LEASING - Dívidas em Dólar

Questionamento sobre forma de pagamento das dívidas em dólar americano

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8 de julho de 1999, 0h00

LEASING – DÍVIDAS EM DÓLAR. PAGAR OU NÃO ?

Geraldo Doni Júnior

Questiona-se muito se os arrendatários de bens, cujo contrato foi firmado com a correção em dólar norte americano devem ou não pagar suas prestações reajustadas, conforme determina o contrato que firmaram.

Questionando as queixas verifica-se que: em suma, houve uma mudança drástica nos valores das prestações dos contratos. Os ganhos de capital em regra, tiveram uma variação inferior e desproporcional equiparados ao valor do aumento verificado. O equilíbrio econômico-financeiro do início do contrato foi alterado. Houve uma vantagem para a Instituição credora, de forma substancial. Além de que, o ocorrido não pode ser tido como correção da inflação. As Instituições credoras em geral não demonstram que tomaram o dinheiro utilizado no exterior ao firmar o contrato. Existia confiança na estabilidade prometida pelos nossos governantes. Os tomadores em geral agiram de boa-fé ao firmar os contratos. E em última análise, não é ético adotar-se medidas, que sabe-se, tornam desprotegidos os consumidores que confiaram nas afirmativas de que o real valia tanto quanto, ou mais que o dólar.

Outros tantos questionamentos poderiam ser feitos, para verificar se o direito básico do contratante está sendo vilipendiado.

O Código de Proteção e Defesa do Consumidor em seu art. VI, inciso V, determina: ser direito básico do consumidor: a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas”. Da mesma forma são as determinações do art. 51 do mesmo codex em seu inciso IV , que diz: “São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade”, além de outros artigos que no correr do trabalho serão citados.

DO LEASING –

Sem dúvida é difícil identificar com minúcias qual a natureza do leasing, especialmente de todas as relações contratuais que formam o seu contexto e mesmo a natureza dos institutos a ele afetos, pois, enquanto uns localizam-se no direito comercial, outros tem sede no Código Civil, nas legislações esparsas e até no direito alienígena.

Claude Champaud, citado por Rodolfo de Camargo Mancuso , chega a apontar cinco figuras negociais no leasing: uma promessa sinalagmática de locação, uma relação de mandato, uma locação de coisas, uma promessa unilateral de venda e, eventualmente uma venda.

Claro que por não tratar-se de contrato real, a promessa sinalagmática de locação é contestável, vez que a locação dispensa a tradição para manifestar-se. Contestável também a relação de mandato, inserida como figura negocial, vez que supõe-se seja ela gratuita, o que inocorre no leasing.

Aliás, já se manifestara em lapidar sentença, o ilustre juiz de direito da Comarca de Curitiba – Pr., Dr. Benjamim Acácio de Moura e Costa, em assunto semelhante e tecendo comentários sobre a Natureza Jurídica do Contrato de Leasing, conforme a praticada pelas Instituições Financeiras em nosso País.

Disse ele :

“Assim, ante a limitação para identificar sua origem, igual dificuldade gera na interpretação do contrato de leasing, pois, por momentos deve se pensar na aplicação do Princípio da Autonomia da Vontade, porém, conforme a origem do Instituto contratual, esta autonomia sofre a mitigação no Princípio da Autonomia Monitorada pelo Interesse Público(grifamos), ou, até, na Indisponibilidade da Vontade. No mesmo rumo alicerça-se a aplicabilidade das Teorias da Obrigatoriedade Absoluta dos Pactos, Da Revisão dos Pactos pela Imprevisão, ou como mais recente, através do Código de Defesa do Consumidor, a simples demonstração do Excesso de ônus a ser suportado pelo Contratante, humanizando ainda mais o direito obrigacional.

Assim, indaga-se se leasing é um contrato, em sendo, se o é de Direito Comercial, Mercantil, Financeiro, Social etc…, de forma que, de acordo com a inclinação das vertentes jurídicas acima mencionadas, permitirá uma análise mais branda ou severa do Instituto, em especial dentro da obrigatoriedade contratual, porém, é incontroverso que, ao lado do Título de Crédito, foi o Leasing, inegavelmente uma das criações mais fomentadoras da circulação e utilização de mercadorias, cuja interpretação a ser dada pelo Poder Judiciário, já que sequer lei específica existe, deve, ainda, ater-se para que não se transforme em um instituto de prática inviável”.

