Juiz da "lava jato"

Decisão de Moro de aceitar cargo de ministro reforça críticas de parcialidade

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1 de novembro de 2018, 14h32

Na primeira entrevista que deu à imprensa, depois de dois anos da operação "lava jato", o juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, afirmou que jamais entraria para a política. Na semana seguinte ao primeiro pleito presidencial depois disso, Moro aceitou o convite do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), para se tornar ministro da Justiça. De acordo com ele, o objetivo é implementar uma agenda anticorrupção e anticrime organizado, além de consolidar avanços obtidos pela operação "lava jato" e impedir retrocessos.

Ao longo dos últimos anos, Moro tem recebido críticas acerca de sua postura à frente dos processos da "lava jato". Dentre as mais frequentes, a de que não seria imparcial no trato dos casos que julga, especialmente os ligados ao PT. Do outro lado, no campo político oposto, ele é tido como alguém duro no combate à corrupção, de posições firmes.

Enquanto alguns advogados e juristas ouvidos pela ConJur acreditam que Moro é um bom nome e tem estatura para contribuir com o novo governo, boa parte entende que a decisão reforça as críticas de parcialidade do magistrado. No entanto, para eles, a "lava jato" não sofreria repercussões importantes, já que o novo juiz deve seguir a mesma linha.

Leia as manifestações de integrantes da comunidade jurídica:

Celso Vilardi, criminalista e professor de Direito da FGV em São Paulo
"A notícia faz mal à 'lava jato'. Dois aspectos parecem-me negativos: legitima o discurso da parcialidade e não faz bem ao Judiciário que juízes tornem-se protagonistas com objetivos políticos. Ainda que não tenha sido o objetivo de Moro, é o que poderá transparecer."

Davi Tangerino, criminalista
"É muito difícil dizer, porque eu consigo identificar dois discursos que vão surgir. Um é sobre o juiz que solta o áudio da Dilma com o Lula, julga o caso Lula em caso recorde, no meio das férias não deixa a Polícia Federal soltar o Lula quando dada a liminar pelo desembargador Favretto, que posterga audiência do Lula para depois das eleições para que ele não tenha ali o interrogatório como palanque, que libera a delação do Palocci e aí vai para o Ministério da Justiça. Ou seja, para o discurso de suspeição e de golpe do Judiciário, que é muito forte por parte do PT e do Lula especificamente, é a coroação.

Agora, o modo de fazer política, o discurso que elegeu o Bolsonaro, como tudo que for uma crítica a ele é petismo, comunismo, vai ser simplesmente o de que o juiz honrado, probo, combatente à corrupção, diante de um governo comprometido com o combate à corrupção, aceitou o convite, pelo visto condicionando a ter poderes grandes. Vai ser uma disputa de narrativas.

Cabe aqui refletir: diante disso, qual será a avaliação que os ministros farão do episódio da segunda instância? Era mesmo sobre a segunda instância? De novo vamos para disputa de discursos: era agenda de combate à corrupção geral e irrestrita ou acabaram sendo também levados por uma onda cujo motor era Lula especificamente? Se eles, diante da aceitação do Moro, repensam a neutralidade dele como juiz e de repente será que alguém reflete de que também foram induzidos ao erro? Ele aceitar o cargo político agora coroa o que se diz há muito de que ele é político. Fora alguns embaraços. O PP era um dos partidos centrais do petrolão. E agora é um partido muito próximo, que foi do Bolsonaro durante anos. Acho a narrativa da imparcialidade muito forte, mas não existe espaço institucional ou público para que esse discurso seja considerado. Na média, vai se considerar como a consagração de um governo limpo, desvinculado da corrupção. De novo, a história da [operação italiana] mãos limpas, em que o procurador mais tarde vira político."

Alberto Zacharias Toron, advogado criminalista
"É um juiz competente e é legítima sua nomeação e o fato de ter aceitado o convite. Mas resta saber se ele era imparcial para julgar o ex-presidente Lula. E francamente a resposta parece ser negativa. Lembro de dois comportamentos dele: quando divulgou as conversas telefônicas entre a então presidente Dilma Rousseff e Lula e agora quando divulgou a delação de Antonio Palocci pouco antes das últimas eleições. Ambos os comportamentos tiveram um impacto político forte. Ele faz militância contra o PT."

