Concurso para juiz

Justiça Federal nega liminar para anular concurso para juiz no PR

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26 de abril de 2001, 0h00

A Justiça Federal negou o pedido de liminar para anular o concurso público para juiz federal substituto da 4ª Região, em Paranaguá (PR). A decisão é da juíza Ana Beatriz Vieira da Luz. O pedido para a anulação havia sido feito em ação popular impetrada pela advogada Marineide Spaluto. Segundo ela, de 49 aprovados, 20 sequer foram classificados na fase preliminar.

De acordo com a juíza, “não há lesividade presumida nos alegados vícios, já que o interesse público exige a ampla participação em concursos”. Segundo Ana Beatriz, “seria desejável que todos pudessem prosseguir nas demais fases da seleção para ao final escolher-se os que se mostrassem aptos; no entanto, por critérios de conveniência administrativa é definido um limitador”.

A advogada interpôs embargos de declaração que foram protocolizados na Justiça contra o indeferimento da liminar.

Veja a decisão da juíza que indeferiu a liminar

JUSTIÇA FEDERAL DA 1ª VARA FEDERAL DE PARANAGUÁ/PR

Trata-se de pedido de liminar em ação popular proposta por Marineide Spaluto contra a União, o Presidente do TRF da 4ª Região e outros, visando à suspensão da nomeação e posse dos candidatos aprovados no IX Concurso Público para Provimento de Cargos de Juiz Federal Substituto da 4ª Região, ao argumento de nulidade do certame.

Alega, em síntese, que o Regulamento do Concurso, aprovado pela Resolução n.3, de 31 de março de 2000, do Conselho de Administração da TRF da 4ª Região, previa que somente seriam convocados para a segunda etapa do concurso os 120 primeiro candidatos, bem como os que empatassem nesta última colocação.

Ocorre que a Comissão anulou 04 questões da primeira prova e, em razão disso, a denominada “nota de corte” passou a não mais ser de 68 e sem de 71 pontos. No entanto, ao invés de serem aprovados apenas os 120 primeiros candidatos como previa o edital, a Comissão entendeu por aprovar também aqueles candidatos que obtiveram 68 pontos, relacionados na lista de aprovados inicial.

Asseverou a existência de vício no ato praticado pela Comissão de Concurso principalmente pela alteração dos critérios de classificação sem aprovação do Conselho de Administração do TRF/4ª Região e após a divulgação dos resultados.

É a síntese da inicial.

Decido.

Não vejo presentes os requisitos autorizadores da concessão da medida liminar pleiteada. Com efeito, ainda que o Edital não seja claro a respeito do procedimento a ser adotado no caso de questões anuladas, é certo que não veda o procedimento de “cortes” utilizado IX Concurso Público para provimento de cargos de Juiz Federal Substituto da 4ª Região, sendo, portanto, no máximo, omisso. E em havendo omissão, ela foi suprida pelo Conselho da Administração e não, como alega a autora, pela Comissão Examinadora.

O Presidente da Comissão Examinadora apenas “torna pública” a relação dos candidatos classificados, cuja homologação é feita pelo Conselho da Administração. Ainda que no final do certame, é o Conselho que decide acerca da classificação e aprovação relatada pela Comissão Examinadora. Dessa forma, acolhe não só o resultado final, mas também o de todas as etapas anteriores do concurso.

De outra parte, não vejo tampouco lesividade presumida nos alegados vícios, já que o interesse público exige a ampla participação em concursos. Seria desejável que todos pudessem prosseguir nas demais fases da seleção para ao final escolher-se os que se mostrassem aptos; no entanto, por critérios de conveniência administrativa é definido um limitador. O critério de corte na forma como foi adotado pela Comissão ampliou o número de candidatos para a segunda fase e não o restringiu. Assim, a participação foi mais democrática e menos restritiva, não sendo razoável atribuir-se a pecha de “lesivo” ao ato que entendeu por manter os primeiros cento e vinte candidatos aprovados e mais aqueles que, após a anulação das questões, foram incluídos no resultado oficial. É bom lembrar que, em que pese parte da doutrina entender que o art. 4º da LAP trata de lesividade presumida, há real possibilidade, no caso concreto, de ser afastada essa presunção no decorrer da instrução.

