Mais de 150 processos cíveis desapareceram dos 55 cartórios do Fórum João Mendes, no Centro, apontado pela Corregedoria da Polícia Civil como quartel-general da gangue dos fóruns.
A quadrilha formada por funcionários da Justiça e advogados é acusada de furtar processos criminais e cíveis sob encomenda, para vendê-los a partes interessadas nas ações.
Levantamento da diretoria administrativa do João Mendes, em setembro do ano passado, mostra que 155 processos sumiram no período de 12 meses. A maioria dos autos extraviados refere-se a causas com quantias milionárias, envolvendo grandes empresas, bancos e pessoas físicas.
A tese de que o João Mendes é mesmo a base da gangue dos fóruns é defendida pelo delegado Luiz Antônio Rezende Rebello, titular da Delegacia de Crimes Funcionais. O gabinete do principal integrante da quadrilha, o escrevente José Joaquim Nogueira, diretor do cartório do 2º Tribunal de Alçada Civil, fica no 17º andar do prédio do Fórum Civil.
Outros funcionários presos trabalharam no local e freqüentavam o edifício. ‘O grosso da quadrilha agia no João Mendes’, disse Rebello. ‘O problemas deles foi se aventurar em seara alheia’, afirmou.
O delegado referiu-se à ganância do bando, que expandiu seus negócios para as varas criminais do Complexo Judiciário Ministro Mário Guimarães, na Barra Funda Zona Oeste.
Um processo-isca, plantado em um dos cartórios do Complexo, foi encomendado a Nogueira, que exigiu R$ 70 mil para subtrair o volume. Ele caiu na armadilha da Corregedoria e foi preso, dia 7, no saguão do Hotel Maksoud Plaza, recebendo R$ 10 mil falsos, como adiantamento.
O furto de processos no João Mendes e em outras unidades da Justiça não era fato novo às autoridades. No 1º Distrito (Sé), o delegado titular Joaquim Dias Alves tem 11 inquéritos para apurar a subtração de autos.
Este levantamento foi pedido pelo corregedor-geral de Justiça, Roberto Solimene. Um dos inquéritos, de número 1.232/97, é sobre o sumiço da apelação 624-122-5, do 1º Tribunal de Alçada Civil, que envolve as indústrias de óleos Alby e Olvego, da Comarca de Bariri.
O investigado é o advogado João Roberto Damasi, de São José dos Campos, Vale do Paraíba. Damasi foi citado na investigação como o advogado que retirou os autos do 11º cartório, em 4 de fevereiro de 1997. Ouvido pela Polícia, o advogado disse desconhecer os envolvidos, nunca ter atuado para qualquer das partes e que a assinatura da retirada do processo foi falsificada.
Ele apresentou ocorrência provando que seus documentos, como a carteira de advogado, foram furtados em 11 de dezembro de 1995.
Isso reforça a suspeita de Rebello de que o bando usava documentos de advogados, como o de Newton Silva, já morto, como forma de retirar os processos sem correr riscos.
Juiz
O levantamento dos processos subtraídos foi feito por ordem do juiz Luiz Eurico Costa Ferrari, diretor do Fórum João Mendes, que determinou atenção no serviço de segurança para impedir o desaparecimento dos autos. ‘No ano passado foram solicitadas informações aos cartórios quanto à existência de processos subtraídos ou extraviados. O escrivães comunicaram um número excessivo de autos.’
A pesquisa coincidiu com sindicância do juiz Adherbal dos Santos Acquati, da 1ªVara Cívil. ‘Com base na lista geral e verificados alguns casos coincidentes de partes em varas diferentes, foi solicitada a instauração de inquérito, na 2ªDelegacia de Crimes Funcionais do antigo Decon’, lembrou Ferrari.
O prejuízo à Justiça está na dificuldade em restaurar os processos. ‘O procedimento acarreta a mobilização dos órgãos auxiliares e esforço das partes na busca de elementos para reprodução exata do que se perdeu: é falsa essa idéia de que a supressão beneficia quem pratica a subtração’, disse Ferrari.
Ele esteve também na 33ªVara, onde foi verificado segunda-feira o sumiço de um processo no qual é réu o criminalista José Alves de Brito, de 43 anos, acusado de participação na gangue dos fóruns. Ele teve a prisão temporária decretada ontem pela Justiça e está foragido.
Fonte: Diário Popular