Cofins não é devida por sociedades civis, diz OAB-SP
29 de julho de 1997, 0h00
A Seccional de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP) impetrou mandado de segurança coletivo, com pedido de liminar, para assegurar às sociedades de advogados a isenção do recolhimento da contribuição mensal sobre faturamento, prevista na legislação que regula a Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social).
O mandado de segurança foi proposto à Seção Judiciária de São Paulo da Justiça Federal contra os delegados que representam a Receita Federal no Estado, as autoridades coatoras, por exigir dos escritórios de advocacia organizados em sociedades civis o recolhimento, a partir de maio deste ano, da contribuição de 2% da receita bruta mensal.
O pedido de medida liminar encontra precedente na Justiça Federal, em São Paulo: o juiz Sérgio Nojiri, da 13ª Vara, autorizou o escritório “Badia, Quartim e Carmona – Advogados Associados” a depositar mensalmente os valores em juízo, em vez de fazer os recolhimentos da Cofins à Receita Federal, até que seja dada decisão sobre o mérito da questão.
Um dos pontos fundamentais do mandado de segurança diz respeito à hierarquia das leis. De acordo com o artigo 59 da Constituição, o processo legislativo compreende a elaboração de: I) emendas à Constituição; II) leis complementares; III) leis ordinárias; IV) leis delegadas; V) medidas provisórias; VI) decretos legislativos; VII) resoluções.
No caso, as sociedades civis de profissão regulamentada – entre as quais se incluem as sociedades de advogados – foram isentas da contribuição por lei complementar (LC 70/91, art. 6º) e obrigadas ao recolhimento da Cofins por lei ordinária (Lei 9.430/96).
A lei ordinária não pode alterar a lei complementar, hierarquicamente maior. A lei complementar só pode ser modificada por outra lei complementar. O Congresso Nacional depende de maioria absoluta (dois terços dos parlamentares da Câmara e do Senado) para aprovar uma lei complementar. E apenas de maioria simples (metade mais um) para aprovar uma lei ordinária.
As “sociedades civis”, às quais se refere a LC 70/91, são as descritas no Decreto-Lei 2.397/87. Em seu mandado de segurança, a OAB-SP relata que o artigo 1º desse decreto “tratava das sociedades civis de prestação de serviços profissionais relativo ao exercício de profissão legalmente regulamentada, registradas no Registro Civil das Pessoas Jurídicas e constituídas exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no País, dispondo que os lucros seriam tributados pelo IR na pessoa do sócio, pessoa física, e não na sociedade”.
Na verdade, o artigo 6º da LC 70/91 estabelece a “não incidência” da contribuição sobre essas “sociedades civis”, bem como sobre as sociedades cooperativas e entidades beneficentes.
Estabelece, assim, casos de imunidade tributária e não de dispensa de pagamento de tributos, porque a contribuição sequer chega a ser devida.
Um ponto “curioso” da nova Lei da Cofins, segundo a petição da OAB-SP, é que ela revogou outras disposições de leis e decretos anteriores, incompatíveis com suas determinações, mas sequer mencionou o artigo 6º da Lei Complementar 70/91. Ou seja, criou uma nova obrigação de recolhimento da contribuição, sem revogar a isenção. E tanto “criou” a contribuição, que lhe concedeu o benefício legal da “anterioridade” de 90 dias (o prazo que a lei concede para o início da validade de uma contribuição nova).
Outra falha da nova legislação: a fonte de custeio da seguridade social, de acordo com a LC 70/91, é baseada no “faturamento” das empresas (na forma do artigo 195, inciso I, da Constituição Federal). As sociedades de advogados, remuneradas pelos honorários advocatícios, não emitem faturas. Para incluir entre as fontes de custeio da seguridade social a “receita bruta de prestação de serviços” das sociedades civis seria necessária, como nos pontos anteriores, uma nova lei complementar.
Sob esses aspectos, a exigência do recolhimento da Cofins pelas sociedades civis, isentas pela lei complementar, é ilegal e inconstitucional, diz a OAB-SP.
O QUE É UMA SOCIEDADE DE ADVOGADOS
Nos limites da lei
Sociedades de advogados operam sob regras bastante rígidas
Sociedades de advogados são sociedades civis de “prestação de serviços profissionais da advocacia”, com uma característica peculiar: não podem fazer nada mais do que isso.
Para ficar dentro da lei – isto é, do “Estatuto da Advocacia” – uma sociedade de advogados não pode exercer as atividades, por exemplo, de administração ou venda de imóveis, contabilidade, consultoria econômica, religião, política ou qualquer outra atividade lucrativa não prevista em sua legislação específica.
Uma sociedade de advogados não pode assumir qualquer característica mercantil, como as das sociedades anônimas, sociedades por quotas de responsabilidade limitada, sociedades de capital e indústria. Por isso, a responsabilidade dos sócios de uma sociedade civil desse tipo é considerada “ilimitada” – ao contrário das sociedades em que a responsabilidade de cada sócio é “limitada” à sua quota do capital social.
Não se registra uma sociedade de advogados na Junta Comercial – nem mesmo no cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas. A sua “personalidade jurídica” é constituída mediante registro no Conselho Seccional da OAB. Aliás, qualquer pessoa jurídica que pretenda incluir entre as suas atividades a da advocacia fica sujeita a esse regime, de acordo com essa legislação.
Os advogados, para o exercício da profissão, sequer podem se organizar em cooperativas. Só podem se reunir em Sociedades Civis – desde que inscritos na Ordem, excluídos bacharéis em Direito não inscritos, estagiários e leigos.
E essas sociedades nada mais são do que a “reunião de advogados com o mero intuito de facilitar o exercício da profissão”, diz a OAB-SP em seu mandado de segurança contra a exigência do recolhimento da Cofins por sociedades de advogados.
Existe a sociedade, diz a OAB, mas “o trabalho exercido é intelectual e individual, não se podendo admitir qualquer outra forma de visualização desse contexto. A sociedade, nesse caso, é um “meio” utilizado para atingir os objetivos individuais dos profissionais que nela atuam e jamais pode ser considerada como “fim” dessa coletividade – no que difere das sociedades que têm a associação como um fim em si própria.
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