Lenio Luiz Streck, jurista, professor de Direito Constitucional e pós-doutor em Direito
"Moro, ao aceitar o Ministério da Justiça, partidariza a Justiça. E coloca gasolina na fogueira de todos os pedidos de suspeição e impedimento feitos contra ele. Desde a divulgação da conversa de Dilma e Lula até a divulgação antes da eleição do 'pacote Palocci', passando até mesmo por atuação antes da eleição em processos de adversários do presidente novo, tudo isso conforma um conjunto de elementos concretos de que ele não poderia ter julgado os casos dos adversários do seu novo chefe. Aliás, o general Mourão já antes das eleições falava de Moro para o Ministério da Justiça. O projeto é, pelo visto, antigo. Não é de hoje ou de depois do resultado do pleito que há essa afinidade do novo ministro da Justiça com o novo presidente. Não há problema de um juiz pedir demissão do cargo e assumir um cargo no Executivo. O problema é se esse juiz foi o responsável pelo julgamento de todos os processos que envolveram os adversários do presidente que o nomeou como novo ministro da Justiça. Vamos ver o que diz a comunidade jurídica. E qual será a opinião da OAB, que deve ter posição institucional nesses casos."

Antonio Carlos de Almeida Castro (Kakay), advogado criminalista
"Das coisas mais sérias e graves do processo penal é provar a parcialidade de um juiz. É muito difícil. Nós, advogados, estamos há muito discutindo a questão da parcialidade do Moro. E é claro que tem certo grau de subjetividade, salvo aquelas questões que estão enumeradas pelo Código, quanto à suspeição especialmente, que deixam margem muito grande de dúvida e por isso o Judiciário sempre opta por não determinar que tal juiz seja impedido. Nesse caso, o Moro deu a oportunidade clara, evidente, de que deveria ter se dado como impedido em vários processos. É claro que quem acompanha o Judiciário e está acompanhando a política sabe que Moro julgou o Lula, no meu ponto de vista, sem competência para tal. Como é que tem competência para julgar um caso de um apartamento no Guarujá estando em Curitiba? O Lula era o grande opositor do Bolsonaro. Então, entendo que os diversos levantamentos de que havia parcialidade, e isso foi questionado inclusive em tribunais internacionais, estão agora evidenciados com ele aceitando ser ministro do Bolsonaro. É absolutamente lamentável. Eu defendi que ele não ousaria tanto. Acho que ele deu uma bofetada no Poder Judiciário. Porque tendo agido como agiu, determinado vazamentos ilegais — como ele próprio reconheceu —, expondo a delação do Palocci de última hora… ele claramente tinha um lado. Ele tomou um lado nas eleições. E ele não tinha direito como um juiz federal de tão logo acaba a eleição assumir o ministério daquele que ele ajudou a se eleger.

Talvez seja um caso raro em que a parcialidade fica evidente. Isso, como um todo, é muito ruim para o Judiciário. É muito grave. Temos um juiz que se notabilizou no país, por uma série de acessos, embora a operação 'lava jato' tem uma série de vantagens e eu sempre elogio isso. Tivemos um juiz que foi duríssimo, que deu penas duríssimas, que é acusado de não ser imparcial desde o início, de não conceder a ampla defesa aos acusados , mas tudo isso ficava, de certa forma, num embate entre a acusação e a defesa. Agora, não. A foto que restará é ele, como ministro da Justiça, ao lado de Bolsonaro — que ele, indubitavelmente ajudou a eleger com uma série de ações enquanto juiz —, e ao lado de outros tantos ministros que certamente Bolsonaro vai escolher e que compõem um perfil que, com todas as vênias, não combina com a serenidade que deve ter o Poder Judiciário.

