STF devolve a bola

Racionamento: STF devolve ao Planalto responsabilidade pela crise.

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28 de junho de 2001, 0h00

A vitória do governo no Supremo Tribunal Federal, no julgamento do plano de racionamento, por oito votos a dois surpreendeu até o mesmo o Palácio do Planalto.

A estratégia do advogado-geral da União, Gilmar Mendes, de demonstrar o estado de necessidade com mais ênfase do que o embasamento jurídico para as medidas, funcionou. O seu recuo tático, de alterar o texto original da Medida Provisória antes de apostar no “tudo ou nada” no STF deu certo. Ele ganhou.

Os ministros que deram seu aval à MP justificaram seus votos com a preocupação de que o país mergulhe no caos do apagão. Evidenciou-se que os juízes não se dispuseram a tomar das mãos do Executivo a responsabilidade pela solução da crise energética. A argumentação jurídica não ficou em primeiro plano.

Voto vencido, acompanhado pelo presidente do STF, ministro Marco Aurélio, o relator da ação, ministro Néri da Silveira, preliminarmente reconheceu a controvérsia judicial alegada pela Advocacia-Geral da União nas decisões que responderam ao grande número de ações apresentadas à Justiça contra o plano e pela insegurança jurídica gerada pelas medidas contestadas.

O ministro Néri considerou cabível o ajuizamento da ADC observando, contudo, que as oito ações declaratórias de constitucionalidade anteriores apresentadas ao STF foram movidas contra leis ou emendas constitucionais. “A Medida Provisória busca, no caso, disciplinar situação tida como de emergência”, disse.

Ao analisar a MP, porém, o relator da ação considerou constitucionalmente impossível a previsão de suspensão de fornecimento do serviço público, que entendeu como discriminação que fere o princípio da isonomia.

Ele também entendeu não haver evidência de contraprestação de serviço de energia elétrica na cobrança da tarifa especial. “Seu recolhimento comporá uma reserva para beneficiar terceiros a ser paga pelos que descumprirem as metas de racionamento”.

No entender do ministro Néri, a tarifa especial é sanção por descumprimento de medida administrativa, que não poderia ser tratada por medida provisória.

Ao acompanhar o relator, o presidente do Supremo considerou “irreal” o bônus prometido em pagamento a consumidores que gastarem menos energia elétrica do que a meta estipulada.

“A previsão do bônus é inócua porque os que hoje gastam cem quilowatts não vão alcançar a economia a não ser que fiquem na escuridão. Os que consomem acima, se alcançarem a meta de redução em 20 por cento, já vão ser verdadeira exceção e não vão reduzir o consumo além dos 20 por cento”, disse.

O ministro Marco Aurélio também julgou que a sobretarifa não poderia ser ao mesmo tempo algo que será devolvido aos usuários. “Pouco importa o rótulo. É algo criado sem a determinação da Constituição, sem lei complementar e ganha contornos de verdadeiro empréstimo”.

Em seu voto, a ministra Ellen Gracie discordou do relator, por não ver obstáculo ao regime de tarifação especial, com fixação de bônus. “As normas promovem o direito de todos os consumidores em época de escassez e evita o desbaratamento de recursos escassos.”

A ministra também entendeu não haver dupla punição na previsão de sobretarifa e de suspensão do corte de energia por descumprimento de metas. “Os pressupostos de aplicação de cada um são diversos”, afirmou.

Primeiro voto a acompanhar a dissidência aberta pela ministra Ellen Gracie, o ministro Nelson Jobim afirmou que quem ultrapassa a meta de consumo é a classe média alta e que a Medida Provisória estabelece uma política tarifária e compensações futuras.

“A sobretarifa é um mecanismo de equanimidade. Se não tivermos regras para adequar a oferta à demanda, teremos o que popularmente se denominou de apagão”.

Conforme proclamado ao final do julgamento, a decisão tem efeito vinculante e suspende os efeitos de qualquer sentença aprovada desde a edição da MP, que tenha tido por pressuposto a inconstitucionalidade dos artigos 14 a 18 da Medida Provisória.

A conclusão do julgamento se dará na sessão plenária desta sexta-feira (29/6) com o julgamento das ações diretas de inconstitucionalidade propostas pelo PSL (2.468), pela CNTM (2.470) e por quatro partidos de oposição(2.473).

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