Tortura coletiva afasta juiz

Juiz acusado de promover tortura é suspenso em SP

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14 de janeiro de 1999, 23h00

O Tribunal de Justiça de São Paulo suspendeu, por 30 dias, o juiz José Marcos Silva, suspeito de patrocinar uma “sessão de tortura coletiva” na cadeia pública de Osasco, em 10 de dezembro passado. A decisão foi anunciada nesta sexta-feira (15/01) pela Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo.

A permanência do juiz Marcos Silva à frente da Vara do Júri e Execuções Criminais de Osasco foi considerada inconveniente pelo Corregedor-Geral da Justiça, desembargador Sérgio Augusto Nigro Conceição, “ante a gravidade das imputações atribuídas ao magistrado no episódio ocorrido em Osasco”.

Em 7 de dezembro passado, os presos da cadeia de Osasco se rebelaram e mantiveram alguns carcereiros como reféns. A rebelião foi contornada, não havendo nenhum prejuízo à integridade dos reféns e à cadeia. No entanto, três dias após a rebelião, – quando se comemorava o cinquentenário da Declaração Universal dos Direitos Humanos – o juiz Marcos Silva teria comandado uma revisão nas celas.

Segundo o promotor dos Direitos Humanos do Ministério Público do Estado de São Paulo, Carlos Cardoso de Oliveira Júnior, responsável pelo inquérito, “a pretexto de promover uma revista nas celas, teria sido realizada uma operação de agressão generalizada e com requintes de crueldade, praticada por policiais militares e civis”.

Os presos teriam sido arrancados de suas celas, um a um, e levados para o pátio, onde foram vítimas de espancamento. Segundo os detentos, eles foram obrigados a passar pelo chamado “corredor polonês”. Os líderes da rebelião teriam sofrido agressões mais violentas em celas separadas.

As agressões teriam durado todo o dia. Os familiares dos presos, alguns deles moradores nas imediações, foram alertados pelos gritos que eram escutados até em suas casas. Muitos afirmam ter visto policiais entrando no presídio vestindo luvas cirúrgicas, e ao sair, traziam as roupas e as luvas marcadas de sangue.

No inquérito policial instaurado pelo MP, os presos confirmaram as acusações e afirmaram que o diretor da cadeia, José Geraldo Leonel Ferreira, e o juiz Marcos Silva, assistiram e estimularam as agressões. Exame de corpo delito realizado em cerca de 150 presos constatou lesões corporais em 132 deles. O Ministério Público calcula que mais de 400 presos sofreram agressões.

“Não está sendo fácil conduzir o inquérito policial porque a Polícia Militar de Osasco está criando uma série de dificuldades”, afirmou o promotor Oliveira Júnior. Para ele, “está prevalecendo o espírito de corporativismo em detrimento dos Direitos Humanos. Nesses casos, o decurso joga sempre a favor do réu”.

O promotor afirma que seria possível ouvir de 15 a 20 presos por dia, enquanto a polícia toma o depoimento de apenas 4 ou 5 homens diariamente.

Paralelamente ao inquérito, o TJ instaurou uma sindicância para apurar a conduta do juiz, que gerou a suspensão. Caso as agressões sejam confirmadas, o juiz José Marcos Silva poderá responder a processo criminal. “Também responde pelo crime de tortura a autoridade que toma conhecimento do fato e, podendo evitá-lo, não o faz”, sustenta o promotor.

Caso se confirme que o magistrado tenha estimulado as agressões, diz Oliveira Júnior, “seu caso seria até mais grave”. O magistrado teria cometido outro crime ao omitir as violências cometidas pelos policiais em relatório sobre a “visita” ao local.

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