O Judiciário sai menor. Ele é um homem preparado. Eu não discuto isso. Mas desmereceu o Poder Judiciário ao sair neste momento para assumir o MJ de um candidato que ele ajudou a eleger. Entendo, que como ele disse, está se afastando do cargo, e isto é o mínimo do mínimo. E poderá ter dado um tiro no pé, um tiro no escuro. Ele pegou um ministério ampliado, forte, que tem segurança pública, segurança nacional, Polícia FEderal, em parte o MPF, ele sempre trabalhou, de certa forma, mandou no MPF, na Polícia Federal. Mas agora ele vai ter de cumprir uma política do presidente. E ninguém sabe o que Bolsonaro pensa sobre política pública, sobre segurança. Ele ganhou sem se manifestar sobre isso. Moro vai assumir o ministério, do meu ponto de vista, desqualificadamente, em a moral que tinha com juiz, fragilizado por esta parcialidade, vai ter de lidar com os políticos que ele tanto criminalizou e vai ter que conviver com o presidente da República, que ninguém sabe o que pensa."

Aury Lopes Jr., criminalista e professor da PUCRS
"Isso impacta em duas dimensões. Num primeiro aspecto vai fortalecer toda a crítica do lawfare, da perseguição política, porque ele está indo na mesma linha do que Antonio di Pietro fez na Itália quando começou a mani pulite, a mãos limpas, na primeira parte, que foi a Tangentopoli, ele foi muito criticado porque estaria perseguindo políticos com ambições políticas. Ele sempre negou, mas anos mais tarde entrou para a política. De certa maneira, quando um personagem como esse, que teve postura proativa, que foi tão criticado por decisões equivocadas que tomou, pela postura inadequada enquanto juiz, frente aos processos, agora ele vai favorecer e fazer jus a toda crítica que foi feita até aqui. Essa é uma dimensão. Com relação à 'lava jato', tem outra perspectiva. Não vai haver enfraquecimento porque vai ter outro juiz, que possivelmente siga no mesmo perfil. A 'lava jato' já está entrando na fase final. Temos processos tramitando e terminando, a operação em si terminou. E ele vai ter um papel importante no Ministério da Justiça na aprovação de projetos, como foram as 10 medida que foram barradas por uma série de inconstitucionalidades. É claro que como ministro da Justiça ele vai ter essa possibilidade de desengavetar essas medidas mais punitivistas, de endurecimento, e de fortalecer a posição da equipe da PF e do MPF. Todas as suspeições alegadas até então se confirmam."

Fernando Augusto Fernandes, criminalista
"A 'lava jato' já chegou à exaustão. É impensável uma eterna conexão de processos com sentenças eternizando os poderes de um juiz. Este tema será objeto de análise futura no Supremo. Assim, o juiz Sergio Moro saindo desta operação policial interminável, os inquéritos tendem a serem distribuídos aos seus locais conforme competência do Código de Processo Penal. Existe, no entanto, a tendência de o novo ministro da Justiça tentar replicar os abusos cometidos no Paraná em vários locais do Brasil, em uma articulação que mistura os poderes Executivo e Judiciário."

Leonardo Isaac Yarochewsky, advogado e doutor em Direito
"Ao aceitar ser ministro da Justiça de Bolsonaro, o juiz Sergio Moro deixou transbordar toda sua parcialidade na condução da operação 'lava jato', notadamente em relação ao ex-presidente Lula, que — sem provas — foi condenado 'à jato' e impedido de disputar e, provavelmente, vencer as eleições contra aquele que chefiará o juiz Moro.

Não é demais lembrar que Moro quebrou e vazou interceptação telefônica de conversa entre Lula e a então presidente Dilma; já demonstrou afinidades com membros do PSDB e, recentemente, às vésperas do primeiro turno divulgou a delação de Antônio Palocci… Assim, evidenciado está que as decisões de Moro contra Lula são eivadas de nulidades e alimentadas por interesses pessoais políticos."

Mariz de Oliveira, advogado criminalista
"Entendo que o juiz Sergio Moro reúne condições plenas para ocupar o Ministério da Justiça, em face de sua larga experiência como magistrado e de sua capacidade intelectual, poderá vir a manter um importante diálogo com o Poder Judiciário em benefício do aprimoramento da distribuição da Justiça no Brasil. Espero, ainda, que ele abra um canal com a advocacia, que poderá trazer preciosa contribuição, especialmente no campo do garantismo penal. O Direito Penal não é só punitivo, ele também é um instrumento de proteção da liberdade e da dignidade dos acusados."

