Juizados Especiais Criminais

Juizados Especiais Criminais

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15 de maio de 1998, 0h00

Nos últimos trinta anos, o Brasil experimentou um grande desenvolvimento econômico e sua população dobrou, vivendo, hoje, perto de 80% nas grandes cidades. A par disso, a qualidade de vida, no tocante à segurança pública, piorou sensivelmente, com índices alarmantes de criminalidade. Ao longo desse tempo, Polícia, Judiciário, Ministério Público e o sistema de execução de penas não foram dotados de recursos materiais e de pessoal à altura da demanda pelos seus serviços. Nem tampouco a organização, sob o plano institucional, modernizou-se como os cidadãos almejam, e, em conseqüência, acentuou-se cada vez mais a insatisfação da sociedade em relação à Justiça, considerada como um todo.

A invocação mais costumeira e permanente é a impunidade. Reclama-se que a polícia não previne o crime e não investiga adequadamente; que os processos se eternizam no Judiciário; que os criminosos não são presos, processados e condenados, o sistema não os recupera ou os ressocializa, mas, pelo contrário, torna-os mais aptos.

Sob o ponto de vista legal, o Judiciário parece cada vez mais sobrecarregado. Processos e procedimentos continuam lentos, com uma possibilidade recursal extremamente generosa. O número de processos, nesse rumo, é assustador, sendo difícil antever o fim. A quantidade de leis e sua mudança incessante criam um verdadeiro caos na inteligibilidade do que é crime ou mero ato ilícito não penal.

Dentro dessa realidade, o imaginário jurídico-legal está refinando-se. Ao mesmo tempo que se criam leis, aumentando as penas, com novos tipos de crimes e regras processuais supressoras de garantias constitucionais, também, por outro lado, instituem-se instrumentos despenalizadores, com forte tendência liberalizante, uma vez que a experiência demonstrou que a imposição da pena privativa de liberdade como solução para todos os conflitos sociais não reduziu os índices de criminalidade, como teoricamente sustentado, mas aumentou a crença popular na impunidade.

Restava por em prática a idéia de que ao Direito Penal é reservada uma função fragmentária, mínima e subsidiária na tarefa de tutela social. Porque lhe é conferida a proteção de alguns, apenas dos bens e interesses sociais, os reputados mais relevantes pela comunidade, deve o Direito Penal ser invocado a intervir somente, quando se mostrarem insuficientes, ou ineficazes, os demais ramos do ordenamento jurídico.

No segmento desta linha de pensamento, não compete ao Estado perseguir penalmente toda e qualquer infração social. Face a estrutura do ordenamento jurídico em vigor, sustentava-se que ao Estado se impunha mitigar o princípio da obrigatoriedade da ação penal pública, substituir, em alguns casos, o princípio da verdade real pelo da verdade consensual, bem como introduzir novas medidas alternativas à tradicional pena privativa de liberdade, destacando-se esta como último recurso posto à disposição do Estado para proteção de seus súditos.

Com a edição da Lei n.º 9099/95 e a conseqüente vigência entre nós de seus modernos institutos, inúmeras são as situações novas a serem enfrentadas no cotidiano forense. Para dirimir estas questões, devemos sempre ter por norte o espírito primordial do legislador, que foi o de imprimir a celeridade, a oralidade e, até, a informalidade na condução dos feitos por ela regidos. Em resumo, temos que ser criativos, eis que este avançadíssimo estatuto convive com o Código Penal e de Processo Penal – apesar das reiteradas modificações – bastante antigos.

Os Juizados Especiais seguem um idéia reformista do modo de atuação do Poder Judiciário, ou melhor, de fazer-se justiça com o Judiciário, constituindo-se o centro das atenções com vistas à eficácia e celeridade processual, mediante o emprego da oralidade, simplicidade e economia, nas questões cíveis de menor complexidade e nas infrações penais de menor potencial ofensivo. Os Juizados Especiais têm inspiração na Common law e eram defendidas, há muito, pela doutrina patrícia, sendo objeto de normatização na seara do direito infraconstitucional, mediante a edição da Lei n.º 7.244, de 07 de novembro de 1984 criando-se o Juizado Especial de Pequenas Causas Cíveis, que foi instalado em diversas comarcas, muito embora, encontrasse resistência de advogados e, até, mesmo, de juízes.