Neste sentido, considerando que o leasing é “a locação de bens móveis duráveis ou imóveis, adquiridos pela locadora para esse fim, sendo dado ao locatário, no término da locação, a tríplice opção de prorrogar o aluguel, devolver o bem, ou comprá-lo pelo seu valor residual”, facilmente detecta-se o primeiro nascedouro do contrato, qual seja, fomentar a atividade produtiva, é um contrato estimulador da contenção do capital de giro da Arrendatária, de forma a não descapitalizá-la, aquecendo a economia empresarial, portanto, assume todos os caracteres de uma natureza jurídica MERCANTIL.


Contudo, mesmo que não seja exclusivamente mercantil, percebe-se numa análise perfunctória que o contrato de leasing tem por meta fomentar a atividade que produz sem o aumento do patrimônio e conseqüentemente sem descapitalizar o arrendatário.

Da digressão acima, se depreende que, empreendido raciocínio ou objetivos diversos destes, especialmente aquele que deturpa o contrato em vista da descapitalização do consumidor contratante, não se estará interpretando um contrato de leasing, mas sim, outro qualquer dentre os Financeiro, Mercantil, Econômico ou Cível, pois um contrato genuíno de leasing visa o fomento mercantil e não a decapitação do arrendatário.

Qualquer outra camuflagem não atingirá os objetivos e apresentar-se-á desvirtuado de sua origem e razão.

Como se sabe, embora identificado, a nossa legislação, até o presente momento, não se ocupou em regrar o contrato de leasing, enquanto relação entre contratante e contratado, cabendo à doutrina e Regramentos esparsos do Governo Federal quando de seus planos de Estabilização Econômica.

Em regra, o legislador, tratou tão somente de seu aspecto fiscal, cujo resultado agregado às crises econômicas e aos desajustes naturais de nossa economia, passou a gerar crises nesta relação contratual, cujo objetivo final deve ser única e exclusivamente o seu caráter fomentador mercantil, cujo fundamento é a não descapitalização da empresa arrendatária ou a necessidade de capital de giro.

Não é sem razão que, originalmente o Leasing somente era concedido a pessoa jurídica, viabilizando, assim, o desenvolvimento destas.

Embora estejamos diante de um contrato sem regra específica ou desregrado, já que gera tanta celeuma, tanto que não se sabe se é ele uno ou encadeamento de contratos, vez que nele, pode ser exercido a compra e venda do bem arrendado ou a devolução e até a prorrogação do contrato, sendo que há um empréstimo de dinheiro para aquisição do bem, surgiu uma norma tímida emanada da Comissão de Programa de Controle de Estabilidade Econômica – a Nota Técnica nº 12, de 03-03-89, suprindo a inexistência de Lei, que procurou fornecer subsídios relevantes para o entendimento e funcionamento deste contrato sem regra, e o fez nos seguintes termos:

“I- as operações de leasing não se caracterizam como locação ou prestação de serviços em virtude de apresentarem peculiaridades próprias, tais como:

a)- o contrato de leasing apresenta três alternativas de livre escolha do arrendatário ao final do contrato: opção de compra do bem, devolução do bem ou renovação do contrato;

b)- o bem arrendado não se encontra disponível na sociedade arrendadora, sendo por esta adquirido somente por solicitação específica do arrendatário, junto ao fornecedor por ele indicado, e que será usado exclusivamente pelo arrendatário;

c)- o contrato de leasing é de natureza irretratável, irreversível, não cancelável, seu prazo longo aproximando-se da vida econômica útil do bem;

II- apesar da forma jurídica do leasing, disciplinada pelas leis nº 6099/74 e 7132/83, atribuir tratamento tributário semelhante ao aluguel, a essência da operação é um financiamento para obtenção de um bem do ativo fixo, pois:

a) a sociedade arrendadora é uma intermediária na operação, captando recursos no mercado financeiro e repassando-os através do contrato de leasing;

b- a sociedade arrendadora está sujeita ao controle e fiscalização do Banco Central do Brasil;

c)- a operação constitui-se numa alternativa financeira para aquisição do ativo fixo e não consubstancia nenhum serviço a não ser comprar o bem arrendado, pagar o fornecedor e colocá-lo à disposição da arrendatária;

d)- a operação de leasing apresenta cláusula de valor residual, base para a opção de compra, que usualmente representa parcela simbólica, significativamente inferior ao seu valor de mercado.