João Paulo Martinelli, criminalista e professor do IDP-São Paulo
“Aceitar o convite para exercer um cargo político exige a exoneração do cargo de magistrado, por incompatibilidade constitucional. No caso específico, há dúvidas que podem surgir com a atuação de Moro antes das eleições, principalmente na divulgação da delação de Palocci às vésperas das eleições. Isso será motivo de discussões jurídicas pela aparente parcialidade nas decisões. A 'lava jato' agora toma um rumo diferente, pois a juíza substituta da vara vai acumular todos os processos, ao contrário de Moro, que só cuidava dos processos da 'lava jato'. Esse convite faz supor que o caminho de Moro ao STF está aberto para 2020. Já houve outros casos de ministros da Justiça que foram indicados ao STF posteriormente.”

Renato Ribeiro de Almeida, advogado eleitoralista
"Creio que Moro irá assumir um cargo político, mas que requer conhecimento técnico. O cargo já foi ocupado por Miguel Reale Jr, Thomás Bastos, José Eduardo Cardozo, Eugênio Aragão, Torquato Jardim, entre outros. Todos esses são nomes de relevo no meio jurídico, mas que, em algum grau, possuíam alguma relação com o mundo político. Moro não vem do mundo político. Então seu desafio será conjugar seu saber técnico-jurídico e absorver rapidamente a dinâmica das questões políticas, que tem sua liturgia própria.”

Vera Chemim, advogada constitucionalista
"O fato de o juiz Moro aceitar o cargo de Ministro da Justiça e Segurança Pública denuncia a vontade de continuar o seu trabalho, embora de forma totalmente diferente, no combate à corrupção e ao crime de modo geral. Na mesma linha de ação, Moro poderá agora, como Ministro ter acesso a um maior número de recursos humanos e tecnológicos, para colocar em prática as ações indispensáveis para a obtenção de êxito na defesa da sociedade. Ademais, trata-se de um profissional preparado para enfrentar tal tarefa. A oportunidade de exercer uma função pública no Poder Executivo adquire ainda, maior relevância na atual conjuntura em que, a sociedade brasileira está sujeita às incertezas decorrentes de um total descaso com a segurança pública.

Por outro lado, a juíza que o substituirá já faz parte da sua equipe, tendo o mesmo perfil de Moro, no que se refere à condução dos processos com a mesma seriedade, ética, cautela, imparcialidade e de acordo com o rigor da lei. Portanto, a operação 'lava jato' não sofrerá riscos quanto a sua continuidade, enquanto instrumento voltado para o processamento e julgamento de crimes ligados à corrupção.

O fato de Moro ter aceitado o cargo de Ministro, no futuro governo de Bolsonaro nada tem a ver com as suas atividades como Magistrado. Isso equivale a afirmar que, até então, Moro conduzia os processos no âmbito da Operação Lava Jato, com a mais absoluta imparcialidade e neutralidade. Os argumentos que venham a ser utilizados pela esquerda, tentando ligar a sua função enquanto juiz, com a atual conjuntura são totalmente descabidos e carecem portanto, de fundamentação lógica e jurídica."

Adib Abdouni, constitucionalista e criminalista
"A aceitação do convite por parte de Sergio Moro é o resultado natural da trajetória de um homem público do mais alto quilate, que se notabilizou na magistratura, na docência e na literatura jurídica por pensar em um país que efetivamente implemente políticas e instrumentos estatais hábeis a combater as organizações criminosas especialmente afetas aos crimes de corrupção e contra o sistema financeiro.

O superministério, ao concentrar os órgãos federais de controle, fiscalização, prevenção e de persecução penal de delitos dessa ordem sob a tutela de Moro, fortalecerá a operação 'lava jato' e seus desdobramentos — que já dispõe em sua consolidada estrutura de agentes policiais, procuradores e juízes federais bem afinados com os propósitos de enfrentamento ao crime organizado — e, sobretudo, fomentará a credibilidade do próprio governo de Jair Bolsonaro."