O periculum in mora milita em favor dos réus. Acaso a liminar fosse concedida antes da regular instrução do feito, os prejuízos morais e materiais seriam imensos e irreversíveis; e não só para os réus como também para toda a sociedade que ficaria privada de uma melhor prestação jurisdicional. Nem se alegue que os candidatos não estariam qualificados para o exercício da função pois, como dito no início desta decisão, o sistema de cortes adotado tornou a seleção dos futuros magistrados ainda mais rigorosa e acirrada.

Por essas razões seria totalmente desproporcional a suspensão liminar de um concurso que atendeu ao interesse público de forma irretocável.


INDEFIRO, pois.

Cite-se os réus como requerido.

Notifique-se o MPF.

Intimem-se.

Paranaguá, 20 de abril de 2001.

Ana Beatriz Vieira da Luz

Juíza Federal

Veja o recurso impetrado pela advogada contra o indeferimento da liminar

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA 1ª VARA FEDERAL DE PARANAGUÁ/PR

MARINEIDE SPALUTO, já qualificada, nos presentes autos de Ação Popular autuados sob nº 2001.70.08.002023-4, em que contende com UNIÃO E OUTROS, postulando por si, em favor da sociedade, vem, mui respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, interpor recurso de

EMBARGOS DECLARATÓRIOS contra r. decisão de indeferimento da liminar, com suporte no art. 535 e seguintes do Código Processual Brasileiro, na forma das razões inclusas, e expor e requerer o que se segue.

Paranaguá, 25 de abril de 2001.

MARINEIDE SPALUTO

OAB/PR Nº 10937

DAS RAZÕES RECURSAIS

“…é absurdo falar-se em interesse público à margem da lei. Por definição, o que não aparece como legal é um malefício, e não um interesse público”. Celso Antônio Bandeira de Mello, in Curso de Direito Administrativo, pág. 552, 13ª Edição.

ÍNCLITO JULGADOR !

Vossa Excelência houve por bem indeferir a liminar requerida, ao fundamento de que não estão presentes os pressupostos necessários para o deferimento.

Contudo, analisando-se detidamente as razões deduzidas por Vossa Excelência, a autora popular não pôde deixar de constatar omissão, obscuridade e contradição no r. decisório, defeitos estes que devem ser expungidos, de modo a viabilizar o acesso às instâncias superiores.

A autora popular impetrou a presente ação popular, requerendo a anulação do IX concurso público para provimento de cargos de Juiz Federal Substituto da 4ª Região e, liminarmente, a suspensão imediata das nomeações dos “candidatos aprovados”, de modo a impedir lesão ao patrimônio moral e material da União.

Para tanto, teceu os seguintes argumentos:

1) A Comissão do Concurso, desviando-se do Regulamento, convocou para a segunda fase, aproximadamente, duzentos e cinqüenta bacharéis em direito, quando, em verdade, somente os 120(cento e vinte) primeiros poderiam ter prosseguido na forma do artigo 17 do Regulamento.

Houve violação ao Regulamento. A Comissão não o pode desrespeitar. Por mais forte motivo, quando não é ela quem o elabora. O Edital, o Regulamento é a lei interna da concorrência.

2) ainda que pudesse modificá-lo, não o poderia fazer, após a divulgação dos resultados, e sem a devida publicação na imprensa oficial, sob pena de restarem malferidos, entre outros, os princípios da legalidade, moralidade, e impessoalidade.

3) o concurso é nulo, pois, houve quebra da isonomia. Para agravar a situação, 20(vinte) CANDIDATOS REPROVADOS na prova seletiva, constam na relação final, homologada pelo Conselho de Administração do TRF/4ª Região, que teve o desplante de dizer que o homologava “nos termos do Regulamento”.

Pois bem.

A decisão de Vossa Excelência olimpicamente ignorou a inicial.

