Integridade física

Empresa de transporte responde por assédio sexual de passageiro, decide STJ

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15 de maio de 2018, 15h54

Assédio sexual dentro dos transportes coletivos é caso fortuito interno, de responsabilidade objetiva da transportadora de passageiros. Assim entendeu a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, nesta terça-feira (15/5), ao determinar que a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos indenize em R$ 20 mil uma mulher vítima de ato libidinoso praticado por outro usuário, dentro do trem.

O caso, inédito na corte, envolve uma mulher que sofreu assédio sexual dentro de uma estação, em 2014. Ela contou que “foi importunada por um homem que se postou atrás da mesma, esfregando-se na região de suas nádegas”, e que ao se queixar com o agressor constatou que o homem estava com o órgão genital ereto. A vítima relatou ainda que, por ter reclamado do ato, outros usuários do trem a chamaram de “sapatão”.

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CPTM é condenada a pagar R$ 20 mil de indenização a uma mulher vítima de assédio sexual dentro do trem. 
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O juízo de primeira instância havia rejeitado o pedido de indenização por danos materiais e morais, por entender que a CPTM não poderia responder por ato praticado por terceiros.

De acordo com a sentença, a transportadora não quebrou nenhum dever de vigilância e segurança e, naquele dia, deteve o autor dos atos após reclamação da vítima e o encaminhou à autoridade policial, conforme boletim de ocorrência. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve o entendimento.

Já a relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, afirmou que o dano integra os riscos inerentes ao transporte, mesmo causado por terceiro. É dever da ré, segundo a relatora, zelar pela incolumidade do passageiro, levando-o, a salvo e em segurança, até o local de destino.

“Embora a recorrida – em cumprimento de seu dever – tenha localizado e conduzido o agressor à delegacia, nada mais fez para evitar que esses fatos ocorram. Há uma plêiade de soluções que podem talvez não evitar, mas ao menos reduzir a ocorrência deste evento ultrajante, tais como a disponibilização de mais vagões, uma maior fiscalização por parte da empresa, etc”, disse Nancy. 

Sergio Amaral
Nancy Andrighi afirmou que empresa poderia conter episódios como esse com mais vagões e aumento da fiscalização.
Sergio Amaral

“Mais que um simples cenário ou ocasião, o transporte público tem concorrido para a causa dos eventos de assédio sexual. Em tal contexto, a ocorrência desses fatos acaba sendo arrastada para o bojo da prestação do serviço de transporte público, tornando-se assim mais um risco da atividade, a qual todos os passageiros, mas especialmente as mulheres, tornam-se sujeitos”, afirmou.

A ministra apontou que o assédio sexual tem crescido no estado de São Paulo, conforme dados da Secretaria da Segurança Pública: entre janeiro e dezembro de 2017, houve  aumento de 35% no número de ocorrências registradas, em relação ao mesmo período de 2016.

Problema histórico
A ministra disse ainda ser necessário proteger a “incolumidade físico-psíquica” das mulheres que sofrem assédios em transportes públicos no Brasil. “O ciclo histórico que estamos presenciando exige um passo firme e corajoso, muitas vezes contra uma doutrina e jurisprudência consolidadas. É papel do julgador, sempre com olhar cuidadoso, tratar do abalo psíquico decorrente de experiências traumáticas ocorridas durante o contrato de transporte”, disse Andrighi.

“Atos de caráter sexual ou sensual alheios à vontade da pessoa a quem se dirige – a exemplo de 'cantadas', gestos obscenos, olhares, toques não consentidos, entre outros – revelam manifestações de poder do homem sobre a mulher, mediante a objetificação sexual de seus corpos. Em que pese tenham natureza lasciva, esses atos servem, também, para a reafirmação da masculinidade e poder”, destacou a relatora.

A decisão desta terça-feira foi por maioria de votos. Ficou vencido o ministro Marco Aurélio Bellizze, presidente da 3ª Turma. 

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Questão controversa
A discussão sobre a responsabilidade objetiva do transportador, julgada agora pelo STJ, é recorrente no Judiciário paulista.

Das 16 câmaras do Direito Privado que julgaram recentemente o tema, só 6 reconhecem o dever de indenizar quando isso ocorre, conforme levantamento do Anuário da Justiça São Paulo.

Clique aqui para ler o voto da relatora.
REsp 1.662.551

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