Justiça para todos

Juizado itinerante: justiça para todos

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28 de dezembro de 1997, 23h00

Se depender da vontade do novo chefe do Judiciário paulista, a população de São Paulo será melhor servida em termos de Justiça. O eleito, desembargador Dirceu de Mello, traz em seu plano de vôo três interessantes novidades: implantação dos juizados especiais (os antigos tribunais de pequenas causas) itinerantes; anúncio trimestral de metas e resultados – com a divulgação dos sucessos e insucessos obtidos; e o compromisso de recuperar as perdas salariais sofridas pelos servidores da justiça.

Ardoroso defensor do Judiciário, Dirceu de Mello, ao tomar conhecimento da premiação de Fernando Henrique Cardoso como Homem do Ano na América Latina, afirmou que “se pudesse também daria o voto a ele”. Acompanhe aqui algumas das posições do novo presidente do TJ:

Lei 9.099/95 – A Lei 9.099/95 introduziu importantes modificações no sistema penal e processual-penal brasileiro criando os Juizados Especiais Criminais e possibilitando a solução imediata de litígios, através da composição, tanto no âmbito civil como no criminal. Essa lei, entretanto, até hoje não foi regulamentada.

A demora, inicialmente, se deu por falta de entendimento entre o Judiciário, a Ordem dos Advogados do Brasil, o Ministério Público e as autoridades policiais.

Algumas dessas áreas entenderam que o projeto apresentado não ia ao encontro dos interesses gerais e partiu-se para um substitutivo. Isso não agradou o Tribunal de Justiça que na última gestão conseguiu a retirada do projeto.

Como o funcionamento efetivo dos juizados reclama a regulamentação da lei, uma comissão presidida por Dirceu de Mello foi encarregada de elaborar nova proposta – remetida à Assembléia há 4 meses.

A regulamentação da 9.099 trará expansão e dinamização aos juizados e propiciará a implantação dos juizados especiais cíveis itinerantes destinados ao atendimento, principalmente, das áreas periféricas. “Com o juizado itinerante um dia em Itaquera, outro em Santo Amaro, por exemplo, estaríamos mais próximos da população necessitada na intervenção da Justiça”, diz Mello.

A idéia não é pioneira já que em alguns Estado o juizado itinerante funciona a pleno vapor. No Amapá até com a força do remo. “Temos um vídeo que mostra o atendimento ao pessoal que habita as margens dos rios. Existe um barco para esse tipo de atendimento.”

Súmulas vinculantes – O presidente do TJ paulista acha interessante a súmula vinculante do ponto de vista prático, mas reconhece que em certos casos torna-se um entrave à liberdade de manifestação de pensamento do magistrado. “O problema da consciência profissional é muito sério.” Às vezes, o juiz entende o justo de determinada maneira e a lei aponta resultado diferente.

A súmula pode colocar o magistrado na encruzilhada: atende o que a sua consciência reclama ou se acomoda a uma súmula que o obriga a decidir? Mello esclarece que função de resultados não há como negar que a súmula vinculante seja uma forma de desafogar os tribunais. “Tendo-a podemos julgar dezenas, centenas de casos na chamada justiça do pacote.”

Medidas Provisórias e FHC – A Suprema Corte italiana proibiu a reedição sistemática de Medidas Provisórias, alegando que a repetição por longos períodos descaracteriza a provisoriedade e invade a atribuição do Legislativo. No Brasil é comum ultrapassar-se 40 reedições.

Em um paralelo entre um país e outro, Mello explica que a crítica às medidas provisórias é de todos. “Ninguém pode aplaudir, mas temos que verificar a nossa realidade. Isso alcança mais o Executivo e Legislativo.” Segundo ele, as realidades culturais são diferentes e, embora sejamos latinos, o que pode servir para lá pode não nos servir.

Na sua opinião, o presidente Fernando Henrique Cardoso tem estado em posição de destaque. “Não podemos discutir os seus méritos, cultura, conhecimento e dinamismo. Concordamos ou não com algumas das medidas tomadas, mas não é isso que vai comprometer a ação do homem no conjunto de suas atitudes.”

Ao ser informado que FHC foi considerado o Homem do Ano na América Latina, por causa dos posicionamentos assumidos frente aos problemas brasileiros, o presidente argumenta: “É uma razão a mais para ficarmos satisfeitos. Se pudesse também daria o voto a ele”.

Maiores necessidades – Questão polêmica que o presidente do TJ terá em sua pauta relaciona-se aos vencimentos. Os funcionários da casa há quase três anos não têm revisão e Mello reconhece que o salário do magistrado em início de carreira não entusiasma ninguém.

Atento aos problemas, expõe uma atitude administrativa inovadora: anúncio trimestral de metas e resultados.

O Judiciário não tem só defasagem salarial, necessita também recursos humanos. Em matéria de juízes a falta é da ordem de 500 a 600 magistrados. Quanto à escassez de servidores, o número ainda não foi levantado.

Quanto às leis – Não é segredo que o descumprimento de algumas leis muitas vezes é institucionalizado. A Lei das Execuções Criminais e o Estatuto das Crianças e Adolescentes são exemplos clássicos. A primeira regula a aplicação e o cumprimento da pena imposta ao condenado, o segundo trata dos direitos regulamentados dos que são considerados incapazes ou relativamente incapazes perante a esfera civil e penal.

Segundo Dirceu de Mello, diplomas como esses são por demais otimistas – se analisados independentemente de suas condições de aplicabilidade. “São extraordinários, mas muitos dos preceitos não têm condições para ser vivenciados.” Também não é segredo para ninguém que o país deve ter leis ajustadas à sua realidade, caso contrário não serão implementadas. Mello acha que, nesses casos, as leis devem ser revistas.

O presidente do TJ reconhece que esses diplomas passam por uma fase de provação porque os textos são preparados nos gabinetes e só depois ganham as ruas. “É nesse momento que verificamos se há ou não necessidade de acertos”, explica.

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