Preliminarmente,

DA ADMISSIBILIDADE DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO TIRADOS CONTRA DECISÃO INTERLOCUTÓRIA

O Superior Tribunal de Justiça – Tribunal encarregado da uniformização da interpretação da legislação federal – superando dissensões antigas, pacificou o entendimento de que é cabível interpor embargos de declaração em face de decisões interlocutórias que padeçam dos vícios noticiados no art. 535 do Código de Processual Brasileiro.

A autora traz à colação a ementa do julgado, da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, que pôs fim à discussão, in verbis:

PROCESSUAL CIVIL – DECISÃO INTERLOCUTÓRIA – EMBARGOS DECLARATÓRIOS – CABIMENTO – INTERRUPÇÃO DO PRAZO RECURSAL – APRESENTAÇÃO POSTERIOR DO AGRAVO – VALIDADE – GARANTIA MAIOR DA FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS – DOUTRINA – PRECEDENTES – EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PROVIDOS – Os embargos declaratórios são cabíveis contra qualquer decisão judicial e, uma vez interpostos, interrompem o prazo recursal. A interpretação meramente literal do art. 535 do Código de Processo Civil atrita com a sistemática que deriva do próprio ordenamento processual, notadamente após ter sido erigido a nível constitucional o princípio da motivação das decisões judiciais. (STJ – ED-REsp 159317 – DF – C.Esp. – Rel. Min. Salvio de Figueiredo Teixeira – DJU 26.04.1999 – p. 36)

Vencida esta questão preliminar, passemos às razões.

INTRODUÇÃO

VOSSA EXCELÊNCIA BEM SABE QUE NÃO É QUALQUER FUNDAMENTAÇÃO QUE ATINGE O ESCOPO VISADO PELO CONSTITUINTE NO ART. 93, IX, DA CONSTITUÇÃO DA REPÚBLICA. O PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO IMPÕE QUE A FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS SEJA NÃO SOMENTE SUFICIENTE, MAS, TAMBÉM, PERTINENTE. OS JURISDICIONADOS TÊM O DIREITO À ADEQUADA FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS; POIS, SE REALMENTE VIVEMOS NUM ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO; SE REALMENTE SOMOS UMA REPÚBLICA; SE, DE FATO E DE DIREITO, TODO PODER EMANA DO POVO, É SUMAMENTE INADMISSÍVEL QUE UMA DECISÃO JUDICIAL, SOB VESTES FORMAIS, SEJA NÃO A EXPRESSÃO DO DIREITO APLICÁVEL À ESPÉCIE, MAS, SIM, A VONTADE ARBITRÁRIA DO JULGADOR, AGINDO COM DOLO DE PREJUDICAR A PARTE. O JUIZ QUE ASSIM AGE TRAI, DA MANEIRA MAIS COVARDE, A PRÓPRIA SOCIEDADE QUE, UM DIA, PROCLAMOU DEFENDER, VILIPENDIA A CONSTITUIÇÃO QUE, UM DIA, AFIRMOU RESPEITAR….


Feito este intróito, vamos, um a um, apontando os defeitos da decisão liminar.

DA OBSCURIDADE

Vossa Excelência afirma que “Com efeito, ainda que o Edital não seja claro a respeito do procedimento a ser adotado no caso de questões anuladas, é certo que não veda o procedimento de “cortes” utilizado no IX Concurso para provimento de cargos de Juiz Federal Substituto da 4ª Região, sendo, portanto, no máximo, omisso. E em havendo omissão, ela foi suprida pelo Conselho da Administração e não, como alega a autora, pela Comissão Examinadora”.

Concessa maxima venia, o trecho é bastante obscuro e está em desconformidade com os elementos trazidos aos autos. O que Vossa Excelência chama, em linguagem bastante arrevesada, de procedimento de “cortes” não é outra coisa, senão o critério de classificação na prova seletiva. E se alguma omissão há no regulamento ela diz respeito, tão-somente, à possibilidade de a Comissão do Concurso anular questões da prova seletiva, e, posteriormente, atribuir a todos os candidatos os pontos relativos às questões anuladas. Realmente, o regulamento, em momento algum, confere à Comissão o poder de anular questões imprestáveis. Diga-se, contudo, a bem da verdade, que nunca, em concurso algum, negou-se tal poder à Banca Examinadora, ainda que o Regulamento seja omisso.