Buscando corroborar com o entendimento já expendido anteriormente, temos que o governo deu contornos relevantes ao contrato de leasing, e das considerações acima, pode-se extrair que é um contrato, cujo prazo de duração, é marcado pela longevidade, a qual deverá ter como paradigma a aproximação com a vida econômica útil do bem, também, depreende-se que a empresa arrendadora poderá captar recursos dentro do mercado financeiro, e os recursos serão repassados através do contrato, sendo que o contrato é uma alternativa financeira de fomento, portanto, é um contrato sujeito às regras do mercado financeiro, e o valor residual para a compra será muito inferior ao valor de mercado do bem.

A natureza jurídica embora não detectada, desperta entendimentos diversos, sendo assim, sem um consenso comum.

De qualquer forma, mesmo sem a uniformidade dos operadores, muitos aspectos relevantes são destacados e devem ser considerados para a análise um contrato de leasing, e são eles: 1) o caráter fomentador da operação; 2) a não descapitalização da empresa; 3) analisá-lo especificamente como um contrato financeiro; 4) sua longevidade deve ser compatível com a vida útil do bem ; 5) manutenção da base objetiva do contrato.


DA APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Se o Código de Defesa do Consumidor é norma de ordem pública, e, portanto, do interesse público, sendo, assim, cabível a sua aplicação, desde logo, aos contratos em geral.

O contrato de Leasing, possui o caráter de contrato de adesão por excelência. E nos contratos de adesão é indiscutível a predominância da vontade de uma das partes em detrimento da outra.

Assim, como a predeterminação das cláusulas fica a critério do proponente, não raras vezes aquele que adere acaba nem se apercebendo das cláusulas que lhe são desfavoráveis, assume, assim, obrigações exageradas e injustas.

E é justamente em razão disso que o nosso ordenamento jurídico reserva maior proteção à parte aderente, cuja autonomia da vontade limita-se à concordância em relação às cláusulas previamente estabelecidas.

Note-se que em regra, não é concedido a qualquer contratante oportunidade de discutir o conteúdo das cláusulas existentes no contrato.

Não restam dúvidas de que o Código de Defesa do Consumidor se aplica aos contratos bancários, tendo em vista que a Instituição Financeira é fornecedora de créditos (ou empréstimos) e serviços, sendo os clientes meros consumidores desses créditos ou serviços e os próprios contratos assim se identificam.

Além disso dispõe o art. 6º da Lei nº 8.078, em seu inciso VIII, que é direito básico do consumidor a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova.

Portanto, se um contrato faz lei entre as partes, seu equilíbrio inicial, ou seja, as bases em que foi firmado devem ser mantidas, sob pena de a parte mais fraca, o contratante, sofrer lesões irreversíveis, ao passo que o credor, no caso em cheque, obtém uma vantagem exagerada.

O C.D.C., não se ateve apenas em ocupar-se das relações existentes entre Consumidor e Fornecedor ( relação de consumo), mas também, preocupou-se em mirar regras visando as relações que podem afetar a Ordem Pública e o Interesse Social, ainda que não marcadas por uma relação de consumo (art. 1º do C.D.C), portanto, aí também se encontra a aplicação do CDC nos contratos de leasing, pois estes trazem em seu bojo, como dito, face o caráter fomentador e não descapitalizador da força produtiva, o relevante interesse social e preocupação com a ordem pública .

“ART.1º – O presente código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social, nos termos dos arts. 5º, inciso XXXII, 170, inciso V da Constituição federal e art. 48 de suas Disposições Transitórias”

Da mesma forma, tem-se pela regra do art. 29 do CDC, novamente, a viabilidade legal da sua aplicabilidade, senão vejamos:

“ART.29 – Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas”.

Desta forma, certo é a aplicabilidade das normas do CDC nos contratos de leasing.

Assim, todo contrato de leasing sem qualquer sombra de dúvidas está afeto às relações de consumo, quer pelo interesse ou pela ordem pública que esta relação ostenta, como também pela utilização final do bem adquirido.

