Sentença histórica

Conheça a decisão condenatória dos precatórios judiciais de SP

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6 de dezembro de 2000, 11h26

Em 1997, o juiz Pedro Aurélio Pires Maríngolo produziu uma das mais consistentes decisões a respeito da administração pública, ao incumbir-se de examinar a acusação de improbidade administrativa nas operações irregulares, praticadas pela prefeitura de São Paulo, com títulos municipais (LFTM) emitidos para pagamento de precatórios judiciais.

Clamoroso, o episódio, teve uma série de desdobramentos. Mas foi com o deslinde dessas operações, que o Brasil tomou conhecimento das danosas transações que se vinham praticando contra o interesse público.

Foi também a primeira sentença que condenou o Prefeito Pitta, Wagner Ramos e algumas corretoras e bancos, por improbidade administrativa, relativamente a nove operações irregulares com títulos municipais da Capital lançados no mercado para pagamento de precatórios.

A condenação que, pela sua importância jurídica, a publicamos aqui, também foi mantida no TJSP, afastada apenas a condenação solidária das pessoas jurídicas no total dos prejuízos causados à municipalidade paulistana.

Leia a íntegra:

“Trata-se de ação de responsabilidade civil por improbidade administrativa, fundada na Lei nº 8.429, de 02/6/92, ajuizada pelo Ministério Público Estadual (três Promotores de Justiça da Cidadania da Capital), sob o rótulo de Ação Civil Pública, em face de Celso Roberto Pitta do Nascimento, Wagner Baptista Ramos, Negocial DTVM Ltda., Contrato DTVM Ltda., Áurea DTVM Ltda. (atualmente, Áurea Consultoria, Administração e Participações Ltda.), Big S/A (Banco Irmãos Guimarães S/A), Paper DTVM Ltda. (atualmente, Arjel Distribuidora de Títulos e Valores Imobiliários Ltda.), Banco Investor de Investimentos S/A, Banco Tecnicorp S/A, Valor Corretora de Câmbio, Títulos e Valores Mobiliários Ltda., Perfil Corretora de Câmbio, Títulos e Valores Mobiliários Ltda., JHL DTVM Ltda. (atualmente, JHL Participações Ltda.), Leptos DTVM Ltda., Cedro DTVM Ltda., ERG DTVM Ltda., Banco Indusval S/A, e Credicorp DTVM Ltda.

A inicial, instruída com autos de inquérito civil, em quinze volumes, instaurado a partir de representações feitas pelo Deputado Estadual Walter Feldman e pelo Partido dos Trabalhadores, por seu Presidente Nacional, Deputado Federal José Dirceu, foi aditada a fls. 78/79 e imputa aos requeridos a realização de operações irregulares com títulos municipais (LFTM) emitidos para pagamento de precatórios judiciais, nos termos do parágrafo único do artigo 33 do ADCT da CF/88, ocorridas entre 1994 e 1996, lesivas à Municipalidade de São Paulo no montante de R$10.398.000,00, segundo análises do Banco Central, ou de R$10.749.146,08, segundo laudo extrajudicial produzido no mencionado inquérito civil, com especificação do lucro acumulado por cada uma das corretoras e distribuidoras requeridas nessas operações irregulares.

Basicamente, segundo a inicial e seus documentos, os títulos municipais foram lançados no mercado, em operações compromissadas com cláusula de recompra pela municipalidade, com taxas de deságio muito acima do mercado (isso os tornava muito baratos para os primeiros compradores) e assim, em operações sucessivas e recíprocas, muitas vezes diárias, entre as várias corretoras e o Tesouro Municipal, eles eram recomprados e revendidos, também pela Municipalidade, até o momento em que atingiam o valor real, de mercado, pago pelo comprador final ou definitivo, em operação realizada com instituição não pertencente a esse grupo de corretoras requeridas.

Assim, a diferença entre o valor pago pelo comprador final dos títulos, em operação realizada a preços realmente de mercado, e o depreciado valor inicial efetivamente recebido pelo Tesouro, era o lucro dessa cadeia de operações intermediárias realizadas, sempre, com as mesmas corretoras e distribuidoras requeridas, sem nenhum tipo de leilão, com autorizações escritas do requerido Celso Pitta, então Secretário Municipal de Finanças, e materializadas pelo requerido Wagner Ramos, então Coordenador da Dívida Pública daquela Municipalidade.

