Mulheres mutiladas

Anistia tentar combater mutilação genital feminina

Autor

23 de fevereiro de 1999, 0h00

Os números podem parecer absurdos, mas segundo a Anistia Internacional, anualmente, cerca de 2 milhões de meninas são submetidas à mutilação genital. Pelos cálculos da entidade 135 milhões de mulheres já foram mutiladas pelo mundo.

A mutilação genital feminina corresponde à extirpação total ou parcial dos órgãos genitais da mulher. A operação é realizada sem anestesia, em meninas de quatro a oito anos de idade. A prática, generalizada em mais de 28 países africanos e em algumas nações do Oriente Médio (Egito, Oman, Iêmen e Emirados Árabes Unidos), está sendo difundida entre comunidades de imigrantes em países industrializados, na Ásia e na América Latina.

A Anistia afirma já ter recebido relatos de mutilações ocorridas na Austrália, Canadá, Estados Unidos e em cerca de seis países europeus. As meninas são submetidas à mutilação em suas próprias comunidades, sendo operadas de forma clandestina. Em muitos casos, médicos compatriotas dessas comunidades chegam do exterior unicamente para realizar a cirurgia ou as meninas são enviadas a seus países de origem para serem mutiladas.

Existem três tipos de mutilação feminina: infibulação, ablação e excisão. A mais grave – informa a Anistia – é a infibulação, também conhecida como circuncisão faraônica. Neste tipo de cirurgia são extraídos, total ou parcialmente, o clitóris e os pequenos lábios, e retirados os grandes lábios. Desta forma, cria-se uma superfície em carne viva que é costurada para que cicatrize e tape a vagina.

Costume, tradição e até religião são princípios invocados pelas comunidades adeptas da mutilação para justificar o ato. O controle da sexualidade e das funções reprodutivas da mulher é uma das causas da mutilação. Alguns grupos acreditam que ela diminui o desejo sexual, reduzindo, desta forma, as possibilidades de infidelidade.

Em algumas sociedades as mulheres não-mutiladas são consideradas sujas e não tem permissão para lidar com água. Outra crença é a de que os órgãos genitais femininos são feios e volumosos e que o clitóris pode provocar a morte do homem, caso seu pênis o toque durante a relação sexual. Acredita-se, ainda, que se o clitóris encostar no bebê durante o parto provoca sua morte. A religião é invocada para justificar a mutilação nos países muçulmanos onde a prática é realizada. No entanto, os líderes muçulmanos não se mostram unânimes em relação ao assunto.

A mutilação feminina está sendo considerada motivo para pedido de asilo em outros países. Em 1993, o Canadá reconheceu a condição de refugiada à uma mulher somali que havia fugido de seu país, temendo que sua filha de 10 anos fosse obrigada a submeter-se à cirurgia. As autoridades norte-americas, em 1996, concederam asilo à Fauziya Kasinga, que havia solicitado refúgio para escapar da mutilação no Togo. Em 1997, a Suécia refugiou duas famílias pelo mesmo motivo.

A Anistia Internacional alertou para o problema pela primeira vez em 1981, na reunião do Conselho Internacional da entidade. No entanto, o assunto só entrou na pauta de trabalho em 1995. Desde então a Anistia vem tentando despertar a consciência da opinião pública para o assunto. Com base em normas internacionais de direitos humanos, a entidade propôs um programa de ação aos governos, que inclui medidas para investigar e combater a prática da mutilação genital em seus países, a fim de erradicá-la.

Fonte: Boletim da Anistia Internacional – fevereiro/99.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!