Brigas trabalhistas

Excesso de documentos solicitados em briga trabalhista é criticado

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30 de novembro de 2001, 12h01

Abordaremos no presente artigo as solicitações de juntada de documentos efetivadas em processos em que a Empresa é parte (consistentes de Ações de indenização por acidente de trabalho ou doença profissional interpostas por empregados ou ex-empregados contra a Empresa-Empregadora), e também naqueles em que a Empresa não é parte.

Destes documentos, o mais solicitado em tais processos tem sido o prontuário médico, seguido do PCMSO, mapas de controle quanto a acidentes havidos na Empresa, Ordens de Serviço existentes, etc…

E assim o fazemos por se tratar de assunto que vem assumindo grande importância, pois tem se tornado comum tentar-se fazer de tal tipo de processo uma verdadeira “CPI” de molde a entulhá-lo com documentos que, no geral, são desnecessários ao deslinde do feito.

O que em contrapartida coloca a Empresa em posição de se ver anexando em juízo elevado número de documentos (o que implica em custos) sem necessidade.

Isto porque a Empresa já é normalmente fiscalizada pelos órgãos administrativos do Governo, tais como Delegacia Regional do Trabalho, fiscalização do INSS, no que se pressupõe que se está a Empresa em pleno funcionamento é porque cumpre as normas garantidoras dos direitos trabalhistas previstos na nossa legislação, bem como as Normas de Segurança e Medicina ditadas pelo Ministério do Trabalho.

Posto isto, passamos ao assunto em tela para dizer que, acorde o disposto no artigo 355 do CPC “o juiz poderá ordenar que a parte exiba documento ou coisa que se ache em seu poder”.

Outrossim, temos que, em sendo instada judicialmente a exibir determinado documento e não pretendendo fazê-lo, deverá a Empresa em 05 dias manifestar as suas razões de recusa, conforme artigo 357 do CPC.

Sendo que por seu turno dispõe o artigo 358 do CPC que o Juiz não admitirá recusa: “I – se o requerido tiver obrigação legal de exibir; II – “omissis” III – se o documento, por seu conteúdo, for comum às partes”.

Hipóteses estas dos incisos I e III do artigo 358 do CPC na qual se enquadraria o prontuário médico, pelo que em princípio não se admitiria recusa à exibição do mesmo em Juízo.

No entanto, o assunto “obrigatoriedade ou não de juntada de prontuário médico” em Juízo, se instada judicialmente a Empresa a tanto, não se encerraria no artigo 358 do CPC. Senão vejamos:

Assim, antes de mais nada há que se lembrar por primeiro que, a teor do disposto no artigo 5º, inciso II da Constituição Federal “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

Outrossim, temos que por seu turno, ao que se depreende do artigo 168 da CLT, os exames obrigatórios por conta do empregador são os de admissão, demissão e periódico, devendo a Empresa entregar ao trabalhador os resultados de tais exames e dos complementares, diagnósticos, uma vez observados os preceitos da ética médica.

Quanto às normas complementares expedidas pelo Ministério do Trabalho sobre tal assunto, temos a NR 01, item 1.7, no sentido de que cabe ao empregador informar aos trabalhadores “os resultados dos exames médicos e dos exames complementares de diagnóstico aos quais os próprios trabalhadores forem submetidos”.

A NR 07, item 7.4.1, ao se referir ao PCMSO manda incluir entre os exames médicos obrigatórios os de retorno ao trabalho após alta do INSS, em caso de afastamento do trabalho por acidente de trabalho, doença profissional, ou doença propriamente dita, bem como que seja efetivada anamnese clínica, ocupacional, exames físico e mental no empregado.

Em conclusão a nosso ver, o que a Empresa por força de lei tem que manter em seus arquivos é um prontuário médico ocupacional, qual seja, que contenha anamnese clínica e ocupacional, exames físico e mental do empregado, e resultados dos exames obrigatórios exigidos em lei, no caso admissional, periódico, de retorno e demissional.

Em suma a Empresa tem, por força de lei, que manter um prontuário médico ocupacional contendo os exames supra referidos, bem como fornecer aos empregados, e portanto exibir em Juízo, os resultados dos exames médicos exigidos em lei emitidos através dos ASOS (Atestado médico de saúde ocupacional, admissional, periódico, de retorno, e demissional) e os resultados dos exames complementares a que o empregado for submetido na Empresa, desde que respeitada a ética médica, conforme preceitua o parágrafo 5º, do artigo 168 da CLT.

E nem poderia ser de outra forma, pois que o prontuário médico propriamente dito, contendo todas as anotações a cada vez que o paciente procura o médico é inerente ao médico, a clinica médica e não a uma Empresa que exerça atividade industrial ou comercial.

Outrossim, há que se lembrar que se trata o “prontuário médico”, de documento sigiloso, o qual por força de lei é vedada a exibição em Juízo, haja visto o disposto nos artigos 154 do Código Penal, 34 e 36 do Código de Ética Médica.

Pelo que poderia a Empresa invocar também como motivo à não exibição do prontuário médico em Juízo, o caráter sigiloso de que se reveste tal documento.

