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Artigo: É preciso mudar anteprojeto que regulamenta e-commerce.

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4 de junho de 2001, 0h00

Com o advento da Internet, como meio revolucionário de comunicação e realização de negócios, veio atrelado o problema de se adequar institutos já consolidados a uma nova realidade, agora virtual.

O Direito, enquanto ciência que visa a solução dos conflitos de interesse, não poderia pretender estar imune a estas reformulações, de forma que a edição de leis que versem sobre a nova realidade cibernética, desses já consagrados conceitos, se torna imperiosa, sob pena de se afastar do “e-commerce” o Estado que não se dispuser a tais fins.

Em um primeiro momento, deve-se ter em mente que regular as atividades realizadas no meio virtual, se difere consideravelmente de qualquer outra edição de lei que vise regulamentar matéria unicamente de âmbito interno, haja vista que quando se fala em Internet, abstrai-se da idéia de fronteiras, havendo toda uma aldeia global participando deste processo.

Desta forma, qualquer nação que pretenda editar legislação visando regular as atividades em meio eletrônico, deve buscar ao máximo a uniformidade com as leis já editadas por outros Estados, ou em modelos já elaborados, como a da UNCITRAL, a fim de que não se afaste, ou se crie óbice a este mercado que movimenta milhões em cifras diariamente.

No Brasil, ainda não há nenhuma legislação vigente acerca do tema, não obstante os expressivos valores negociados neste mercado.

Buscando se ajustar a essa nova conjuntura mundial, vem sendo elaborado no Brasil, inúmeros Projetos de Lei, visando regulamentar não só a validade do documento eletrônico, através da assinatura digital e criptografia assimétrica, como também o próprio comércio eletrônico.

Entre os projetos de lei em trâmite perante o Congresso Nacional Brasileiro, destaca-se o Anteprojeto n. 1589/99, desenvolvido pela Comissão Especial de Informática Jurídica, da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção São Paulo, e que tramita junto ao Congresso, desde agosto de 1999, por iniciativa do Deputado Federal Luciano Pizzato.

O anteprojeto, baseado no modelo da UNCITRAL e na diretriz da União Européia, dispõe sobre o comércio eletrônico, a validade jurídica do documento eletrônico e a assinatura digital.

No tocante a validade jurídica do documento eletrônico, as disposições daquele instituto são expressas ao considerar sua originalidade, sempre que for assinado pelo autor, utilizando-se da assinatura digital e do sistema de criptografia assimétrica, havendo, nestes casos, a presunção de veracidade do conteúdo do documento, em relação ao autor.

Entretanto, não se trata de presunção absoluta, sendo mister a observância de determinados requisitos, também elencados no anteprojeto, tais como; de que seja a assinatura digital única e exclusiva para o documento que foi firmado, seja possível a identificação de sua validade, que o acesso à assinatura eletrônica seja exclusivo do signatário, que esteja vinculada a totalidade do texto do documento, e que não tenha sido gerada após o prazo para a sua expiração, que segundo o instituto, será de 2 (dois) anos, na ausência de sua estipulação, quando, então, caberá à parte a quem a assinatura beneficiar comprovar que foi a mesma gerada em período anterior a expiração ou a revogação.

No concernente ao comércio eletrônico, o anteprojeto possui várias disposições que regulamentam a oferta de produtos e serviços por meio eletrônico, assegurando direitos e deveres individuais e coletivos dos consumidores.

Também merece destaque, as disposições atinentes aos provedores de acesso e armazenamento, que regra geral, ficam isentos da responsabilidade pelo conteúdo das informações movimentadas pelos seus usuários ou clientes.

Um dos pontos mais controversos do anteprojeto é indubitavelmente a questão da regulamentação da certificação digital.

As entidades certificadoras foram divididas em dois grupos; entidades certificadoras privadas, de natureza comercial, e as certificações eletrônicas por tabelião, havendo uma clara distinção entre os efeitos dos serviços prestados por elas, que teriam suas atividades sujeitas ao controle do Poder Judiciário e do Ministério da Ciência e Tecnologia.

A distinção nos efeitos das atividades das duas autoridades certificadoras pode ser constatada a partir de um paralelo entre as disposições dos arts. 24 e 25, do anteprojeto:

O art. 24 dispõe, in verbis: “Os serviços prestados por entidades certificadoras privadas são de caráter comercial, essencialmente privados e não se confundem em seus efeitos com a atividade de certificação eletrônica por tabelião, prevista no Capítulo II deste Título”.

Rege o caput do art. 25, in verbis:

O tabelião certificará a autenticidade de chaves públicas (grifo nosso) entregues pessoalmente pelo seu titular, devidamente identificado; o pedido de certificação será efetuado pelo requerente em ficha própria, em papel, por ele subscrita, onde constarão dados suficientes para identificação da chave pública, a ser arquivada em cartório”.

Assim, resta claro que a certificação realizada por entidades certificadoras particulares, embora legítima, não gera presunção de autenticidade perante terceiros, ficando a cargo exclusivo do tabelião a atividade garantidora da identidade do signatário de documento digital.

Ao conceder exclusividade ao tabelião para autenticar chaves públicas, nota-se uma clara e inequívoca contradição entre as disposições do anteprojeto e a finalidade do mesmo. Isto porque, se o objetivo é regulamentar um mercado moderno, veloz e de alta tecnologia, sendo mister que a certificação feita pelas autoridades particulares possuísse os mesmos efeitos da certificação por tabelião, haja vista que tais entidades possuem um volume de recursos muito maior do que as entidades públicas, que dificilmente conseguirão montar o aparato tecnológico necessário para acompanhar a rapidez do mercado eletrônico e seu rápido e constante desenvolvimento.

Assim, limitar a competência para autenticar a chave pública ao tabelião, consagrando o velho hábito do cartorialismo, é como criar uma barreira ao fluxo natural do próprio comércio eletrônico, o que implicaria de maneira inconteste, no afastamento do Brasil deste tão relevante mercado.

De todo o exposto, pode-se dizer que o anteprojeto é, indubitavelmente, uma obra bem elaborada, visando a disciplinar um mercado carente de regulamentação, e cuja expansão se dá a uma velocidade cada vez maior.

Entretanto, se faz necessária a modificação de algumas disposições, em especial as que tocam às autoridades certificadoras, a fim de que se possa contar com uma legislação em perfeita consonância com o mercado eletrônico e seus novos institutos.

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