e outros operadores do direito à morosidade do sistema judicial
205 27,7 313 42,2 146 19,7 52 7,7 5 0,7 20 2,7


Fonte: IDESP

Como vemos, 83,4% dos entrevistados consideraram “muito relevante” ou “relevante” para explicar a morosidade da Justiça a existência de um “formalismo processual exagerado”. É evidente que o combate a esta mazela transita necessariamente por mudanças culturais na comunidade jurídica, mas certamente também por alterações nas leis que regem o processo jurisdicional – visando afastar as formalidades que sejam inúteis para o bom funcionamento do sistema.

Foram constatações e postulados deste matiz que inspiraram a criação dos Juizados Especiais no Brasil – o mais bem sucedido instrumento de agilização da máquina judiciária implementado nas últimas duas décadas. Esta afirmação é amparada pelo crescimento constante do número de processos submetidos à apreciação dos Juizados Especiais no âmbito dos Estados, associado a uma avaliação majoritariamente positiva sobre os serviços ali prestados.

Especificamente no tocante à Justiça Federal, a utilização deste instrumento só muito recentemente passou a ser possível. Com efeito, a Emenda Constitucional nº 22 publicada em 19 de março de 1999, corrigiu um equívoco do legislador constituinte de 1987/1988, concernente à possibilidade de criação de Juizados Especiais no âmbito da Justiça Federal. Segundo a primitiva redação do art. 98 da Constituição, a União só poderia criar tais órgãos no Distrito Federal e nos Territórios. A citada emenda constitucional corretamente acrescentou um parágrafo único ao dispositivo em foco determinando que: “Lei federal disporá sobre a criação de juizados especiais no âmbito da Justiça Federal”.

A lei destinada a conferir plena eficácia a este preceito foi recentemente editada, conforme veremos a seguir.

2- A Lei nº 10.259/2001

Em 1994 – portanto antes mesmo da edição da Lei nº 9.099/95, que instituiu os Juizados Especiais na esfera estadual – o juiz federal William Douglas Resinente dos Santos propôs um debate acerca da instituição daqueles órgãos na Justiça Federal. Ainda que esta iniciativa não tenha produzido frutos imediatos, é importante registrar e reconhecer este pioneirismo.

Como já assinalado, a emenda constitucional que expressamente autorizou a criação dos Juizados Especiais Federais foi promulgada em março de 1999. Em outubro do mesmo ano, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (AJUFE) começou a discutir os contornos da lei exigida pela nova sistemática constitucional. Isto ocorreu com a publicação do anteprojeto formulado pelos juízes Salomão Viana, Itagiba Catapretta e César Fonsêca, por ocasião do 16º Encontro Nacional dos Juízes Federais (realizado em Fortaleza-CE). Ainda em 1999, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região promoveu um seminário para tratar do tema, resultando na apresentação de mais um anteprojeto em torno da matéria.

Contudo, somente a partir do início de 2000 esta discussão assumiu um caráter mais sistemático e objetivo(13). Para tanto, foram importantes dois eventos, praticamente simultâneos: em primeiro lugar, a constituição, por ato do então presidente Tourinho Neto, de uma comissão no âmbito da AJUFE para definir a proposta da entidade(14); em segundo, a investidura do ministro Paulo Costa Leite na presidência do STJ, seguindo-se a dinamização dos trabalhos de uma comissão integrada por ministros daquele Tribunal, também destinada a oferecer anteprojeto sobre o assunto.

Ambas as comissões trabalharam paralelamente, até que se deu a síntese celebrada em uma sessão do Conselho da Justiça Federal, ocorrida em setembro de 2000. Esta convergência encontra-se bem analisada em publicação do Conselho da Justiça Federal. (15)

O anteprojeto assim elaborado no âmbito do Judiciário Federal foi então enviado ao Poder Executivo, onde foi constituída uma comissão interministerial para cuidar do assunto. Nesta fase prosseguiram os diálogos envolvendo o STJ e a AJUFE, de modo que se manteve ativo o processo de busca de consensos em torno do projeto a ser submetido ao Congresso Nacional – envolvendo obviamente concessões recíprocas, típicas de uma alternativa concertada.(16)

Em janeiro de 2001 o projeto resultante deste processo foi enviado ao Congresso Nacional pelo presidente da República, sendo aprovado em ambas as Casas Legislativas no mês de junho do mesmo ano, com pequenas alterações(17). Esta célere tramitação legislativa só foi possível à vista da metodologia empregada para a formulação do projeto, daí porque consideramos importante registrá-la com detalhes – como uma experiência modelar.

Do texto da nova Lei, cremos que alguns pontos merecem especial relevo.