E mais. Entendendo-se o contrato de leasing como sendo um todo, porém fruto de agregação de diversos atos jurídicos, ou seja: Compra e Venda, por ser bem móvel, Financiamento ou Locação, verifica-se que em todos estes contratos, tem-se vertente a figura de consumidor e fornecedor, portanto, sujeitos às normas do CDC.

O DÓLAR COMO INDEXADOR

No caso do dólar, não pode ele ser concebido como índice de correção monetária, posto que, a indexação é uma forma de se resguardar o valor da moeda em períodos inflacionários, mantendo o equilíbrio dos contratos. Portanto, não se justifica a abusividade dos aumentos, vez que onera de forma desproporcional o contratante em favor do contratado, não podendo o dólar ser enquadrado como índice indexador, em face de ser uma forma de especulação financeira, indo além do objetivo que foi figurado no contrato. Assim, não se poder dizer, que era previsível que tal ocorresse por ocasião da assinatura da avença.

Vale ressaltar que o contrato, especialmente os de leasing, já prevêem um ganho de capital para a arrendadora.

Ante o esposado, resta evidente que a flutuação do dólar torna impraticável qualquer previsão e nem reflete a inflação de nossa economia. A dita flutuação está a mercê de interesses financeiros estranhos aos contratos, restando claro que a cláusula de escala móvel pactuada não guarda relação com a sua finalidade.

Considerando ainda, que os instrumentos contratuais analisados, são todos contratos típicos de adesão, ou seja, contém vários “complementos” e bloco de cláusulas previamente estabelecidas, promissórias assinadas em branco etc., em suma, o credor impõe as condições e o tomador adere as cláusulas, sem outra alternativa, as atenuantes do devedor se minimizam.


Desde logo é bom que se saliente que a liberdade de contratar não é ilimitada; ao contrário, encontra seus limites na ordem pública e nos bons costumes.

Na verdade, o contrato bancário deve ser interpretado com cautela, em favor da parte mais fraca .

Doutrinadores da lavra de Gustavo Tepedino, entendem que, o Estado, não pode se eximir das responsabilidades de seus atos sobre a responsabilidade dos negócios. Nem pode deixar o Poder Judiciário à mercê do estreito ditame dos acordos negociais, desestabilizados como são, a todo instante, por leis, decretos, resoluções, indexações e desindexações que transformam a cada momento as circunstâncias e a finalidade inicial almejada pelas partes.

As tais cláusulas denominadas de “cláusula surpresa e a cláusula contratual com termos de flutuação, têm sido banidas por nossos tribunais :

Recentes decisões têm entendido que :

“Os contratos formulário ou contratos de adesão estão intimamente vinculados ao princípio geral da boa-fé, o qual faz ter por gênese um dever de informar as condições da contratação levada a termo.

Isto se dá para que não nasça uma situação caracterizada através da cláusula surpresa.

A surpresa sobre determinada circunstância contratual pode decorrer, não só da má-fé do fornecedor na conclusão do contrato e da falta de esclarecimento adequado sobre o conteúdo do contrato, mas também da redação obscura. A redação clara e de fácil compreensão também é princípio que deve ser observado para que o contrato de consumo tenha eficácia relativamente ao consumidor. (Nelson Nery Júnior, “Código Brasileiro de defesa do Consumidor, Ed.Forense Universitária – Biblioteca Jurídica, 1ª ed., 1991, pg.345).

Ainda que não haja uma relação de consumo propriamente dita, tais princípios são aplicáveis seja por serem informativos da matéria, seja por derivarem de uma interpretação dos próprios institutos de natureza mercantil.

A cláusula contratual que estipula um dever de informação das alterações dos fatores econômicos previstos em contrato estão em consonância a estes princípios. Norma, aliás, não cumprida pela Instituição Financeira.

Deixando de prestar as informações devidas, o termo de flutuação em anexo ao contrato de Arrendamento Mercantil (“Leasing”) faz com que a flexibilidade as suas normas tenham natureza potestativa, sendo nulas de pleno direito, não sendo permissível que a arrendante altere as taxas ao seu talante, com isso aumentando o valor das contraprestações devidas pela arrendatária.

A repetição do indébito é devida, ainda mais se deste modo demonstrou o laudo pericial”.

