Abuso sem autoridade

Subprocurador ameaçou processar Pedro Malan por vaga na CMN

Autor

22 de janeiro de 2001, 23h00

O subprocurador-geral da República Miguel Guskow, suspeito de ter ajudado o empresário Robert Whitehead, acusado de dar um golpe de US$ 10 milhões com títulos da dívida externa brasileira, ameaçou processar o ministro da Fazenda, Pedro Malan, por crime de responsabilidade, por ele ter rejeitado seus pedidos para participar das reuniões do Conselho Monetário Nacional (CMN). O órgão, entre outras atribuições, define as condições da venda dos títulos da dívida nacional no exterior.

A ameaça foi feita em ofícios enviados por Guskow desde março de 1999 na condição de coordenador da Câmara do Consumidor e Ordem Econômica da Procuradoria-Geral da República.

Nesse mesmo posto, ele assinou em fevereiro de 2000 um documento atestando a “competência profissional” de dois envolvidos no golpe com títulos da dívida externa brasileira – o norte-americano Robert Whitehaead e o brasileiro Taniel Marcolino.

O procurador-geral da República em exercício, Haroldo Nóbrega, disse que vai aguardar o retorno do chefe da instituição, Geraldo Brindeiro, para analisar a denúncia formulada pela revista Veja sobre o suposto envolvimento de Guskow com os responsáveis pelo golpe com títulos da dívida externa.

Dizendo atuar a favor do Código de Defesa do Consumidor, Guskow queria que ele ou um dos dois outros membros da câmara participassem das reuniões do CMN, ao lado dos ministros da Fazenda e do Planejamento e do presidente do Banco Central.

No primeiro ofício, enviado em março de 1999, Guskow pediu que o CMN informasse “as pautas das próximas reuniões”. Recebeu resposta negativa de José Antônio de Castro, secretário para Assuntos da Diretoria do CMN.

Em resposta, o subprocurador ampliou o pedido, solicitando, além das pautas, as datas e os locais das reuniões, “onde um dos membros dessa Câmara, no ofício da Ordem Econômica, poderá estar presente como observador, não lhe sendo legalmente oponível qualquer barreira ou sigilo”.

Dois meses depois, Guskow enviou reclamação ao procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro, pedindo sua ajuda para que ‘as nossas atribuições sejam convenientemente assimiladas pela autoridade pública (o presidente do CMN, que é o ministro Malan)’.

A situação ficou mais grave em 12 de maio de 2000, quando o subprocurador deu prazo de dez dias ao CMN para atender à sua solicitação, sob pena de processar judicialmente o ministro da Fazenda por crime de responsabilidade, previsto na Lei Orgânica do Ministério Público Federal, a lei complementar 75, de 1993.

Na avaliação do subprocurador, o ministro da Fazenda não goza de direito a foro privilegiado de julgamento em razão do cargo que ocupa. Isso porque ele estava sendo questionado na condição de presidente do CMN. Para o subprocurador, ‘presidentes de colegiados não gozam de foro privilegiado’.

Parecer da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional foi enviado no início de junho ao subprocurador. Alertava que somente o procurador-geral da República tinha competência para pedir informações oficiais a um ministro de estado.

Como o subprocurador voltou a insistir na ameaça, dando novo prazo de 10 dias para denunciar o ministro, o próprio Malan recorreu a Brindeiro no dia 31 de julho de 2000, queixando-se do subprocurador. Segundo ele, Guskow não havia analisado o parecer da procuradoria do ministério, deixando de atender ‘ao direito constitucional do devido processo legal’

Leia o ofício, na íntegra, em que o subprocurador ameaça processar Malan

Brasília-DF, 03 de maio de 1999

Ofício n° 099/99/3ªCâmara

3ª Câmara de Coordenação e Revisão

Consumidor e Ordem econômica

‘Doutor Procurador Geral da República,

‘Cumprindo as atribuições constitucionais e as legais que nos são pertinentes, retransmito a Vossa Excelência o nosso Ofício n° 39/99-3ª Câmara e a resposta oferecida no Ofício 1132/99 de 26.04.99 do Conselho Monetário Nacional (Banco Central).

‘Solicito os bons ofícios de Vossa Excelência para que nossas atribuições legais sejam convenientemente assimiladas pela autoridade pública (Presidente do CMN), a fim de que a presença de um dos membros desta 3ª Câmara seja ‘franqueada’ às reuniões daquele colegiado, não como beneplácito, mas como estrito cumprimento da lei.

‘Outrossim, informo a Vossa Excelência que qualquer Presidente de Colegiado não tem foro privilegiado, mesmo sendo Ministro de Estado, sendo que, a continuar a negativa, nos obrigará a demendá-lo perante a Justiça Federal Comum.

‘Esclareço também que, se está prevista a faculdade de ‘convidar’ qualquer pessoa (pública ou privada) pelo Presidente do CMN para participar das suas reuniões, sem que isto implique na quebra do sigilo (Decreto n° 1307/94), é totalmente destituída de fundamento a recusa da presença de membro da 3ª Câmara do MPF, que é decorrente da lei e do ofício.

O CMN é órgão público e não foi criado para ser um clube de gestão privada ou simplesmente para atender a privilégios defesos em lei.’

Atenciosamente,

Miguel Guskow

Subprocurador-Geral da República

Fonte: Jornal do Brasil

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!