Serviço não é comércio

'Planos de Saúde não precisam contribuir com Sesc, Senac e Sebrae'.

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16 de agosto de 2001, 10h02

As Operadoras de Planos de Saúde estão desobrigadas de recolherem contribuições destinadas ao Sesc, Senac e Sebrae, totalizando um benefício fiscal de 3,1% da folha de salários, equivalente ao valor cobrado mensalmente pelos três tributos, além de ter a possibilidade de compensar o indevidamente recolhido nos últimos 10 anos.

As operadoras são prestadoras de serviços e como tal, é uma atividade relacionada às determinações e necessidades do cliente, já a atividade comercial e industrial está vinculada a uma obrigação de oferecer um produto industrializado, produzido em massa, em série, sem considerar as especificações, determinações e necessidades dos clientes, apuradas de forma individualizada, com posterior atividade mercantil representada na forma de comercialização de bem móvel.

Este foi o entendimento do MM. Juiz de Direito da 21ª Vara da Justiça Federal de São Paulo, a saber:

Estabelecimento comercial pode ser entendido como sendo o conjunto de bens operados pelo comerciante, sendo que este se dedica, em caráter profissional a circulação de bens, praticando esta atividade com o intuito de lucro. A autora comprova, de acordo com o contrato social acostado aos autos ser uma prestadora de serviços, não se enquadrando desta forma com o contido na legislação que instituiu a contribuição ao Sesc, ao Senac, motivo pelo qual não pode se submeter à cobrança de tal contribuição de interesse de categoria profissional ou econômica.

No tocante a diferença entre industrialização e prestação de serviços, deve também ser transcrita a lição de Marçal Justen Filho citada pelo jurista José Eduardo Soares de Melo:

Entende que industrializar, em suma, é conceito que reúne dois requisitos (aspectos básicos e necessários, quais sejam: a) alteração da configuração de um bem material b) padronização e massificação.

No tocante à prestação de serviços, no seu sentir, ocorre o oposto, a produção de utilidades – de regras irrepetíveis (no sentido da impossibilidade de, uma vez esgotado o serviço, ser ele reiterado de modo exatamente idêntico).

(…)

A nota característica do serviço é a sua individualidade, onde cada serviço é um serviço, na acepção de haver em cada oportunidade, uma identidade inconfundível e irreparável: enquanto que cada produto industrializado é uma espécie de um gênero que se destina a ser ilimitado quantitativamente.”

Por sua vez, as contribuições ao Sesc, Senac, foram criadas com a finalidade de obter recursos das áreas do comércio, promovendo cursos de aprendizagem e outras atividades em favor dos comerciários, já o Sebrae foi instituído para auxiliar o desenvolvimento das pequenas empresas. Dessa forma, fica evidente a impossibilidade das prestadoras de serviços serem compelidas a recolher tais exações, por se tratar de contribuições de interesse de categoria profissional.

Abaixo, transcrevemos a decisão proferida pela MM. Juíza da 8ª Vara Federal de São Paulo, Dra. Lesley Gasparini, a saber:

“Todos os tributos devem ter um supedâneo na Constituição Federal e tal entendimento não é diferente para as contribuições sociais – tributos para fiscais. Prescreve o artigo 149 da Constituição Federal que a União pode instituir contribuições visando a preservação de interesses de categoria profissional ou econômica, logo se as contribuições ao Sesc e Senac foram instituídas, pela União, para atender aos interesses específicos dos comerciários, não poder ser exigidas de outros seguimentos, tais como das prestadoras de serviços. A respeito destas contribuições, o Prof. Hugo de Brito Machado, ensina: “em se tratando de contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas, é razoável entender-se que o contribuinte deve ser a pessoa física ou jurídica, integrante da categoria profissional ou econômica. Pessoa que não integra qualquer uma dessas categorias não deve ser compelida a contribuir no interesse das mesmas.” (Curso de Direito Tributário, 10ª ed. Ed. Malheiros, 1995, p. 317)”.

Peço vênia, neste momento, para incluir aqui outras contribuições, que devem ter o mesmo tratamento, a exemplo das contribuições Sebrae e Sesi. São, também, contribuições paraestatais instituídas com interesse específico da categoria profissional, econômica ou do ramo das pequenas e médias empresas, não podendo, desta feita, serem exigidas de entidades que não serão beneficiadas com o recolhimento, como bem ensinou o Pro. Hugo de Brito Machado.”

Diante dos fatos, verifica-se a total impossibilidade das prestadoras de serviços serem consideradas como sujeito passivo dos tributos em tela, ante a inexistência de qualquer justificativa de financiamento da seguridade social, pois este financiamento já é realizado através do pagamento dos tributos previstos no inciso I do artigo 195, além da exação instituída como nova fonte de custeio pela Lei Complementar nº 84/96.

Além de todos os fatos elencados acima, existem mais dois argumentos, cuja inteligência vem da nova Regulamentação dos Planos de Saúde e produtos similares, quais sejam:

1) Nos termos do Artigo 2º da Lei nº 10.185, de 12 de fevereiro de 2001,

“Para efeito da Lei nº 9.656 (que regulamenta o sistema de saúde), de 1998, e da Lei nº 9961 (que criou a Agência Nacional de Saúde), de 2000, enquadra-se o seguro saúde como plano privado de assistência à saúde e a sociedade seguradora especializada em saúde como operadora de plano de assistência à saúde (grifamos e negritamos).

2) Não bastasse o articulado no item anterior, a Lei nº 9.961, de 28/01/2000 (que instituiu a ANS), com redação dada pela MP 2177-43, de 27/07/2001, e colocam numa mesma vala, todos os produtos que oferecem garantia de prestação de serviço de saúde, desde seguro, plano até cartão de descontos, conforme se desprende da própria legislação específica (parágrafo 4º do 4º Art. Lei 9.961/00) literalmente transcrita literalmente abaixo:

“Estão subordinados às normas e à fiscalização da ANS quaisquer modalidades de plano, produto, serviço, contrato ou correlato que ofereçam garantia de prestação de serviço de saúde especializado, específicos ou auxiliares, para utilização futura ou eventual, tais como: cartão de desconto, cobertura de procedimento ou doença específica, UTI móvel ou remoção, cuidados domiciliares, dentre outros, conforme disciplinamento específico da ANS.”

Conforme se nota, não é permitido aos olhos do Princípio da Isonomia, consagrado na nossa Carta Magna, tributação diferente para produtos com a mesma conceituação, as mesmas normas de vigência e fiscalização, principalmente com o mesmo objeto fim.

Isto posto, uma vez que as Seguradoras não contribuem (como, aliás, não devem contribuir) com o Sesc, Senac e o Sebrae, não é justo nem legal, que as Operadoras de Planos de Saúde – OPS, onerem seus produtos em 3,10%, sobre o valor de sua folha de pagamento, como ocorre atualmente.

Diante dos argumentos acima expostos, resta claro que as prestadoras de serviços, em especial as Operadoras de Planos de Saúde, não devem ser compelidas ao recolhimento destinado ao Sesc, Senac e Sebrae.

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