Taxa Selic

Taxa Selic: decisão sobre constitucionalidade fica para agosto.

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26 de junho de 2000, 0h00

O uso da taxa Selic para correção de tributos só será julgado pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em agosto, informa o ministro-relator Franciulli Neto.

O recurso foi ajuizado do pela Fazenda Nacional contra um grupo de pessoas que pede devolução do compulsório sobre combustíveis referente a 1987, corrigido pela Selic.

A Segunda Turma do STJ já decidiu por unanimidade que a utilização da Selic para fins tributários é inconstitucional, porque está regulamentada apenas em portarias do Banco Central. Para sua aplicação a tributos, a taxa deveria estar prevista em lei.

Uma eventual confirmação dessa inconstitucionalidade deve abrir precedentes para outras ações que já tramitam na Justiça e que venham a ingressar no STJ.

O governo, atualmente, corrige tributos e contribuições sociais atrasados, com base na Selic.

A decisão da Segunda Turma (publicada pelo Diário da Justiça em 19/6), que considerou a Selic inconstitucional, fundamentou-se nos seguintes argumentos apontados pelo relator da ação, ministro Franciulli Neto:

1. Inconstitucionalidade do § 4º do artigo 39 da Lei n. 9.250, de 26 de dezembro de 1995, que estabeleceu a utilização da Taxa Selic, uma vez que essa taxa não foi criada por lei para fins tributários.

2. Em matéria de tributação, nesta incluídas as contribuições previdenciárias, os critérios para aferição da correção monetária e dos juros devem ser definidos com clareza pela lei.

3. Taxa Selic, indevidamente aplicada, ora como sucedâneo dos juros moratórios, ora dos juros remuneratórios, sem prejuízo de sua conotação de correção monetária.

4. A Taxa Selic é de natureza remuneratória de títulos. Títulos e tributos, porém, são conceitos que não podem ser embaralhados.

5. Impossibilidade de equiparar os contribuintes aos aplicadores; estes praticam ato de vontade; aqueles são submetidos coativamente a ato de império.

6. A Taxa Selic cria a anômala figura de tributo rentável. Os títulos podem gerar renda; os tributos, per se, não.

7. O emprego da Taxa Selic provoca enorme discrepância com o que se obteria se, ao invés dessa taxa, fossem aplicados os índices oficiais de correção monetária, além dos juros legais de 12% ao ano.

8. Aplicada a Taxa Selic há aumento de tributo, sem lei específica a respeito, o que vulnera a artigo 150, inciso I, da Constituição Federal, a par de ofender também os princípios da anterioridade, da indelegabilidade de competência tributária e da segurança jurídica.

9. Se tais pechas contaminam a arrecadação, igual defeito existirá nas hipóteses de compensação ou restituição de tributos.

10. Ainda que se admitisse a existência de leis ordinárias criando a Taxa Selic para fins tributários, ainda assim, a título de argumentação de reforço, a interpretação que melhor se afeiçoa ao artigo 161, § 1º, do CTN (que possui natureza de lei complementar – art. 34, § 5º, do ADCT), é a de poder a lei ordinária fixar juros iguais ou inferiores a 1% ao mês, nunca juros superiores a esse percentual. Sob o arnês desse raciocínio, a Taxa Selic para fins tributários só poderia exceder a esse limite, desde que também prevista em lei complementar, visto que, de ordinário, essa taxa tem superado esse limite máximo. Não há conceber que uma lei complementar estabeleça a taxa máxima e mera lei ordinária venha a apresentar percentual maior.

11. Para que a Taxa Selic pudesse ser albergada para fins tributários, havia imperiosa necessidade de lei estabelecendo os critérios para sua exteriorização, por ser notório e até vetusto o princípio de que o contribuinte deve de antemão saber como será apurado o quantum debeatur da obrigação tributária. A Taxa Selic está longe, muito longe, de ser um instituto jurídico a dispensar melhor dilucidação, razão pela qual era de rigor sua conceituação legal para penetrar no campo do Direito Tributário. Ainda assim, há máculas decorrentes da impossibilidade de se aferir correção monetária ante acta, ou seja, por mera estimativa do que poderá vir a ocorrer.

12. O artigo 193, § 3º, da Constituição Federal dita que a taxa de juros reais não pode ser superior a 12% ao ano. Ainda que se trate de norma de eficácia contida ou limitada, sujeita a lei complementar, a doutrina moderna de Direito Constitucional é no sentido de inexistir norma constitucional despida totalmente de efeito ou eficácia. Assim, inibe o legislador ordinário de legislar em sentido contrário.

13. Incidência de bis in idem na aplicação da Taxa Selic concomitantemente com o índice de correção monetária.

14. Mesmo nas hipóteses em que não há adição explícita de correção monetária e Taxa Selic a ilegalidade persiste, por conter a Taxa Selic embutida fator de neutralização da inflação.

15. A Taxa Selic é calculada sobre os juros cobrados nas operações de venda de título negociável em operação financeira com cláusula de compromisso de recompra e não sobre a diferença entre o valor de compra e de resgate dos títulos. A Taxa Selic reflete a remuneração dos investidores pela compra e venda dos títulos públicos e não os rendimentos do Governo com a negociação e renegociação da Dívida Pública Mobiliária Federal interna (DPMFI).

16. Mencionando a lei que se aplica a Taxa Selic para tributos e contribuições previdenciárias, e deixando a fixação dessa taxa ao alvedrio exclusivo do Bacen (que tem competência financeira mas não tributária), há também inconstitucional delegação de competência tributária. Assim é porque o quantum debeatur, — que afinal, repita-se, é o que interessa —, acaba por ser alterado à margem da lei. Fixada a Taxa Selic por ato unilateral da Administração, fica vergastado o princípio da indelegabilidade de competência tributária. Além disso, o Comitê de Política Monetária do Banco Central do Brasil (Copom) pode delegar ao Presidente do Banco Central a prerrogativa de aumentar ou reduzir a Taxa Selic.

17. A Taxa Selic é fixada depois do fato gerador e por ato unilateral do Executivo, em matéria de atribuição exclusiva do Legislativo, que não fixou os nortes, as balizas e os critérios para sua mensuração, o que fere, além do princípio da indelegabilidade, o da anterioridade.

18. A quantia a ser recolhida, seja a título de tributo, seja a título de correção monetária ou de juros incidentes sobre o tributo, não pode ficar na dependência de fixação unilateral do Governo (in casu, do Banco Central), pouco importando que assim o faça em nome do mercado financeiro, atrelado às regras da oferta e procura. Esse raciocínio é perfeitamente válido e eficaz no que toca à plena autonomia do Bacen na gestão dos títulos públicos e de sua remuneração, mas não fornece nenhum respaldo, por mais tênue que seja, para a cobrança de tributos presos aos princípios da legalidade (art. 150, I, da CF), da anterioridade (art. 150, III, “b”, da CF), da indelegabilidade de competência tributária (arts. 48, I, e 150, I, da CF) e da segurança jurídica (como se infere dos vários incisos do art. 5º da CF).

19. Inconstitucionalidade material, além da flagrante inconstitucionalidade formal (Resp 21881).

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