Por isso, a demanda é por condenação de Celso Pitta e de Wagner Ramos na perda de funções públicas, na suspensão de seus direitos políticos, no pagamento de multa civil, na proibição de contratação com o poder público, e na proibição de recebimento de benefícios e incentivos fiscais ou creditícios; por condenação das empresas requeridas na perda dos lucros ilícitos que auferiram naquelas operações irregulares, tal como já rastreadas pelo Banco Central e pela CPI do Senado, e na proibição de contratarem com o poder público ou dele receberem benefícios e incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente; e por condenação solidária de todos os requeridos e requeridas no ressarcimento integral do dano que cada uma dessas irregulares operações causou ao Tesouro Municipal, tal como estimado.


A inicial postulou, ainda, liminar de indisponibilidade dos bens dos agentes públicos e das outras beneficiárias de tais improbidades administra-tivas, como medida de segurança e asseguradora do efetivo ressarcimento dos prejuízos.

O Juízo deferiu a liminar mediante decisão (fls. 57/76) contra a qual quase todos os réus tiraram agravos de instrumento, todos improvidos.

O Juízo, a pedido de determinados réus e com a concordância do Ministério Público, deferiu algumas substituições da indisponibilidade patrimonial universal inicialmente decretada por depósitos judiciais

e outros tipos de caução (…).

Regularmente citados (fl. 1067), todos os réus, salvo a “Áurea DTVM Ltda.” (atualmente, “Áurea Consulto-ria, Administração e Participações Ltda.”), contestaram os pedidos, como se vê a fls. (…)

Em suma, quanto ao mérito, todas as contestações sustentam, com argumentações assemelhadas, a regularidade das operações com títulos da Municipalidade de São Paulo referidas na inicial.

Preliminarmente, as contestações trazem diversas alegações comuns (ilegitimidade de parte passiva das requeridas pessoas jurídicas que não negociaram diretamente com a Municipalidade; ilegitimi-dade de parte ativa; inépcia da inicial; prevalência do julgamento das operações questionadas no Tribunal de Contas do Município; e incompetência do juízo de primeiro grau, ante o disposto no artigo 29, inciso X da Constituição Federal de 1988).

Os ex-administradores da “Negocial”, liquidada pelo BACEN, requereram o ingresso no processo como assistentes litisconsorciais dessa ré (fls. 805/809) mas não foram atendidos pela decisão de fl. 1056 – item 1, contra a qual manifestaram agravo de instrumento cujo resultado o Juízo desconhece. Apesar disso, fizeram juntar uma contestação em que sustentam, em suma, a regularidade de suas condutas, na gestão da “Negocial”, relativamente às operações com os títulos da Municipalidade de São Paulo (fls. 2193/2220).

A Municipalidade de São Paulo, intimada para os fins do artigo 17 §3º da Lei nº 8.429/92, ingressou no polo passivo do processo para “defender os atos de negociação de títulos públicos municipais no mercado” (fls. 2.508/2520).

O processo tem quatorze volumes de autos (o primeiro e o quinto volumes têm apensos), além dos quinze volumes de documentos trazidos com a inicial (o primeiro desses volumes tem um apenso).

Relatados no essencial, passo a decidir.

1. A hipótese comporta julgamento antecipado, porquanto apenas de direito a controvérsia, provados documentalmente e/ou não impugnados os fatos que dão suporte a lide.

Nenhuma das contestações negou os fatos essenciais – certamente porque eles foram documentalmente provados – que, no caso, são as circunstâncias das operações de compra e venda de LFTM’s realizadas pelo Fundo de Liquidez da Dívida Pública do Município de São Paulo no segundo semestre de 1994, ao longo de todo o ano de 1995 e no primeiro semestre de 1996, conforme detalhada verificação do Banco Central do Brasil (fls. 1333/1393 – 7º volume dos documentos).

2. Ficam adotados como razão de decidir, praticamente, todos os fundamentos da substanciosa réplica de fls. 2265/2376, subscrita pelo Promotor de Justiça Doutor Wallace Paiva Martins Júnior, brilhante ornamento do Ministério Público paulista, com os acréscimos seguintes.

3. A competência para o conhecimento de improbidades administrativas tais como definidas na Lei nº 8.429 de 02/6/92, eventualmente praticadas por agentes públicos ou políticos de qualquer nível federativo, é do juízo de primeiro grau, não se aplicando a essa espécie de processo civil as regras de competência criminal “ratione personae” definidas, na Constituição Federal (artigo 29, atual inciso X) e na Constituição Estadual de São Paulo (artigo 74, inciso I), pelas prerrogativas de função de determinados réus, entre eles os Prefeitos Municipais.

