STF no banco dos réus

Analistas do TCU entram com ação contra ministros do STF

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22 de maio de 2001, 12h48

Um grupo de analistas do Tribunal de Contas da União entrou, nesta terça-feira (22/5), com Ação Popular contra a mudança no Regimento Interno do STF. A ação foi impetrada na Justiça Federal de Brasília. Os analistas pedem suspensão liminar da garantia à manutenção dos atuais ocupantes dos cargos de confiança da secretaria, que impede o futuro presidente do STF, Marco Aurélio, de exonerá-los.

Também foi solicitada a invalidação da norma que prevê o sigilo do voto para a escolha dos futuros dirigentes administrativos do órgão. Os dois pedidos se fundamentam na infringência ao princípio da moralidade administrativa, como causa autônoma para a propositura da ação.

Segundo os analistas do TCU a mudança no regimento interno do STF foi “casuística, inoportuna, ilegítima, temerária, imotivada, inconstitucional e atentatória ao interesse público”.

A ação deve ser apreciada antes da posse do presidente eleito do STF. Estão sendo citados na ação os ministros Carlos Velloso, Moreira Alves, Nelson Jobim, Ellen Gracie, Maurício Corrêa, Néri da Silveira e Sydney Sanches, além dos atuais ocupantes dos cargos comissionados da cúpula administrativa do STF, beneficiários do ato.

Veja, na íntegra, o pedido dos analistas do TCU

Exmº. Sr. Juiz Federal da Vara da Seção Judiciária de Justiça Federal do DF

Ementa : Administrativo – Ação Popular – Alteração no Art. 355 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal – Norma de Efeito Concreto -Princípio Constitucional da Moralidade Administrativa – Infringência – Impugnação Parcial – Cabimento da Ação – Procedência do Pedido

A UNIÃO FEDERAL, em sentido material, vem – por meio de seus substitutos processuais, RICARDO LUIZ ROCHA CUBAS, brasileiro, solteiro, CPF nº 523.890.571-87; FLÁVIO MARCOS GODOY KRECKE , brasileiro, casado, CPF nº 152.935.721-72; WAUCILON CARVALHO SOUSA, brasileiro, casado, CPF nº 093.299781-34; todos cidadãos (comprovantes de cidadania anexos, DOC. 01) ocupantes do cargo de Analista de Finanças e Controle Externo no Tribunal de Contas da União (TCU), domicílio funcional à SAF SUL, Edifício do TCU, lotados e em exercício naquele Tribunal, via seus advogados (DOC. 02) – propor, com fulcro no inciso LXXIII do art. 5º da Constituição Federal c/c o arts. 1º e 6º da Lei 4.717/65 (LAP),

AÇÃO POPULAR com pedido de medida liminar contra os Ministros do Supremo Tribunal Federal : CARLOS VELLOSO, MOREIRA ALVES, MAURÍCIO CORRÊA, NELSON JOBIM, ELLEN GRACIE, NÉRI DA SILVEIRA E SYDNEY SANCHES; contra CÉLIO MENECUCCI (Secretário de Serviços Integrados de Saúde); ROBERTO BAPTISTA (Secretário-Geral da Presidência); MIGUEL AUGUSTO FONSECA DE CAMPOS (Diretor-Geral); VALÉRIA BRAZ MARTINEZ DA SILVA (Secretária de Processamento Judiciário); ALBERTO VERONESE AGUIAR (Secretário de Apoio aos Julgamentos), ALTAIR MARIA DAMIANI COSTA (Secretário de Documentação); TORQUATO FERNANDO LIMA (Secretário de Administração e Finanças); SANDRA DO COUTO MOREIRA (Secretário de Recursos Humanos), LEONARDO ALAM DA COSTA (Secretário de Informática); ARMANDO DE ARAÚJO CARDOSO (Secretário de Imprensa) e o INALDO DE VASCONCELOS SOARES (Secretário de Controle Interno), esses últimos, cargos de confiança no Supremo Tribunal Federal, BENEFICIÁRIOS do ato, e, finalmente, contra a UNIÃO FEDERAL, em sentido formal, tudo, com base nos fatos e fundamentos de direito abaixo transcritos :