Agora, não há omissão quanto ao procedimento de “cortes”: basta ler o artigo 17 do Regulamento. O regulamento, obviamente, veda qualquer procedimento de “cortes” que não seja o estampado no artigo 17, exatamente, o contrário do sustentado por Vossa Excelência. Seria absurdo até imaginar um concurso em que o Edital ou Regulamento silenciasse sobre os critérios de classificação em cada etapa. Nenhum regulamento de concurso algum no mundo é silente sobre os critérios de aprovação nas sucessivas etapas.

Vê-se, neste ponto, que é obscura a decisão, ao dizer que: “ainda que o Edital não seja claro a respeito do procedimento a ser adotado no caso de questões anuladas, é certo que não veda o procedimento de “cortes” utilizado no IX Concurso para provimento de cargos de Juiz Federal Substituto da 4ª Região, sem, portanto, no máximo, omisso”. Vossa Excelência reputa omisso o Regulamento quanto ao procedimento de “cortes”, quando, por óbvio, se omissão há, ela é relativa à faculdade outorgada à Comissão de proceder anulação de questões. Como há confusão, neste particular, cumpre esclarecer o que Vossa Excelência entende por procedimento de “cortes”, evidenciando, afinal de contas, de qual omissão padece o Regulamento, e como e de que forma o procedimento de “cortes” se relaciona com o critério de classificação na prova seletiva estampado no artigo 17 do Regulamento.

Este o primeiro defeito a ser superado.

DA OMISSÃO SOBRE PONTO RELEVANTE – PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE

Em outra passagem, Vossa Excelência afirma:

“O Presidente da Comissão Examinadora apenas “torna pública” a relação dos candidatos classificados, cuja homologação é feita pelo Conselho da (sic) Administração. Ainda que no final do certame, é o Conselho que decide acerca da classificação e aprovação relatada pela Comissão Examinadora. Dessa forma, acolhe não só o resultado final, mas também o de todas as etapas anteriores do concurso”.

Vossa Excelência entende que o fato de o Conselho de Administração ter homologado o resultado final do concurso, sanou qualquer vício anterior que pudesse haver. Deste modo, ainda, que o Edital nº 04 de 03 de agosto de 2000 não tenha sido subscrito pelo Conselho de Administração da 4ª Região, o assentimento posterior significou que tudo “correu bem”.

Contudo, na trilha eleita por Vossa Excelência, há omissão sobre ponto relevantíssimo, a saber: juridicamente, como é possível adotar um critério de classificação estranho ao certame e que nunca foi revelado aos candidatos, sem que seja necessário oficialmente divulgá-lo? Ainda que se entenda que o Conselho de Administração, ao homologar o resultado final do concurso, sanou o vício de competência, seria juridicamente válido que o critério de classificação fosse mudado sem que os candidatos fossem informados a respeito?

É claro que compete ao Conselho de Administração modificar o regulamento e ele pode fazê-lo inclusive durante o transcorrer do certame, desde que preservados os princípios administrativos. Sem entrar, ainda, na questão atinente à modificação posterior à divulgação dos resultados, Vossa Excelência deve dizer, juridicamente, como seria possível retificar, alterar o Regulamento, num ponto tão importante quanto aos critérios de classificação, sem que os candidatos fossem informados a respeito e sem que tal omissão implicasse infringência ao princípio da publicidade? Pode, então, no entender de Vossa Excelência, a Administração agir de forma sorrateira e quando, demandada em juízo, afirmar, que alterou tudo direitinho, que fez tudo certinho, só não trouxe a conhecimento do público, porque razões de interesse público não a permitiram agir de tal forma?


Excelência, não é por outro motivo que o Presidente do Conselho de Administração do Tribunal Regional Federal da 4ª Região integra o pólo passivo da presente lide. Isto porque, falaciosamente, diz o Edital nº 10 de 26 de março de 2001 que: O JUIZ MANOEL LAURO VOLKMER DE CASTILHO, PRESIDENTE DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO, em exercício, no uso de suas atribuições legais e tendo em vista os termos do Regulamento do Concurso, TORNA PÚBLICA a classificação dos candidatos aprovados no IX Concurso Público para Provimento de Cargos de Juiz Federal Substituto, homologada pelo Conselho de Administração na Sessão Extraordinária realizada no dia 26 de março de 2001.