RECURSO PROVIDO – Acórdão N. 2690 – 6ª Vara Cível

Segundo o Prof. Francisco Campos (in Anteprojeto do Código das Obrigações) :

“O juiz pode ordenar a resolução ou a revisão do contrato quando em razão de circunstâncias que não podiam ser previstas, o devedor, na execução de prestações futuras, seja onerado por prejuízo considerável e o credor aufira um proveito injusto”.

O contrato, diz-se, tem força de lei entre os contraentes. No entanto, esta regra tem sofrido atenuações consideráveis, graças ao fortalecimento de novas concepções que procuram valorizar a função social dos contratos.

Sua sustentação depende da consideração de outros princípios gerais de direito (equidade, boa fé etc.), cuja existência, nem sempre expressa num texto legal, é indiscutível.

Não é sem razão que o legislador pátrio fez inserir no art 5º da Lei de Introdução ao Código Civil um princípio basilar de aplicação da norma jurídica :

“Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”.

Não que se queira induzir a aceitação da “Teoria da Imprevisão” ou o “Fato do Príncipe” como causadores da quebra do contrato, embora de certa forma poderiam ser elas acatadas. No entanto, o meio balizador é a “Teoria da Quebra do Contrato”, avalizada pelo Código do Consumidor em seu artigo 6º, inciso V, onde o vislumbre é a quebra da base do contrato, tendo em vista o desequilíbrio ocasionado pelo rompimento da relação de equivalência entre as prestações, o que torna o contrato viciado, gerando a insatisfação pessoal do consumidor e prejuízos de ordem econômica.

O magistrado Werson Franco Pereira Rêgo, professor de Direito do Consumidor da Universidade Estácio de Sá – RJ, citando Cláudia Lima Marques , afirma:

“É direito insofismável dos consumidores – nos contratos relacionados à aquisição ou ao arrendamento de bens, cujo critério de reajuste das prestações dos contratantes encontra-se vinculado à variação cambial – revisão de tais cláusulas, com fundamento no art. 6º, V, da Lei nº 8.078/90, fixando-se em reais, o valor da prestação e, após, estabelecer-se um novo critério de reajuste, cuja finalidade última é, apenas, evitar-se a corrosão do valor da prestação e, não, enriquecer a financeira.”


Nesse sentido, acórdão do Egrégio Superior Tribunal de Justiça abonando a tese da quebra da base do negócio por fato superveniente:

“Ementa – Promessa de Compra e Venda. Resolução. Fatos Supervenientes. Inflação. Restituição.

A modificação superveniente da base do negócio, com aplicação de índices diversos para a atualização da renda do devedor e para a elevação do preço contratado, inviabilizando a continuidade do pagamento, pode justificar a revisão ou a resolução judicial do contrato, sem ofensa ao art. 6º da LICC.”

RESP 73370/AM; (95/0043990-5). Fonte DJ.-12-02-1996,pg.02433. Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar (1102). 21/11/1995 – T4 – Quarta Turma.

Como antes aduzido, nos contratos de adesão, “cujas cláusulas são predispostas por iniciativa de uma só das partes, sem permitir modificação por quem a elas aderem”, dando azo, por óbvio, para que o mesmo seja interpretado contra quem o edita, ou seja, contra o credor, mesmo porque, parafraseando Orlando Gomes, “é de se aceitar como diretriz hermenêutica, a regra, segundo a qual, em caso de dúvida, as cláusulas do contrato de adesão devem ser interpretadas contra a parte que a ditou”.

DA COMPROVAÇÃO PELO ARRENDANTE DO EMPRÉSTIMO EXTERNO

Os emprestadores que inserem em seus contratos cláusulas ditando a ciência do devedor de que o dinheiro tomado tem origem em empréstimo externo, devem comprovar a origem do empréstimo, posto que se não o fizerem, o contrato será considerado nulo.

