Procon perde

Veja decisão que suspende retirada de produtos das prateleiras

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30 de agosto de 2001, 18h19

Sem dar direito de defesa à empresa, baseando-se apenas em notícias, o Procon não pode determinar a suspensão da venda de produtos alegando suposta “maquiagem”.

O juiz da 5ª Vara da Fazenda Pública de Belo Horizonte, Afrânio Vilela, suspendeu a determinação de retirada de produtos que estariam com peso reduzido das prateleiras dos supermercados. É a primeira vez que a Justiça de Minas interfere em uma decisão do Procon.

O Mandado de Segurança foi proposto pela empresa Karambi Alimentos, representada pelo advogado Felipe Vidigal de Andrade Serra, do escritório mineiro Benício de Paiva.

Ao conceder a liminar, o juiz entendeu que a determinação foi proferida pelo Procon quando sequer havia processo administrativo, como prevê a lei.

Segundo o advogado, a determinação do Procon de Minas Gerais violou a Constituição Federal. “Especialmente ao afrontar o princípio do contraditório e ampla defesa, além do princípio do devido processo legal, uma vez que sequer foi concedida qualquer oportunidade de resposta da empresa”.

Veja a decisão.

Processo nº 024.01.084.987-5

Poder Judiciário do Estado de Minas Gerais

Justiça de 1ª Instância

Vistos, etc…

1. Karambi Alimentos Ltda. impetrou Mandado de Segurança contra ato do Sr. Promotor de Justiça do Procon Estadual., Especializado na Área de Alimentos, Dr. Amauri Artimos da Matta, afirmando ilegal e inconstitucional a decisão materializada no Oficio datado de 21 de agosto de 2001, onde a Autoridade Impetrada determinou a imediata retirada das prateleiras no âmbito do Estado de Minas Gerais, o extrato de tomate pesando 350 gramas, cujo nome de fantasia é “Colonial”, o qual é produzido e comercializado pela Impetrante. Comenta, ainda, que não teve direito de defesa sob contraditório e, por isso, requer liminar para não se ver submetida à exigência de retirada sumária de seus produtos de todos os estabelecimentos comerciais mineiros, na forma determinada, de forma que possa continuar a comercializar seus produtos, até decisão final.

Vistos, relatados e examinados, decido.

2. Para decisão do pedido de liminar, mister analisar os fundamentos da decisão atacada, que se encontra à f. 14/19, e nela verifico que a Autoridade Impetrada, antes mesmo de instaurar o competente processo administrativo, determinou:

“a) em sede cautelar, e na defesa dos consumidores, a imediata suspensão de fornecimento dos alimentos acima referidos, no âmbito do Estado de Minas Gerais, cuja medida deve ser executada, diretamente, pelos fabricantes, supermercados e estabelecimentos comerciais.”

Sua Senhoria, baseou sua decisão Administrativa em pesquisa realizada pelo Combativo Movimento das Donas de Casa deste Estado, argumentando que o fato foi obtido a partir da informação retro, confirmada pelo Setor de Fiscalização do Procon Estadual.

A prova e, para tanto, documental, para efeito desta analise inicial.

2. Efetivamente, a situação colocada nos autos é complexa, pois de um lado es’ta o Procon Estadual, por Representante do Ministério Público, todos profundamente conhecedores das Leis e, especialmente, da Carta Magna. De lado outro, um produtor de alimentos, que busca a tutela jurisdicional, visando suspender um ato, que aponta inconstitucionalidade.

De simples compulsar dos autos, vejo que está presente o “fumus boni Juris”, para fins de apreciação de liminar, primeiro, porque a determinação da imediata suspensão de fornecimento do produto e a ordem para que todos os fabricantes, supermercados estabelecimentos comerciais a cumpram, foi proferida pela autoridade impetrada quando, sequer, havia processo administrativo, previsto pela Lei, tanto assim que a ordem foi dada no item “a” e o comando para instauração do devido processo legal veio na letra “b”, por óbvio, subseqüente.

Segundo, porque, a principio, uma decisão, deve, pelo menos, ser prolatada em processo já regulamente instaurado; jamais previamente. Mister seja formalizada a conduta tipificada no artigo 5º, LIV da Carta Federal, eis que “ninguém será privado de seus bens sem o devido processo legal.”

Ademais, pelo que existe até o momento, vê-se que a decisão do ilustre Impetrado foi baseada em prova por ele mesmo colhida e sem se dar oportunidade de defesa, ou mesmo de mera explicação, à Impetrante, que, viu-se desapossada de seu produto comercial.

O “periculum in mora” reside na retirada dos produtos que já vem sendo, sistematicamente, feita diante da ordem da Autoridade Impetrada, o que pode causar prejuízos irreversíveis a Impetrante, pois se afinal não provada a imputação à recuperação financeira será morosa, inclusive através de manejo de ação contra o Poder Público, com todas as características desse procedimento.

De lado outro, a permanência dos produtos em exposição nenhum dano acarretará aos consumidores que, se assim quiserem, simplesmente não optarão pela marca comercializada pela Impetrante, sendo esta uma regra de mercado de consumo.

Justifico, ainda, que a ordem atacada, face à abrangência imposta pela Autoridade Impetrada, pode acarretar prejuízos não só a impetrante como para terceiros, direta ou indiretamente, trabalham com a marca.

Por fim, de se registrar que se provada a acusação, dentro do devido processo legal, com ampla defesa, o Procon poderá tomar medidas legais, bem assim impor a pena já reservada para esta situação, punindo, exemplarmente, o mal comerciante.

Todavia, antecipar uma pena, quando sequer instaurado o processo devido, é, a principio, fundo de direito, apto a ensejar a suspensão do ato, até que a situação melhor se defina, através do julgamento tanto administrativo, que por certo ocorrera, como deste “mandamus”.

3. Isto posto, defiro a limiar requerida pela Impetrante e suspendo a decisão administrativa cautelar firmada pela Autoridade Impetrada que determinou a suspensão de fornecimento do alimento produzido pela Impetrante, até ulterior decisão deste Mandado de Segurança.

Notifique a Autoridade Impetrada para, querendo, venha prestar suas informações no decêndio legal.

Intime.

Belo Horizonte, 23 de agosto de 2001.

Juiz José Afrânio Vilela

5ª Vara de Fazenda Pública e Autarquias

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