Ao menos enquanto não se aprovar, no Congresso Nacional, o projeto presidencial da Mensagem nº 197, de 07/4/97, que sintomaticamente pretende acrescentar ao artigo 17 da Lei nº 8.429/92 o seguinte 5º parágrafo: “a ação de improbidade será proposta perante o tribunal competente para processar e julgar criminalmente o funcionário ou a autoridade, na hipótese de prerrogativa de foro em razão do exercício de função pública”.

Além da jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, inclusive de seu Órgão Especial, amplamente colacionada pelo Ministério Público a fls. 2322/2325, confira-se o entendimento prevalecente no Supremo Tribunal Federal, no sentido de que nem mesmo o Presidente da República goza de foro especial que não esteja estritamente indicado na Constituição Federal de 1988:

Competência do Supremo Tribunal Federal. Ação Civil Pública contra Presidente da República. Lei nº 7.347/85.


“A competência do Supremo Tribunal Federal é de direito estrito e decorre da Constituição, que a restringe aos casos enumerados no artigo 102 e incisos. A circunstância de o Presidente da República estar sujeito à jurisdição da Corte, para os feitos criminais e mandados de segurança, não desloca para esta o exercício da competência originária em relação às demais ações propostas contra ato da referida autoridade” (Agravo Regimental na Petição nº 693-4-SP; agravantes: Instituto Ministro Rodrigo Octávio e outros; agravados: Fernando Affonso Collor de Mello e outros; Pleno; julgamento de 12/8/93; relatado pelo Ministro Ilmar Galvão; DJU de 01/3/96, página 5.013).

Quanto aos Prefeitos Municipais, por várias vezes o Supremo Tribunal Federal afirmou a prevalência da competência originária dos Tribunais de Justiça dos Estados para julgá-los quando acusados da prática de crimes comuns (RE nº 162.966/RS, Pleno, relatado pelo Ministro Néri da Silveira, publicado na RTJ 152/657; HC nº 72.465-5/SP, 1ª Turma, relatado pelo Ministro Celso de Mello, DJU de 24/11/95, página 40.387; AI nº 177.313-8/MG, 1ª Turma, relatado pelo Ministro Celso de Mello, DJU de 05/02/96, página 1.283).

De resto, em r. despacho datado de 21/02/97 e publicado na página 4.800-1 do DJU de 04/03/97, o Ministro Carlos Velloso arquivou inquérito que atribuía a Deputado Federal, quando Prefeito de município do interior do Estado do Ceará, a prática de crimes e de atos de improbidade referidos na Lei nº 8.429/92, anotando, quanto a acusação de improbidade administrativa, que havia óbice competencial:

“Anota Marcelo Figueiredo que ‘a ação de improbidade será processada conforme as regras da lei processual civil e terá rito ordinário’ (página 90, Probidade Administrativa, Comen-tários à Lei 8.429/92 e legislação comple-mentar, Marcelo Figueiredo, Malheiros Editores Ltda., 1995).

Como a alegação de improbidade administrativa concerne à atuação do acusado como Prefeito Municipal, observadas as formalidades legais atinentes à espécie, competente para propor a ação de improbidade administrativa é o representante do Ministério Público Estadual, com atribuição específica, ou a Prefeitura Municipal de … (artigo 17 da Lei 8.429). Obviamente, o Supremo Tribunal Federal não é o órgão competente para conhecer, inicialmente, de ação de improbidade administrativa, ainda que proposta contra quem detenha atualmente o mandato de Deputado Federal”.

4. O acórdão do Tribunal de Contas do Município de São Paulo copiado a fls. 1.376 e seguintes não tem nenhuma relevância para o deslinde desta causa.

Em primeiro lugar, porque tal “decisão” não abordou e nem estudou toda a matéria debatida nestes autos, limitando-se a considerar apenas as operações com as LFTM’s ocorridas entre 01/12/94 e 29/11/95.

Em segundo lugar, porque a legalidade dessas operações, ao contrário do que constou no terceiro considerando do acórdão do TCM, não foi afirmada pelo Banco Central quando de seus rastreamentos técnicos (fls. 1333/1393 – 7º volume dos documentos).

