Crimes na Internet

Conheça o Tratado Internacional contra crimes na Internet

Autor

  • Omar Kaminski

    é advogado e consultor gestor do Observatório do Marco Civil da Internet membro especialista da Câmara de Segurança e Direitos do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) e diretor de Internet da Comissão de Assuntos Culturais e Propriedade Intelectual da OAB-PR.

24 de novembro de 2001, 12h16

Trinta países aderiram ao primeiro Tratado de prevenção e combate aos crimes praticados na Internet ou com o uso do computador. As assinaturas foram colhidas na sessão inaugural da Convenção sobre Cibercrimes (ETS 185), nesta sexta-feira (23/11), em Budapeste, na Hungria.

A Convenção visa basicamente obter a cooperação, em sentido amplo, de todos os signatários para que adotem medidas legislativas locais, bem como outras ações preventivas e repressivas no combate aos delitos e ofensas praticadas na Internet, e por meio desta como ferramenta.

Subscreveram o Tratado: Albânia, Armênia, Áustria, Bélgica, Bulgária, Croácia, Ilha de Chipre, Estônia, Finlândia, França, Alemanha, Grécia, Hungria, Itália, Letônia, Moldova, Holanda, Noruega, Polônia, Portugal, Romênia, Espanha, Suiça, República Iugoslava da Macedônia, Ucrânia e Inglaterra. De países não-membros do Conselho Europeu, houve a adesão do Canadá, Japão, África do Sul e dos Estados Unidos. Há ainda a possibilidade de integração de mais dezessete países, que são os demais componentes do Conselho Europeu.

A cooperação prevista nesse instrumento de direito público internacional se materializa por meio da criação de novos tipos penais puníveis – trata-se do primeiro instrumento jurídico transnacional de regulamentação da Web – que certamente deverá influenciar doutrinas e jurisprudências mesmo de países não signatários, como já vem acontecendo com a Lei Modelo da Uncitral e o comércio eletrônico.

As diretrizes do Tratado:

(Titulo 1) Ofensas contra a confidencialidade, integridade e disponibilidade de dados de computador e sistemas: acesso ilegal (no todo ou em parte sem autorização), interceptação ilegal (por meios técnicos, incluindo emissões eletromagnéticas); interferência nos dados (dano, obliteração, deterioração, alteração ou supressão de dados); interferência em sistemas (distúrbios sérios no funcionamento); abuso de dispositivos (incluindo programas de computador, senhas, códigos e dispositivos de acesso);

(Título 2) Ofensas relacionadas a computadores: falsificação (utilização de dados falsos como se verdadeiros fossem, estejam inteligíveis ou não) e fraude (ocasionando perda de propriedade para outrem);

(Título 3) Ofensas relacionadas ao conteúdo: pornografia infantil (produzir, oferecer, tornar disponível, distribuir, transmitir, angariar, ter em posse);

(Título 4) Ofensas relacionadas à infração da propriedade intelectual (observando-se a Convenção de Berna, versão de Paris e o Tratado sobre Direitos Autorais da Organização Mundial da Propriedade Intelectual – OMPI ou WIPO);

(Título 5) Responsabilidade subsidiária e sanções: esforço e auxílio ou colaboração; responsabilização corporativa (crimes cometidos por pessoas jurídicas em seu próprio benefício ou de pessoa natural, utilizando-se de poderes de representação, procuração ou controle); sanções e critérios (persuasivos, proporcionais e dissuasivos, incluindo a pena de privação da liberdade, bem como penas pecuniárias).

Há previsão também da utilização, pelos signatários, de serviços informáticos de busca remota e em tempo real; interceptação e confisco de dados em trânsito ou armazenados, inclusive para fins de prova judicial; bloqueio do acesso de terceiros bem como a possibilidade de se determinar a remoção dos dados;

Caso não haja Tratado ou Convenção firmados entre as partes a respeito de assistência mútua e reciprocidade, o art. 28 prevê a prevalência da norma Convencional sobre a jurisdição e regulamentação locais.

Apesar do aspecto territorial do instrumento, há a previsão de acesso além-fronteiras (“trans-border”) a dados armazenados em computadores sem o consentimento da outra parte ou quando de disponibilidade pública (“open source”), independentemente da localização geográfica desses dados.

Para que seja colocado em vigor, a Convenção exige cinco ratificações, sendo destas três de países integrantes do Conselho Europeu (Councill of Europe). Ainda não há previsão de data para a ratificação.

Uma breve análise:

Em respeito à soberania e aos princípios basilares do Direito, parece ter chegado o momento em que os usuários brasileiros terão que se conscientizar acerca da potencialidade (além da praticidade e benefícios já constatados por todos) e da importância real da Internet, e também da necessidade de se preservar uma rede de servidores locais íntegra em todos os aspectos.

Valorizar os sufixos e os serviços locais (.br), tornando o cibernacionalismo possível (alguns estudiosos já falam em socialismo virtual), e resguardar a privacidade e intimidade de “olhares” espiões.

Pela análise aos termos previstos no acordo multilateral, entendemos que todo internauta poderá vir a ser, hipoteticamente, considerado suspeito até que se prove o contrário, pois nenhum dado armazenado ou em tráfego estará seguro.

Os “sites” são os verdadeiros estabelecimentos virtuais das empresas; caso não se consiga individualizar o agente criminoso, a pessoa jurídica é que poderá vir a ser responsabilizada. E os dados armazenados nos computadores pessoais são nossa história, nosso trabalho, nossa diversão e cada vez mais nossa vida.

Clique aqui para ler a redação final do Tratado (em inglês)

Autores

  • é advogado, diretor de Internet do Instituto Brasileiro de Política e Direito da Informática (IBDI) e membro suplente do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br).

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