Por força do mandamento constitucional (Constituição Federal, artigo 98, I ), o legislador ordinário instituiu no cenário jurídico nacional, a Lei n.º 9.099 de 27/09/95, pela qual se deu margem a uma verdadeira mudança na mentalidade punitiva clássica. Isto porque, criando institutos de natureza marcantemente despenalizadora – composição civil, transação penal e suspensão – investiu contra a couraça da concepção clássica tradicional apoiada, exclusivamente, na aplicação da pena como instrumento para a efetivação do direito, tendo a prisão como um dos seus alicerces fundamentais, rompendo-a e apontando as vantagens jurídicas da nova concepção.

Aí é que os reacionários do Direito Penal não se conformaram. Onde se viu! Barganhar com bandido! Receber alimentos, remédios, cadeira de rodas, etc., de criminoso! Isso é um absurdo. Bandido tem que ir para a cadeia. Esqueciam estes e aliás, muitos deles ainda não se deram conta de que os autores de infrações pequenas, mesmo na sistemática anterior, não iam para a cadeia. A maioria dos delinqüentes desta categoria, como se diz no jargão popular, é absolvido com “sursis“. Ou seja, a punição se exauria no faz de conta. A polícia finge que apura as infrações. O Ministério Público finge que processa o infrator. O juiz finge que pune. O delinqüente finge que cumpre a pena. A sociedade, que aliás paga caro por isto tudo, finge que acredita.

A que se considerar que como qualquer novo instituto está sujeito a críticas dentre elas posições negativas como as que afirmam que a Lei n.º 9099/95 é uma aberração jurídica, dado que seu cumprimento fere a honorabilidade do cidadão, fere a sua cidadania e o Estado nega a sua prestação jurisdicional ao cidadão com o esdrúxulo pretexto de “desafogar” as prateleiras dos Cartórios Criminais de grande parte dos processos, são cometidas as maiores injustiças, fruto da neociência dos indiciados em matéria criminal e da falta de vontade dos defensores para prepararem uma ampla defesa (artigo 5º, LV da Constituição Federal) ela aplica uma pena por crime que o cidadão não só cometeu, como condená-lo sem dar a ele o direito de ampla defesa (assegurada na Constituição Federal, artigo 5º, da LV), para comodidade e ociosidade dos operários do Direito (juízes, promotores e advogados), como se provará adiante. Sendo uma lei enganosa na sua aplicação e tendo como protagonistas dessa situação vexatória para a imagem da Justiça os juízes, promotores e advogados.

Asseveram, ainda, os críticos que os lidadores do direito não devam esquecer que a administração da justiça é algo mais do que uma análise dos custos benefícios; é absolutamente injustificável buscar legitimar as práticas de disponibilidade do objeto do processo pena, principalmente estadunidense, ao simples fundamento de que os prejuízos que se podem produzir são enormes. Todos os cidadãos possuem o direito a justiça e é dever do Estado proporcionar um sistema que possa efetivamente prestar justiça para todos, não só para uma minoria; nenhum benefício aparente pode preponderar sobre a necessidade de preservar o sistema de justiça criminal.

Incorre-se em erro ao tentar aplicar à administração da justiça os princípios e valores da sociedade capitalista: a produtividade, entendida como a maior ou menor percentual de condenações obtidas, convertendo-se num instrumento de medida da eficácia da atividade jurisdicional nos ordenamentos jurídicos de nosso tempo.

Num ponto, conquanto as diferenças de enfoques, todos são concordes, as penas privativas de liberdade, ao contrário do que se imaginou, não trouxeram e não trarão os resultados desejados quer na contenção das condutas delituosas, quer na ressocialização ou recuperação dos delinqüentes e não bastasse, o custo da sua execução é altíssima para o erário, eis que, consoante as estatísticas divulgadas, o preso no Brasil tem um custo médio mensal de três salários mínimos e meio. Daí, a necessidade de se buscar novas alternativas às penas privativas de liberdade.

Continua…(ver EDITORIA/ARTIGOS)

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