Óbvio que a relação dos aprovados não está em conformidade com os termos do Regulamento do Concurso, tendo o Sr. Manoel Lauro Volkmer de Castilho feito “vistas grossas” para a nulidade absoluta do concurso.

Portanto, ainda, que o vício de competência tenha sido sanado – no sempre respeitável ponto de vista de Vossa Excelência – como a ausência de publicidade é defeito que, por si só, pode fulminar de nulidade absoluta o ato administrativo, cumpre que haja pronunciamento judicial a respeito.

Este o segundo defeito a ser superado.

DO MANIFESTO EQUÍVOCO DA DECISÃO

A autora acredita que, por um lapso de memória, Vossa Excelência não lembrou, ao prolatar a r. decisão, dos arts. 127, CPC e 37, “caput” da Constituição da República, que dizem respectivamente:

Art. 127. O juiz só decidirá por eqüidade nos casos previstos em lei.

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência…

À vista destas disposições normativas, Vossa Excelência bem sabe que a lide deve ser apreciada não sob um ponto de vista leigo, mas desde uma perspectiva jurídica.

Assim, pouco importa qual foi o intuito da Comissão, se estava de boa-fé ou não, se tal agir implicou maior concorrência, se “a participação foi mais democrática”, tudo isto é muito bonito, porém, juridicamente, desprezível, quando se tem em mente, que, em matéria de Direito Público, o administrador público não pode fazer aquilo que lhe pareça certo, mas deve fazer somente aquilo que é juridicamente permitido que seja feito. Não pode agir praeter, extra, ultra, contra legem, mas, tão-somente, secundum legem.

Doutro vértice, Vossa Excelência só pode decidir com base na eqüidade quando houver expressa permissão legal. Seria ridículo que o administrador, devendo agir sempre secundum legem, quando desrespeitasse a lei, e tivesse que se explicar em Juízo, contasse com juízes “alternativistas”, capazes de engolir “qualquer abobrinha” sob a denominação de interesse público. Seria o fim do regime jurídico-administrativo!!! Os administradores não mais respeitariam o princípio da estrita legalidade, pois, fariam qualquer coisa que lhes parecesse o certo, e, quando tivessem que se defender, diriam que tiveram em mira o “interesse público”.

Como o juiz só decidirá por eqüidade nos casos previstos em lei e, no Direito Administrativo, a eqüidade está totalmente proscrita, pois, a uma, vige o princípio da estrita legalidade e, a duas, não há lei que autorize o Juiz a decidir com base na eqüidade litígios decorrentes de concursos públicos, Vossa Excelência deverá integrar a decisão, abordando, desta vez, sob um prisma jurídico consistente, outro relevante ponto omitido, qual seja:

Como é possível, validamente, alterar os critérios de classificação depois de, identificadas as provas e conhecidos os aprovados, sem que isso implique ofensa aos princípios da isonomia e moralidade?

E para clarear as idéias, a autora popular resume a narrativa dos fatos.

Divulgados os resultados, a Comissão tem em mãos a relação com a nota de todos os candidatos. Anuladas as questões, a Comissão recebe nova lista, com a classificação definitiva dos candidatos. A Comissão vê quem são os novos 120(cento e vinte) primeiros. A Comissão sabe que deve chamar os 120(cento e vinte) primeiros. Porém, opa!! alguém ficou “de fora”. E voilá: inventa-se um critério de classificação de última hora para que haja uma “participação mais democrática”.