Marcelo Knopfelmacher, advogado
"Eu acho superpositiva a ida de Moro para o Ministério da Justiça ampliado. Moro tem estatura para ser um grande ministro da Justiça. Diferentemente do que sustentam alguns setores da mídia, não há que se cobrar imparcialidade com efeitos ex nunc. A comunidade jurídica não pode tecnicamente aceitar a tese da imparcialidade protraída no tempo quanto a atos futuros não praticados. Trata-se, portanto, de excelente escolha técnica, que muito engrandecerá o ministério."

Luís Henrique Machado, advogado criminalista
"Moro é um excelente nome para o Ministério da Justiça pela sua competência e, sobretudo, dedicação à agenda anticorrupção. Todavia, o flerte político ao aceitar o convite para a pasta feito pelo candidato eleito pode colocar uma nuvem de suspeição em relação aos seus atos praticados como magistrado."

Sérgio Gurgel, advogado criminalista
"Sou inteiramente favorável e otimista em relação à nomeação do juiz Sergio Moro para o Ministério da Justiça. Há muito trabalho pela frente, especialmente no que diz respeito à segurança publica. Espero que a trajetória seja vitoriosa e que não haja nenhum desgaste político capaz de prejudicar a sua indicação para o Supremo Tribunal Federal."

Renato de Vitto, ex-diretor do Depen
"Do ponto de vista ético, existe de fato um problema quando o juiz lidera uma operação que inviabiliza a candidatura do pré-candidato com maior intenção de voto e o maior beneficiário é o candidato eleito, que o convida para o cargo de maior destaque na área jurídica do Poder Executivo Federal. Seria desejável, até para a imagem da 'lava jato', que o juiz Moro não se imiscuísse, como ele proclamou que não iria fazer, na seara política, sobretudo engajado no projeto do principal beneficiário das ações da 'lava jato' que são rotineiramente acusadas de ter um viés seletivo partidário.

Do ponto de vista político, a gente tem de fato um ganho de capital político pelo candidato eleito nessa escolha, uma vez que o grande vencedor do Big Brother em que se transformou a Justiça Criminal parece ser o juiz Moro, com a sua altíssima popularidade e status de celebridade, e o futuro presidente se apropria de parte dessa popularidade ao conseguir trazer o juiz para sua equipe. Do ponto de vista do futuro ministro da Justiça, resta saber se os interesses e conflitos que já se anunciam em relação ao núcleo político e jurídico do governo vão viabilizar que ele desempenhe o papel regularmente, e não há garantia disso a não ser verificando como vai ser a dinâmica no futuro governo, mas certamente existe o aceno de algo mais permanente do que um cargo de livre exoneração, como é o de ministro da Justiça, para que ele tenha se inclinado a abandonar a magistratura para aceitar o cargo."

Eduardo Carnelós, advogado criminalista
"O comportamento do magistrado demonstra que ele não é apenas suspeito em relação ao Lula, mas é também — e sempre se mostrou assim — incompatível com o cargo de juiz. Este não pode ter atividade político-partidária, diz a Constituição Federal, e isso é uma das causas que podem fazê-lo perder o cargo (Loman, art. 26, II, a). Além disso, a independência é dever imposto a ele (Loman, art. 35, I), e a imparcialidade, requisito de sua atuação. Se um juiz se declara combatente do crime, assume um dos polos processuais, e, portanto, não pode mais julgar. E o doutor Sergio Moro sempre declarou ter um lado, que ele, eufemisticamente, talvez prefira chamar de "do bem", mas que é o de quem diz combater a corrupção. Tanto que ele aceitou o convite para ser ministro, dizendo que pretende continuar a fazer isso, para 'implementar uma forte agenda anticorrupção e anticrime organizado'. É prosseguiu: 'Na prática, significa consolidar os avanços contra o crime e a corrupção dos últimos anos e afastar riscos de retrocessos por um bem maior'. Ora, fica evidente que ele sempre agiu, na condição de juiz, como combatente por uma causa, e com isso, ao mesmo tempo, entregou-se à atividade política que lhe era desde sempre vedada. E essa atividade foi fundamental para levar ao descrédito toda a classe política e permitir a eleição de quem hoje o faz ministro. Portanto, mesmo correndo o risco de ser considerado insano, digo que todos os atos praticados por Moro na 'lava jato' deveriam ser considerados nulos."