DOS ATOS IMPUGNADOS

2. PRIMEIRO ATO OBJETO DE IMPUGNAÇÃO – Parte final do caput do Art. 355 e do §2º do mesmo artigo, do Regimento Interno do Supremo, com a redação dada pela Emenda Regimental nº 08, de 08.05.2001 (DOC. 03-A e DOC. 03-B – fonte : www.stf.gov.br):

“Art. 355. À Secretaria do Tribunal incumbe a execução dos serviços administrativos e judiciários, e será dirigida pelo Diretor-Geral, com habilitação universitária em direito, administração, economia ou ciências contábeis, nomeado, em comissão, pelo Presidente, nos termos da lei e depois de sua indicação, por este, ter sido aprovada pela maioria absoluta do Tribunal, em votação secreta. Enquanto não for aprovada a indicação do novo Diretor-Geral, permanecerá no cargo o anterior, salvo se exonerado a pedido ou em virtude de falta funcional que o incompatibilize com essa permanência.

§2º – O Secretário-Geral da Presidência, o Secretário de controle interno e os demais Secretários das Secretarias que integram a Secretaria do Tribunal serão nomeados, em comissão, pelo Presidente, nos termos da lei e depois de sua indicação, por este, ter sido aprovada pela maioria absoluta do Tribunal em votação secreta. A todos eles se aplica a parte final do disposto no ‘caput’ desse artigo, em caso de exoneração.” (destaques nossos)

3. SEGUNDO ATO OBJETO DE IMPUGNAÇÃO – previsões de votação secreta constantes no caput no Art. 355, e em seu §2º, do Regimento Interno do Supremo, com a redação dada pela Emenda Regimental nº 08, de 08.05.2001:


“Art. 355. À Secretaria do Tribunal incumbe a execução dos serviços administrativos e judiciários, e será dirigida pelo Diretor-Geral, com habilitação universitária em direito, administração, economia ou ciências contábeis, nomeado, em comissão, pelo Presidente, nos termos da lei e depois de sua indicação, por este, ter sido aprovada pela maioria absoluta do Tribunal, em votação secreta…

§2º – O Secretário-Geral da Presidência, o Secretário de controle interno e os demais Secretários das Secretarias que integram a Secretaria do Tribunal serão nomeados, em comissão, pelo Presidente, nos termos da lei e depois de sua indicação, por este, ter sido aprovada pela maioria absoluta do Tribunal em votação secreta. …” (destaques nossos)

DOS FATOS

4. Em 18.04.01, foi eleito para exercer a Presidência do Supremo Tribunal Federal, no biênio 2001/2002, o Ministro Marco Aurélio (DOC. 04). A posse está marcada para o final do mês de maio.

5. Segundo informações extraídas da imprensa escrita, o Presidente eleito do STF havia noticiado que demitiria todos os servidores aposentados que estivessem ocupando cargos de confiança (DOCS. 05, 06 e 07, 08 e 09).

6. Por coincidência, ou não, em 08.05.2001, os Ministros do STF, reunidos em sessão administrativa, aprovaram emenda regimental que, na prática, transfere a nomeação e exoneração de diversos cargos de confiança da Secretaria do STF da Presidência para o Tribunal, por maioria de votos (DOC. 03-A).

7. A repercussão negativa da medida na opinião pública foi e é manifesta, fato esse público e notório. A título exemplificativo, transcreve-se trecho do editorial Jornal da Tarde “AS ‘BOQUINHAS’ DO SUPREMO”, de 16.05.2001 (DOC. 10), divulgado, inclusive, no site do Consultor Jurídico, meio de divulgação conceituado na comunidade jurídica nacional:

“Numa decisão inédita no história do Supremo Tribunal Federal (STF), sete ministros mudaram o regimento da instituição só para limitar as prerrogativas de seu futuro presidente em matéria administrativa… O que motivou essa decisão, o pouquíssimos dias da troca de comando na mais alta corte de Justiça do País, não foi uma questão jurídica relevante. Foi algo prosaico e mesquinho. Como Marco Aurélio tem por norma não indicar funcionários públicos aposentados para cargos de confiança, sob o argumento que isso é imoral…

Essa decisão é mais do que um tapa no rosto da sociedade. Além de configurar uma atitude de escárnio no trato da coisa pública, ela também retira do STF a autoridade moral para dar a última palavar, em matéria jurídica.