Ninguém aqui foi beneficiado em prejuízo de outros? A Comissão não sabia quem seriam os beneficiados? Quisesse aumentar a concorrência, por que a Comissão não chamou mais e mais bacharéis? Mesmo sabendo a Comissão que estava desrespeitando o Regulamento e quem seriam os candidatos beneficiados, ainda, assim, a Comissão agiu de forma neutra e imparcial, não ferindo o princípio da isonomia? Por que, em fases subseqüentes, a Comissão abandonou o seu lema “da participação mais democrática” e reprovou candidatos que legitimamente passaram na fase seletiva e aprovou candidatos que sequer passaram na prova preambular? Por que a Comissão ignorou os critérios de classificação, tão-somente, em relação a alguns candidatos e não em relação a outros?


Vossa Excelência tem que enfrentar todas estas questões para que a autora popular tenha condições de saber por que, afinal de contas, não está presente o fumus boni juris.

Este é o terceiro defeito a ser superado.

DA POSSIBILIDADE EXCEPCIONAL DE DAR EFEITOS MODIFICATIVOS AO JULGADO

A autora não vê como contornar todos os defeitos do decisum, sem emprestar-lhes efeitos modificativos. Quer crer a autora popular que a decisão teratológica exarada é fruto da excessiva carga de trabalho que acomete os nobres Juízes Federais.

Como Vossa Excelência não lembrou dos dispositivos normativos retro apontados (art. 37, “caput” e art. 127, CPC), acabou por proferir decisão manifestamente equivocada, porquanto, adotou como razões de decidir, um juízo de eqüidade que somente é exercitável pelo Magistrado, quando houver autorização legal – autorização esta que não se faz presente, pois, se está diante de causa sob o manto irrestrito do Direito Administrativo, que tem como princípio e norte inafastável o princípio da legalidade – cumpre que Vossa Excelência, analisando as questões postas, dentro dos lindes legais, corrija os defeitos da decisão, integrando-a e manifestando-se sobre todos os pontos omitidos.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no tocante à possibilidade de conferir excepcionalmente efeitos modificativos ao julgado, em embargos declaratórios, quando a decisão recorrida recai em manifesto equívoco, a saber:

PROCESSO CIVIL – EMBARGOS DECLARATÓRIOS – EFEITOS INFRINGENTES – POSSIBILIDADE – Constatada a omissão e evidenciado equívoco manifesto, são admissíveis os embargos, embora em caráter excepcional, emprestando-se-lhes efeitos infringentes. (STJ – REsp 192608 – ES – 2ª T. – Rel. Min. Helio Mosimann – DJU 01.03.1999 – p. 297).

PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – EQUÍVOCO MANIFESTO – EFEITOS INFRINGENTES – POSSIBILIDADE – 1 – Constatado equívoco manifesto no julgado embargado, possível se torna emprestar aos embargos declaratórios efeitos infringentes do julgado. 2 – Embargos acolhidos para conhecer e dar provimento ao recurso especial. (STJ – EDcl-REsp 221714 – DF – 6ª T. – Rel. Min. Fernando Gonçalves – DJU 08.03.2000 – p. 169).

AGRAVO REGIMENTAL – EMBARGOS DECLARATÓRIOS – EQUÍVOCO DO ACÓRDÃO EMBARGADO – EFEITOS INFRINGENTES – POSSIBILIDADE – Apenas em casos excepcionais são admitidos efeitos infringentes nos embargos de declaração. Caso em que verificado equívoco no acórdão embargado, o reconhecimento deste implica em se alterar o julgado. Embargos recebidos para modificar a conclusão do v. Aresto embargado no sentido de dar provimento ao agravo de instrumento a fim de determinar a subida do recurso especial para melhor exame. Embargos acolhidos. (STJ – EDcl-AgRg-AG 208479 – RN – 5ª T. – Rel. Min. Félix Fischer – DJU 27.09.1999 – p. 111)

A AUTORA, COM A DEVIDA VÊNIA, REPUTA COMO MANIFESTO EQUÍVOCO DAR DECISÃO COM BASE EM JUÍZO DE EQÜIDADE, QUANDO SE ESTÁ A APRECIAR MATÉRIA SOB O PÁLIO DA LEGALIDADE ESTRITA. VOSSA EXCELÊNCIA, NÃO SE SABE O PORQUÊ, CREU ESTAR DIANTE DE PROCEDIMENTO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA OU NOS JUIZADOS ESPECIAIS.

