As 'boquinhas' do Supremo

Leia o editorial do Jornal da Tarde sobre erros do STF

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17 de maio de 2001, 12h44

Numa decisão inédita na história do Supremo Tribunal Federal (STF), sete ministros mudaram o regimento da instituição só para limitar as prerrogativas de seu futuro presidente em matéria administrativa. Até o atual presidente, Carlos Velloso, foi a favor da limitação das competências de seu sucessor, Marco Aurélio de Mello.

O que motivou essa decisão, a pouquíssimos dias da troca de comando na mais alta corte de Justiça do País, não foi uma questão jurídica relevante. Foi algo prosaico e mesquinho. Como Marco Aurélio tem por norma não indicar funcionários públicos aposentados para cargos de confiança, sob o argumento de que isso é imoral, os 20 servidores do STF nessas condições, que seriam por ele afastados, mobilizaram-se para não perder a “boquinha”.

Atualmente, eles consomem R$ 299 mil mensais da folha de pagamento do STF. Com sua substituição por funcionários da ativa, esse gasto cairia para R$ 121 mil, representando uma economia de R$ 177 mil para os cofres públicos.

Mas, como esses 20 privilegiados têm relações de compadrio com os ministros, estes não hesitaram em mudar o regimento, para impedir Marco Aurélio de demiti-los, e invocar até mesmo a Constituição, para justificar esta ação entre amigos.

O mentor da mudança foi o ministro Moreira Alves, que queria preservar as mordomias de seu amigo dileto e médico particular, Célio Menecucci. Assim que se aposentou como funcionário do STF, em 1987, Menecucci foi nomeado por Moreira Alves para um cargo de confiança, duplicando seus vencimentos para continuar exercendo a mesma função. Com isso, hoje ele ganha R$ 17,8 mil, bem mais do que os próprios ministros – sem contar os vencimentos de R$ 2,8 mil da Fundação Hospitalar do Distrito Federal e os lucros de sua clínica particular.

Essa decisão é mais do que um tapa no rosto da sociedade. Além de configurar uma atitude de escárnio no trato da coisa pública, ela também retira do STF a autoridade moral para dar a última palavra, em matéria jurídica.

Como levar a sério a pompa e o latinório de ministros que se valem do formalismo jurídico para travar as medidas tomadas pelo Executivo em nome dos anseios maiores da Nação ou, principalmente, para sangrar os cofres públicos em nome da confirmação de “direitos adquiridos” por corporações privilegiadas, mesmo sob risco de implodir as finanças públicas, mas que se esquecem das mais elementares normas éticas quando julgam causas de interesse pessoal?

Como pode um país acreditar no futuro se até em sua Corte suprema os interesses pessoais prevalecem sobre as leis?

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