Como pode um país acreditar no futuro se até em sua Corte suprema os interesses pessoais prevalecem sobre as leis?”

8. NA COMUNIDADE JURÍDICA AS REPERCUSSÕES NEGATIVAS TAMBÉM SE FIZERAM PRESENTES :

EM NOTA OFICIAL DE 10.05.01 A ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MAGISTRADOS DA JUSTIÇA DO TRABALHO (DOC. 11):

“A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho – ANAMATRA vem a público manifestar a sua profunda divergência com a decisão tomada pelo Supremo quanto ao preenchimento dos cargos de provimento emcomissão, no âmbito daquela Corte.

Parece óbvio que a açodada medida, longe de se destinar a democratizar o processo de escolha dos futuros diretores da Casa, configura surpreendente reação da maioria dos seus membros à intenção declarada pelo Ministro Marco Aurélio de afastar os atuais ocupantes decargos comissionados que sejam servidores aposentados, aquinhoados com retribuição pecuniária em duplicidade, abrindo espaço, assim, para os titulares de cargos efetivos, atualmente na ativa.

Os Juízes do Trabalho externam a sua irrestrita solidariedade ao Ministro Marco Aurélio Mello, pelapostura ética e moralizadora revelada no episódio, elamentam o casuísmo indisfarçado contra ele perpetrado.”

O PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO DOS JUÍZES FEDERAIS NA SEÇÃO PAINEL DA FOLHA DE SÃO PAULO DE 15.05.01, ASSIM SE MANIFESTOU (DOC. 12):

“Nunca na história republicana um presidente do STF foi boicotado sistematicamente pelos seus pares. Um chefe do Poder Judiciário isolado e debilitado significa um Judiciário Fraco.”

O CONSULTOR JURÍDICO (CF6.UOL.COM.BR/CONSULTOR) DIVULGOU TEXTO, INTITULADO “STF PRIVILEGIA UNS POUCOS, PUNE UM E PREJUDICA MUITOS.” EXTRAÍDO DO SITE PRIMEIRA LEITURA (WWW.PRIMEIRALEITURA.COM.BR), QUE CHEGOU AO CONHECIMENTO DA COMUNIDADE JURÍDICA NACIONAL (DOC. 13). EIS ALGUNS TRECHOS:

“A uma suprema corte cabe decidir pensando na questão institucional; infelizmente não é o que se vê no caso da ação contra o ministro Marco Aurélio de Mello.

É um casuísmo dos mais descarados e exemplo dos mais nefastos a ação de ministros do Supremo Tribunal Federal para limitar os poderes do futuro presidente..


Se querem os nobres juízes limitar os poderes do presidente de plantão, que o propusessem para o mandato daquele que vier a substituir Mello. Deveria ser o Supremo a primeira instituição do país a garantir que não se mudam as regras de um jogo que já começou. Mas não, em vez disso, agem os nobres ministros como uma corte que legisla ad hoc. Corte máxima do país, comporta-se como um grêmio estudantil a aplicar pequenos golpes nos adversários…

Não se está aqui a defender um cavaleiro sem máculas contra o dragão da maldade. O ministro está sujeito a erros como qualquer pessoa. O que não pode, o que preocupa, o que constrange é que o STF, como instituição, decida-se por expedientes de urgência, ditados ao calor da hora, pensados para privilegiar uns poucos, punir um só e prejudicar a muitos.”

