Taxa cobrada de forma indevida

Corregedoria acaba com execuções indevidas de taxa

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5 de dezembro de 2000, 23h00

Os advogados paulistas estão livres de ações de cobrança de taxa judiciária relativa à juntada de procuração, que é de 2% do salário mínimo (hoje R$ 3,02). A decisão é da Corregedoria Geral de Justiça, atendendo a ofício expedido pela OAB-SP.

A Corregedoria concluiu que não são os advogados, mas sim as partes, que devem pagar a taxa.

Quando um advogado não fazia o recolhimento da taxa judiciária relativa à juntada de procuração, alguns Juizes vinham entendendo que deveriam mandar inscrever o valor na “Dívida Ativa” colocando o nome do advogado como devedor.

Recentemente a Procuradoria Geral do Estado recusou-se a promover o andamento dessas cobranças, por entender que se tratava de taxa devida à OAB, já que a taxa destina-se à Carteira de Previdência dos Advogados, administrada pelo Ipesp.

A decisão permite que o Ipesp cobre a taxa das partes do processo até por meio de execução fiscal.

Leia o parecer do Conselheiro da OAB, Raul H. Haidar, que defendeu a proibição da cobrança:

ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – SEÇÃO DE SÃO PAULO

TRIBUNAL DE ÉTICA E DISCIPLINA

Expediente s/ nº de 07.08.2000

Interessados: Diversos

RELATÓRIO:

1. O Presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP, Dr. José Urbano Prates, encaminha cópias de ofícios datados de 18/7/2000, 21/7/2000 e 1/8/2000, dirigidos ao Dr. Presidente da OAB-SP e enviados pela MM. Juíza de Direito da 14a. Vara da Fazenda Pública da Capital, onde solicita “as providências necessárias” face à devolução de expedientes encaminhados à Procuradoria Fiscal do Estado, relacionados com “custas previdenciárias não recolhidas”.

2. As ilustres juízas da mencionada 14a. Vara da Fazenda Pública , dras. Simone Gomes Rodrigues Casoretti e Adriana Sachsida Garcia Abujamra, expediram ofícios ao Sr. Secretário da Fazenda do Estado de São Paulo solicitando providências para que “seja inscrita na dívida ativa o patrono” de partes envolvidas em vários processos judiciais.

3. Tais ofícios, recebidos no Gabinete do Secretário da Fazenda, foram despachados pelo Chefe do Gabinete e encaminhados à CAT (Coordenação da Administração Tributária), onde foram despachados por um Assistente Fiscal, o qual encaminha-os à DA (Diretoria de Arrecadação) “para providenciar a imediata inscrição do débito na dívida ativa”.

4. Na DA , o seu Diretor encaminhou-os à PF-11 (Procuradoria Fiscal) órgão da Procuradoria Geral do Estado, onde a Procuradora Dra. Elisabeth Jane Alves de Lima resolveu devolver todos os ofícios às MM. Juízas, informando que se trata “de cobrança estranha à competência desta Procuradoria Fiscal…” (ofício de 3/7/200) e que “trata-se de contribuição federal, cuja arrecadação compete à O. A. B. ” (ofício de 19/7/2000)

5. Diante dessa devolução, sem que tivessem sido inscritas as dívidas, a MM. Juíza encaminhou à OAB-SP tais expedientes, “para as providências necessárias”.

PARECER:

6. Na verdade, está havendo um equívoco das magistradas que pensam ser a referida taxa devida pelos advogados quando na verdade o sujeito passivo é a parte, o cliente do advogado. Este é apenas o mandatário do cliente e em nome deste recolhe a taxa. Também equivocou-se a Procuradora do Estado, pois não se trata de contribuição federal, nem sua arrecadação compete à OAB, como adiante exposto.

7. Em algumas Comarcas do Interior do Estado já há notícias de que magistrados têm mandado inscrever na Dívida Ativa o valor da referida taxa, fazendo consignar como devedor o advogado, tendo ainda o próprio Tribunal de Ética e Disciplina recebido representações contra advogados que não a recolhem regularmente.

8. Tais inscrições são nulas de pleno direito, pois que não são os advogados os contribuintes e as representações de natureza ético-disciplinar têm sido sistemáticamente arquivadas, por inexistência de qualquer falta disciplinar.

9. Assim, ao não dar andamento às inscrições, bem agiu nossa Colega, a ilustre Procuradora do Estado dra. Elisabeth Jane Alves de Lima, pois não é possível inscrever na dívida ativa quem não é contribuinte do tributo, além do que parte dos ofícios não trazem os requisitos necessários à inscrição, previstos na Lei 6830. Todavia, labora em equívoco a Procuradoria Fiscal, ao afirmar que “trata-se de contribuição federal, cuja arrecadação compete à O. A. B. ” (ofício de 19/7/2000)

10. A Lei estadual (de São Paulo) nº 10.394 de 16/12/70 , em seu artigo 40, inciso III criou a referida contribuição como uma das fontes de receita para financiar a Carteira de Previdência dos Advogados de São Paulo, administrada pelo IPESP – Instituto de Previdência do Estado de São Paulo. As demais fontes de receita estão definidas no artigo 48 do mesmo diploma legal e são, basicamente, as contribuições mensais dos segurados e aposentados, doações, rendimentos patrimoniais, etc.

