STF solta Pimenta Neves

Pimenta Neves responderá morte de ex-namorada em liberdade

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24 de março de 2001, 0h00

Um habeas corpus obtido junto ao Supremo Tribunal Federal garantiu na noite desta sexta-feira (23/3) a liberdade para o jornalista Antonio Pimenta Neves, que matou sua ex-namorada, Sandra Gomide.

A decisão de revogar a prisão preventiva do ex-diretor do jornal O Estado de S.Paulo foi adotada pelo ministro Celso de Mello, que determinou a imediata comunicação ao Juízo de Direito da 1ª Vara da Comarca de Ibiúna e a expedição do alvará de soltura.

O advogado da família de Sandra Gomide, Márcio Thomaz Bastos, lamentou a decisão, que prejudicaria a garantia da aplicação penal. “Há elementos nos autos que justificam a prisão preventiva”, afirmou, citando o fato de Pimenta Neves ser radicado no exterior, o que evidenciaria a possibilidade de fuga para o exterior. “Ainda preso, o réu passou seus bens para o nome de suas filhas”, lembra o advogado.

Em nota assinada pelos pais de Sandra, João e Nilda Florentino Gomide, a mesma preocupação: “Sabemos que quando o réu está solto a Justiça anda mais devagar. Sabemos que os advogados do assassino farão de tudo para que ele não seja julgado nos próximos anos. Enquanto isso, tudo pode acontecer. O assassino pode fugir do Brasil.”

Como assistente de acusação, os advogados da família de Sandra não têm acesso a exame de habeas corpus. Thomaz Bastos, contudo, acredita que a Turma do STF que vai examinar a matéria irá reformar a decisão.

O assassinato foi cometido no dia 20 de agosto do ano passado, em um haras no interior de São Paulo.

Ao conceder habeas corpus (80.719) em favor do jornalista, que ocupava cela na 77ª Delegacia de Polícia destinada a presos de nível universitário, o ministro Celso de Mello considerou que “não existe situação configurada de real necessidade que possa justificar a prisão preventiva do réu”.

O ministro observou em seu despacho, que os fundamentos que basearam a decisão da Primeira Vara de Justiça de Ibiúna, onde tramita o processo por crime de homicídio, para prender o jornalista Pimenta Neves não se ajustam à jurisprudência do Supremo.

O juiz também considerou destituída de fundamento a alegação de que caso Pimenta Neves fosse mantido em liberdade ele seria capaz de interferir nas provas e de influir no depoimento das testemunhas.

Para o ministro, essa presunção é arbitrária e não pode legitimar a privação da liberdade do réu, uma vez que todas as testemunhas arroladas pela acusação já foram ouvidas em juízo, não tendo sido apontada qualquer conduta que possa ser atribuída ao réu “de ilícita interferência na produção da prova penal”.

Tecnicamente, o Superior Tribunal de Justiça já havia decidido, uma semana antes, que Pimenta Neves e todos os presos que têm direito a prisão especial em São Paulo devem ser soltos.

Ao julgar pedido em favor do ex-vereador Hanna Garib, o STJ entendeu que não há instalações em São Paulo que se enquadrem na definição de “prisão especial”.

Leia a Nota divulgada pela Associação Justiça para Sandra Gomide, assinada pelos país de Sandra

“Não entendemos de leis. Mas entendemos de dor. Ficamos assustados, ficamos preocupados com a decisão do ministro do STF de permitir que o assassino de nossa filha seja posto em liberdade. Não queremos discutir com o ministro. Sabemos que se fosse a filha dele ele pensaria como nós.

Mas temos nossa opinião e temos o direito de torná-la pública. É uma opinião do pai e de uma mãe que ainda trazem muita dor no coração. É uma opinião de um pai e de uma mãe que enterraram no dia 21 de agosto uma filha querida, assassinada de forma cruel e premeditada. Ela levou um tiro pelas costas e em seguida, já caída no chão, um segundo tiro na têmpora para não ter chances de sobreviver.

Sabemos que quando o réu está solto a Justiça anda mais devagar.

Sabemos que os advogados do assassino farão de tudo para que ele não seja julgado nos próximos anos.

Enquanto isso, tudo pode acontecer. O assassino pode fugir do Brasil.

Ele tem filhas que nasceram nos Estados Unidos e que ainda moram por lá. Até os jornais já noticiaram que, mesmo preso, o assassino tentou vender bens que possui por aqui. Seria difícil trazê-lo de volta. Sabemos também que o assassino de nossa filha é um homem poderoso e bem relacionado. Tem um poder de pressão sobre testemunhas que saberá usar. Ele ficou sete meses na cadeia. Acha que já foi o suficiente. Nós não achamos.

Queremos que esse homem volte para atrás das grades. Ele é mau, ele é cínico, ele é prepotente. Lançamos um apelo para que os outros ministros do STF, que ainda devem dar uma opinião sobre o caso, aceitem a decisão já tomada por um outro tribunal superior, o STJ, que passou o cadeado na porta da cadeia e impediu que o assassino recebesse de presente a impunidade.

Com a soltura do assassino, outros crápulas perceberão que é leve a punição de quem comete violências contra as mulheres.

Não somos só nós, os pais de Sandra, que estamos hoje tristes. Muita gente por esse Brasil afora também se entristeceu. É mais um criminoso em liberdade. É mais um criminoso que acredita que não precisará pagar pelo crime que cometeu.

Mas ainda temos esperanças. Temos esperanças na Justiça.”

São Paulo, 24 de maio de 2001

João e Nilda Florentino Gomide

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