9. EM QUE PESE AS SUSO OPINIÕES CONTRÁRIAS, O PRESIDENTE DO STF, MINISTRO CARLOS VELLOSO, SE MANIFESTOU DEFENDENDO A ALTERAÇÃO REGIMENTAL PERPETRADA EM NOTAS DIVULGADA NO SITE OFICIAL DO STF:

[VELLOSO AFIRMA QUE RESOLUÇÃO NÃO TIRA PODER DE MARCO AURÉLIO – DOC. 14]

“…O MINISTRO CARLOS VELLOSO AFIRMOU AINDA QUE A DECISÃO NÃO REDUZ O PODER DO MINISTRO ELEITO DO STF, MINISTRO MARCO AURÉLIO. ‘ISSO É ALGO QUE ALGUM DIA ACONTECERIA E SE ACONTECESSE DEPOIS DA POSSE SERIA PIOR’ …”

[VELLOSO DEFENDE VOTO SECRETO NAS REUNIÕES ADMINISTRATIVAS – DOC. 15]

“O PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), MINISTRO CARLOS VELLOSO, DEFENDEU HOJE (10/05) A ADOÇÃO DO VOTO SECRETO NAS REUNIÕES ADMINISTRATIVAS DO MINISTROS DO STF POR CONFERIR MAIS INDEPENDÊNCIA AOS MAGISTRADOS E SER UMA PRÁTICA DE MAIS DE DEZ ANOS…”

Do Direito

“Infringência ao princípio da Moralidade Administrativa Constitucional”

8. Conforme se verá adiante, não resta a menor dúvida de que os atos ora impugnados infringem o princípio da moralidade administrativa. OS FATOS “FALAM” POR SI SÓS. Indubitavelmente, tomamos a liberdade, inclusive, de parafrasear excerto de frase proferida por um dos réus, Ministro Moreira Alves, em suas aulas na Universidade de Brasília, para dizer que tudo, certamente, ofende a “NATUREZA MESMA DAS COISAS”.

9. O legislador constituinte elevou à maior hierarquia normativa o princípio da moralidade administrativa, nos termos do caput do art. 37 da Constituição Federal de 1988 (“A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência…”, redação EC n. 19), prevendo o cabimento da ação popular para a sua defesa nos termos do inciso LXXIII do art. 5º da Constituição (“Qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa…”) .

10. Dois dos maiores administrativistas desse país anunciam o referido princípio nos seguintes termos:

* Helly Lopes Meirelles ( in “Direito Administrativo Brasileiro”, 20ª ed., Malheiros Editora):

” A moralidade administrativa constitui, hoje em dia, pressuposto de validade de todo ato da Administração Pública (CF, art. 37, caput) . Não se trata – diz Hauriou, o sistematizador de tal conceito – da moral comum , mas sim da moral jurídica, entendida como ‘o conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração’ … a moral administrativa é imposta ao agente público para sua conduta interna, segundo as exigências da instituição a que serve e a finalidade de sua ação: o bem comum ” (págs. 83 e 84)

* Celso Antônio Bandeira de Mello (in “Curso de Direito Administrativo”, 12ª ed., 2ª Tiragem, Malheiros Editora, págs. 89 e 90):

“De acordo com ele, a Administração e seus agentes têm de atuar na conformidade dos princípios éticos. Violá-los implicará violação ao próprio direito, configurando ilicitude que assujeita a conduta viciada a invalidação, porquanto tal princípio assumiu foros de pauta jurídica, na conformidade do art. 37 da Constituição. Compreende-se em seu âmbito, como é evidente, os chamados princípios da lealdade e da boa-fé… “

11. O PRIMEIRO ATO IMPUGNADO (manutenção dos atuais beneficiários desse ato nos cargos de confiança) é IMORAL, sob a ótica administrativa, por várias razões: A UMA QUE, a mudança perpetrada foi CASUÍSTICA, uma vez que o Ministro Presidente eleito do STF, Marco Aurélio, manifestou sua intenção de trocar os ocupantes de cargos de confiança que já fossem aposentados;

A DUAS QUE, a garantia de permanecer nos cargos de confiança foi obtida às vésperas da posse do ministro presidente eleito, a medida portanto, é INOPORTUNA. Referida constatação é corroborada pelo motivo explanado pelo presidente do STF que afirmou taxativamente que um dia a limitação dos poderes da Presidência daquele corte aconteceria, se acontecesse depois da posse “seria pior”;


A TRÊS QUE, o ato foi aprovado pela Corte de Justiça de mais alta hierarquia, guardiã da Constituição Federal da República, ato portanto TEMERÁRIO;

A QUATRO QUE, a previsibilidade de exoneração ad nutum dos atuais ocupantes, réus-beneficiários, dos cargos em comissão (previsibilidade inerente ao exercício desse tipo de cargo) fica ao bel prazer de seu ocupante, transgredindo a essência do conceito do ‘cargo em comissão’; e

A CINCO QUE, ainda que se possa argumentar que a mudança é formalmente legal, a medida é carecedora de legitimidade, na medida em que atende a interesse pessoais, infringe o princípio da impessoalidade, sendo portanto ILEGÍTIMA.