Rodrigo Roca, advogado criminalista
"Nada muda. Sergio Moro se tornou um selo. Mal comparando é como se pretender acabar com o tráfico de drogas. Não importa quantos sejam presos ou até mesmo mortos, haverá sempre alguém disposto a assumir o seu lugar, para fazer o mesmo e obter as mesmas 'glórias'. Moro quis testar a máxima de que o crime não compensa, mas só conseguiu demonstrar que o despotismo pode te alçar a altos postos. E com isto, assim como o Capitão Nascimento, 'caiu para cima'. Se há alguma diferença, ela está em que, agora, o desmando virá de um lugar mais alto e, provavelmente, com mais força. Enfim, o caminho foi mostrado; discursem que nunca serão, mas sejam-no na primeira oportunidade. Se você construir bem a imagem de bom moço, tudo parecerá uma grande coincidência."

Daniel Leon Bialski e Guilherme Pereira Gonzalez Ruiz Martins, advogados criminalistas
"Ninguém melhor que o juiz Sergio Moro para compor a pasta do superministério do presidente Jair Bolsonaro. Moro é conhecido por sua atuação cirúrgica em casos de corrupção, assegurando a apuração de crimes nos moldes e procedimentos previstos em lei, conduzindo a operação 'lava jato' por anos e, inobstante críticas sobre algumas medidas, sua atuação e a manutenção de suas decisões são a marca de sua judicatura. Sua competência e conhecimento falam por si, não somente como juiz, mas também como professor e jurista, o que o habilita para desempenhar essas novas funções. Espera-se, então, com a sua integração no futuro governo, a atualização de nossa legislação, o endurecimento da agenda anticorrupção, a proposição de mecanismos de investigação mais eficazes e o auxílio no aparelhamento das polícias e instituições do Poder Judiciário para o combate ao crime e permitir a paz social, mas sem esquecer que vivemos num Estado Democrático de Direito."

Wadih Damous, deputado federal (PT-RJ) e advogado do ex-presidente Lula
"O aceite é a demonstração cabal do partidarismo de Moro. Ele deve se afastar ou ser afastado imediatamente da condução dos processos da 'lava jato' por escandalosa suspeição. Quanto às decisões já proferidas, deveriam ser anuladas, particularmente as que envolvem o ex-presidente Lula."

Deltan Dallagnol, procurador da "lava jato", pelo Twitter
"Minha avaliação pessoal — não estou falando neste post pelas equipes que trabalham na 'lava jato', que podem ter diferentes visões desse assunto — é que a decisão é bastante positiva para a causa anticorrupção e para o país. Há muito tempo falo que, hoje, é mais importante para o país mudar o ambiente que favorece a corrupção do que futuros resultados da 'lava jato'. Há muitas propostas substanciais, como as 10 medidas e as novas medidas, que poderão ser apreciadas, aperfeiçoadas e aprovadas.

Como ministro da Justiça, o juiz Sergio Moro poderá impactar ainda órgãos muito importantes para o controle da corrupção, como a Polícia Federal, a CGU e o Coaf, ampliando sua influência positiva dos casos em Curitiba para todo o país. Se o juiz Moro tivesse aspiração política, ele poderia ter se tornado presidente ou senador nas últimas eleições com alta probabilidade de êxito. Mentiras como essa serão repetidas, mas não vão abalar a LJ, em que atuam não só um juiz, mas 14 da primeira à última instância. O que vejo é sim uma pessoa que já demonstrou, com árduo trabalho, elevada qualidade técnica e muito sacrifício pessoal ao longo de 4 anos, que se somaram a uma trajetória pretérita respeitada, o seu comprometimento com o interesse público, com o serviço à sociedade e com o país. Vejo ainda o aproveitamento de uma oportunidade pelo juiz para dar o seu melhor a fim de construir uma sociedade com mais justiça social, mais democracia e mais segurança, assim como menos corrupção, menos impunidade e menos crime organizado. Aqui em Curitiba, a 'lava jato' seguirá com outros magistrados. Há ainda bastante por fazer e será feito. Perde-se o grande talento de um juiz, mas a maior parte da equipe seguirá firme lutando contra a corrupção, como profissionais, na operação, e como cidadãos."

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