Em terceiro lugar, porque ninguém pode excluir da apreciação do Poder Judiciário a lesão ou ameaça a direito (artigo 5º, inciso XXXV da CF/88), certo que os “Tribunais de Contas” não fazem parte do Poder Judiciário e nem o compõem.

E, finalmente, porque os diversos controles da Administração, inclusive os chamados “externos”, tais como aqueles exercidos pelos Tribunais de Contas, não vinculam o Poder Judiciário, cuja competência se restringe ao “controle da legalidade e da legitimidade do ato impugnado. Por legalidade entende-se a conformidade do ato com a norma que o rege; por legitimidade entende-se a conformidade do ato com a moral administrativa e com o interesse coletivo (princípios da moralidade e da finalidade), indissociá-veis de toda atividade pública. Tanto é ilegal o ato que desatende à lei formalmente, como ilegítimo o ato que violenta a moral da instituição ou se desvia do interesse público, para servir a interesses privados de pessoas, grupos ou partidos favoritos da Adminis-tração” .

5. A inicial não é inepta e o Ministério Público é parte ativa legítima para a demanda, tal como já se observava a fls. 73/76, quando da decretação da indisponibilidade patrimonial dos requeridos.

Acrescente-se que essas questões também foram alegadas, preliminarmente, em alguns dos vários agravos de instrumento tirados contra tal decisão, todos improvidos, segundo notícias divulgadas pela mídia.

De todo modo, embora equivocadamente rotulada como “Ação Civil Pública”, a petição inicial descreve com precisão a rede de negócios irregulares com os títulos públicos, rastreados por técnicos do Banco Central, inclusive, e que também foram objeto de profunda e estrondosa investigação por Comissão Parlamentar de Inquérito instaurada no Senado da República, como se sabe, cujos relatórios preliminares e transcrições de depoimentos foram juntados, por cópia, nos alentados autos de inquérito civil que a acompanham.


Em tese, as condutas imputadas aos requeridos, pessoas físicas e jurídicas, constituem improbidade administrativa que atenta contra os princípios da Administração Pública, assim configurada na ação ou omissão que viola os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições, e notadamente – e é o que interessa – na prática de ato visando fim proibido em lei ou regulamento, ou diverso daquele previsto, na regra de competência e na regra do mercado financeiro.

Em suma, as pretensões condenatórias veiculadas na petição inicial, apesar do rótulo manifestamente equivocado, têm respaldo na Lei nº 8.429/92, extraindo-se da disposição de seu artigo 17 a legitimidade ativa do Ministério Público.

6. O mais preliminarmente alegado nas contestações, tal como a ilegitimidade passiva das empresas requeridas, é questão de mérito ou enfoque que com este se confunde, não merecendo conhecimento destacado ou isolado.

7. Para melhor compreensão do tema “sub judice” nestes autos, são necessárias algumas observações sobre o contexto em que se deram as operações com títulos públicos municipais inquinadas de irregulares.

A Constituição Federal de 1988 foi discutida e promulgada sob o signo de ressaca democrática. Vínhamos, como se sabe, regidos por normas constitucionais outorgadas por sistema político de exceção que perdurou quase 25 anos, e era mesmo necessária uma reforma estrutural no Estado brasileiro.

Ocorreu, entretanto, que vingou a tese de uma assembléia constituinte “profissional”, formada por integrantes do Congresso Nacional, Senadores e Deputados Federais então eleitos para também comporem a Assembléia Constituinte, e isso redundou em texto constitucional pouco explícito e contraditório em muitos temas, excessivamente longo e detalhista, que mal resolveu, até pela forma ideal e pouco realista com que redigido, as questões institucionais federativas .

De todo modo, naquilo que vem ao caso, essa Assembléia Constituinte autorizou, no artigo 33 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, uma moratória de oito anos para os precatórios judiciais de créditos não alimentares pendentes na data de promulgação da nova carta política (05/10/88), que deveriam ser pagos, incluído o então remanescente de juros e correção monetária, em oito prestações anuais atualizadas, iguais e sucessivas, a partir de 01/7/89; permitida às entidades devedoras (União, Estados e Municípios) a emissão de títulos de dívida pública, não computada para efeito do limite global de endividamento, no exato montante desse dispêndio.

