Liberdade de imprensa

Jornal não deve indenizar por publicar foto de cadáver em reportagem, diz Supremo

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24 de outubro de 2018, 11h24

Não cabe ao juiz substituir o jornalista e decidir se a publicação de uma foto em reportagem é necessária ou não. Esse foi o entendimento que prevaleceu na 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal ao negar pedido de indenização contra um jornal pelo uso da fotografia de um cadáver.

O caso chegou ao Supremo após o Tribunal de Justiça de São Paulo condenar o jornal Folha de S.Paulo a pagar R$ 60 mil de indenização a familiares de vítima de assassinato. O homem foi atingido dentro de seu carro, quando voltava de viagem de negócios, numa troca de tiros na rodovia Anhanguera, durante assalto a carros fortes, e uma foto sua dentro do carro foi publicada no jornal, segundo a família, “sem os cuidados necessários de preservar a imagem do morto”.

Ao fixar a condenação, o TJ-SP entendeu que o direito fundamental à liberdade de informação não isenta a responsabilidade civil de órgãos de imprensa. Segundo o tribunal estadual, “era desnecessária a publicação da foto do rosto desfigurado do falecido, sem o cuidado de sombrear a imagem” — tanto que outros jornais divulgaram a notícia sem a publicação de imagens.

Em decisão monocrática, a ministra Cármen Lúcia entendeu que a decisão do TJ-SP censurou a atuação da imprensa, “substituindo-se ao jornalista e ao jornal para impor o que considera ‘desnecessário’”. Segundo a ministra, a decisão diverge da jurisprudência do STF, firmada em diversos precedentes. Assim, ela proveu o recurso e negou o pedido de indenização.

Contra a decisão monocrática, os familiares interpuseram agravo regimental, que foi analisado pela 2ª Turma. Em seu voto, a ministra Cármen manteve seu entendimento.

A relatora explicou que a decisão do tribunal paulista divergiu da jurisprudência do STF e citou nesse sentido o julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 130, quando o Plenário, ao declarar a não recepção da Lei de Imprensa (Lei 5.250/1967) pela Constituição Federal de 1998, assegurou a liberdade de informação jornalística e a proibição à censura.

Após pedido de vista, o ministro Gilmar Mendes divergiu da relatora. Segundo ele, a decisão do TJ-SP está de acordo com a jurisprudência do Supremo. “O acórdão recorrido não restringiu a liberdade de imprensa. Não houve nenhuma espécie de censura prévia ou proibição de circulação de informação. Houve sim ponderação entre a liberdade de imprensa e o direito à imagem, honra, intimidade e vida privada como forma de posterior verificação da responsabilidade civil”, disse.

Para Gilmar, o tribunal paulista entendeu que a fotografia da vítima na cena do crime sem o devido sombreamento da imagem configuraria extrapolação da liberdade de imprensa e violação aos direitos de personalidade da vítima e de seus familiares. “O TJ-SP não negou ao veículo de comunicação a liberdade de publicação da imagem, mas retaliou a forma como ela foi usufruída, sem o cuidado de não expor excessivamente a imagem da vítima”, ponderou.

A divergência foi seguida pelo ministro Ricardo Lewandowski, para quem a publicação da foto abalou a família da vítima, que já tinha perdido um ente querido de forma violenta, provocando duplo sofrimento. Já os ministros Luiz Edson Fachin e Celso de Mello seguiram o voto da relatora, formando a maioria. Assim, o colegiado decidiu negar o pedido de indenização. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

ARE 892.127

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