LEASING EM DÓLAR

CONTRATOS DE LEASING EM DÓLAR

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18 de fevereiro de 1999, 23h00

ACORDO FECHADO ENTRE A ANEF E O MINISTÉRIO DA JUSTIÇA EM TORNO DOS CONTRATOS DE LEASING EM DÓLAR É PREJUDICIAL AO CONSUMIDOR: SAI AINDA MAIS CARO DO QUE PAGAR COM A COTAÇÃO ATUAL

E o que é pior: ANEF consegue se livrar também dos processos administrativos por possíveis irregularidades nos contratos (movidos pelo próprio Governo), que poderia render às suas associadas multa de quase R$ 3 milhões. Todos serão arquivados.

Manter a cotação do dólar em R$ 1,23 somente até abril deste ano e cobrar a diferença ao final do contrato não traz vantagem nenhuma para o consumidor.

Ao contrário, traz prejuízo.

Não obstante possa dar algum alívio por dois ou três meses, o refresco acaba por ser ilusório, apenas protelando o problema para o futuro: a diferença mensalmente apurada terá que ser paga após a última parcela do leasing, evidentemente acrescida de juros iguais ou maiores que os contratuais.

Segundo Luiz Carlos Ewald, professor da PUC (“O Dia”, 1999-02-19), “um consumidor cuja prestação seja de 350 dólares. Com o dólar a 1,90, esse pagamento seria de R$ 665. Com o dólar a 1,23, o valor fica em R$ 430. A diferença é de R$ 235 ou 123 dólares por mês. Já que o acordo vale para quatro meses, o saldo em dólar será de 492 dólares. Como o acordo prevê a incidência juros, a dívida vai crescer. A maioria das empresas cobra entre 1% e 2%. Se faltarem 10 meses, com saldo de 490 dólares e taxa de 1,5% ao mês, a conta chegará a 568,23 dólares. Considerando o mesmo dólar de 1,90, o valor que hoje é de R$ 931 chegará a R$ 1.079,63. Diferença: R$ 148. Se esse mesmo consumidor optar por diluir o saldo em prestações mensais, o valor acrescido a cada mês será de 53,13 dólares. Na mesma cotação de 1,90, no fim de 10 meses, o saldo que era de R$ 931 terá se transformado em R$ 1.009. Diferença: R$ 78. Utilizando o mesmo exemplo, mas considerando que faltem 20 prestações, o saldo no fim será de 660 dólares ou R$ 1.254. Se optar pelo parcelamento, o consumidor pagará 20 prestações de 28,54 dólares e um total de R$ 1.084,52. Se seguir a decisão judicial, pagará apenas a mensalidade de R$ 423,50, pelo dólar de 1,21 mais o INPC.”

Em resumo, se não entrar com uma ação na Justiça, o arrendatário acaba pagando mais do que se quitasse as parcelas agora, mesmo que com o dólar em alta.

Mas não é só.

O dólar teima em não baixar e, segundo a previsão de especialistas, dificilmente ficará abaixo de R$ 1,80.

Ora, se o acordo tem validade somente até abril próximo, a perspectiva é de que a briga entre as empresas de leasing e os arrendatários novamente se instale, pois ninguém mais aceitará pagar as prestações em valores elevados em mais de 40%.

Daí que a melhor saída é mesmo procurar um advogado e pleitear desde já na Justiça a desindexação dos contratos de leasing, para que passem a ser pagos somente com a correção do INPC, como milhares de Juízes têm recentemente decidido.

E não se recomenda ao consumidor se acomodar às ações coletivas promovidas pelo PROCON, as “ações civis públicas”, que em tese beneficiariam a todos, não só sob o aspecto da concessão da liminar coletiva mas, principalmente, pelo fato de que ninguém mais precisaria gastar com advogados para obtê-la.

A razão é simples: as arrendadoras certamente não estão cumprindo as liminares coletivas, o que obriga a cada consumidor procurar um advogado para denunciar o fato ao Juiz da causa.

Ora, considerando-se que cada ação civil pública tem sido movida contra 40 ou mais empresas de leasing e em favor de centenas de milhares de arrendatários, logo a maioria deles estará indo denunciar ao Judiciário o descumprimento da ordem judicial, o que provocará um tumulto processual jamais visto, posto que todos comparecerão em um único processo para reclamar seus direitos.

É mais ou menos como viajar de excursão ou sozinho: de excursão pode ser mais cômodo e barato, mas se enfrenta fila para tudo…

Outra questão fundamental é que as ações coletivas não estão questionando a indexação em si, que deve atender a três pressupostos básicos para ser válida: a) captação no exterior em moeda estrangeira; b) destinada especificamente à aquisição do bem arrendado e, c) que ainda não tenha sido quitada junto ao credor externo.

Não atendidos tais requisitos o contrato de leasing não pode ser em dólar, tudo conforme a Lei 8.880/94 (que institui a URV), a Lei 9.069/95 (do Real), e as Resoluções 980/84 e 2.309/96, ambas do Banco Central.

Mas as ações coletivas não incorporam tais argumentos e, assim, têm se mostrado frágeis na sustentação do mérito, que decide a causa, pois centram fogo apenas na alegada excessiva onerosidade da cláusula contratual que prevê a indexação, um argumento que impressiona, mas que tem vida curta, e certamente não sobreviverá à sentença final ou a um recurso por parte das arrendadoras.

O melhor mesmo é individualmente procurar um advogado.

Gasta-se um pouco agora, em honorários, mas resolve-se o problema rapidamente, com eficácia e sob o amparo do Judiciário, tendo-se a honra de não cair neste engodo armado pela ANEF e pelo Ministério da Justiça, em benefício somente dela: ao aceitar o acordo com o Ministério, a ANEF consegue se livrar também dos processos administrativos por possíveis irregularidades nos contratos (movidos pelo próprio governo), que poderia render às suas associadas multa de quase R$ 3 milhões. Todos serão arquivados.

Quanto aos honorários do advogado, eles se pagam já nas duas ou três prestações pagas com o dólar a R$ 1,20, com certeza.

ERNESTO DE OLIVEIRA S.THIAGO NETO (advogado, especialista em Direito Bancário e sócio fundador da “STN & ADVOGADOS ASSOCIADOS”).

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