Acatando a idéia do eminente juiz Dr. Benjamim Costa, a alegação de que houve captação de dinheiro no mercado externo, dá ao contrato, contornos de contrato financeiro (elemento delimitador). Neste aspecto é inegável que foi cumprido, pois a empresa arrendadora desembolsou dinheiro para efetuar a compra do bem fornecido à arrendatária, tudo de acordo com as especificações dadas por esta, porém, se no contexto contratual, não restar demonstrada a transação do Arrendador junto ao Mercado de Capital, sede que teria, em tese, percorrido para arrecadar o dinheiro do contrato, esta garantia é fundamental para se ter confirmada a legítima pretensão de repasse da importância captada, uma vez não demonstrada esta origem, fere a boa fé contratual e incide a presunção de que o Arrendador não precisou ir até este mercado tão específico, logo, impossibilitado está de socorrer-se daqueles índices.

Muito embora verdadeiro que a captação em dólar, seja através de repasse via Resolução 63 do Banco Central, ou através da emissão de Eurobônus, passou a ser uma das maneiras mais utilizadas pelas companhias de arrendamento mercantil para a formação de “funding” (Gazeta Mercantil, relatório,p.7 – apud, by CARLSO ALBERTO DI AUGUSTINI, in Leasing, Atlas,1995,p.61), não menos certo é que, conforme o disposto na resolução 980 do Banco Central, este mesmo “funding” ou a “forma de captação de recursos que serão aplicados na concessão de operações às empresas arrendatárias” pode ser composto, além da captação no exterior, também com:

a) recursos próprios das empresas de leasing;

b) cessão de crédito;

c) colocação de debêntures;

d) repasse de recursos do sistema BNDES;

e) captação via CDI;

f) venda de CDBs etc.

Mas para que a responsabilidade pela paridade cambial seja repassada ao arrendatário, é imprescindível que a arrendadora comprove sem deixar margem a dúvidas, que, em sua totalidade, os recursos com os quais adquiriu o bem arrendado, efetivamente tenham sido captados no exterior em moeda estrangeira (grifamos).

Não bastasse isso, o numerário obtido pela empresa arrendadora deve guardar vínculo explícito e comprovado com a operação de compra do bem arrendado. É necessário demonstrar a arrendadora o caminho contábil que liga à verba efetivamente destinada à aquisição do bem objeto do leasing a fim de que se atenda ao disposto no art. 38 da Res. 980 do Banco Central.

Finalmente, deve ainda a arrendadora comprovar que a aludida captação ainda esteja pendente, vale dizer, que ainda não tenha sido liquidada junto ao Banco estrangeiro pois, se já o foi, não terá mais, frente ao arrendatário, um crédito em moeda estrangeira, mas, isto sim, em moeda nacional, ou seja, em real, que passa a ser acrescido apenas de correção monetária.

Este é o entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça

“A correção Cambial deve se estender até o efetivo desembolso do numerário, pelo Banco Nacional, para satisfazer a dívida em dólares, perante o Banco Estrangeiro; a partir daí, a correção será pelos índices internos de atualização das dívidas. (RSTJ vol.76/175.M.Ruy Rozado de Aguiar)”

DA TAXA FLUTUANTE

Bem explanou o MM juiz Dr. Antenor Demeterco Júnior, que em recente e lapidar sentença concedendo liminar, citou o prof. Eugênio Gudin : “Tal regime monetário anárquico (a expressão é do prof. Gudin), configura o regime permanente de taxas cambiais flutuantes, ou a omissão em adotar a política monetária indispensável para reduzir as flutuações ao mínimo.

As taxas flutuantes não têm a virtude de um “estabilizador automático” .

Com “inflação” ou “instabilidade política” a fuga da moeda é inevitável, e a taxa cambial não será mais flutuante e sim cadente.

Entregar a fixação do preço do bem adquirido ou de seu arrendamento aos azares da especulação, das flutuações violentas do câmbio, é ignorar o sistema legal protetivo do consumidor no Brasil”.

CONCLUSÃO

Ante estes e outros tantos argumentos, que por certo os operadores do direito hão de formular, entendo que as dívidas corrigidas pelo dólar, mediante certas circunstâncias devem ser discutidas em juízo, bem como, penso que as negociações da forma como estão sendo propostas pelas Instituições Financeiras não são convenientes ao tomador, especialmente se o valor residual vem sendo cobrado junto com as parcelas mensais. De outra sorte, se ficar constatado que além da correção pela moeda norte americana, está sendo cobrado a famigerada comissão de permanência, juros sobre juros e outros acréscimos, por certo o contrato está a merecer uma revisão mais ampla.

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