11. O artigo 56 da lei institui um Conselho, composto de representantes da OAB-SP, do IASP e da AASP. Portanto, presume-se que os recursos arrecadados pela Carteira, inclusive os decorrentes da referida contribuição, estejam sendo fiscalizados quanto à sua utilização.

12. O contribuinte da mencionada taxa é o outorgante, não o advogado, pois o já mencionado artigo 48, III, diz:

“Art. 48 – A receita da Carteira é constituída:

III – da contribuição a cargo do outorgante de mandato judicial;”

13. Trata-se sem dúvida de tributo, na forma da definição contida no artigo 3º do Código Tributário Nacional. E é um tributo da espécie denominada taxa, assim definida no artigo 77 do CTN:

“Art. 77 – As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição”.

14. A natureza tributária da referida taxa já foi reconhecida em inúmeras decisões judiciais. Veja-se, a respeito, o AI 484.783 da 5a. Câmara do 2º Tribunal de Alçada Civil, julgado em 23.04.1997:

“A taxa judiciária é um tributo. A lei que a instituiu tem natureza tributária, não comportando interpretação limitativa ou ampliativa”.

15. Na Apelação 746.754-3, a 1a. Câmara de Férias do 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, sendo Relator o Juiz Elliot Akel, decidiu.

“A lei de custas, em seu artigo 8º, também regulou a destinação de parcelas da taxa judiciária, gênero da qual a contribuição exigida pela sentença é espécie. Espécie cuja natureza não é afastada pelo fato de a exigência da verba advir do ato da juntada do mandato ao processo, dando-se a ela a denominação de “contribuição especial”, contemplada, aliás, pela lei estadual nº 10.394/70.”

16. O 1º Tribunal de Alçada Civil deste Estado, na AC 0000395-1/91, decidiu:

“TAXA JUDICIÁRIA – MANDATO – Juntada de Instrumento aos Autos – Ausência, todavia, da guia de recolhimento da taxa devida – Irrelevância – Extinção afastada, devendo o fato ser comunicado à Carteira dos Advogados do IPESP para cobrança – Recurso desprovido para esse fim. ” (GN)

17. Assim, a referida taxa não é cobrada pela OAB, mas pelo IPESP. Como bem decidiu o 1º TAC (item 15 acima) , é uma contribuição especial, espécie do gênero “taxa judiciária”. Ora, o Estado pode cobrar taxa pela utilização do serviço público específico e divisível, no caso o decorrente do andamento do processo em que o mandato é juntado. O fato de destinar sua receita para financiar determinado órgão, fundo ou despesa , não a desnatura.

18. Acresce salientar que a inscrição de dívidas de pequeno valor na Dívida Ativa do Estado pode causar prejuízos ao Erário. Por certo que tal inscrição tem como objetivo executar a dívida e tal execução, pelos valores envolvidos, causaria sérios danos ao Estado e à sociedade, que já sofrem perdas expressivas com o acúmulo de processos judiciais, a dificultar a realização da verdadeira Justiça.

19. Há precedentes legais que autorizam ou determinam a não inscrição em determinadas hipóteses, o que a autoridade competente deve observar, a bem do interesse público. Certamente que os esforços e o tempo utilizados neste caso poderiam ser empregados em outras atividades.

20. Como o 1º Tribunal de Alçada Civil decidiu (item 16 acima) a ausência da guia de recolhimento é irrelevante para o andamento de qualquer feito e não implica em sua extinção, devendo o fato ser comunicado à Carteira dos Advogados do IPESP para cobrança

21.Pelo exposto, entendo que:

a) a referida contribuição é um tributo da espécie taxa e sua exigibilidade está prevista em lei estadual, inexistindo proibição de seu uso para financiar a Carteira de Previdência;

b) é nula qualquer cobrança judicial ou mesmo a inscrição da taxa na dívida ativa, quando feita contra o advogado, pois o contribuinte é a parte, não o profissional;

c) não comete qualquer infração disciplinar o advogado que deixa de recolher a taxa, por não ser o contribuinte e por falta de tipicidade;

d) pode o Juiz, constatada a falta de recolhimento, comunicar o fato ao IPESP, para que sejam adotadas as medidas cabíveis para a cobrança da taxa pelos meios previstos em lei, inclusive através da execução fiscal, desde que tal execução se faça contra o contribuinte, que é o outorgante do mandato, não o advogado.

22. Tendo em vista que tal questão tem se tornado comum, proponho ainda que este parecer seja encaminhado às MM. Juízas , ao DD. Secretário de Estado dos Negócios da Fazenda, ao Diretor de Arrecadação da Secretaria da Fazenda, à Procuradoria Geral do Estado, à Corregedoria Geral da Justiça e seja divulgado pelo Jornal do Advogado, encaminhando-se cópia às demais entidades da Advocacia (AASP, IASP, etc.), para ampla divulgação.

É o meu parecer, sub censura.

São Paulo, 10 de outubro de 2000

Raul H. Haidar

Conselheiro da OAB

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