Ausência de elementos

Mais uma vez, Justiça não reconhece vínculo entre Uber e motorista

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26 de novembro de 2018, 11h48

A Justiça entendeu novamente que não há vínculo de emprego entre a Uber e o motorista que utiliza o aplicativo para captar clientes. A decisão agora é da juíza Solyamar Dayse Neiva Soares, em exercício na 19ª Vara do Trabalho de Brasília, para quem o trabalhador não conseguiu comprovar a existência dos elementos que caracterizam uma relação de emprego, como habitualidade, onerosidade, pessoalidade e subordinação.

Na reclamação, o motorista afirmou que seu trabalho tinha os elementos que configuram vínculo empregatício, mas que seu contrato não foi registrado na carteira de trabalho. Disse ainda que, em virtude do não reconhecimento do vínculo, não foram cumpridas as obrigações decorrentes do vínculo nem de seu término. Em defesa, a empresa sustentou que não havia relação de emprego, mas uma relação meramente comercial entre as partes.

Na sentença, a magistrada explicou que a caracterização do vínculo de emprego depende da presença dos elementos tipificadores legalmente estabelecidos: a habitualidade, a onerosidade, a pessoalidade quanto ao trabalhador e, principalmente, sua subordinação ao tomador de serviços.

Por força do contrato de emprego, disse a magistrada, o empregador tem o direito de dirigir a própria prestação de serviços, estabelecendo, além do objetivo, a forma e os meios pelos quais será empregada a força de trabalho do trabalhador, bem como os horários e dias em que o serviço será prestado — determinações que devem ser cumpridas pelo empregado, sob pena, inclusive, de punição disciplinar.

No caso dos autos, ressaltou a juíza, o próprio motorista informa que 75% do valor de cada corrida feita cabia a ele. A autonomia na definição dos períodos e horários da prestação de serviço está evidenciada nas declarações do próprio reclamante, frisou a juíza, mostrando que o trabalhador disse que poderia recusar chamados, que não estava sujeito a horário ou turno de trabalho, que suportava os custos de combustível, seguro e manutenção do veículo e, principalmente, que "poderia ligar e desligar o aplicativo quando quisesse; que poderia desligar o aplicativo por um mês".

Também segundo o próprio autor, prosseguiu a magistrada, não havia típico exercício de poder disciplinar por parte da empresa. "De fato, mesmo nos casos de rejeição de corridas, não cumprimento do afirmado número mínimo de viagens, ou mesmo nas hipóteses em que o aplicativo permanecia desligado, o motorista poderia receber mensagens ou sugestões para aprimoramento do serviço, mas não era advertido ou suspenso das atividades."

O depoimento do trabalhador ainda deixa claro que mesmo o dito "desligamento" da plataforma, nas situações de baixa avaliação pelos usuários do serviço, rejeições reiteradas de corridas, ou longo período sem acesso ao aplicativo, não se dava a título de punição e, portanto, não caracteriza exercício daquele poder disciplinar.

"A autonomia na utilização do próprio tempo e a ausência de exercício do poder diretivo, inclusive em sua dimensão disciplinar, afastam a subordinação característica do vínculo de emprego", salientou a magistrada.

Alteridade
É característica da relação de emprego que o empregador se aproprie da diferença existente entre o valor pago pela prestação de serviços e o importe total recebido com essa prestação. Por isso se diz doutrinariamente que um dos elementos típicos do vínculo empregatício seria a alteridade, na medida em que, por força do contrato de emprego, o empregado recebe pelos serviços prestados apenas a remuneração ajustada, enquanto que o produto total de seu trabalho reverte em benefício do patrão, disse a magistrada.

Para ela, no caso concreto, "não se pode inequivocamente sustentar que o reclamante trabalhasse em benefício da reclamada, que não parece ter auferido a mais-valia típica da contratação de empregado, na relação que manteve com a autora. Falta, portanto, à vinculação havida entre as partes, aquela característica da alteridade que também serve para distinguir o contrato de emprego das demais relações de trabalho".

Por considerar ter ficado demonstrado que a relação entre as partes não se desenvolveu sob o manto do contrato de emprego, a magistrada negou o pedido de reconhecimento de vínculo empregatício e, em consequência, os demais pedidos formulados na reclamação.

Debate da "uberização"
O reconhecimento ou não do vínculo de emprego entre motorista e Uber ainda é controverso na Justiça. Em Minas Gerais, o juiz Márcio Toledo Gonçalves, da 33ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, aprofundou-se em conceitos sociológicos, históricos e legais para decidir que há vínculo de emprego nesses casos.

A empresa foi condenada a pagar férias, 13º, horas extra e adicional noturno. O juiz cunhou o termo "uberização" como um conceito de relação danosa ao trabalhador.

Quando o caso subiu de instância, o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região reformou a decisão e não reconheceu o vínculo. Para a relatora, desembargadora Maria Stela Álvares da Silva Campos, a impessoalidade na relação entre motorista e Uber fica clara pelo fato de que outra pessoa pode dirigir o mesmo carro, sendo que basta um cadastro no aplicativo para isso. O TRT-2, que atua em São Paulo, também já decidiu não reconhecer o vínculo. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-10.

Processo 0001479-11.2016.5.10.0019 (PJe)

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