Em primeiro lugar, destacamos a forte restrição aos recursos processuais, cuja seqüência interminável revelou-se incompatível com as necessidades das contemporâneas sociedades de massa e com o crescimento avassalador dos conflitos. Na medida em que os recursos serão limitados e apreciados por Turmas Recursais integradas por juízes de primeira instância, reduzir-se-á acentuadamente a quantidade de processos enviados aos TRFs e ao STJ. Não se trata de ilação destituída de base objetiva. Vejamos, por exemplo, que no Judiciário Estadual do Rio Grande do Sul enquanto o Tribunal de Justiça julgou 88.425 processos em 1999, os Juizados Especiais solucionaram 259.481.


A segunda grande virtude da Lei dos Juizados Federais está na inexistência de privilégios excessivos para a Fazenda Pública. Esta deixa de dispor de prazos em dobro ou em quádruplo e, quando vencida nas ações, não terá em seu favor o reexame necessário – que leva automaticamente o processo para a instância recursal.

Finalmente, nos Juizados Especiais Federais haverá uma execução simplificada, sem a necessidade dos precatórios que postergam o pagamento dos direitos dos cidadãos, impedindo a realização tempestiva da Justiça. Com efeito, prevê a nova lei que “após o trânsito em julgado da decisão, o pagamento será efetuado no prazo de sessenta dias, contados da entrega da requisição, por ordem do Juiz…”

Gerar-se-ão, assim, a um só tempo, dois significativos resultados positivos: a) decisões finais serão alcançadas e efetivadas de modo mais célere, sobretudo em prol daqueles que normalmente mais precisam de uma Justiça rápida (aposentados e pensionistas do INSS, mutuários do SFH, servidores públicos de menor renda, micro e pequenos empresários); e b) desafogar-se-ão o Superior Tribunal de Justiça e os Tribunais Regionais Federais, que poderão examinar com mais velocidade e mais profundidade as ações de maior repercussão social e complexidade, relativas, por exemplo, ao crime organizado, a graves danos ambientais, aos escândalos de corrupção, ao combate à sonegação fiscal.

Estas expectativas otimistas encontram respaldo em números concernentes ao ano em curso. De acordo com o que informa Gilmar Ferreira Mendes, no ano de 2001 81,48% dos precatórios devidos pelo INSS têm valor inferior ou igual a 60 salários mínimos (representando 33.204 precatórios). Quanto a outros precatórios devidos pela União (excluído o INSS), este percentual alcança 83,12% (equivalendo a 53.295 precatórios).(18)

Desta forma, a Lei nº 10.259/2001 deve ser recebida como uma importante evolução na ordem jurídica nacional, inclusive abrindo caminho para que novas mudanças positivas se efetivem. Este aspecto, aliás, foi bem exposto pelo juiz federal Walter Nunes Júnior, ao apresentar o anteprojeto da AJUFE, cuja elaboração foi por ele coordenada:

“Esses órgãos jurisdicionais poderão desempenhar papel de fundamental importância no desenvolvimento das técnicas de simplificação do processo, tendo em mira conseguir efetividade e celeridade maior na atividade judicante, com a plena materialização dos princípios da oralidade e da informalidade. No nosso trabalho, os Juizados Especiais foram encarados como o germe de uma nova forma de fazer justiça: atividade judicante mais célere e efetiva e, principalmente, mais democrática, com a simplificação da atuação do Judiciário e a sua aproximação dos consumidores da Justiça. “

No entanto, a Lei nº 10.259/2001 – a despeito dos muitos aspectos positivos já realçados – não criou estruturas administrativas próprias para os Juizados, ao contrário do que a AJUFE preconizou no âmbito do Conselho da Justiça Federal. Esta lacuna, se não impede o início da aplicação do novo rito, certamente gera dificuldades que só serão superadas de modo pleno com a aprovação do projeto de lei que cria 181 novas Varas Federais, já elaborado pelo Conselho da Justiça Federal.

Enquanto tal não acontece, é imperativo que providências criativas e bem planejadas sejam tomadas, a fim de que a lei possa ser cumprida e os seus inúmeros efeitos benéficos sejam sentidos pelo povo brasileiro. Esta, aliás, deve ser a principal preocupação dos que desempenham funções no Estado: com a máxima velocidade e eficiência implementar medidas que tragam benefícios para o maior número possível de destinatários dos serviços públicos, mesmo que isto sacrifique desejos e expectativas individuais de alguns dos agentes envolvidos. Com efeito, conforme afirmamos na abertura do recente 18º Encontro Nacional dos Juízes Federais, além de “socialmente injusta, a eventual definição egocêntrica de objetivos seria suicida – na medida em que nos conduziria à deslegitimação aos olhos do povo e à nossa destruição institucional”.

