Juros ilegais

Juros ilegais nos cartões de crédito

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26 de outubro de 1999, 23h00

As quitandas e os vendedores de água de coco não podem cobrar juros maiores que 12% ao ano, e as administradoras de cartão de crédito também não.

Como é do conhecimento geral, os juros cobrados pelas administradoras de cartões de crédito são os mais altos do mercado, chegando a mais de 300% ao ano. Ocorre que tal cobrança é ilegal.

Primeiramente cumpre esclarecer que não obstante a vetusta posição tomada nos idos da década de 80 pelo Supremo Tribunal Federal (ADIN nº4), no sentido de que não seria auto-aplicável o § 3º do art. 192 da Constituição da República (que limitou os juros reais deflacionados – em 12% ao ano), o fato é que hoje contam-se aos milhares por todo o Brasil os julgados em sentido contrário – inclusive recentemente a Quarta Câmara Civil do Tribunal de Justiça de Santa Catarina fechou questão a respeito, finalmente decidindo que sua posição é “pela limitação dos juros ao fixado no § 3º do art. 192 da CF” (Apelação cível 98.010311-8, relator Des. João José Schaefer, em 30 de junho de 1999).

Mas, apesar desta verdadeira “insubordinação jurisprudencial de base”, não se pode negar que o Supremo Tribunal Federal não alterou ainda – sua posição original e, ao contrário, vem reiterando-a. No mesmo diapasão segue o Superior Tribunal de Justiça, ora remetendo a questão ao STF, ora decidindo que a norma constitucional que limita os juros em 12% ao ano carece de regulamentação para ter plena eficácia.

Para os que mantêm este último e já superado entendimento, restaria, então a aplicação, no caso, do disposto na Lei da Usura (Decreto 22.626/33), que em seu artigo 1º desde a primeira metade deste século que finda limitou os juros anuais máximos em 12%.

Mas aqui haveria outro óbice: grande parte da jurisprudência, corroborada por posição unânime do Superior Tribunal de Justiça entende – equivocadamente, diga-se – que a criticada Lei 4.595/64 teria revogado a sujeição das instituições financeiras à Lei da Usura, e que estas estariam livres para praticar os juros que quisessem. É a vitória da já desmentida doutrina neoliberal de que o mercado promove a auto-regulação dos preços, entre eles dos juros – o preço do dinheiro. O que levaria à conclusão de que as administradoras de cartões de crédito, na qualidade de instituições financeiras, também poderiam taxar livremente os juros.

Nada mais falso, e por uma simples razão: as administradoras de cartões de crédito não são instituições financeiras.

Realmente, o site do Banco Central informa que o regular funcionamento de uma instituição financeira depende prévia autorização daquele órgão, dizendo, porém, em outro ponto, que “não autoriza e não fiscaliza regularmente administradoras de cartões de crédito” (http://www.bcb.gov.br). Ora, se uma instituição financeira, para funcionar regularmente, necessita de prévia autorização do Banco Central, e se às administradoras de cartões de crédito é garantido o funcionamento sem tal chancela (assim como é permitido às quitandas e aos vendedores de água de coco), então, evidentemente é porque não revestem-se da qualidade de instituição financeira e, portanto, não estão ao abrigo da famigerada Lei 4.595/64 e, muito menos, a salvo da incidência da Lei da Usura, sendo-lhes vedada, então, a prática de juros superiores a 12% ao ano, em tese permitida somente às instituições financeiras, entras as quais, como visto, não se enquadram as quitandas, os vendedores de água de coco e, igualmente, as administradoras de cartões de crédito.

Tal tese, aliás, já está sendo objeto de julgamento no Superior Tribunal de Justiça, e, segundo informa a renomada revista eletrônica “Consultor Jurídico” (http://cf3.uol.com.br:8000/consultor), o primeiro voto foi dado pelo Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, para quem “as administradoras de cartão de crédito não são instituições financeiras e, por isso, não podem cobrar juros na fatura dos clientes superiores a 12% ao ano”.

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