12. JÁ O SEGUNDO ATO IMPUGNADO (previsão de votação secreta para a aprovação da indicação dos ocupantes dos cargos de confiança, objeto da impugnação), também é IMORAL, sob a ótica administrativa:

A UMA QUE, a regra constitucional na Administração Pública é a publicidade dos atos. Portanto, a invocação do sigilo em norma infra-constitucional é INCONSTITUCIONAL;

A DUAS QUE, o sigilo nesse tipo de ato deve atender a relevante interesse público, o que, in casu, não se verifica vez que o controle social sobre a escolha dos ocupantes dos altos cargos da secretaria do STF deve prevalecer em relação à ocultação dos responsáveis pela indicação de fulano, sicrano ou beltrano. Assim o ato é imoral, pois o sigilo em questão NÃO ATENDE AO INTERESSE PÚBLICO;

A TRÊS QUE, referida regra, sigilo na aprovação de comissionados, não existe em qualquer órgão da Administração Pública, sendo a mesma TEMERÁRIA;

A QUATRO QUE, o atual presidente do STF, afirmou que o sigilo conferiria mais independência aos magistrados. Ora, há que se separar a atividade judicante dos magistrados, com as suas atividades administrativas. Nas justificativas para a previsibilidade do sigilo, nada foi mencionado (DOC. 03-A). Por tais razões deve ser invalidado pela aplicabilidade da Teoria dos Motivos Determinantes. Assim, o ato, ou se baseia em FALSO MOTIVO, ou é IMOTIVADO, decorrendo daí sua imoralidade.

Assim sendo, conclui-se que tanto o primeiro ato impugnado, quanto o segundo atentam contra o princípio da moralidade administrativa. A imoralidade do primeiro ato impugnado decorre do casuísmo, da inoportunidade, da temeridade, da desvio dos cânones do instituto do cargo comissionado e da ilegitimidade da medida. Já o segundo ato impugnado, também, é imoral, pois atenta quanto ao princípio constitucional da publicidade, não atende ao interesse público, abre precedente temerário, ou pelo fato do mesmo estar baseado em falso motivo ou ser, simplesmente, imotivado.

“Do Cabimento da Ação Popular”

13. A infringência ao princípio da moralidade administrativa constitui causa autônoma para o acolhimento da presente ação, com fulcro no art. 5º, LXXIII, da Constituição Federal (vide Mancuso, Rodolfo de Camargo, in “Ação Popular”, Editora Revista dos Tribunais, 3a. Edição, págs. 88 e seguintes – subitem ‘3.2.3.1 – A moralidade administrativa como causa autônoma’).

14. Ademais, há que se consignar que tanto o primeiro ato impugnado, quanto o segundo, prevêem suportes fáticos de efeitos concretos para a validade e a eficácia da norma regimental ora atacada, o que torna impugnáveis os atos via ação popular, por serem normas de efeitos concretos. Senão vejamos: o primeiro ato beneficia exatamente os atuais réus beneficiários que foram escolhidos sob a regras anteriores de nomeação de cargos de confiança realizados pela Presidência do STF, sendo vedada as suas exonerações ad nutum pelo futuro presidente do STF, daí a concretude do ato. Frise-se que o que está sendo impugnado são os efeitos do ato que aproveitam somente os atuais ocupantes beneficiários dos cargos comissionado em questão;

já o segundo ato atacado, cria um sigilo de votação que recai sobre a aprovação de um rol determinado de funções comissionadas dentro da Secretaria do STF, o que perfaz, também, a concretude desse ato.

