Cerca de 60 calouros da Faculdade de Direito da USP assinaram um atestado (“termo de adesão ao trote”) permitindo o tradicional “Banho na Sé”. Nesse documento, os primeiranistas declaram que participaram do trote e assinaram o termo por vontade própria. Além disso, disseram que estão orgulhosos por serem a primeira turma “dentre as muitas que virão” a tomar banho espontaneamente.
O “Banho na Sé” é realizado na Faculdade há muitos anos. Os calouros percorrem em fila o caminho do Largo de São Francisco até a Praça da Sé, rodeados por veteranos que cantam as trovas da Faculdade.
No final do ano passado foi sancionada uma lei estadual que proíbe os trotes na USP, Unesp e Unicamp (lei 10.454). Também há uma Portaria da própria diretoria da Faculdade que trata do assunto.
Antes da saída dos alunos para a Praça da Sé, a Diretora da Faculdade, Ivete Senise Ferreira, tentou impedi-los. Desistiu quando ouviu das próprias “vítimas” que não tinham sido forçadas a assinar o documento e que estavam gostando da brincadeira.
Os estudantes compreendem as medidas adotadas pela diretoria pois “há muita tensão na universidade, em razão da morte de um calouro do curso de Medicina, o ano passado”. Eles dizem que a Faculdade de Direito precisa manter uma posição de “vanguarda” no que se refere à regulamentação do trote.
Para eles, a assinatura do “termo de adesão ao trote” é mera precaução contra eventuais problemas e um complemento ao controle exercido pela diretoria.
Segundo o coordenador do grupo de trabalho pró-calouro da USP (GT/USP) e presidente da comissão de graduação da faculdade de física, Luís Carlos Gomes, a lei estadual que trata dos trotes “chove no molhado”, pois as práticas violentas que a lei condena já são devidamente proibidas por outros instrumentos legais.
De acordo com Gomes, essa lei foi uma resposta à pressão social e política contra a prática do trote, que atingiu seu ápice com a tragédia ocorrida na faculdade de Medicina Pinheiros.
O coordenador do GT/USP é favorável a medidas preventivas contra o constrangimento dos alunos, como por exemplo um “workshop” sobre violência realizado em agosto de 1999, em que estavam presentes representantes dos centros acadêmicos das faculdades e do núcleo de estudos de violência da USP.
Um dos principais feitos do GT/USP foi a organização da semana de recepção dos calouros, que durou do dia 21 ao dia 27 de fevereiro. Cada faculdade enviou à reitoria da universidade programas com atividades voltadas para a integração dos novos alunos no ambiente acadêmico.
Foram aplicados principalmente os chamados “trotes-cidadão”, como, por exemplo, doação de sangue, recolhimento de alimentos para instituições de caridade, atividades “amistosas de integração”, palestras e outros eventos culturais.
Gomes encarou com certa dose de humor a atitude dos estudantes de Direito e disse que, quanto ao aspecto jurídico da iniciativa, não poderia tecer comentários. Mas, do ponto de vista ético, havendo concordância e vontade dos calouros em tomar o famoso “banho”, ele não pode fazer oposição.
Para ele “o problema do trote é cultural. As pessoas desejam submeter-se às brincadeiras. É uma comemoração. Talvez o trabalho contra o trote devesse ser feito nos cursinhos e nas escolas”.