A idéia básica, como não é difícil perceber, apesar de sua duvidosa moralidade , era permitir o decantado equilíbrio das contas públicas: a União, os Estados membros e os Municípios teriam como financiar boa parte dos passivos judiciais existentes até a promulgação da Constituição, sujeito o endividamento posterior a rígido controle por parte do Senado Federal (artigo 52, incisos V, VI, VII e IX) .

Infelizmente, nada disso aconteceu, ao menos no que se refere aos governos do Estado de São Paulo e de muitos de seus Municípios, inclusive o da Capital, havendo notícia de que em alguns governos de outros Estados membros essa moratória constitucional também foi mal aproveitada ou deturpada, porque houve manipulação das quantias relativas a tais débitos judiciais (em muitos casos se afirmou, falsamente, a existência de maior volume do débito judicial abrangido pela moratória, assim possibilitado o lançamento de títulos da dívida pública em quantia superior ao constitucionalmente permitido) ou porque houve a aplicação dos recursos assim levantados em outros fins que não o pagamento de tais débitos judiciais, muitos deles simplesmente não pagos até hoje…

Especificamente quanto aos precatórios judiciais paulistas de créditos não alimentares, que se referem, basicamente, a indenizações de desapropriações (maior parte) e repetições de indébito tributário (menor parte), há de se lembrar que o volume desse endividamento só não foi maior, quanto às desapropriações, porque os Juízes em exercício nas Varas de Fazenda Pública desta Capital, entre 1989 e 1990, passaram a exigir, antes da imissão do Poder expropriante na posse dos imóveis expropriados, o depósito judicial do valor de mercado desses bens, obtido em perícia de avaliação provisória realizada logo no início dos processos.

O estudo desse grupo de juízes, que passou a ser adotado em quase todas as comarcas e varas de fazenda pública do país, foi publicado na RT 669, páginas 243/252, em julho de 1991, teve como propósito, entre outros, “impedir que administradores inescrupu-losos promovam obras repassando a parte mais gravosa das despesas para as gestões seguintes”, e tal procedimento judicial ganhou, depois de alguma hesitação, o beneplácito da então 2ª Seção do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e do Superior Tribunal de Justiça.

Ainda de passagem, até como contribuição para o aperfeiçoamento normativo institucional que se faz necessário para evitar a repetição de fatos como os discutidos nestes autos – se é que realmente se pretende isso -, nesses tempos de revisão ou de reformas do texto constitucional, chegou a hora de alguém propor a supressão do artigo 100 da CF/88, à título talvez da acalentada reforma do Poder Judiciário, porquanto tal norma, em especial, é a maior responsável pela morosidade da efetiva e concreta resposta jurisdicional às demandas dos cidadãos contra as fazendas públicas.

Não há, atualmente, motivo algum para a manutenção dessa odiosa discriminação, que implica em sujeitar o cidadão, quando sucumbente em demanda judicial com as fazendas públicas, a um fulminante processo de execução (artigo 652 e seguintes); e em sujeitá-lo, quando vencedor da demanda, a um moroso processo de execução para haver seu crédito (artigo 730 e seguintes), que demora mais tempo que o necessário para o aperfeiçoamento do título judicial, ainda que considerando a contagem diferenciada dos prazos processuais e o duplo grau obrigatório, privilégios outros das fazendas públicas em juízo…

Em suma, é politicamente incorreto e juridicamente insustentável, inclusive em termos de direito comparado, pugnar pela manutenção das regras do artigo 100 da CF/88 e do artigo 730 do CPC, que vulneram o princípio da isonomia e também desequilibram os ideais republicanos, nas palavras recentes do Presidente do Supremo Tribunal Federal e do Presidente do Senado Federal.

8. Para cumprir seus orçamentos, os Municípios só podem obter dinheiro de quatro fontes distintas : a) arrecadação de impostos e taxas; b) financiamento para antecipação de receita orçamentária (ARO); c) financiamento para desenvolver projetos e obras específicas; e d) financiamento mediante a emissão de títulos públicos.

Salvo quanto a arrecadação tributária e a rara concessão de créditos, “a fundo perdido”, pelos governos federal e estadual – ou por governos e instituições estrangeiras – visando o desenvolvimento de projetos ou a realização de obras específicas, todas as outras formas de obtenção de dinheiro são onerosas para os Municípios, que não raro se comprometem a pagamentos prolongados por vários anos, muito além do tempo de mandato eletivo, hoje de quatro anos (…).

Clique aqui para ler a continuação da sentença.

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