15. Conclui-se, assim, que os atos impugnados se configuram como normas de efeitos concretos, com fundamento jurídico autônomo de infringência à moralidade administrativa, que tornam cabíveis a propositura da presente ação popular. Assevere-se, finalmente, que a sociedade espera de V. Exa. coragem e independência para que se retorne a normalidade do ordenamento jurídico, uma vez que “Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. … Isto porque, com ofendê-lo, abatem-se as vigas que o sustêm e alui-se toda a estrutura nelas esforçada.” (Celso A. Bandeira de Mello – in “Curso de Direito Administrativo”, Capítulo XIV, 4ª edição, fl. 409). O perigo da demora é patente razão pela qual impõe-se o deferimento da liminar.


Do Pedido

Por todo o anterior exposto, requer, se digne, a V. Exa. que :

I – promova a citação dos réus, para, no prazo legal, apresentarem contestação, sob pena de revelia e confissão;

II – a citação da União Federal, na pessoa de seu representante legal, nos termos do caput e §3º do art. 6º da Lei 4.717/65 (LAP), alertando-o que o mesmo, a seu juízo, poderá abster-se de contestar o pedido, ou atuar no pólo ativo da presente ação;

III – intime o representante do Ministério Público Federal;

IV – defira liminar (§4º do Art. 5º da LAP), inaudita altera pars,:

suspendendo os efeitos do primeiro ato impugnado;

suspendendo o segundo ato impugnado, de forma a que se retorne ao status quo ante, qual seja, a regra geral da publicidade dos atos administrativos;

V – declare a procedência do pedido, suspendendo em definitivo os efeitos dos atos impugnados e decretando, por via de conseqüência, a invalidade dos mesmos, condenando todos os réus ao pagamento dos honorários advocatícios no valor que Vossa Excelência fixar.

Dá-se a causa o valor simbólico de R$18,00 (dezoito reais).

Protesta provar o alegado por todos os meios de obtenção de provas admitidos no nosso ordenamento jurídico.

Por ser medida da mais pura e lídima justiça e que atende aos anseios da sociedade brasileira pela moralidade administrativa, pede e aguarda deferimento.

Brasília, 22 de maio de 2001.

Ricardo Luiz Rocha Cubas – OAB/DF nº 15.049

Marcelo Freitas de Souza Costa – OAB/DF nº 15.043

Relação de documentos anexos:

DOC. 01 – Comprovantes de cidadania dos autores populares

DOC. 02 – Procurações outorgadas

DOC. 03-A – Mudança regimental divulgada no site oficial do STF, contendo a justificativa para o ato

DOC. 03-B – Emenda Regimental nº 08, de 08.05.2001 (DJ eletr. no site do STF)

DOC. 04 – “Marco Aurélio é eleito presidente do Supremo Tribunal” – site do STF

DOC. 05 – “Presidente eleito do STF terá menos poderes”

Correio Braziliense de 09.05.01

DOC. 06 – “STF limita poder de Marco Aurélio”, Jornal do Brasil de 09.05.2001

DOC. 07 – “STF limita poder de presidente do tribunal”, Folha de São Paulo de 09.05.2001

DOC. 08 – “STF muda regimento interno para impedir que o novo presidente tire aposentados de cargos de confiança”, Revista Época, ed. 156

DOC. 09 – “Numa desavença rara, STF ceifa poder de seu futuro presidente”, Revista Veja, ed. 1700

DOC. 10 – “As ‘boquinhas’ do Supremo”, Jornal da Tarde, de 16.05.2001

DOC. 11 – “Nota Oficial da Anamatra”, de 10.05.2001, site oficial da anamatra

DOC. 12 – “TIROTEIO”, seção PAINEL, Folha de São Paulo, de 15.05.2001

DOC. 13 – “STF privilegia uns poucos, pune um e prejudica muitos”, texto extraído do site PrimeiraLeitura, publicado no Consultor Jurídico

DOC. 14 – “Velloso afirma que resolução não tira poder de Marco Aurélio” site do STF

DOC. 15 – “Velloso defende voto secreto nas reuniões administrativas” site do STF

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