Com tais premissas, doravante faremos algumas considerações e sugestões acerca da estruturação dos Juizados Especiais Federais, considerada a realidade normativa hoje existente. Ressalte-se que tal manifestação ocorre em caráter pessoal, não expressando – pelo menos nesse momento – posições oficiais da AJUFE, ainda em debate nas instâncias estatutárias.

3- A estruturação dos Juizados Especiais Federais

A implementação dos Juizados Especiais Federais é um momento bastante propício para que se evolua em direção à superação de um dos graves problemas administrativos do Judiciário, qual seja a não incorporação, em sua cultura organizacional, da idéia de planejamento estratégico e global. Os sintomas desta dificuldade são bem evidentes, tais como: diferenças abissais no nível de informatização dos serviços e procedimentos; incompatibilidade entre sistemas de informática; superposição de tarefas (v.g. armazenar a jurisprudência, editar revistas etc); existência de Varas com até cinqüenta vezes mais processos em tramitação do que outras, no mesmo ramo do Judiciário.


Neste passo, cremos que a instalação dos Juizados Especiais Federais deve ser planejada detalhadamente, estabelecendo-se metas a serem alcançadas em cada Seção Judiciária e Região, agora e quando novas Varas forem criadas pelo Congresso Nacional. Para tanto, é essencial partir-se da elaboração de uma projeção de qual será a realidade da Justiça Federal após janeiro de 2002, quando entrar em vigor a Lei nº 10.259/2001. Um bom método para isso é a utilização de dados referentes às ações propostas em alguns meses do ano corrente, classificando-as como se já estivéssemos vivendo a nova realidade normativa. Em alguns Estados este caminho já tem sido trilhado, contudo – no momento em que este texto é redigido – não há ainda a conclusão e consolidação destes diagnósticos. Assim, é importante esclarecer que, para a formulação das propostas adiante apresentadas, partimos de algumas premissas – que serão infirmadas ou confirmadas em breve – quais sejam:

– Em mais de 90% das ações previdenciárias novas será aplicável o rito da Lei nº 10.259/2001.

– A quantidade de ações criminais que tramitarão segundo o rito dos Juizados Especiais Federais não será expressiva.

– Entre 30 e 50% das ações cíveis novas serão processadas de acordo com a nova lei. A margem de variação deriva de três aspectos fundamentais: a) aspectos da realidade de cada Estado e Região, uma vez que há demandas que se concentram com maior evidência em algumas partes do território nacional; b) a interpretação que será conferida a algumas disposições da lei em exame, especialmente as que afastam a competência dos Juizados Especiais Federais; c) a conduta que será adotada pelos advogados em relação à nova lei. Por exemplo, haverá uma opção preferencial pelos Juizados Especiais Federais em detrimento dos mandados de segurança? Acreditamos que sim.

Ainda visando estabelecer hipóteses de trabalho, consideramos que – diferentemente do que ocorreu na Justiça dos Estados – não haverá, na Justiça Federal, uma “explosão” de novos usuários dos serviços judiciários. Dizendo de outra forma, parece-nos que a demanda reprimida na Justiça Federal é substancialmente menor do que a que existia na Justiça dos Estados antes da Lei nº 9.099/95, uma vez que a contenção verificada neste último caso decorria diretamente do elevado valor das custas judiciais cobradas em grande parte das unidades federadas.

Aduzimos, outrossim, que tivemos nos anos 90 um avassalador crescimento do número de processos na Justiça Federal em decorrência de questões sazonais (empréstimos compulsórios; bloqueio de cruzados novos; expurgos inflacionários atingindo servidores públicos, poupadores e correntistas do FGTS; criação de novos tributos e/ou reajustes de alíquotas etc). No cenário atual, entretanto, é razoável prever uma tendência de ligeira queda no número de ações novas ajuizadas na Justiça Federal ou, pelo menos, a estabilização nos patamares alcançados em 2000, ou seja, 1.097.964 (em 1999 foram 1.079.158).

Isto posto, passamos a apresentar algumas propostas para a organização do sistema dos Juizados Especiais Federais.

3.1- Juizados especiais autônomos e adjuntos. Juizados especiais previdenciários.

A distinção entre as duas modalidades de Juizados Especiais Federais (autônomos e adjuntos) é definida pelo artigo 18, parágrafo único, da Lei nº 10.259/2001:

“Serão instalados Juizados Especiais Adjuntos nas localidades cujo movimento forense não justifique a existência de Juizado Especial, cabendo ao Tribunal designar a Vara onde funcionará.”

Temos, então, que se caracteriza a existência de Juizado Especial Federal (JEF) autônomo quando a Vara for especializada na aplicação do novo rito, enquanto que o JEF adjunto não exclui a competência daquela para o processamento de demandas que não se enquadram nos critérios da lei em foco.

Leia a continuação do artigo.

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