Negociação coletiva

'Flexibilizar a CLT é perder a garantia de proteção da lei'

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1 de dezembro de 2001, 7h36

Está em discussão no Congresso Nacional o Projeto de Lei do Executivo que é o canhonaço de misericórdia na já moribunda CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).

Consiste em inverter o princípio de hierarquia das leis, de modo que as partes contratantes, que em Direito do Trabalho são os empregadores e seus empregados, possam pactuar livremente, sem as limitações e garantia das normas jurídicas vigentes. Dizem os seus autores que tudo fazem em nome da modernidade e do estímulo às negociações coletivas. Bah!!!

Inverte-se, assim, um dos mais basilares princípios da ciência jurídica, para o qual a lei é meramente exemplificativa de um amplo conjunto de normas éticas a ser observado, e não a enunciação taxativa de tudo o que pode ser feito e do que é proibido fazer.

Na legislação trabalhista esse ditame se expressa através do artigo 444 da CLT, que faculta (e ao facultar estimula) a contratação em condições além do mínimo legal. Vale dizer mais favoráveis ao trabalhador, ao qual a lei assegura o patamar menor das garantias.

Esse princípio, se aprovado o esdrúxulo projeto, passará a ser o seu próprio avesso, uma vez que as partes poderão pactuar condições de trabalho sem a proteção da lei (a isso estarão estimuladas) que uma vez realizadas revogam as normas específicas.

Dizem os iluminados autores da proposta que, modernamente, as conquistas sociais devem fluir de negociações livres entre empregados e empregadores. Eles certamente esquecem que as disposições em vigor resultam de séculos de negociações, impasses e conflitos e que, o fato de, no Brasil se revelarem predominantemente através da lei, além de não ser inusitado, é desejável. Afinal, a lei, tanto quanto os contratos, compõem formas de atuação do mundo civilizado.

Mudando o que deva ser mudado, querem os sábios convencer o credor, titular de crédito por decisão judicial transitada em julgado (a sentença é lei entre as partes), a renunciar aos efeitos do julgado para negociar, novamente, a disposição de quitá-lo. No todo ou em parte, onde, e quando……

Vale notar que ninguém de boa intenção é contrário à negociação coletiva. Todos a desejam e praticam, desde que a ordem jurídica assegure condições de seu exercício.

Porém, estas devem versar o não obtido, ou seja; aquilo que o artigo 444 da CLT sugere e é aplicável tanto aos pactos individuais quanto aos contratos coletivos de trabalho. É assim que se faz e sempre se fez no curso da história: um processo permanente de estender às grandes maiorias o que, para poucos, é relativamente fácil de ser obtido.

A contrário senso, ora flexibilizando e ora renunciando, estaremos invertendo a direção da vontade social, que ao invés de perseguir condições reais de negociação coletiva, vai acabar encontrando quem projete a renúncia aos consectários da Lei Áurea, que, afinal, é lei.

E dirão os fundamentalistas do liberalismo que o certo será negociar com os Senhores de Engenho a reconquista da liberdade formal.

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