Por fim, Vossa Excelência, ao ter que corrigir os defeitos apontados no decisório, dará conta do fumus boni juris. No mais, a autora popular reitera os argumentos expendidos na inicial.

OMISSÃO E OBSCURIDADE QUANTO AO PERICULUM IN MORA

Vossa Excelência ao abordar o periculum in mora, equivocou-se novamente. Vejamos:

Diz o CPC, art. 2º: “Nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a requerer nos casos e forma legais”.

E, no art. 128, do mesmo Códex, lê-se: “O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte”.

Salvo se puseram abaixo o sistema processual brasileiro, o perigo na demora, significa avaliar, se, no caso concreto, a medida judicial – requerida pela parte que ingressou em juízo – não pode esperar o julgamento final para ser deferida, sob pena de ser ineficaz – antecipação dos efeitos da tutela – ou, ainda, implicar a produção de resultados nefastos e deletérios irreversíveis – medida acautelatória do direito deduzido.

Vossa Excelência, além de não apreciar os fundamentos trazidos pela autora para justificar o periculum in mora, apressou-se em defender o perigo na demora de uma medida judicial que sequer foi proposta pelos réus quando disse que o “periculum in mora milita em favor dos réus”. Vossa Excelência preocupou-se em justificar a presença dos requisitos de um pedido liminar que não foi feito, pois, não há nos autos pedido contraposto, reconvenção ou quejandos formulados pelos réus.

Não há perigo na demora em favor dos réus, pelo simples fato de que eles não solicitaram qualquer provimento judicial. A autora pergunta: Demora em relação a quê, se os réus nada pediram a Vossa Excelência?


Obscura é a decisão, neste particular. Vossa Excelência deverá explicar: como é possível falar de periculum in mora em favor dos réus, quando eles não pediram a Vossa Excelência que proferisse qualquer decisão? Este o quarto defeito a ser superado.

Só para constar, a autora popular, mui diversamente, de Vossa Excelência entende que não se obterá a melhor prestação jurisdicional, admitindo-se, na judicatura federal, candidatos que sequer demonstraram condições de passar na prova seletiva e que, além disso, ingressarão na Magistratura pela “porta dos fundos”, quer dizer, por meio de concurso nulo, em que não foi respeitado o princípio básico da isonomia. É um modo diferente de ver as coisas, solamente.

Como Vossa Excelência resolveu ingressar na temática do periculum in mora, quando tal era desnecessário, pois, no sentir de Vossa Excelência, não havia sequer fumus boni iuris, a autora popular não pôde deixar de constatar omissão, uma vez que não foram abordados todos os fundamentos expostos na inicial no que tange à existência de efetivo perigo na demora.

Vindo Vossa Excelência a entender que presente está o fumus boni juris, espera a autora popular que Vossa Excelência aprecie, sem omissões, todos os argumentos contidos na inicial, em relação a este ponto, também.

PERORAÇÃO

Para finalizar a autora encerra, dizendo o seguinte: ao analisar a existência ou não do periculum in mora Vossa Excelência demonstrou que é uma pessoa preocupadíssima com a qualidade da prestação jurisdicional. Disse Vossa Excelência: “…os prejuízos morais e materiais seriam imensos e irreversíveis; e não só para os réus como também para a toda a sociedade que ficaria privada de uma melhor prestação jurisdicional”.

Entende a autora popular, contudo, que a excelente qualidade da prestação jurisdicional não pode ser uma proposta para o futuro, ela deve estar presente também nas decisões que hoje, agora, estão sendo dadas pelo Poder Judiciário Federal. Nada justifica que a qualidade da jurisdição prestada, neste caso, também, não seja ótima, excelente, como é o desejo de Vossa Excelência.

Como crê a autora popular que Vossa Excelência pode e quer dar sua parcela de colaboração para atingir tão meritório desiderato, não se furtará em oferecer a melhor prestação jurisdicional que está ao seu alcance.