No que tange aos riscos na esfera penal, pelo não atendimento de solicitação Judicial de juntada de prontuário médico em processo em que determinada empresa é parte (e o Juiz não admitir a recusa à exibição) não tipificaria crime haja vista que imposta sanção processual, pela não juntada do documento, no caso a do artigo 359 do CPC (“confissão ficta”), qual seja: a não exibição do documento poderia importar que “provadas as alegações efetivadas pela Autor da Ação no sentido de que teria o mesmo a doença profissional por este aventada no processo”.

E o entendimento de nossos doutrinadores com respaldo jurisprudencial é no sentido de que uma vez prevista sanção administrativa (no caso a do artigo 359 do Código de Processo Civil), não haveria que se falar em crime, pelo não atendimento à solicitação de entrega de prontuário médico em processo movido contra a Empresa por empregados e ex-empregados, conforme comentários de Celso Delmanto ao artigo 330, do Código Penal, com respaldo jurisprudencial em seu “Código Penal Comentado”, 4ª edição Saraiva, 1986, págs. 410/411.

Quanto aos processos movidos por empregados ou ex-empregados, em que a empresa não é parte, e sim “terceiro” que se encontra de posse de prontuário médico, a não entrega do mesmo, poderá, em não aceitando o Juízo os motivos à recusa na sua exibição, acarretar além da apreensão do documento, responsabilidade por crime de desobediência, conforme previsto no artigo 362 do CPC:

“Se o terceiro, sem justo motivo, se recusar a efetuar a exibição, o juiz lhe ordenará que proceda ao respectivo depósito em cartório ou noutro lugar designado, no prazo de cinco (5) dias, impondo ao requerente que o embolse das despesas que tiver; se o terceiro descumprir a ordem, o juiz expedirá mandado de apreensão, requisitando, se necessário, força policial, tudo sem prejuízo da responsabilidade por crime de desobediência.”

Sendo que por seu turno o crime de desobediência está previsto no artigo 330 do Código Penal, o qual assim dispõe:

“Art. 330. Desobedecer a ordem legal de funcionário público:

Pena – detenção, de 15 (quinze) dias a 6 (seis) meses, e multa”.

No entanto, como as solicitações de exibição de documento em Juízo são no geral efetivadas através de simples oficio, que não é ordem legal na acepção da palavra, temos que não tipificaria crime, o não atendimento à solicitação judicial de juntada de documento através de Oficio, ao que se depreende do entendimento de nossos tribunais ou seja:

“Simples ofício em que se solicita, caso não respondido, não basta para a caracterização do delito, que requer ordem legal” (TAPR, HC 179, RT 492/398), conforme Celso Delmanto em comentários ao artigo 330 do Código Penal, obra acima citada.

Os processos em que a Empresa é parte e venha a ser instada judicialmente também comportam defesa à não exibição do prontuário médico, na forma acima exposta , porém não exclui o risco da “confissão ficta” prevista no artigo 359 do CPC, qual seja, que a não exibição do documento poderia importar que provadas as alegações efetivadas pelo Autor da Ação no sentido de que teria o mesmo a doença profissional por este aventada no processo.

Cabe pois a Empresa nos dois casos pesar tais riscos, e decidir a final, se vale a pena corrê-los.

Acrescido do fato de que a questão não envolve apenas a Empresa, mas também o médico do trabalho, que tem por dever legal guardar sigilo profissional quanto a tal prontuário, sob as penas do artigo 154 parágrafo único do Código Penal, qual seja, “detenção de 03 (três) meses a um ano, ou multa”.

Quanto aos demais documentos que vêm sendo solicitados em processos movidos por empregados ou ex-empregados da Empresa, tais como, controle periódico de riscos ambientais, cópia do PCMSO, mapa de avaliação anual entregue à Secretária de Segurança do Trabalho pela Empresa e demais referidos nas Normas de Segurança e Saúde, necessariamente não teriam que ser anexados ao processo.

Isto porque tais documentos além de não serem comuns às partes, e sim da Empresa têm por força de lei que serem mantidos no local de trabalho para fiscalização pela Delegacia Regional do Trabalho, com vistas à aferição se cumpre ou não a Empresa as Normas de Segurança e Medicina ditadas pelo Ministério do Trabalho.

Quanto muito poderiam tais documentos serem colocados à disposição do Perito Judicial para exame na Empresa, quando da perícia técnica no local de trabalho, ou médica, em assim entendendo necessário o Perito nomeado pelo Juiz.

Igual conduta poderia ser adotada quanto ao prontuário médico ocupacional, qual seja colocado à disposição do Perito Judicial para exame naquilo que não contrariar o sigilo profissional, e isto a critério do médico do trabalho na Empresa.

E tudo no intuito de preservar a Empresa, pois que se por um lado esta não tem a intenção de ocultar informações ao MM. Juízo, não pode se ver obrigada a anexar documentos em Juízo, em nome de uma “solicitação Judicial de juntada de documentos” (que no geral não vem do próprio Juiz, e sim por força de pedido da parte adversa) que comumente de nenhuma valia são para os processos concernentes à Ação de Indenização por acidente de trabalho ou evento a ele equiparável (doença profissional) movida contra as Empresas por empregados ou ex-empregados.

Posto que, para o deslinde de tais processos, necessário isto sim a perícia médica (para aferição do real e atual estado de saúde do empregado ou ex-empregado capacidade laborativa) e perícia técnica, ou produção de prova testemunhal (com vistas a se saber das condições de trabalho na Empresa) e não entulhá-lhos de documentos flagrantemente inúteis ao seu desfecho.

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