DAS PROVIDÊNCIAS PROCESSUAIS

O termo de autuação está incorreto, uma vez que são réus não apenas a União, Presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Presidente do Conselho de Administração do Tribunal Regional Federal 4ª Região, Presidente da IX Comissão do Concurso para ingresso na carreira de Juiz Federal Substituto da 4ª Região, mas, também, todos os candidatos “aprovados”. Deste modo, mister que seja retificado o termo de autuação e que todos passem a figurar no pólo passivo da demanda;

A autora, com base legal, requereu a citação por edital dos beneficiários diretos do ato impugnado – ou seja, dos candidatos “aprovados” – e, assim, o fez porque cria que o feito fosse processado com o deferimento da liminar. Contudo, muito possivelmente, diante dos termos da decisão retro, o pedido de liminar restará indeferido, ou, na melhor das hipóteses, será deferido nas instâncias superiores, situação que não impedirá os réus de tomarem posse. De meros candidatos passarão a Juízes Federais. Como entende a autora popular que a citação editalícia, apesar do esteio legal, se houver mudança na situação jurídica dos candidatos, poderá suscitar discussões e dispensáveis argüições de nulidade, pede vênia para emendar à inicial, requerendo a citação pessoal dos candidatos réus.

Reitera, ainda, a necessidade de notificação do Presidente da IX Comissão do Concurso Público para Provimento de Cargos de Juiz Federal Substituto para que preste as informações necessárias a fim de viabilizar as citações, intimações e notificações dos candidatos “aprovados”. Veja-se: art. 7º, I, b, Lei nº 4717/65: I – Ao despachar a inicial o juiz ordenará: b) a requisição às entidades indicadas na petição inicial, dos documentos que tiverem sido referidos pelo autor (artigo 1º, § 6º), bem como a de outros que se lhe afigurem necessários ao esclarecimento dos fatos, fixando o prazo de 15 (quinze) a 30 (trinta) dias para o atendimento.

DIANTE DO EXPOSTO, e pelo que muito mais será suprido pelo elevado saber de Vossa Excelência, requer que:

seja procedida a retificação do termo de autuação conforme fundamentado acima;

a citação dos beneficiários diretos do ato, não mais por edital, mas, sim, pessoalmente, tendo-se, então, a presente petição como emenda à inicial; a notificação do Presidente da Comissão Examinadora do IX Concurso para provimento de cargos de Juiz Federal Substituto da 4ª Região para que junte aos autos a qualificação dos candidatos aprovados, no prazo legal, sob pena de prisão, de modo a viabilizar o processamento da demanda;

Quanto aos embargos de declaração, requer que:

Vossa Excelência esclareça o que se deve entender por procedimento de “cortes”, evidenciando, afinal de contas, de qual omissão padece o Regulamento, e como e de que forma o procedimento de “cortes” se relaciona com o critério de classificação na prova seletiva estampado no artigo 17 do Regulamento, corrigindo a obscuridade;

Vossa Excelência pronuncie-se a respeito de ponto relevante sobre o qual é omissa a decisão, v.g.: ainda, que o vício de competência tenha sido sanado, em face da homologação do resultado final do concurso pelo Conselho de Administração do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, como é possível considerar juridicamente válida a modificação no regulamento sem que os candidatos dela tenham sido informados?

Vossa Excelência pronuncie-se a respeito de outro ponto relevante omitido, a saber: como é possível, validamente, alterar os critérios de classificação depois de, identificadas as provas e conhecidos os aprovados, sem que isso implique ofensa ao princípio da isonomia e moralidade?

Vossa Excelência esclareça, suprimindo a obscuridade, como é possível falar de periculum in mora em favor dos réus, sem que eles tenham formulado à Vossa Excelência qualquer solicitação de providência judicial e sem que, em razão do mesmo fato, fique caracterizado o exercício de ofício da jurisdição?

Vossa Excelência analise os fundamentos trazidos para justificar a existência do periculum in mora, colmatando a omissão;

Por fim, Vossa Excelência acolha, in totum, os presentes embargos declaratórios, dando efeitos infringentes à decisão, se não houver outra maneira de suprir as deficiências apontadas.

Nestes termos, pede deferimento.

Paranaguá, 25 de abril de 2001.

MARINEIDE SPALUTO

OAB/PR Nº 10937

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